Capítulo 26 - Exploração
*Essa é uma prévia da reescrita! Ainda está crua, sem o polimento final, mas logo ganha forma. Se notar algo fora do lugar, toda ajuda é bem-vinda!
Com uma expressão sombria, Ana seguiu a jovem à sua frente. O frio do dia mal tocava sua pele, e seus passos eram leves, calculados, como se pisar com força demais pudesse quebrar algo invisível.
— Se quiser, pode ficar com sua mãe, Ana. A gente se encontra mais tarde.
— Não. — Sua resposta veio sem hesitação. O reencontro havia sido estranho, algo que ela ainda precisava processar.
A outra garota riu, mas foi um riso curto, quase pensativo.
— Eu te entendo. Não sei como eu agiria se me reencontrasse com meus pais.
— Não sabe onde estão?
A jovem hesitou um instante.
— Na verdade, sei… — desviou o olhar, umedeceu os lábios como se ponderasse a resposta. — Morreram faz alguns anos.
A conversa terminou ali, mergulhada em um silêncio incômodo. Ana apenas assentiu, e a outra garota retribuiu com o mesmo gesto.
“Bom, pelo menos os pais dela não querem matá-la.”
O pensamento veio junto de um riso abafado.
Seus dedos roçaram o cabo da faca presa ao cinto, um gesto automático, casual, mas o peso metálico contra a pele oferecia um estranho conforto. Um lembrete de que ainda estava ali, de que podia reagir se fosse necessário.
Sua mente vagou, repassando os últimos minutos.
Para ser sincera, até a ver em sua frente, nem lembrava que tinha uma família.
Era como se houvesse sempre uma névoa em torno desse assunto, um borrão indistinto que nunca exigiu ser desvendado. E agora, de repente, tomava forma.
Sua mãe.
Margareth estava mais velha, claro, mas absurdamente mais saudável do que a última vez que lembrava dela. Dez anos deveriam tê-la desgastado, marcado sua pele com linhas mais profundas, fragilizado seus movimentos… mas não.
A mana realmente era uma coisa de louco.
Já seu pai…
Ela sabia que havia laços ali. Sabia que memórias existiam. Mas quando tentava puxá-las, tudo se dissolvia. Apenas vagas impressões, sem rostos definidos, sem vozes nítidas.
Não sentia dor, mesmo sabendo que deveria sentir.
Não estava feliz com isso, mas… a indiferença quanto a seus familiares coloria seu coração.
E, no fim, havia algo mais importante: Que merda tinha acontecido ali?
Claro, de certa forma, sabia a resposta.
Não precisou nem mesmo ver, sentiu.
Cada ação de sua mãe estava cravada no ar, como um cheiro forte que não se dissipava. Aquele arrepio na nuca. O corpo gritando perigo.
Intenção assassina.
O instinto veio antes da razão. Seus músculos se enrijeceram, prontos para responder. A cada passo que deu em direção a Margareth, observou. Mediu a respiração. Os pequenos tremores. O olhar fugidio, os dedos tensos, pairando perto de algo escondido sob o balcão.
Não sabia de onde viria o golpe, mas estava pronta para sacar a lâmina ao menor indício de ataque. Confiava que seria mais rápida.
Felizmente a ameaça real nunca se mostrou.
Margareth baixou a guarda antes que Ana precisasse decidir se realmente moveria a lâmina.
O motivo? Pelo jeito, uma planta.
Era azul, fofo, até. Três caules, mas uma única flor solitária, oscilando levemente, como se respirasse. Como se tivesse vida própria. Nunca tinha visto aquela espécie antes. E algo nela fez sua mente parar, por um instante.
Percebeu então algo que sempre ignorara: a própria fraqueza pelo desconhecido. Assim, tarde demais, preparou-se para reagir ao que quer que fosse acontecer.
Mas nada aconteceu.
Sabe-se lá o porquê, sentia que suas ações, de algum modo, evitaram um reencontro sangrento.
“O mundo está mais fodido do que pensei.”
Deveria aproveitar o ambiente hostil como um teste, uma oportunidade para aprimorar suas habilidades de sobrevivência enferrujada?
Ou, quem sabe, focar em trabalhar melhor suas relações familiares?
Ou, claro…
Você devia matar ela.
A jovem milenar revirou os olhos e bufou, mas seus lábios não se moveram.
“Não vou fazer isso. Também não vou mais te responder.“
É a regra da selva. Matar ou ser morto.
“Acho que uma conversa que dure mais que cinco minutos resolveria as coisas. As pessoas são tão complicadas…“
O silêncio se alongou. A voz dentro de sua cabeça surpreendentemente não insistiu.
Suspirando, deixou os pensamentos se dissiparem ao virar uma esquina, depois outra. Os cheiros da cidade — madeira queimada, pão recém-assado, aço — misturavam-se ao burburinho abafado das ruas.
Uma criança passou correndo, rindo, perseguida por um cachorro de pelos desgrenhados. O mundo seguiu, indiferente ao seu caos interno, e foi em meio a tal distração mundana que sua atenção foi sugada por uma construção estranha que se erguia em meio às demais.
As paredes de pedra eram sólidas, resistentes ao tempo, mas não imunes ao esquecimento. O desgaste era sutil, discreto, como rugas em um rosto que já viu mais do que deveria. Os pilares da entrada sustentavam um arco sem adornos, onde inscrições gastas sussurravam palavras que ninguém mais sequer conseguia ler.
Mesmo sem extravagância, havia algo naquela estrutura que impunha respeito. Uma aura de quietude, de segredos enterrados sob camadas de poeira e páginas amareladas.
Ana deslizou os dedos por uma das colunas, sentindo a aspereza da pedra fria.
— Ei, Marina.
A garota virou-se para ela com um olhar curioso. Seus olhos brilhavam de expectativa sem razão.
— Que foi?
— Esse lugar… o que ele é?
— Ah, é a biblioteca — Marina arqueou a sobrancelha, como se a pergunta fosse absurda.
“Como pensei…”
— Então tem livros lá dentro?
— Claro, boba, é uma biblioteca, ué.
Ana soltou um riso suave. A resposta foi óbvia, mas não sem um certo charme. Marina parecia mais desinibida do que antes, embora sua inquietação ainda se manifestasse nos dedos nervosos.
— Eu ia te acompanhar, mas… consegue me dizer onde estão ficando? Vou aproveitar o dia para ler um pouco.
Na verdade, era uma separação meio desconfortável.
Era muito descortês se separar sem mais nem menos? Talvez, mas, de qualquer forma, estava seguindo o grupo basicamente só porque foi convidada. Também tinha o fato de não ter exatamente um lugar para ir, mas isso era outra história.
O importante é que não tem como completos desconhecidos confiarem uns nos outros tão repentinamente, sabia disso. Talvez nem quisessem Ana por perto e estivessem apenas sendo educados, então sua despedida era mais do que uma formalidade. Era uma brecha. Um convite para que simplesmente seguissem com suas vidas, sem a culpa de abandoná-la à própria sorte.
A garota loira piscou, abriu um sorriso largo demais para o contexto e soltou, despreocupada.
— Na verdade, provavelmente vamos virar moradores de rua hoje à noite…
Ana arqueou as sobrancelhas.
— Ouvi os outros murmurando sobre isso. O que tá rolando?
Marina abriu os braços em um gesto teatral, como se narrasse um épico de tragédia e desespero.
— Nossa taxa de sucesso nessa nova guilda é de zero por cento!
E então começou a gargalhar. Ana a acompanhou, não conseguiu evitar um riso sincero. Gostava de pessoas que conseguiam rir das próprias desgraças.
— Mas não se preocupa. — A jovem fez um gesto despreocupado com a mão, limpando uma lágrima de riso que quase escapava de seus olhos. — Vamos conseguir pelo menos umas duas semanas em algum hotel barato com a venda das carcaças. A gente se encontra na loja da sua mãe em alguns dias, tá?
Ponderou um instante, o olhar distraído percorrendo os prédios ao redor.
— Não que a cidade seja muito grande… é bem provável que a gente acabe se esbarrando por aí antes disso.
— Combinado. — Ana sorriu de leve e ergueu a mão em um gesto tranquilo. — Fortuna audaces iuvat.
A manipuladora inclinou a cabeça, confusa.
— Hã?
— Virgílio.
— …
Ana segurou um novo sorriso que ameaçou surgir.
— Esquece, é bobeira. Só desejei boa sorte.
— Entendi… — Marina ajeitou a postura, inflou o peito e repetiu com uma confiança exagerada, como se aquilo fosse um encantamento poderoso. — Fortuna audaces iuvat!
Ana assentiu. Pelo menos ela parecia se divertir com aquilo. Com um olhar animado, se despediram.
Sem mais delongas, Ana atravessou a entrada e adentrou um de seus lugares favoritos no mundo. Se havia algo a ser descoberto, ela sabia que aqui era o lugar certo.
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REESCRITA – TEMPORARIAMENTE SEM IMAGEM
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