Capítulo 160: Duelo inesperado
Quando cheguei em casa, no início da noite, encontrei todas as meninas reunidas na sala de estar, rodeando Alana, que cantava e tocava suavemente. Claire era a única ausente.
Assim que entrei, Nix se levantou com um sorriso e veio me receber com um beijo. Senti meu coração se aquecer.
— Venha, Alana está cantando pra gente — disse ela, puxando minha mão.
— Preciso tomar um banho — respondi, mas me deixei levar. — Onde está a Claire?
— Saiu logo depois de você. Ia se encontrar com Lenora e depois visitar a mansão Umbrani. Disse que precisava organizar nosso casamento. O cerimonialista não apareceu a semana toda, segundo ela.
— Realmente, ele deveria ter vindo — concordei, sentindo um aperto no peito. A última vez que ela foi à casa dos tios, quase foi condenada por usar miasma e por estar ligada a mim. Fiquei tenso. O que será que aconteceu dessa vez?
Mal me sentei ao lado das garotas para ouvir Alana, Claire entrou. Seu semblante estava fechado, os olhos carregando uma raiva contida.
— O que aconteceu? — Nix perguntou, tensa.
— O casamento foi adiado — respondeu Claire. — Pelo menos por mais quatro dias.
— O quê?! — Eu e todas as meninas exclamamos ao mesmo tempo.
— Meu tio e minha tia conseguiram adiar o casamento com Lenora. Aparentemente, Lior se tornou um solteiro muito cobiçado.
— O que isso tem a ver? — perguntei, confuso.
— Zia me desafiou para um duelo. O prêmio é você. Vamos lutar no dia de Solis.
Fiquei sem palavras. Mais uma vez, os nobres estavam me tratando como um objeto, como um cavalo de criação premiado. Nem bem havia me acostumado com a ideia do casamento com Claire, e agora isso. A raiva subiu como uma labareda.
— Vou falar com Lenora agora mesmo! — esbravejei. — Não sou um troféu em exposição!
— Já falei com ela. Disse que, se o que você falou pra ela é verdade, então não temos nada a temer. Você mesmo disse que eu limparia o chão com Zia.
— E acredito nisso — falei, com convicção.
— Então vamos resolver isso de uma vez — disse Claire, firme. — Pra que não restem dúvidas.
Assenti e me sentei novamente.
— Faremos isso, então.
Me virei para Pandora.
— Conto com você.
Ela assentiu, um sorriso se formando nos lábios.
— E com vocês também — acrescentei, olhando para Nix, Niana e Alana.
Todas concordaram, sérias. Claire já era uma delas.
— Eu e Claire vamos precisar de todas vocês, hein — falei, enquanto pensava em como não poderia estar tão presente nesses próximos dias com Claire e as meninas.
Pela manhã, Lock me esperava no laboratório. À tarde, eu deveria ir até o campo de treinos. Tinha certeza de que conseguiria escapar das sessões vespertinas, mas os estudos com Lock eram importantes demais para adiar.
Lembrei dos livros que Lock havia me dado para estudar e os tirei do anel com um pensamento. Os olhos de Claire brilharam ao vê-los.
— O que é isso?
— Livros de magia dimensional — respondi. — Estão proibidos pra você até o duelo. Não quero distrações. Quando derrotar sua prima, vou dar um jeito de levar você para conhecer uma pessoa especial. Tenho certeza de que vai aprender muito com ele.
Claire se animou ainda mais, os olhos cintilando.
— Por isso, não vou poder ajudar diretamente com seus treinos pro duelo. Deixo isso aos cuidados de Nix, Niana e Pandora.
— Posso levá-la para o Matadouro? — perguntou Pandora. — Muitos gladiadores vão gostar de ajudar. Tenho certeza.
— Faça o que achar melhor. Quero ela bem preparada. Zia não é maga, é guerreira. Você sabe o que fazer.
Recolhi os livros e comecei a sair da sala. Claire fazia um beicinho ao vê-los sumindo.
— Vou tomar meu banho, depois preciso estudar.
Nix se levantou, virou-se para as outras e mostrou a língua, provocativa.
— Espere! Eu também preciso de banho…
Correu atrás de mim. Apenas ri daquilo.
Mais tarde, já no quarto, estava deitado com um dos livros na mão. Nix cochilava, usando meu peito como travesseiro.
Dois toques suaves na porta.
— Pode entrar — falei, sem tirar os olhos da página.
Era Claire. Já estava vestida para dormir.
— Vim desejar boa noite, Lior.
Abaixei o livro.
— Está com medo?
— Um pouco… Mas mais do que medo, estou com raiva. Quem ela pensa que é, querendo roubar meu noivo?
Ela se aproximou e sentou-se à beirada da cama.
— Tenho certeza de que vai derrotar Zia. Mas não deixe de treinar. Não subestime ela. Pandora é uma treinadora incrível. Vai te preparar melhor do que eu conseguiria.
— Ela é incrível mesmo. Tenho visto ela tirar o couro das meninas.
Claire riu. E por um instante, me pareceu que o quarto inteiro se iluminava só com aquele som.
— Quer deitar aqui com a gente? — perguntei, tranquilo.
Ela corou profundamente.
— Melhor não… pelo menos até depois do duelo.
— Sabia que já levei a Nix num encontro? E a Selune também. Mas você… ainda estou te devendo um. A gente nunca teve tempo pra conversar a sós, pra nos conhecermos melhor. Sempre tudo na correria.
— Depois do duelo — respondeu, mordendo os lábios.
— Combinado.
Ela se inclinou, me beijou suavemente nos lábios.
— Boa noite.
E saiu do quarto.
Os outros dias passaram como se fossem repetições uns dos outros. Acordava cedo e ia direto para o castelo, onde Lock já me esperava, pontual e sempre com uma lista de tarefas em mãos.
Tirando o primeiro dia, quando conversamos longamente e até visitamos a torre em uma ilha isolada, os demais foram de trabalho pesado e contínuo. Eu o auxiliava em projetos diversos, atendendo às demandas do Império. Os assuntos iam de dispositivos arcanos a sistemas defensivos experimentais, passando por esquemas de selamento e condução de mana em larga escala. Nem mesmo tempo para discutir dúvidas sobre magia dimensional nós conseguíamos arrumar.
Eu já tinha estudado um pouco de engenharia de mana durante meu tempo com a Casa Vulkaris, mas aqueles dias ao lado de Lock pareciam um curso avançado, extremamente técnico, sem pausas e com aplicações práticas quase imediatas. Era exaustivo, sim, mas também instigante. Mesmo que não fosse exatamente o foco do meu interesse, aprender ao lado de alguém como ele era uma oportunidade rara demais para ser desperdiçada.
À tarde, dividia meu tempo entre o Palácio e os treinos das meninas. No Palácio, participava de atividades com os jovens magos, cada vez mais curiosos sobre minhas técnicas. A desconfiança inicial havia virado fascínio, e agora eles me cercavam com perguntas e convites para debates e testes.
No campo de treinamento, assistia Claire se dedicar com afinco sob o olhar atento de Pandora e Nix. A cada dia ela parecia mais rápida, mais precisa, mais determinada. Em minha opinião, era impossível que Zia conseguisse vencê-la. Mas um duelo sempre carrega seus próprios riscos. Erros, nervosismo, surpresas. Eu sabia disso melhor do que ninguém.
Com o passar dos dias, soube por algumas garotas do Palácio que as apostas sobre o duelo estavam se espalhando. A maioria, desconhecendo o verdadeiro potencial de Claire, apontava Zia como favorita. Algumas, mais atrevidas, comentavam sem pudores que pretendiam desafiar a vencedora, como se eu fosse um troféu a ser conquistado. Era irritante, mas ao mesmo tempo necessário. Claire precisava vencer, e vencer com contundência. A mensagem precisava ser clara: “não mexam comigo.”
À noite, nossa rotina era quase sagrada. Reuníamo-nos na sala de estar ou à mesa de jantar, onde falávamos sobre o dia, trocávamos experiências, e ríamos das pequenas vitórias e tropeços. Eu ouvia, opinava quando pediam, e compartilhava também os desafios da minha rotina com Lock. A harmonia entre todas era visível, e o progresso de Claire me deixava especialmente orgulhoso. Ela florescia diante dos meus olhos, deixando para trás a menina tímida e hesitante que conheci no baile de máscaras, tornando-se uma mulher forte, segura, pronta para enfrentar o que viesse.
Os dias passaram num piscar de olhos. Quando percebi, o Solis já se aproximava. Era a véspera do duelo.
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