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    Germano mantinha-se firme no centro da arena, sua estranha arma cuspindo projéteis de mana com uma cadência quase mecânica. Cada disparo transformava uma criatura em uma nuvem vermelha, desintegrando zumbis e traçando uma linha de fogo que separava os vivos dos mortos, oferecendo cobertura para os que corriam em busca de segurança.

    A multidão ao meu redor era um caos vivo. Eu podia sentir o cheiro do suor, do medo, o som de gritos abafados pela cacofonia da batalha. Revesti minha espada com uma das minhas esferas de mana, a lâmina tremeluzindo com um brilho azulado, e saltei em direção às arquibancadas. Minha mente trabalhava rápido. Precisava abrir caminho até onde meus amigos estavam, mas também precisava impedir os zumbis de alcançarem os civis.

    Minha aterrisagem na parte inferior da arquibancada fez o piso tremer. Sem perder tempo, comecei a correr, avançando contra a maré de corpos vivos e mortos. As pessoas fugiam em pânico, empurrando-se umas às outras, como uma torrente desgovernada. Reforcei meus sentidos, forçando meu mana a fluir mais rápido, ampliando minha percepção e meus reflexos. A cada passo, desviava de braços estendidos, de mãos desesperadas que se agarravam a qualquer coisa na tentativa de escapar.

    E então, como o romper de uma onda, a multidão passou. Atrás de mim, os últimos civis desapareceram em uma das saídas da arena. Na minha frente, a horda.

    Por um breve momento, o mundo pareceu suspenso. O vento quente trazia o cheiro pútrido dos zumbis, uma mistura de carne em decomposição e terra úmida. O som se reduziu a grunhidos e arrastar de pés.

    — Isso vai ser difícil… — murmurei, os dentes trincados, enquanto me preparava para o confronto.

    Os primeiros monstros avançaram, suas bocas se abrindo em silvos. Ergui minha mão e uma barreira de mana se formou diante de mim, translúcida e pulsante. Os zumbis bateram contra ela com força, seus corpos quebrando-se sob o próprio peso. Ossos estalaram, carne explodiu.

    Quando a barreira desapareceu, avancei. Minha espada começou a cantar sua canção, uma melodia de aço e morte. Os cortes eram precisos, cada movimento uma resposta natural ao próximo. Minhas lâminas abriam caminho pela carne morta, mas por mais que derrubasse um, dois, três zumbis, eles continuavam vindo.

    Era como lutar contra o mar. Para cada criatura que caía, duas surgiam para tomar o seu lugar, seus olhos vazios e bocas famintas. Eu não avançava. Na verdade, sentia que cada golpe me fazia perder terreno. Cada passo era um esforço, cada movimento uma luta não só contra os mortos, mas contra a própria exaustão que já fazia meus ombros arderem.

    Eu precisava mudar de estratégia. Recuei, a respiração ofegante. Meus olhos percorreram o caos ao meu redor, buscando uma saída, um caminho.

    No meio do pandemônio, vi Gérard e Domina. Ainda estavam onde os tinha visto pela última vez. Lutavam lado a lado, os corpos colados, formando uma barreira viva contra a horda. Gérard tinha sangue no rosto, uma linha vermelha que descia pela têmpora, mas ele ainda sorria, como se a batalha fosse uma brincadeira perigosa. Domina, ao seu lado, movia-se com a precisão de uma dançarina, seu chicote estalava cortando o ar em arcos perfeitos. Outros gladiadores os ajudavam, suas armas sujas e suas expressões endurecidas.

    Do outro lado, vislumbrei Marreta e Torreta. Os dois eram muralhas humanas, cada golpe deles abria espaço na multidão de mortos. Marreta usava a marreta como um aríete, esmagando crânios e ossos, enquanto Torreta cobria suas costas, ágil e letal. Eles não estavam sozinhos, outros gladiadores os cercavam, formando uma linha defensiva improvisada.

    E, no entanto, meu estômago gelou.

    Eu não via Rosa. Nem Pandora. Nem Hass. Meus outros amigos pareciam ter desaparecido na confusão. Para não estarem aqui, lutando ao nosso lado, significava que enfrentavam problemas em outro lugar. Considerando o caos ao meu redor, seus problemas deviam ser tão grandes ou maiores do que os meus.

    Engoli em seco.

    — Segurem firme — murmurei para mim mesmo.

    Apertei o punho da espada, senti a energia da mana fluindo quente pelos meus músculos. Precisava encontrá-los. Precisava manter esses zumbis longe dos civis. E, acima de tudo, precisava sobreviver.

    Enquanto avaliava meus próximos passos, a voz da minha contraparte sombria ecoou pela minha mente. Desde a explosão em meu oceano de mana — um incidente que quase me matara — ele permanecia estranhamente quieto, uma sombra silenciosa em meus pensamentos.

    — Deixe um pouco de miasma fluir — sussurrou. — Eles vão responder positivamente a isso.

    Os mortos-vivos não davam trégua. Vinham em minha direção em uma maré incessante de carne apodrecida e olhos sem vida. Cada passo deles parecia sugar o pouco de energia que me restava. Meus braços pesavam como chumbo, os músculos ardiam, e o cansaço se infiltrava em minha mente como uma neblina densa. Precisava encontrar uma forma de atravessar a horda, mas o ambiente já estava saturado de miasma. O ar era pesado e tóxico, um véu sombrio que envolvia a arena. Usar um pouco mais desse poder não deveria me denunciar. Se realmente ajudasse, não via motivos para hesitar.

    Respirei fundo, buscando o restante de mana que ainda pulsava em mim. Avancei. Senti o miasma se espalhando, uma corrente fria que escapava dos meus poros e se mesclava à atmosfera pútrida ao meu redor. Assim que a névoa densa tocou os mortos-vivos, uma conexão formou-se entre nós. Era sutil, quase imperceptível, mas cada uma daquelas criaturas possuía um ponto de miasma que pulsava onde seus núcleos deveriam estar.

    Ao alcançarem minha área de influência, percebi que poderia fazer mais do que apenas sentir sua presença. Se infundisse mais miasma, poderia manipular seus movimentos, transformá-los em marionetes de carne. Mas o risco era grande. Se alguém visse, se alguém testemunhasse o controle sombrio que eu exercia, não haveria desculpas, não existiria explicação aceitável.

    Então, optei pela sutileza. Não os controlei completamente, apenas diminuí sua agressividade. Suas mandíbulas pararam de bater, seus braços caíram lânguidos ao lado dos corpos decompostos. Uma dezena de olhos vazios me observava, mas sem a fome habitual. Movi-me entre eles, cada passo uma prova de autocontrole. Minha lâmina sussurrava ao cortar a carne necrosada, abrindo um caminho de aço e membros decepados em direção aos camarotes.

    A sensação era surreal. Andar entre os mortos como se fosse um deles, um espectro deslizando pela escuridão. Ao sair do alcance da minha influência, o encanto se quebrou. Os zumbis despertaram de seu torpor. Alguns se voltaram para mim, outros redirecionaram sua fúria para as presas mais próximas nas arquibancadas. Gritos ressoaram, mas eu já estava do outro lado.

    Com um olhar rápido, avaliei a situação na arena. Os gladiadores ainda em pé lutavam com bravura, suas lâminas cintilando no meio da carnificina. Seria difícil e custoso, mas acreditava que conseguiriam vencer as criaturas. Não havia tempo para dúvidas; precisava encontrar meus amigos.

    Sem olhar para trás, parti para os camarotes. Alcancei uma das janelas que dava visão para a arena e me esgueirei para dentro. O cheiro de sangue e morte era sufocante, um miasma metálico que parecia grudar na pele. O silêncio ali era tão denso quanto o ar.

    Cabeças se viraram em minha direção. Três zumbis estavam agachados sobre os corpos de antigos espectadores, seus dentes mastigando o que restava de carne e ossos. Não dei tempo para que reagissem. Minha lâmina cantou, rápida e precisa, ceifando suas vidas já mortas. Os corpos desabaram, um último espasmo correndo por seus membros.

    Segui para o corredor, meus passos apressados ecoando nas paredes estreitas. O som de minha respiração se misturava ao rangido distante de madeira e metal. Corri até o camarote onde meus amigos haviam estado. A porta estava entreaberta, balançando com o movimento da arena.

    Lá dentro, encontrei apenas sinais de luta. Móveis revirados, manchas de sangue secando no carpete, o ar pesado de mana dissipada. Mas não havia ninguém. O vazio do lugar me atingiu com a força de um soco.

    Pensei rápido. Se não estavam ali e não haviam sido vistos na arena, só poderia haver uma explicação: tinham seguido para a saída. O coração martelava no peito, cada batida alimentando a preocupação crescente.

    De volta ao corredor, não hesitei. Ajustei a empunhadura da arma, controlei a respiração e me dirigi à entrada. Se meus amigos estavam indo para a saída, então eu os encontraria, e embora fossem capazes, me sentia responsável por eles e faria o que fosse necessário para tirá-los dali com vida.

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