Índice de Capítulo

    Quer apoiar o projeto e garantir uma cópia física exclusiva de A Eternidade de Ana? Acesse nosso Apoia.se! Com uma contribuição a partir de R$ 5,00, você não só ajuda a tornar este sonho realidade, como também faz parte da jornada de um autor apaixonado e determinado. 🌟

    Protótipo de capa Volume 1 – Ironia Divina

    Capa Volume 1

    Apoia-se: https://apoia.se/eda

    div

    A luz filtrada pelas folhas das árvores derramava-se sobre Ana como um véu dourado, desenhando sombras ondulantes sobre sua pele. O calor era familiar, mas havia algo diferente nele. Não era apenas luz. Era textura. Era peso. Sentia partículas do ar tocando sua pele como seda invisível, acariciando-a, enquanto o sopro do vento trazia um mosaico de aromas que jamais percebera antes.

    A terra sob seu corpo não era apenas um chão. Era um campo pulsante, transmitindo vibrações sutis, como se ela pudesse ouvir o sussurro das raízes sob a superfície. Até o silêncio, antes tão absoluto, agora parecia vivo. Ouvia os insetos rastejando na madeira, a tensão de cada folha resistindo ao vento, a cadência oculta no canto distante dos pássaros. O mundo respirava ao seu redor, e ela respirava com ele.

    — No fim realmente não morri? — murmurou, ainda atordoada. Seu próprio tom soou estranho aos seus ouvidos. Mais fundo e controlado.

    Abriu e fechou as mãos. A força ali presente era algo novo. Era uma força crua, intensa de forma diferente da que recordava possuir. Sem pensar, ergueu-se. Seus músculos responderam antes mesmo que sua mente ordenasse. Sentia-se presa dentro do próprio corpo. Precisava se mover.

    A faca estava em sua cintura. Puxou-a com fluidez instintiva e cortou o ar com um golpe rápido. O silvo da lâmina foi afiado, deixando o vento em pleno lamento. Movimentou-se de novo, e de novo. Cada ataque parecia desconectado de qualquer memória de treinamento, mas ainda assim exalava uma maestria inquietante. Suas pernas deslizavam sobre a areia, o corpo girava com precisão absurda.

    Era gracioso de forma incomum, como se dançasse.

    — Sim… a “Dança de Ana”… 

    Um bom nome. Mas um nome para quê?

    — Eu… não sei.

    Como podia não saber?

    O pensamento incompleto a irritou. A frustração cresceu dentro dela, incendiando cada movimento. Seus golpes tornaram-se mais rápidos e mais ferozes. Precisava esvaziar a mente, dissipar a inquietação. Girou, atacou o nada com brutalidade.

    Até que algo sólido se interpôs em seu caminho.

    A faca encontrou uma pedra massiva. Resistente e imóvel, deveria ter sido o fim do ataque. Mas não foi. O aço ruiu, se despedaçando em incontáveis fragmentos, enquanto uma fissura monstruosa serpenteava pela superfície da rocha como se tivesse sido atingida por um trovão.

    Ana recuou um passo, ofegante. Olhou para o cabo da arma destruída ainda em sua mão. O que ela acabara de fazer? Não importava, sorriu.

    Ergueu os olhos para o céu. Havia escuridão ali.

    — Não era manhã? — sussurrou, incrédula.

    A certeza de que havia despertado sob o sol quente era absoluta. No entanto, agora o firmamento estava denso, pesado. A ponta de uma grande lua minguante já se mostrava no horizonte, e a noite aos poucos tomava seu merecido espaço.

    Então, ouviu um som seco, um estalar de lábios.

    — Tsc.

    Era o tipo de coisa que não ouvia há muito tempo. Um de resmungo que, até onde se lembrava, só costumava sair dos seus próprios lábios.

    A voz veio logo depois, carregada por um tom que não combinava com o dono.

    — Não precisa ficar com essa cara de ué. Entendo o que está sentindo.

    A familiaridade somada à estranheza fizeram com que virasse o rosto abruptamente, e suas sobrancelhas arquearam em surpresa. Gabriel estava ali. Mas não como sempre. Não com aquele desdém celestial e distante. Não com aquele tom impassível que fazia questão de manter.

    Seus olhos a analisavam com algo novo. Uma mistura de curiosidade e admiração.

    Ana franziu a testa.

    — Desde quando você fala assim?

    O anjo inclinou a cabeça levemente, como se considerasse a pergunta. Então, um pequeno sorriso nasceu, e ele a ignorou e continuou.

    — Você se perdeu no instinto, monstro.

    — De que merda você tá falando?

    — Disso! — exclamou Gabriel, apontando para os destroços da faca no chão, como se estivesse mostrando um corpo recém-assassinado. — Sua memória pode ter sumido, mas não dá pra apagar o que foi marcado na sua carne através do esforço.

    Ana o encarou. Algo dentro dela se agitava, uma onda fria tentando arrastar seu entendimento para a superfície. E então, o estalo.

    Sua memória… não estava lá.

    Mas não era um vácuo. Não era o esquecimento gentil de quem deixa um copo em algum lugar e não lembra onde. Era um buraco negro consciente, um parasita devorador de significado.

    Ainda podia sentir o conhecimento ali, escorrendo como óleo entre seus dedos. Quando olhava para as árvores, sabia, em algum nível primitivo, que elas não eram apenas árvores, mas sistemas complexos de vasos e fibras vivas. Se observava as próprias mãos, conseguia nomear cada osso, cada maldita articulação, cada centímetro de tecido que lhe pertencia.

    E Gabriel… era como se ele sempre tivesse existido ali.

    Essas certezas eram um ferro em brasa na mente dela, mas entre o início do Grande Vazio e aquele momento… Havia uma lacuna. Um silêncio seco e sufocante onde deveria haver um rugido de lembranças.

    O vazio não a assustou.

    O vazio a enfureceu.

    — O que você fez?

    — Sempre a mesma pergunta… eu te ajudei.

    A frase deveria ter sido um bálsamo, mas desceu como um punhado de agulhas.

    — Me ajudou?! — O grito rasgou sua garganta, e a dor só inflamou ainda mais o riso amargo que escapou logo em seguida. Um riso de incredulidade. De desespero. De alguém que acabara de perceber que lhe arrancaram um pedaço da alma e esperavam que ela dissesse “obrigada”. — Eu me sinto… ridícula. Eu me sinto burra! Como você pôde?

    Cada palavra cuspida era como um prego cravado em sua própria carne. A verdade se revelava cruel: o que restava era somente a incerteza.

    O que ela ainda sabia? O que tinha sido apagado? Pelo que passou de verdade? O que viveu? Por que diabos se sentia tão pequena? 

    Gabriel bufou, se apoiando na pedra partida com a casualidade de quem não estava prestes a levar uma facada — se ela ainda tivesse uma, claro.

    — Você é ingrata pra caralho.

    Havia algo nos olhos dele. Uma tensão contida, um cansaço que não combinava com seu dócil semblante feminino.

    — Seu cérebro humano estava prestes a fritar. Eram informações demais, mais do que você podia carregar. Agora essa merda toda tá selada, então, sim, eu te ajudei, desgraçada. Te salvei! — A mandíbula dele se contraiu, um pequeno traço de algo que se assemelhava ao ressentimento. — E acredite… você não foi a única que perdeu nessa brincadeira.

    Ana piscou.

    — O quê?

    A ficha caiu como um meteoro em sua mente. 

    Um selo.

    O uso de tal palavra implicava em trancafiamento, não em perda. Menos mal, afinal, selos podem ser quebrados. Não pôde evitar o meio sorriso resignado. Ainda havia um caminho. Ainda havia algo a fazer.

    Vendo a fagulha de pensamento crescer nos olhos dela, Gabriel suspirou, cruzando os braços.

    — Nem começa a maquinar, monstro. Suas memórias foram apenas arquivadas. Tá tudo aí dentro. — Ele a observou por um segundo antes de continuar, com um tom mais sombrio. — Mas se quer de volta, tem que ser capaz de carregar o peso delas. Torne-se mais forte. Seu corpo e sua mente precisam ser dignos da busca pela onisciência.

    Força?

    Essa palavra já não significava o que um dia significou.

    Antes, força era algo físico. Era um punho fechando. Um golpe certeiro.

    Isso não deveria ser uma condição de existência. Um pré-requisito para ser quem ela era. Seu treinamento até aquele momento havia sido uma forma de preencher o tédio. Uma forma de evitar o medo.

    Agora a lembrava uma dívida a ser paga.

    — Não acho que eu possa ficar mais forte do que já sou — murmurou.

    — Eu também não — Gabriel riu, um som curto, sem qualquer esforço para ser reconfortante. — Mas você tem algo melhor pra fazer além de tentar?

    Ana ergueu o rosto, pronta para mandá-lo para o inferno.

    Mas sua boca a traiu. Seus lábios tremiam.

    Ele estava certo.

    E isso era um saco.

    A raiva se dissolveu em uma gargalhada exausta, e seus dedos finalmente afrouxaram. Fragmentos do que restava do cabo de sua pequena arma caíram no chão, tilintando fracamente contra a pedra. Os observou por alguns segundos, e logo suspirou.

    — Mas primeiro, preciso de uma nova faca.

    Gabriel revirou os olhos.

    — Pra quê? Vai acabar igual a essa.

    — Foda-se. Eu gosto de facas.

    O anjo encarou a noite por um instante enquanto a jovem eterna ao seu lado começava a caminhar, como se estivesse perguntando a alguma entidade divina por que diabos ainda se dava ao trabalho de questioná-la.

    — Você realmente não sabe definir prioridades.
    div


    Quer apoiar o projeto e garantir uma cópia física exclusiva de A Eternidade de Ana? Acesse nosso Apoia.se! Com uma contribuição a partir de R$ 5,00, você não só ajuda a tornar este sonho realidade, como também libera capítulos extras e faz parte da jornada de um autor apaixonado e determinado. 🌟

    Venha fazer parte dessa história! 💖

    Apoia-se: https://apoia.se/eda

    Discord oficial da obra: https://discord.com/invite/mquYDvZQ6p

    Galeria: https://www.instagram.com/eternidade_de_ana

    Curtiu a leitura? 📚 Ajude a transformar Eternidade de Ana em um livro físico no APOIA.se! Link abaixo!

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 100% (4 votos)

    Nota