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Protótipo de capa Volume 1 – Ironia Divina
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Capítulo 187 – As Asas da Rainha
Não demorou para Ana entender como controlar o elegante navio.
Ela passou horas mergulhada no estudo do pequeno pingente, entendendo cada traço minucioso da runa gravada.
“Algo assim realmente não podia ser tão simples.”
Percebeu que o objeto era muito mais complexo do que aparentava à primeira vista, repleto de nuances que escapavam a olhos desatentos.
Cada traço era um enigma, um mistério esculpido em metal antigo. O que parecia uma simples gravação revelava-se um labirinto de inscrições microscópicas, tão elaboradas que apenas utilizando vidros improvisados, lentes rudimentares e a luz filtrada do sol era possivel discernir seus segredos — uma gambiarra que, para sua surpresa, funcionou perfeitamente.
Assim, viu padrões que dançavam diante dos seus olhos, seguindo a análise como se estivesse dissecando uma criatura viva. Tudo aquilo era como um mapa, ou talvez um idioma feito de linhas, curvas e pontos que simulavam um circuito de comandos ocultos, codificados em camadas sobrepostas.
O navio era um reflexo de cada detalhe daquela estranha runa.
Para controlá-lo, ela precisava de contato direto com o pingente. Felizmente, não necessariamente sua mão deveria estar em torno dele, mas sim qualquer mínimo toque já era o suficiente, desde que um fluxo constante de mana alimentasse a conexão.
O controle era incrivelmente sensível, e curiosamente íntimo.
Lia cada intenção, cada impulso de sua mente, cada fragmento de pensamento e cada variação emocional.
Tudo parecia influenciar a estabilidade da embarcação.
Era um sistema perigoso, uma simples distração poderia significar um desastre, fazendo o navio mergulhar como uma pedra, despedaçando-se em uma explosão espetacular.
Exigia uma concentração constante e precisa.
Foco absoluto.
Mas para Ana?
Isso não era um problema.
Na verdade, era como se o próprio destino tivesse implantado um novo membro em seu corpo — um titã dos céus, respondendo ao menor dos seus caprichos.
Após algumas voltas ao redor da taverna, a rainha já estava confortável o suficiente para conversar com os demais, como se estivesse dirigindo uma carroça qualquer.
Conduzir aquela monstruosidade era como andar de bicicleta.
Divertido. Natural. Instintivo.
Finalmente confortável, pousou o navio pela primeira vez.
Assim que o casco tocou o chão, ficou evidente que algo estava errado.
Um som seco, como o primeiro eco de um aviso.
E então, vieram os vômitos.
Talvez fosse devido ao pingente estar em sua posse, por sua mana ser diferente da dos outros ou por alguma bobeira cósmica que ela não se importava em entender profundamente, mas a rainha não sentia nada estranho em seu próprio corpo.
No entanto, não era o mesmo para os outros sobreviventes.
Todos, até então atônitos enquanto observavam as manobras na estrutura voadora, caíram em uma onda de fraqueza.
Um após o outro, começaram a desmoronar de joelhos, curvando-se, com as mãos trêmulas apoiadas no chão, ofegantes enquanto seus corpos tremiam.
“É bem problemático…”, pensou Ana, franzindo o cenho.
Sem perder tempo, saiu apressadamente dali, deixando o cenário de náusea para trás.
Depois de algumas horas de observação e análise, finalmente entendeu o motivo.
“Essa merda é uma devoradora de mana.”
O navio não apenas navegava pelos céus — ele se alimentava.
Sugava a mana não apenas da atmosfera, mas de qualquer coisa viva ao seu redor. Era como uma criatura faminta, silenciosa, insaciável.
Com mais alguns testes cuidadosos, identificou que, dos mais de cento e cinquenta sobreviventes, menos de cinquenta conseguiram embarcar ao seu lado sem desmaiar.
E mesmo esses poucos ainda apresentavam sintomas leves: tontura, fraqueza muscular, uma sensação de vazio que os fazia parecer mais humanos do que nunca.
Era como se seus corpos estivessem sendo forçados a retornar a um estado “normal”, forçados a viver por um breve momento como se nunca tivessem tocado a mana.
— Não tem o que fazer — disse Ana, dando de ombros. — É ótimo ele conseguir se manter no ar apenas roubando mana da atmosfera, mesmo com esse efeito colateral.
Alex, lutando para se manter de pé, parecia estar carregando o peso de uma montanha. Sua nova armadura, que cobria de cima a baixo seu avermelhado corpo corrompido, agora era uma âncora que o arrastava para o chão.
— Mas isso não é perigoso? — perguntou ele, o rosto contraído de esforço. — Não podemos lutar assim.
— Claro que é perigoso. — respondeu a rainha, com um sorriso cínico e um brilho sádico nos olhos.
Deu um tapinha no casco do navio, como se estivesse elogiando silenciosamente o artista invisível que o construiu, e logo continuou.
— Mas também é útil. E muito.
— Útil?
Como se já esperasse a pergunta, Ana levantou três dedos em frente ao rosto do guerreiro. Com a outra mão, segurou o primeiro deles.
— Qualquer inimigo que tentar invadir vai sofrer o mesmo tipo de consequência. E isso é ótimo, pois não vão estar acostumados como nós.
Alex respirou fundo, aceitando o argumento enquanto lutava para não cair. Antes que pudesse falar, Ana segurou o segundo dedo, e com um abraço largo, puxou Miguel para perto.
— Também temos esses caras! Aqui vão realmente brilhar!
O secretário de pedra deu um sorriso cansado, mas não resistiu ao puxão da rainha, apenas parecendo meio envergonhado.
— E, claro, não falei do ponto mais importante… — murmurou Ana em voz baixa, diferente do alto anúncio que fez a um instante atrás.
Ficando em silêncio, manteve o último dedo levantado, e uma pequena chama escura surgiu ao redor de suas unhas negras, sumindo em um piscar de olhos.
Alex apressadamente se afastou, quase caindo, mas logo se ajeitou enquanto rangia os dentes.
Era ótimo que Ana ainda pudesse usar sua mana reversa em um ambiente em que todos estavam suprimidos, mas havia algo além. Por mais que pensasse que já tinha se acostumado aquele poder escuro, mas por algum motivo havia voltado a sentir arrepios durante as manifestações da rainha. Era mais denso do que antes, mais aterrorizante.
— Faz sentido… Ainda assim, é horrível.
Ana gargalhou alto, uma risada que ecoou pelo ar como um trovão inesperado em um dia calmo.
— Há momentos em que ser fraco é bom. Você vive reclamando que é difícil fazer uma academia para corpos que conseguem levantar carros, não é?
Alex bufou, franzindo o cenho.
— É diferente.
— Porra nenhuma! — Ana deu um tapa amigável no ombro dele, que quase o derrubou com o peso da armadura. — Aproveita que tá sem mana pra treinar de verdade agora. Acabou a moleza.
Alex resmungou algo incompreensível, mas um sorriso surgiu no canto de sua boca.
— Tá, tá… Mas e então? Já vamos entrar? — perguntou enfim o guerreiro, com a curiosidade finalmente vencendo o desconforto.
O sorriso de Ana desapareceu, substituído por uma expressão mais séria, os olhos fixos na porta metálica que levava ao interior do navio.
— Estava esperando as coisas acalmarem. Não sei o que vai ter lá embaixo.
Se coçava para entrar lá desde o primeiro momento em que pisou a bordo.
Mas se conteve.
Não confiava na Colecionadora.
Agora que entendia o básico do funcionamento da embarcação, sentia-se mais preparada.
Respirou fundo, olhou para seus dois companheiros, e assentiu.
— Vocês vêm comigo.
Com um gesto simples, o som do mecanismo ecoou, um estalo metálico seguido por um leve sibilo de ar comprimido.
A porta se abriu, revelando um corredor escuro iluminado por luzes que variavam entre laranja e branco, trazendo consigo um cheiro metálico e estéril, como se o navio guardasse sua própria atmosfera.
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