Capítulo 133: Conselho de guerra improvisado
Esperei na área murada da torre pela chegada dos Vulkaris e de Joaquim com os Javalis e os pais de André. O ambiente ao redor era tenso, carregado pela expectativa da batalha iminente. Guerreiros afiavam suas armas, murmuravam preces e trocavam olhares determinados. A ansiedade era palpável, mas uma faísca de esperança brilhava nos olhos daqueles que se preparavam para o confronto.
Minha mãe e minha irmã chegaram primeiro.
A visão da tropa Vulkaris, imponentes e disciplinados, provocou um murmúrio entre os presentes. Em segundos, esse murmúrio se transformou em um rugido de aprovação. Uma onda de energia percorreu o campo fortificado, e um brado de guerra emergiu espontaneamente, elevando os ânimos de todos. Até mesmo os gladiadores do Matadouro, calejados em combates sangrentos, pareceram ganhar novo fôlego com a presença daquela força.
Levei minha mãe e Althéa até onde estavam Rosa e Hass. Elas poderiam somar muito aos nossos planos de batalha.
— Hass, Rosa… Essas são Lady Isolde e Lady Althéa, da Casa Vulkaris. Vieram nos ajudar, e as deixo em seus cuidados — anunciei.
Rosa fez uma leve reverência, seu olhar avaliando as recém-chegadas com respeito. Hass, sempre prático, apenas acenou com a cabeça, medindo as guerreiras Vulkaris com um olhar calculista.
— É um prazer conhecê-los — disse minha mãe, seu tom de voz firme, mas cortês. Ela indicou Althéa com um leve gesto de cabeça antes de completar: — Falo por nós duas.
— Vou deixar vocês conversando. Preciso falar com Cassiopeia — informei.
Minha mãe me lançou um olhar atento, como se tentasse decifrar minhas intenções. Fiz um breve aceno afirmativo com a cabeça. Por um instante, seus olhos brilharam de surpresa, e sua mão subiu instintivamente ao rosto, cobrindo a boca em um gesto que não conseguia esconder sua emoção.
— Boa sorte — disse ela, sua voz carregada de significado.
Desci as escadas e observei a tropa Vulkaris se misturando com os demais combatentes. Havia uma estranha harmonia naquela cena. Nobres e plebeus, homens e mulheres, soldados de diferentes origens e raças compartilhavam o mesmo espaço, unidos por um propósito comum. A guerra nivelava todos diante do mesmo destino. A única exceção eram os Manaclastes, cujas armaduras e estatura imponentes mantinham uma distância involuntária. Mesmo assim, ver essa união antes da batalha trouxe um raro sorriso ao meu rosto.
Ao longe, avistei Cassiopeia brincando com Viktor. A cena teria sido reconfortante em outra ocasião, mas eu não podia mais adiar aquela conversa. Aproximei-me devagar, ciente de que na última vez que nos falamos sozinhos eu a tinha humilhado em público.
— Lady Cassiopeia, poderia falar com você a sós? — minha voz soou mais grave do que eu esperava.
Ela se sobressaltou ao ouvir meu chamado, seus olhos se voltando para mim com um misto de hesitação e desconfiança. Viktor, ao seu lado, imediatamente se pôs alerta, pronto para intervir. Antes que ele tomasse qualquer atitude, Cassiopeia ergueu a mão, dispensando sua proteção.
— É um assunto importante — insisti.
Seu corpo ficou tenso, e seus olhos refletiram indecisão. Ela hesitou por um longo instante antes de assentir com um leve movimento de cabeça. Viktor permaneceu atento até ela se afastar comigo. Ao longe, Nix me observava, um leve sorriso no rosto e o polegar levantado em incentivo.
Levei Cassiopeia até uma sala dentro da torre, certificando-me de que estávamos a sós. O silêncio no interior do aposento parecia amplificar a tensão entre nós.
— Lady Cassiopeia… — comecei, mas ela me interrompeu com um olhar cortante.
— Não adianta me pedir desculpas. Nunca passei tanta vergonha quanto naquele dia. Ainda tremo de raiva só de lembrar. E ainda por cima o apelido… — sua voz foi ficando mais exaltada, e sua pele começou a adquirir um tom avermelhado.
Seus punhos estavam cerrados, os dedos pálidos pela força com que os apertava. Eu sabia que se tentasse explicar, ela não me deixaria falar. Então, fui direto ao ponto.
— Eu sou Ganimedes! — interrompi suas reclamações.
Ela parou abruptamente, sua boca entreaberta no meio de uma frase. O vermelho da raiva em seu rosto desapareceu instantaneamente, dando lugar a um branco fantasmagórico.
— O quê? — sua voz saiu num sussurro incrédulo.
— Sou Ganimedes. Seu irmão perdido na Névoa. Mamãe sabe desde o início — repeti, deixando as palavras ecoarem na sala.
Cassiopeia piscou algumas vezes, como se tentasse processar o que acabara de ouvir. Então, sem dizer nada, se virou e saiu apressada, seus passos ressoando com força na escada de pedra.
Suspirei e saí para o pátio. Ainda havia muito a fazer, e eu precisava ver se Joaquim já havia chegado.
Me surpreendi ao ver André e minha meia-irmã, Alissande. Não apenas tinham chegado, mas já estavam interagindo com as tropas dos Vulkaris, como se fossem parte delas desde sempre. Alissande, com sua presença confiante, já trocava impressões com alguns dos oficiais, enquanto André observava tudo com atenção, como se tentasse absorver cada detalhe do ambiente.
Joaquim me avistou e veio apressado em minha direção. Seu rosto estava carregado de culpa e frustração.
— Lior, me desculpe, eu… eu tentei, mas não consegui fazer nada por Claire… — Sua voz carregava um peso que eu conhecia bem.
Levantei a mão para interrompê-lo antes que continuasse.
— Vamos nos preocupar com isso depois. Ela está trancada, mas não vão maltratá-la. Por enquanto, isso terá que bastar.
Ele hesitou por um momento, depois assentiu. Sabia que ele se importava com Claire, eu também, mas agora havia prioridades mais urgentes. Para ajudá-la, precisávamos ganhar, e sobreviver à batalha.
Foi então que notei a aproximação de Lorde Jonas e Lady Alia, seguidos por Mia, eram os pais e a irmã de André. Seus rostos estavam iluminados por sorrisos largos, algo raro em tempos de guerra. Assim que se aproximaram, Mia, com sua energia de criança, saiu correndo na direção de Nix e Niana. Sorri ao ver minha pequena raposa se divertindo ao ver a garota. Ela havia conquistado o coração da menina na noite do jantar em sua casa.
— É um prazer ter vocês aqui — disse, genuinamente grato. — Obrigado pela ajuda.
— Nada mais que nossa obrigação, Lior — respondeu Jonas, cruzando os braços. — É bom estar aqui e poder fazer algo útil. Já mandei mensageiros para as outras casas aliadas. Com sorte, teremos reforços até o cair da noite.
Essa era uma notícia melhor do que eu poderia esperar. O simples fato de saber que mais guerreiros poderiam chegar trazia um alívio inesperado. Me afastei um passo e fiz uma mesura respeitosa para o casal, mas Jonas apenas soltou uma risada e me segurou pelos ombros, erguendo-me levemente do chão antes de me soltar.
— Pare com isso, rapaz. Acha que não sabemos que foi você quem salvou Mia e Alia naquela noite? Somos gratos. Mas, mais do que isso, sabemos que temos que fazer nossa parte — sua expressão ficou séria. — Nossas vidas estão em jogo tanto quanto as suas.
Concordei com um aceno firme.
— Realmente estão. Lorde, Lady, o conselho de guerra está reunido no alto da torre, traçando nossa estratégia. Conto com a experiência de vocês para contribuir.
Jonas assentiu e tomou a mão de sua esposa antes de se dirigirem para a torre. Antes de entrarem, deram uma última olhada para Mia, que agora ria com Nix, Niana e Alana, que havia descido depois que os generais subiram para o conselho. Ver aquela cena trouxe um breve calor ao meu peito. Era bom lembrar que, mesmo em meio ao caos, ainda havia espaço para momentos assim.
Agora que todos estavam ali, exceto os reforços mencionados por Lorde Jonas, fiz um sinal discreto para Nix. Ela entendeu imediatamente e veio até mim.
— O que foi? — perguntou, sua voz baixa, porém atenta.
Respirei fundo antes de responder.
— Eu preciso de um tempo para mim. Preciso incorporar as memórias de Mahteal. Sinto que vou precisar de você comigo… para me ancorar.
Seus olhos brilharam com entendimento. Ela não fez perguntas, não tentou me dissuadir. Apenas pegou minha mão e apertou levemente, um gesto silencioso de apoio. Sabia que ela estaria ao meu lado, acontecesse o que fosse.
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