Capítulo 231: Pressionados
Eles caíram de pé, como brinquedos, mas logo se ergueram com a rigidez de marionetes controladas. Vi nos olhos deles o vazio do domínio. Cassiopeia foi a primeira a se mover. O olhar dela não me reconheceu, a lâmina ergueu-se em arco brilhante, carregada de mana, e partiu contra mim sem hesitação.
— Cass… — murmurei, mais para mim do que para ela. Não havia resposta.
A lâmina dela chocou-se contra a minha com um estrondo metálico. O impacto reverberou pelo meu braço, os músculos latejando com a força que ela despejava no golpe. Minha irmã não estava se contendo.
Gus recuou dois passos atrás, já traçando runas no ar. Vi a mana se condensando em círculos à sua frente. Calmon avançou bruto, como um touro, mirando Pandora.
— Cuidado! — gritei, saltando para o lado e desviando da sequência de cortes de Cassiopeia. — Vamos tentar conter sem ferir.
Notei que Cass e Niana concordaram com um pequeno aceno.
Pandora girou o corpo e recebeu Calmon com o escudo, a pancada ecoando pela câmara. Niana disparou contra Gus, garras faiscando, mas foi obrigada a recuar quando uma esfera de energia explodiu no chão, rachando a pedra e cuspindo estilhaços.
Milena se posicionou entre os atacantes e os desacordados à seus pés. Sua postura indicava que iria protegê-los.
— Eu cuido deles! — a voz dela soou firme, decidida. — Não se preocupem.
O dilema me apertava o peito a cada respiração: era minha irmã e meus amigos. Eu não podia tratá-los como inimigos. Cada golpe que desviava, cada ataque que contornava, era mais um risco de ser atingido, ou de feri-los.
Cassiopeia não dava trégua. A espada dela dançava em padrões que eu conhecia bem, não era o mesmo treinamento que eu tive, mas eram de minha Casa. E agora, amplificada pelo domínio fúngico, sua técnica parecia mais afiada, mais selvagem. Sem nenhuma inibição.
— Cass! — tentei outra vez. — Sou eu!
Nada. Apenas o brilho vazio nos olhos dela e mais um golpe vindo em diagonal, rápido demais. Rebati com a plana da minha espada, girando o corpo para amortecer o impacto. A lâmina raspou no meu ombro, rasgando o tecido, deixando um rastro quente de sangue.
— Droga! — gemi baixo.
Do outro lado, Pandora já estava sangrando também. Calmon não era tão forte quanto ela, mas ela se obrigava a se segurar. Não queria feri-lo, preferia ir cedendo terreno conforme seus avanços.
Niana rugiu em sua forma de batalha, desviando de mais um disparo de Gus e partindo em um salto. A garra dela quase acertou o braço dele, mas uma barreira translúcida explodiu, empurrando-a para trás. Gus podia não ser criativo, mas era metódico e poderoso. Principalmente sendo controlado. Era o mesmo efeito que Cass demonstrava.
E então as raízes do cogumelo central se agitaram. Do teto, novas criaturas começaram a se desprender: corpos deformados, carapaças com fungos, membros torcidos. O coro de rosnados preencheu o salão.
— Merda! — Milena bateu o cajado no chão, lançando uma onda de gelo que congelou os primeiros monstros. — Vou segurar esses!
Eu mal tive tempo de responder. Cassiopeia veio com um golpe de cima para baixo, mana vibrando pela lâmina. Segurei o impacto com as duas mãos na minha espada, os joelhos quase cedendo. O choque abriu uma cratera no chão sob nós.
— Pandora! Niana! — gritei entre dentes. — Precisamos derrubá-los sem ferir!
— Você está pedindo o impossível! — Pandora retrucou, bloqueando mais um golpe de Calmon. O escudo dela já estava trincado.
Niana desviou de outra explosão de Gus, bufando. — Se não os ferirmos, vamos morrer aqui!
— Não! — bradei, empurrando Cass para trás com uma onda de vento concentrada. — Eles ainda estão lá dentro. Eu sinto!
Cass voltou em seguida, rápida como um raio. Girei a lâmina em espiral, desviando do golpe e batendo o punho contra o cabo dela, tentando desarmá-la. Ela me acertou com um chute no abdômen que me jogou contra uma parede. O impacto fez meus ossos vibrarem.
O fungo não controlava seus corpos como nas outras criaturas. Eu podia ver, os movimentos eram fluidos, naturais. A conexão era mental, pura dominação psíquica. Isso explicava por que estavam tão intactos. A semente congelada em seu cérebro impedia que o fungo tivesse o controle completo. Era sua arma contra eles mesmos.
— Droga… — cuspi sangue, me levantando. — Não é biológico. É mental. Ele está apenas na mente deles.
Cassiopeia não esperou eu recuperar o fôlego. A lâmina dela veio de lado. Rolei pelo chão, senti a pedra rasgando ao meu lado, ergui a espada a tempo de desviar da sequência.
Pandora gritava, segurando Calmon com esforço. A espada dele bateu contra o escudo, quase arrancando-o das mãos dela. Ela cambaleou, mas não cedeu.
Niana atravessava o campo, garras à mostra, tentando impedir Gus de acumular energia. Mas a cada vez que ela chegava perto, ele liberava outra explosão que a jogava para longe. Controlado era era mais eficiente que em seu estado natural.
O chão tremeu de novo, mais criaturas foram surgindo. Milena gritava encantos, o gelo e o fogo dela iluminando a escuridão. O cheiro de queimado e podridão enchia o ar.
Eu precisava decidir. Cada segundo que passava, o desgaste aumentava. Pandora estava no limite, Niana começava a sangrar, Milena já arfava de tanto gastar mana. E Cassiopeia… ela me pressionava como se fosse minha sombra invertida.
Ela não ia parar.
Olhei nos olhos dela mais uma vez, segurando a lâmina dela contra a minha. Havia um vazio ali, mas embaixo do vazio… havia algo. Um resquício.
Eu só tinha uma opção.
— Cass… — murmurei, deixando minha mana correr pela espada até a lâmina dela. — Me ouça.
Ela empurrou com força, tentando quebrar minha guarda. Eu deixei a energia fluir, não para repelir, mas para conectar.
— Segurem! — gritei para Pandora e Niana. — Eu vou entrar na mente dela!
Pandora arregalou os olhos, mas não teve tempo de responder. Calmon a pressionava sem trégua.
Niana rugiu, cortando mais uma criatura infectada ao meio.
Fechei os olhos, respirei fundo, e deixei meu sol de mana expandir-se em direção à mente da minha irmã. O fungo estava lá, enraizado, torcendo pensamentos, dominando vontades.
Não importava. Eu iria arrancá-la de volta, nem que me perdesse nesse processo.
Mergulhei.
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