Índice de Capítulo

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    — Dessa vez só acertei um.

    A voz de Eva veio carregada de frustração contida enquanto removia cuidadosamente uma flecha de sua coxa. Os músculos do rosto estavam tensos, cada movimento era um exercício de controle para não soltar um palavrão alto o suficiente para chamar atenção indesejada.

    Lucia, ao seu lado, segurava uma faca sobre uma pequena chama conjurada, esperando que a lâmina atingisse um brilho incandescente. Assim que ficou quente o suficiente, estendeu para a ruiva.

    — Aqui.

    — Obrigada… — Eva pegou com uma relutância visível.

    A palavra soou sincera, mas abafada pela dor iminente.

    Os dentes travaram. A lâmina quente encontrou a pele rasgada. O cheiro de carne queimada se misturou ao ar frio da floresta.

    Eva não gritou.

    Ela simplesmente respirou fundo e seguiu em frente.

    Foi a segunda vez que foi acertada. Depois do primeiro lançamento, os caçadores ficaram mais espertos. Eles começaram a correr mais rápido, se aproximando cada vez mais. Quando Eva se lançou ao ar pela segunda vez, seis flechas vieram na sua direção.

    Duas foram desviadas com seu próprio arco. Três erraram. Mas uma…

    Uma passou rente demais.

    O corte no braço direito era longo, ardia como fogo, mas não foi o suficiente para pará-la. Mesmo ferida, conseguiu eliminar mais dois inimigos. Isso foi o suficiente para reacender uma centelha de esperança.

    Assim, três deles ainda restavam.

    E agora estavam ocultos. Silenciosos. Como predadores esperando a presa abaixar a guarda.

    Entre estes, estava Matheus. Eva o viu. E ele a viu de volta.

    Na terceira vez em que subiu ao céu, seus olhos haviam se cruzado.

    E ele sorriu.

    Um sorriso que não deveria estar ali. Que não combinava com o momento. Que fazia algo frio se espalhar pelo corpo de Eva. Ela soube, soube, que se voltasse ao céu, morreria.

    — Aquele cara é nojento.

    — Inegavelmente sim — respondeu Lucia com um meio sorriso. A pausa que se seguiu veio densa, carregada de tensão. — Nossa situação melhorou. Você acha que eles vão continuar nos seguindo?

    Eva suspirou, testando sua perna machucada antes de se apoiar no arco e se levantar.

    — Tenho certeza que sim. — A dor era um lembrete incômodo, mas ignorável. — Você sabe lutar, certo?

    — Claro que sim — Lucia respondeu automaticamente. — Mas não à distância…

    — Ótimo. — Eva limpou um fio de sangue do braço e apontou para a direção onde os caçadores deviam estar. — Eles estão a mais ou menos 300 metros atrás. Se pararmos, vão disparar. Quero que me lance de novo.

    Lucia franziu a testa.

    — Você não disse que vai dar merda se subir mais uma vez?

    — Sim… mas, de qualquer forma, eu não vou conseguir continuar correndo assim. — Apontou para a perna ferida. — Assim que me lançar, quero que você corra direto para eles. Vamos atacar juntas.

    — Mas não vou conseguir te segurar se fizer isso!

    Eva deu de ombros.

    — Eu me viro. Um ou dois ossos quebrados são melhores do que uma flecha atravessando minha cabeça.

    As duas se encararam. E riram. Baixo, sem exagero, sem alegria de verdade, mas riram.

    Porque o desespero às vezes se disfarçava de humor.

    Eva inspirou fundo.

    — Vamos parar. Assim que desviarmos do disparo, você me joga e corre.

    Lucia assentiu.

    — Certo…

    Então pararam. Não houve hesitação do outro lado, três flechas voaram de imediato em direção às duas.

    Era agora ou nunca.

    Deram a mão e saltaram juntas.

    As flechas rasgaram o ar, zunindo perto demais, rápidas demais. Eva sentiu o vento cortante de uma passando a milímetros de sua bochecha. Foi por um triz.

    Lucia não perdeu tempo. Assim que seus pés tocaram o chão, abaixou-se e, num movimento brusco, lançou a companheira ao céu novamente.

    O tempo pareceu desacelerar.

    Menos de dois segundos haviam se passado e Eva já conseguia enxergar o campo de batalha de cima. Seus olhos correram rápido, absorvendo tudo. Viu as novas flechas sendo disparadas em direção a Lucia, e a jovem se escondendo atrás de uma árvore para evitá-las.

    Ela segurou a respiração. Não podia errar dessa vez.

    Sua flecha já estava em seu arco, a tensão do fio ressoando na palma da sua mão. Seu alvo era Matheus. Encontrou-o rapidamente entre as sombras. O homem também a encontrou.

    O disparo dele veio primeiro.

    Eva quis retaliar, quis enfiar uma flecha naquele maldito sorriso, mas, no último instante, algo chamou sua atenção.

    Lucia já estava sobre eles.

    A garota se jogou como um animal selvagem sobre um dos arqueiros, derrubando-o no impacto. Mas o outro…

    O outro estava mirando diretamente em suas costas.

    “Tenho certeza que vou me arrepender disso.”

    Eva virou a mão no último segundo.

    A flecha que deveria ter ido em direção ao líder da guilda agora voava como um raio em direção ao subordinado que ameaçava Lucia. O tiro foi certeiro. O homem tombou sem nem entender o que aconteceu, e, apesar de ter disparado, o curso foi desviado com sucesso, acertando apenas o solo. Mas Eva mal teve tempo de sentir alívio.

    Seu próprio corpo foi sacudido pela dor.

    A lateral de seu abdômen foi perfurada.

    O impacto foi brutal, roubando o ar de seus pulmões. Tentou se mover, puxar mais uma flecha, mas a dor queimava como fogo líquido, tornando sua visão embaçada. Seu braço fraquejou. Seu arco pesou como chumbo em suas mãos.

    Abaixo dela, Matheus ria, e já estava disparando de novo.

    Dessa vez, contra Lucia.

    Mas a garota também já estava em movimento. E seus movimentos foram incríveis.

    Vendo a flecha vindo em sua direção, soube que não conseguiria se esquivar totalmente. Mas ainda assim, girou o corpo. A lâmina de sua espada ricocheteou o disparo. O impacto arrancou a arma de suas mãos, e desviou a flecha apenas o suficiente para que ela não perfurasse seu peito.

    O ombro esquerdo não teve a mesma sorte.

    A flecha atravessou sua carne, passando perigosamente perto do coração. Um centímetro de diferença, e ela estaria morta.

    Mas Lucia ignorou as juntas destruídas. Com um olhar frio, jogou-se sobre Matheus.

    Então Eva perdeu a visão.

    Seu corpo despencou. O vento chicoteava seu rosto, arrancava seus pensamentos. Ela tentou desesperadamente se agarrar a um galho com o arco.

    Agarrou.

    Mas seus braços não tinham mais força, a arma deslizou de seus dedos.

    E então… impacto.

    Um estalo seco ecoou na floresta. Depois, outro.

    A dor veio cortante, avassaladora, incapacitante. Eva não precisava olhar para saber — ambos os braços estavam quebrados, torcidos em posições que com certeza não deveriam estar.

    Se forçou a não gritar, mas lutar contra a escuridão que ameaçava puxá-la era uma batalha muito mais difícil.

    “Se eu desmaiar, morro.”

    Foi esse pensamento que a manteve acordada. Felizmente, ouviu um chamado.

    — Eva! — A voz veio de longe, mas se aproximava rápido. — Eva, eu consegui!

    Lucia surgiu sobre a garota caída, jogando-se no chão ao lado de seu corpo.

    A manipuladora também estava um desastre. Um grande hematoma escuro envolvia seu olho esquerdo, os braços estavam ensanguentados. Sua espada… sumira. Mas seu rosto…

    Seus lábios, seus dentes, até seu nariz estavam completamente vermelhos.

    Sangue.

    Eva riu fracamente.

    “Lembra a Ana até demais.”

    Não sabia o que Lucia havia feito, mas conseguia imaginar.

    — Luci… a… o… frasco… vermelho.

    Sua voz estava fraca, muito mais do que esperava, mas conseguiu dizer.

    A manipuladora entendeu de imediato.

    Sem hesitação, pegou o objeto da cintura da ruiva, puxou a tampa com os dentes e fincou firmemente na armadura negra.

    — Isso vai te curar?

    Eva tentou responder, mas não conseguiu. Apenas acenou levemente, sentindo o líquido quente se espalhar por suas veias.

    Lucia sorriu, aliviada.

    Mas então… algo mudou.

    Seu rosto se contorceu em espanto, a testa franziu e a boca entreabriu-se, como se um súbito pavor a tomasse.

    Eva estranhou tal reação, e também franziu a testa. Então sentiu.

    Seus olhos começaram a queimar. Queimar muito.

    O calor não era de cura. Era corrosivo. Fogo dentro de sua cabeça.

    Tentou respirar, mas o ar não vinha. Tentou falar, mas a voz mal saía.

    — Qual… frasco… pegou?

    Lucia piscou, confusa.

    — Ué, peguei o vermelho, como você disse. O que estava pendurado na sua cintura.

    — Qual… la… do?

    — Esquerdo… tinha alguma diferença?

    Eva riu. Ou tentou rir.

    O som que saiu foi um suspiro fraco, quase um lamento.

    — Ah… fe…rrou…

    A consciência começou a escorregar por seus dedos.

    Maldita ideia de escolher um frasco só por causa da cor.

    Maldita ideia de aceitar qualquer coisa vinda de Ana.

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