Índice de Capítulo

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    Protótipo de capa Volume 1 – Ironia Divina

    Capa Volume 1

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    — Você me lembra uma criança.

    A acusação veio carregada de ironia, mas sem malícia. Júlia cruzou os braços, a boca preenchida por um sorriso zombeteiro.

    — Júlia! — Alex suspirou, empurrando sutilmente o braço da garota com o cotovelo, como um pai lidando com uma filha que não sabia quando parar.

    — Que foi? Ela lembra mesmo! — Júlia rebateu, empinando o queixo como se desafiasse qualquer um a discordar. — Olha pra ela, tenho certeza que vai perguntar o que são caçadores!

    — Não vai não. Eu acho…

    O olhar da arqueira ruiva deslizou para Ana com uma expressão que misturava provocação e desafio. O sorriso ficou mais largo quando percebeu que a mulher torcia os lábios, como se tentasse segurar uma resposta que não queria admitir.

    Ana expirou lentamente, deixando o corpo relaxar de forma quase exagerada.

    Tinha uma ideia do que eram caçadores. Eles não eram raros em mundos de fantasia. Mas o fato de não serem raros não significava que eram todos iguais.

    Já lera sobre mundos onde caçadores eram soldados governamentais, divididos por patentes rígidas e obrigações estatais. Em outros, eram mercenários independentes, livres para explorar, mas obrigados a pagar tributos exorbitantes. Alguns eram guardiões espirituais, escolhidos não por habilidade, mas por algo que só os deuses entendiam. Outros eram simplesmente sobreviventes, lutando pela própria vida contra horrores insondáveis.

    Ou seja, dar um palpite agora era só pedir para passar vergonha.

    — Eu vou ser sincera, estive um pouco isolada nesses últimos anos… não sei o que são.

    Júlia franziu o cenho.

    — Alguns chamam de  pioneiros, vanguarda, transcendentes, excelsi ou adeptos. Nada disso soa familiar?

    Ana ergueu ambas as mãos, como uma estátua de pura ignorância.

    Júlia arregalou os olhos, escandalizada.

    — Eita preula! Não vai me dizer que você veio do norte?

    — Não tem como ela ser do norte, tonta. — Alex rolou os olhos, visivelmente acostumado às teorias absurdas da amiga. — Ela fala português bem demais.

    — Mas eu ouvi que teve brasileiros que acabaram indo parar lá também, idiota! Só não sei se sobreviveram… São todos bárbaros naquelas bandas…

    O jovem lanceiro sorriu, desistindo de discutir. Então, voltou-se para Ana com um olhar mais sério, embora ainda curioso.

    — É mais fácil só perguntar. Sem querer ser indelicado, mas… em que região você vivia em Aurórea?

    Ana piscou. 

    Desisto…

    Aurórea. Mais um termo novo para investigar. Respirou fundo, massageando a têmpora antes de responder.

    — Vocês não estão entendendo. Eu estive absolutamente isolada, vocês são as primeiras pessoas que vejo em anos.

    A desculpa ia colar? Não sabia.

    Mas também não tinha a menor ideia de como explicar a verdade sem parecer completamente insana.

    Oi, prazer, sou Ana, vivi sozinha por alguns séculos sem envelhecer, treinando habilidades absurdas enquanto um anjo me seguia sem dizer uma palavra. Ah, e tem mais: acordei numa floresta que não deveria existir, matei dois monstros gigantes, e agora vocês tão falando como se eu devesse saber onde diabos é Aurórea. Mas eu não sei!

    Sim. Definitivamente não ia rolar.

    Na verdade, nem ela sabia se acreditava mais em sua própria história.

    — Primeiras pessoas em anos? Se foi tão reclusa assim… não vivia em uma cidade, então? — Alex inclinou ligeiramente a cabeça, observando-a com curiosidade. — Não achei que fosse possível viver sozinho por tanto tempo, mas deve ser por isso que você é tão forte mesmo sendo tão jovem.

    Ana engasgou com uma risada involuntária, mas disfarçou com uma tosse. Jovem? Aquilo era engraçado.

    — Não sei de nada disso, eu só… vivi normalmente. — Desviou o olhar, o fixando nas chamas oscilantes da fogueira. — Enfim, caçadores são algum tipo de organização?

    — Mais ou menos. — O lanceiro coçou o rosto, escolhendo as palavras. — Muita gente morreu depois que fomos jogados em Aurórea, então os sobreviventes acabaram se juntando pra criar alguns pontos seguros… Pô, é difícil demais explicar sem você conhecer as cidades…

    — Caçadores são a elite. — Júlia interrompeu, claramente impaciente com a falta de clareza do companheiro. — Não querendo me gabar, mas nem todo mundo conseguiu aprender a lutar nesses dez anos. Quem tem talento com armas virou caçador. Quem não tem, cuida do resto.

    Havia orgulho em sua voz, mas logo fez uma careta emburrada, cruzando os braços.

    — Claro, nem todo mundo é talentoso igual você. Um caçador de rank D aos vinte e pouquinho é ridículo. — Resmungou, olhando para Ana com uma mistura de admiração e ressentimento. — Gente normal, igual nosso grupo, tá no rank F. Os melhorzinhos chegam no rank E. Você é elite da elite.

    Ana franziu o cenho.

    — Ranks…?

    A pergunta pairou no ar, incompleta, mas clara o suficiente. 

    Júlia revirou os olhos.

    — Você é muito alienada!

    — Deixa ela em paz, Júlia. Como ela ia saber de ranks se nunca viu caçadores? — Alex brincou, sentando-se novamente próximo à fogueira. — É tudo sobre quanta mana você absorveu. Sabe, mais mana, mais força e tal. Não tem muito o que explicar disso.

    — Ah, sim… faz sentido…

    Mas não fazia.

    Se estava absorvendo mana apenas por existir, como exatamente aquilo funcionava? Era um processo involuntário? Precisava de alguma técnica específica? E mais importante, se estavam dizendo que ela parecia uma rank D, então significava que existiam pessoas mais fortes do que ela? Mesmo depois de tanto tempo treinando, se aprimorando, moldando cada fibra do próprio corpo?

    A ideia era intrigante. Um incômodo gostoso rastejou sob sua pele, algo entre excitação e descontentamento.

    Mas algo muito mais alarmante tomou sua atenção.

    Dez anos.

    Foi um detalhe solto, quase casual, mas cravou-se em sua mente como um prego enferrujado.

    Dez anos?

    Sua cabeça girou, processando a informação com um atraso desconfortável. Dez anos para eles… e quanto tempo para ela?

    Tinha certeza que não esteve sozinha apenas por uma década. Não podia ter sido só isso. Nem mesmo o tempo que passou em frente àquela bigorna — com testes, erros e repetição infinita — cabia em meros dez anos.

    Era como se estivesse tentando encaixar um oceano dentro de um copo d’água.

    Então o que estava acontecendo? Distorção do tempo. Foi a única hipótese que conseguiu montar sem saber os detalhes. O mundo a esqueceu por um tempo maior do que aqueles jovens jamais poderiam imaginar. Era ridículo descobrir que para o resto da humanidade se passou tão pouco tempo.

    Seu corpo tencionou instintivamente, os dedos tocando o cinto onde guardava a faca. Ou onde deveria guardá-la.

    Não estava lá.

    Seu coração deu um único baque forte no peito.

    — Onde está minha faca? 

    Olhou em volta, pensou um pouco, e então caminhou até o lobo-guará no qual estava apoiada. Com um único movimento, virou a criatura. O peso não era um problema; seus músculos, mesmo doloridos, ainda respondiam com precisão. E lá estava ela, cravada como um espinho fatal, um último suspiro transformado em aço.

    A faca permanecia fincada no corpo do monstro, parcialmente oculta entre os pelos avermelhados, uma extensão de sua própria existência. Puxou-a com firmeza, sentindo a resistência momentânea antes do som úmido da lâmina se desprendendo da carne morta. Girou-a entre os dedos, um gesto automático, um ritual inconsciente que fazia parte de quem era.

    Ao tentar embainhá-la, um detalhe a fez parar.

    A arma não encaixou perfeitamente.

    Franziu o cenho, afastando-se um pouco para analisar melhor. Retirou o cinto, trazendo a lâmina ao nível dos olhos. Uma pequena fresta separava a empunhadura do estojo, uma diferença mínima que apenas alguém que conhecia cada milímetro da própria criação perceberia.

    Puxou-a de volta, o metal deslizando suavemente para fora da bainha, refletindo a luz da fogueira com um brilho escuro e opaco. Passou os polegares ao longo do gume, sentindo a frieza da lâmina, o peso sutilmente diferente em suas mãos.

    Quatorze centímetros e… um pouco mais.

    Não deveria estar maior. Seu corpo se acostumara ao peso exato, ao equilíbrio perfeito que moldara com semanas — não, anos — de tentativas e erros em sua forja. Mas ali estava: algo sutilmente diferente, quase imperceptível, mas real.

    Tentou novamente guardá-la, desta vez posicionando-a com precisão. O mesmo espaço permaneceu.

    — Que estranho…

    Virou a lâmina mais uma vez, estudando-a sob a luz. E foi aí que viu. Dois pequenos riscos, discretos, quase invisíveis ao olhar desatento.

    Arranhões.

    O peso da observação caiu sobre seus ombros. Conhecia a robustez do material, sabia o que aquele aço suportava. As criaturas que enfrentou não foram  capazes de danificá-la.

    Mas os riscos estavam ali.

    Seus olhos se estreitaram, movendo-se por reflexo para os dois jovens ao seu lado. Nenhum deles parecia perceber o que se passava dentro da mente dela. Também não acreditava ter sido possível eles terem feito isso.

    Inspirou fundo, tensionando a perna ainda latejante, desafiando a irritante dor que ameaçava mantê-la prostrada.

    Cada coisa em seu tempo.

    Tinha perguntas demais, respostas de menos.

    Se não pensasse em uma coisa de cada vez, ficaria louca.
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