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    O monstro estalou as pinças com força, e o som reverberou pela caverna como um trovão metálico. Seus múltiplos olhos se moveram em direções diferentes, cada um refletindo a luz fraca dos líquens como fragmentos de vidro quebrado. Um fungo vermelho brotava em sua carapaça, pulsando como um coração exposto.

    Engoli em seco. Sua carapaça parecia mais resistente que as ligas metálicas de Lock. Suas pinças massivas, afiadas e aterradoras. Era uma máquina de matar e destruir.
     

    — Espalhem-se! — ordenei, girando a espada para a guarda alta. — Não vamos ser um alvo fácil!
     

    Se nos mantivéssemos juntos, pelo seu tamanho, um único ataque acertaria nós todos.
     

    Pandora avançou pela esquerda, os músculos retesados, espada em punho, movendo-se como um raio. Niana, em sua forma de batalha, assumiu postura baixa, garras prontas, o pelo eriçado com reflexos prateados. Milena ficou atrás de nós, elevando as mãos e conjurando runas flamejantes, o rosto ainda marcado pelas lágrimas do susto, mas os olhos firmes.
     

    A primeira investida do caranguejo foi devastadora. Sua pinça desceu contra mim como uma muralha em queda. Bloqueei com a espada, desviando a trajetória, mas a força foi tão brutal que meus braços latejaram. Pandora aproveitou o movimento e correu pelo flanco, cortando uma das juntas. A lâmina deixou apenas um arranhão na carapaça.
     

    — Mais duro que aço! — ela rosnou.
     

    Niana saltou pelas pedras, girando no ar antes de cravar as garras na lateral do monstro. Centelhas surgiram no impacto, um rastro marcava a proteção, nada mais. A criatura sacudiu o corpo, lançando-a contra a parede. O baque ecoou como trovão, mas Niana já se levantava, ofegante, os olhos brilhando de fúria.

    Milena ergueu a voz em um cântico. O ar vibrou. Um círculo de fogo se formou sob o caranguejo, e colunas de chamas subiram, envolvendo-o. O rugido que escapou do monstro fez a caverna tremer. O cheiro de carapaça queimada misturou-se ao fedor fúngico, sufocante.
     

    Mas a fera não recuou. Avançou cegamente pelas chamas, pinças abertas, atingindo o solo com violência. Fragmentos de pedra voaram para todos os lados. Não parecia ferida.
     

    Uma nova onda de cogumelos brancos surgiu, o ataque da própria criatura os atingiu, e novos esporos foram liberados, cobrindo metade do salão subterrâneo em branco.
     

    — Não de novo! — gritei. Ativei meu sol de mana, expandindo um turbilhão de vento que manteve a área imediata limpa, mas não consegui conter tudo. A visibilidade se reduzia a cada instante. Redobrei meus esforços.
     

    A pinça direita do monstro veio contra Pandora. Ela girou o corpo, esquivando, bloqueou, afastando-se do monstro e contra-atacou, mas o impacto a lançou contra o chão, quebrando pedras ao redor. Tossindo, levantou-se, sangue no canto da boca, mas ainda com a espada firme.
     

    — Esse desgraçado não vai me derrubar!
     

    Corri até o flanco oposto e canalizei energia. Uma runa complexa se desenhou em minha mente,  um selo de impacto e enfraquecimento. A lâmina brilhou em azul quando a mana explodiu. Golpeei a junta de uma das pernas dianteiras. A espada penetrou fundo, rachando o ponto de apoio. O caranguejo cambaleou, soltando um rugido gutural.
     

    — Agora! — berrei.

    Niana, recuperada, lançou-se contra a outra perna, suas garras deixando riscos profundos. Pandora aproveitou o desequilíbrio e saltou sobre o dorso do monstro, cravando a espada até a metade em um dos olhos. Um líquido negro e fétido jorrou, atingindo seu rosto.
     

    A fera se agitou, rodopiando, tentando se livrar dela. Milena lançou uma rajada flamejante, queimando os fungos que se projetavam em sua carapaça. O cheiro de podridão incinerada nos sufocava, mas a criatura finalmente recuava.
     

    Por um instante, pensei que tivéssemos vencido.
     

    Mas então, um som de estalos horrível reverberou. O fungo pulsante em sua carapaça se abriu como uma flor, liberando uma nuvem de esporos carmesins. A energia ao redor se distorceu. Senti o ar ficar mais pesado, como se a própria caverna tivesse mergulhado em um pesadelo. Os esporos sugavam nossa energia vital.
     

    O monstro começou a se regenerar diante de nossos olhos. As feridas se fecharam. As juntas quebradas voltaram ao lugar. O olho perdido foi substituído por um aglomerado de cogumelos luminescentes.
     

    — Ele está se refazendo! — Milena gritou. — Estou ficando mais fraca!
     

    — Então vamos destruí-lo de uma vez! — Pandora respondeu, descendo da carapaça com um salto.
     

    A fera avançou, mais furiosa do que antes. Uma pinça desceu em arco, mirando Niana. Eu me lancei na frente, bloqueando com um campo de força. O impacto fez meus joelhos dobrarem, quase me esmagando. Pandora atingiu a pinça oposta, tentando cortar a base, mas foi repelida como se golpeasse uma muralha.
     

    Milena, com os olhos ardendo em determinação, ergueu ambas as mãos. Runas flamejantes se multiplicaram no ar, formando um círculo complexo. O calor fez o suor escorrer pelo rosto dela.
     

    — Preciso de tempo! — gritou.

    — Segurem ele! — ordenei.
     

    Niana saltou novamente, garras em chamas depois de um encantamento rápido que coloquei em seu corpo. Ela cravou ambas no mesmo ponto da junta anterior. Eu ataquei ao mesmo tempo, liberando uma onda de mana que rachou ainda mais a carapaça. Pandora mirou o outro flanco, golpeando repetidas vezes até que fissuras começaram a se abrir.
     

    O caranguejo rugiu. As pinças desceram com fúria, levantando fragmentos de pedra e criando ondas de choque. Senti as costelas latejar ao ser atingido de raspão. Pandora rolou pelo chão, tossindo sangue. Niana foi arremessada contra uma estalagmite, que se quebrou com o impacto.

    Ainda assim, seguramos.

    O círculo de fogo de Milena alcançou o ápice. O chão inteiro sob o monstro se abriu em colunas de lava invocada, o calor abrasador queimando até nossos ossos. A fera foi envolvida por um mar incandescente, seus gritos reverberando como trovões. Os fungos em sua carapaça explodiram em labaredas carmesins, espalhando fragmentos ardentes por toda a caverna.

    A luz foi tão intensa que precisei cobrir os olhos.
     

    Quando o clarão se dissipou, o que restava era uma carcaça retorcida, ainda fumegando. O cheiro de carne queimada e fungo carbonizado impregnava o ar.
     

    Ajoelhei, exausto, ofegando. Pandora se apoiava na espada cravada no chão. Niana cambaleava, mas ainda de pé, enquanto Milena desabava de joelhos, drenada pelo feitiço.
     

    Tínhamos vencido.
     

    Ou pelo menos, era o que parecia.
     

    Onde estavam nossos Companheiros? Cass? Alisande? André? Todos os outros?
     

    Meu coração afundou.
     

    Os companheiros que haviam se separado durante a batalha não estavam mais ali. Nem Gus, nem Germano, nem Marreta.
     

    — Não… — sussurrei, os punhos cerrados.
     

    Olhei para o pó branco no chão, para os sinais claros de emboscada. O caranguejo havia sido apenas para nos distrair, o tempo que os inimigos precisavam para retirar os prisioneiros.
     

    A vitória que conquistamos não passava de uma distração planejada.
     

    Atrás de mim, Pandora se aproximou, o rosto sério. Niana rosnava baixo, sentindo o cheiro fresco do inimigo no ar. Milena, com lágrimas presas nos olhos, mal conseguia se levantar.
     

    Respirei fundo, ergui a espada ainda coberta de sangue negro e disse em voz firme, mesmo com a alma pesada:
     

    — Eles estão vivos, posso senti-los através do vínculo que deixei com cada um de vocês. Nós vamos trazê-los de volta.
     

    O silêncio da caverna foi a única resposta.
     

    Mas dentro de mim, uma chama ardia.
     

    Não importava quem havia planejado aquilo. Não importava quão fundo teríamos que caçar. Não deixaria nenhum deles para trás.

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