Capítulo 92

Maxi praticamente ficou confinada aos seus aposentos até que se recuperasse completamente. A preocupação de Riftan era tanta que as servas eram obrigadas a segui-la por todo lugar, inclusive nos aposentos privados.

Mesmo depois de ela ter reabastecido completamente sua mana e sua tontura ter diminuído, sua ansiedade parecia permanecer. Maxi era obrigada a ficar enclausurada em seus aposentos e não podia atender aos seus convidados. Ela se ocupava treinando os gatinhos para caçar ratos.

“O Ron é o melhor nisso”, ela murmurou enquanto balançava de forma desanimada a boneca em forma de rato que Ludis costurara para os gatos.

O rajado, Ron, havia crescido e estava mais pesado. Ele balançou suas patas dianteiras e pegou a boneca.

Roy, por outro lado, ronronava adoravelmente em seu colo, em uma exibição de sociabilidade atípica para um gato. Laura, a rainha do gelo branca e arrogante, estava se limpando à distância como se essas bobagens fossem abaixo dela. Pelas observações de Maxi até agora, Laura era uma gata exigente que não demonstrava interesse por ninguém além de Riftan. Embora Maxi tivesse feito esforços consistentes para chamar sua atenção, a gatinha nunca lhe lançava um olhar.

“O Ron será ótimo para pegar ratos”, observou Ludis. “Ele não é apenas o maior dos três, é curioso e agressivo. O Roy é muito tímido, enquanto a Laura se recusa a fazer qualquer coisa que possa sujar seu pelo branco. O cozinheiro disse que eles deveriam passar fome para aprender a caçar desde cedo.”

“I-Isso não vai funcionar. Eles ainda são filhotes… e tenho certeza de que farão sua parte quando crescerem.”

Maxi segurava os filhotes protetoramente contra o peito. Ela sabia que era normal animais domésticos serem privados de comida ou jogados fora se não servissem ao propósito, mas desde criança, Maxi sempre odiou esse tratamento cruel contra os animais. As circunstâncias miseráveis daqueles seres incompetentes pareciam muito semelhantes às dela.

Ao ver seu rosto decidido, Ludis deu a Maxi um sorriso gentil e disse: “Mesmo que eu quisesse fazer o que o cozinheiro diz, minha senhora, seria impossível privar esses pequenos. As criadas se revezam em dar petiscos a eles, e até mesmo os cavaleiros secretamente os alimentam sempre que eles rondam embaixo das mesas. Veja só como este aqui está gordinho.”

Ludis segurou Ron pelas patas dianteiras e o levantou. Maxi riu ao ver o corpo macio do gato balançando como massa.

“Está tudo bem para eles já estarem vagando pelo castelo? E se as pessoas os chutarem sem querer?”

“Nós só os deixamos vagar pela cozinha ou pelos quartos, então eles devem estar bem, minha senhora. E são ágeis.”

Agitando o boneco de rato, Maxi olhou para baixo para os filhotes, seus rostinhos adoráveis mostrando contentamento. Acariciar seus pelos macios sempre fazia seu coração cansado se sentir um pouco melhor.

“Devo trazer sua refeição agora, minha senhora?”

“Já é… essa hora?” Maxi disse, olhando pela janela.

O sol já havia atingido seu pico.

“E-Eu não estou com fome…”

“Seu senhor instruiu claramente que devemos garantir que você não pule nenhuma refeição”, Ludis respondeu firmemente.

Os filhotes começaram a rosnar rebeladamente enquanto Ludis os empurrava para dentro de sua cesta.

Maxi suprimiu um suspiro. Estava claro que, na mente de Riftan, ela era uma mulher tão frágil quanto um pintinho. Ele sempre foi superprotetor desde o início, mas a forma como ele se preocupava com ela agora beirava a paranoia.

Mesmo quando ela lia na cama, ele se preocupava que ela pudesse se cortar com papel ou que seus músculos doeriam por segurar um livro particularmente pesado. Ele se preocupava com as coisas mais bobas, tanto que Maxi estava começando a se cansar disso.

Não que eu não goste…

Depois de mais de vinte anos de tratamento cruel, Maxi não podia dizer que não gostava da atenção excessiva. Ela tinha que admitir que ser tão querida também a deixava um pouco feliz. Mesmo assim, ela estava cansada de ser tratada como se fosse um bebê.

“Então, por favor, espere enquanto eu vou buscar seu almoço na cozinha, minha senhora.”

“O-Obrigada.”

Enquanto Ludis levava os filhotes para fora do quarto para que não pudessem destruir nenhum dos móveis ou tapetes caros, Maxi se sentou em sua escrivaninha.

Uma vela meio queimada, uma tigela de frutas e uma pilha bagunçada de livros sobre magia estavam espalhados pela superfície. Maxi folheou algumas páginas de um dos livros, pensando que deveria ler enquanto esperava sua refeição, mas logo percebeu que estava perdendo o interesse.

Após perceber que ser a senhora do castelo era o único papel que Riftan permitiria a ela, Maxi não sentia mais motivação para estudar.

Maxi apoiou o queixo na mão e soltou um suspiro profundo. Os moradores do castelo estavam ocupados com a construção da estrada, e até mesmo os convidados estavam ocupados explorando Anatol. Ser a única pessoa fechada em seus aposentos inadvertidamente lembrava Maxi do passado.

Ela havia sido trancada em seus aposentos no Castelo de Croyso, escondida da vista. Sempre que chamava a atenção de um convidado ao ousar caminhar pelos corredores, seu pai iria…

“Maximilian, sou eu. Posso entrar por um momento?”

A voz repentina fez Maxi se levantar abruptamente, e ela caminhou apressadamente até a porta. Era a Princesa Agnes. Ela estava com um vestido branco e veio sem nenhum de seus acompanhantes.

A princesa sorriu e disse: “Peço desculpas pela visita repentina, mas mal a vi ultimamente. Espero que compreenda.”

O rosto de Maxi corou de vergonha. Preparar banquetes para os convidados que vieram de longe e atender às suas necessidades eram deveres importantes da senhora do castelo. Estar ausente do salão de jantar nos últimos dias era praticamente negligenciar seus convidados.

“P-Peço desculpas pela minha falta de hospitalidade, Alteza. E-Estive me recuperando…”

“Meu Deus, você ainda não se recuperou da depleção de mana?”

“N-Não, eu estou… bem agora, mas… Riftan está sendo superprotetor”, murmurou Maxi.

A testa da princesa se franzia ligeiramente antes que ela soltasse um suspiro.

“Pensei que esse fosse o caso. Notei o quão irracional ele pode ser quando se trata de você. Suponho que ele não saiba que é ruim para você ficar o dia todo em seu quarto. Como seu corpo recuperará o vigor se você não se movimentar?”

Com um sorriso sutil, a princesa se aproximou de Maxi.

“Nesse sentido, por que você não se junta a mim para um passeio hoje?”

“U-Um passeio?”

“Hoje é aparentemente o início do Festival da Primavera. Você se lembra? Aquele que ouvimos falar quando fomos ao mercado.”

A princesa deu alguns passos para trás e executou um giro elegante. Os olhos de Maxi se arregalaram ao ver um cinturão feito de tecido azul torcido tremulando sobre a saia da princesa. Foi só então que Maxi se lembrou.

“Você ainda tem a faixa que te dei?”

“S-Sim, mas…” Maxi hesitou, uma expressão preocupada em seu rosto. “Eu não acho… que Riftan me permitiria sair do castelo.”

“Não haverá nada errado se tivermos os cavaleiros nos escoltando.”

A princesa soou confiante. Maxi havia sido alvo da preocupação excessiva de Riftan por algum tempo, no entanto, e estava cética.

“Sou grata pelo convite, Alteza, mas… não posso sair do castelo sem o consentimento do meu marido…”

Maxi não terminou a frase, insegura se a princesa, que viajava livremente por todo o continente, entenderia sua situação.

O rosto da princesa de repente ficou sério. “Tudo bem. Vamos perguntar a ele agora. Você quer ir, não é?”

Depois de um momento de hesitação, Maxi assentiu lentamente. Ela realmente estava curiosa sobre o Festival da Primavera.

Os olhos azuis da Princesa Agnes brilharam como se ela pudesse ler a mente de Maxi. Em seguida, ela segurou o braço de Maxi e entrou no quarto.

“Então você deveria se preparar agora. Vou falar com Riftan, então não se preocupe com isso.”

Embora Maxi estivesse confusa com a princesa a tratando como uma irmã mais nova, ela obedientemente trocou de roupa por um vestido branco e amarrou o cinturão vermelho em volta da cintura. Quando finalmente colocou um manto e saiu do quarto, a princesa pegou sua mão e começou a andar pelo corredor.

“Riftan deve estar nos campos de treinamento. Ouvi dizer que ele não iria ao local da construção hoje.”

“I-Isso está bem?”

“Desde que exterminamos os wyverns, nenhum outro monstro apareceu no local da construção. Embora monstros possam se aproximar do local para atacar os trabalhadores… estou informada de que Ruth instalou dispositivos de detecção mágica por todo o acampamento, então eles agora podem ser lidados antes que causem problemas.”

Os lábios da princesa se contorceram em uma careta como se o que ela estivesse prestes a dizer a seguir deixasse um gosto amargo em sua boca.

“Ele pode não ser um homem decente, mas a habilidade de Ruth quando se trata de criar dispositivos mágicos é excepcional. Se ele diz que está tudo bem, então deve estar. Não há necessidade de Riftan guardar o local da construção o dia todo.”

“É uma boa notícia,” disse Maxi, sorrindo radiante pela primeira vez em um tempo.

Ela estava preocupada com Riftan, então ficou aliviada ao ouvir que ele não precisava mais sair da propriedade com tanta frequência.

Eles foram direto para os campos de treinamento. Maxi esperava ver outra sessão intensa, mas os vastos campos de treinamento estavam vazios quando chegaram. Quando olhou em volta, perplexa, a princesa explicou que o horário tinha mudado devido aos cavaleiros se revezarem na guarda do local de construção. O fato de uma convidada de Anatol saber mais sobre as operações dos Cavaleiros Remdragon do que Maxi, a senhora do castelo, fez Maxi sorrir amargamente.

“Eles devem estar reunidos na sala do conselho.”

A princesa cumprimentou o sentinela com um aceno, depois seguiu na direção dos alojamentos dos cavaleiros localizados ao lado dos campos. Maxi ficou próxima atrás dela. Embora meses tivessem se passado desde que Maxi chegou a Anatol, ela ainda não tinha posto os pés na casa da guarda ou nos alojamentos dos cavaleiros. Seu coração batia rápido como se estivesse entrando em território proibido.

“Perdoem a intrusão.”

A princesa abriu a porta sem hesitação, e Maxi espiou de trás dela para olhar para dentro da sala. Era um espaço escuro alinhado com cadeiras de madeira, mesas, lanças e armaduras. Riftan e outros cinco cavaleiros estavam no meio de uma discussão. Eles olharam para a Princesa Agnes e Maxi simultaneamente.

“Alteza. O que a traz aqui? Não disse que desejava descansar hoje?” Riftan perguntou com uma carranca, claramente infeliz com a interrupção.

A princesa deu de ombros, sem se abalar com a recepção fria, e se aproximou.

“Tinha algo para perguntar a você. Gostaria de aproveitar o Festival da Primavera com Maximilian. Você não se importa, não é?”

O rosto impassível de Riftan instantaneamente se tornou gélido. Ele olhou de um lado para o outro entre a Princesa Agnes e Maxi, que estava atrás dela.

“Minha esposa recuperou a saúde recentemente. Vou mandar os cavaleiros escoltarem vocês, então aproveitem o festival sozinhas aqui.”

Sua rejeição foi fria, não deixando espaço para reconsideração.

“Mas sua esposa parece perfeitamente bem.”

Estreitando os olhos, a princesa se virou para Maxi. Os olhares dos homens sentados ao redor da sala do conselho se voltaram todos para ela ao mesmo tempo.