Pov do Riftan - Capítulo 42

O homem, que havia silenciosamente subido as escadas por um longo tempo, anunciou enquanto paravam em frente à porta de um quarto no final do corredor do terceiro andar. Riftan olhou para os cavaleiros levemente e prosseguiu para entrar na sala. O calor acolhedor do quarto tocou gentilmente seu rosto, que estava frio devido à chuva.

Ele ficou parado na entrada, examinando a sala lentamente. O Rei Ruben estava sentado em frente à lareira, lendo um livro. Riftan estreitou os olhos diante da cena, já que o homem parecia mais confortável do que nunca. Era uma visão muito tranquila para alguém que o apressara para um assunto urgente. O monarca estava vestido com uma túnica vermelho-escuro e largas calças de cetim, seu cabelo dourado fluía agradavelmente como a juba de um leão.

“Você parece um cão selvagem na chuva, Calypse.”

Ele ergueu lentamente a cabeça depois de virar duas páginas do livro. Riftan avançou corajosamente, pingando com a água da chuva na sua frente.

“Sua Majestade pediu para eu vir o mais rápido possível ao receber a mensagem. Corri pela chuva tão rápido quanto o vento, como ordenado.”

“Aprecio sua demonstração de lealdade.” O rei cuspiu sarcasticamente e fez um gesto com a cabeça para a cadeira em frente a ele. “Primeiro, tire seu manto e sente-se. Melhor se aquecer junto ao fogo.”

Riftan tirou seu manto encharcado de água e o pendurou na parede, então se sentou na cadeira. Um servo, que estava encostado na parede na sombra, trouxe-lhes uma garrafa de vinho e serviu em um copo. Riftan apenas o olhou, mas não tocou na bebida. Havia uma regra irônica de não beber nada no palácio, já que era difícil distinguir o cheiro quando misturado com drogas.

“Por favor, não hesite em me contar qual é o problema. Qual é o motivo para me chamar?”

“Você ainda tem o mesmo pavio curto.”

O Rei Ruben recostou-se na cadeira, os cantos dos olhos se enrugando. A expressão em seu rosto não podia ser distinguida, era algo entre estar à beira do riso e se sentir ofendido. Então, como se decidisse pela primeira opção, o canto dos lábios se ergueu e ele fez um gesto para que o servo se afastasse.

“Tudo bem. Eu também não gosto de longas pretensões, então irei direto ao ponto.” Quando o servo saiu após colocar garrafas de licores e frutas na mesa, o rei abriu os lábios novamente para falar. 

“Houve uma reunião em Osiriya sobre o Tratado de Paz entre os Sete Reinos há alguns meses. Geralmente é uma reunião cerimonial, mas desta vez, houve um assunto sério em discussão.”

Riftan esperou que ele continuasse, usando uma expressão séria. Ruben, que deu um gole em seu copo de vinho para umedecer os lábios, prosseguiu com uma voz calma.

“De acordo com os relatórios dos sacerdotes, há uma grande chance de o rei malévolo dos monstros despertar nas Montanhas Lexos.”

Riftan não compreendeu imediatamente suas palavras e arqueou uma sobrancelha. Depois de um momento de raciocínio, um arrepio gelado percorreu sua espinha quando ele entendeu.

“Você está dizendo que o Dragão Vermelho vai acordar?”

“Para ser preciso, ele está atualmente despertando.” O rei corrigiu-se com calma e pegou uma garrafa de vinho, enchendo seu copo. “Como você sabe, as Montanhas Lexos têm sido o domínio do dragão por muito tempo. Ninguém conseguiu pisar na montanha de fogo e romper as barreiras colocadas por aquele monstro há mais de duzentos anos. Mas alguns meses atrás, acontecimentos estranhos começaram a ocorrer perto das Montanhas Lexos.”

“Por acontecimentos estranhos, você quer dizer…”

“Monstros começaram a descer das montanhas e atacar humanos. Isso só pode significar que algo está se desenvolvendo dentro das barreiras. E isso não é tudo, fissuras começaram a se formar por toda a cordilheira. Os sacerdotes afirmaram que esses são todos sinais levando ao despertar do dragão.”

A voz do rei adquiriu um tom mais baixo e sombrio. “Secto se erguerá e semeará o mal nos próximos anos. Precisamos elaborar um contra-ataque antes que isso aconteça.”

O rosto de Riftan escureceu. Ele nunca tinha visto um dragão pessoalmente, mas apenas ler registros sobre isso lhe deu uma imagem clara de quão aterrorizante era esse monstro. Apenas imaginar diante de seus olhos o imenso monstro com uma vida praticamente infinita, poderes mágicos e exalando baforadas de fogo sobre o mundo o fez estremecer.

“… esse é o motivo pelo qual você me convocou?”

O rei acenou levemente com a mão ao perceber a tensão no rosto de Riftan.

“Relaxe, não estou pedindo para você derrotar o Dragão Vermelho de uma vez. Eu te convoquei porque precisava de alguém que pudesse atravessar a geografia do sudeste, tivesse mais conhecimento sobre monstros e conseguisse manter os lábios selados. Preciso de alguém para reunir informações sobre as Montanhas Lexos antes de formar uma equipe de expedição. É difícil encontrar um cavaleiro em Wedon que tenha tanta experiência quanto você. Além disso, ter os Cavaleiros Reais realizando essa tarefa tem uma alta probabilidade de chamar a atenção do público.”

O rei coçou sua barba farta com uma expressão séria. “Haverá um grande alvoroço se as notícias sobre o despertar do dragão se espalharem. Quero manter isso em segredo o máximo possível até que a equipe de expedição seja formada. Você pode ser aquele que reunirá secretamente essas informações?”

Riftan olhou pensativamente para o tapete manchado de gotas de chuva e assentiu lentamente. “Quando você planeja iniciar a expedição?”

“A expedição partirá em menos de meio ano. O poder mágico de Secto se recuperará completamente em cerca de dois ou três anos. Precisamos encontrar e destruir o dragão antes que isso aconteça.”

As Montanhas Lexos eram um lugar desconhecido e intocado pelos humanos há quase duzentos anos. Camadas de barreiras foram construídas pelo dragão e todos os tipos de monstros ferozes habitavam a área. Romper essas barreiras e derrotar os monstros seria algo fora do comum.

“Quantas pessoas você espera reunir para a expedição?”

“Por volta de 40.000 pessoas. Provavelmente será a maior força punitiva em Wedon e Dristan.”

O rei Ruben se levantou lentamente de sua cadeira e caminhou em direção à janela. Ele olhou silenciosamente para a vidraça gotejante da chuva torrencial e contemplou os arredores cinzentos por um longo tempo. Então, ele se virou e declarou.

“Estou pretendendo confiar esta expedição às mãos do Duque.”

Os olhos de Riftan se arregalaram diante da absurda declaração do rei. Ele irrompeu em risadas, imaginando o nobre carregando uma espada estreita e adornada na cintura.

“Não será fácil.”

“Eu não estou desconsiderando sua influência; ele ainda é meu vassalo. Ele precisará de uma desculpa razoável para desobedecer abertamente meus comandos.” O rei sorriu maliciosamente, girando o copo de vinho em sua mão.

“No entanto, ele não conseguirá encontrar nenhuma desculpa desta vez. As Montanhas Lexos ficam bem ao lado dos territórios do Duque. Ninguém pode negligenciar o dever de proteger suas terras enquanto reivindica sua posse sobre elas. Se o Duque de Croyso rejeitar meu comando de liderar a expedição, muitos nobres o ridicularão. Seu atual conflito com Dristan também o colocará em desvantagem.”

“… será a honra dele ou a vida dele. Qual opção será?” 

“Ele escolherá sua vida”, afirmou Ruben, seguro de suas palavras. “Eu o conheço bem. Ele valoriza sua honra acima de tudo, mas nunca colocará sua vida em risco. Não será fácil enviar tropas dadas as circunstâncias atuais dele com Dristan.” Um sorriso malicioso se espalhou pelos lábios do rei. 

“No fim das contas, o Duque não terá escolha senão recorrer à minha misericórdia. Mesmo que ele consiga encontrar uma saída, não me causará nenhum dano. Não seria delicioso assistir o homem lutar para escapar desse predicamento?” 

“… eu não sabia que você estava profundamente descontente com o Duque.” 

“Eu não dou a mínima para o ouro que o Duque de Croyso gera. No entanto, estou profundamente irritado com os conflitos tediosos que ele causa.” O rei afundou de volta em sua cadeira e soltou um longo suspiro. “É a terceira vez este ano que a atitude hostil do Duque quase se transforma em uma guerra total. O poder do duque precisa diminuir um pouco. Vou aproveitar ao máximo a oportunidade para contê-lo.” 

Riftan engoliu os pensamentos cínicos que passaram por sua mente. Um monstro capaz de aterrorizar o mundo todo está acordando, e ainda assim o rei está planejando uma trama política absurda… 

Será que tudo o que passa pela mente das pessoas poderosas sempre envolve lutas por interesses ocultos? Riftan perguntou-se interiormente com nojo. 

“Posso saber por que você está me revelando isso?” 

“Se você for o responsável por investigar as Montanhas de Lexos, terá que adentrar frequentemente no território do Duque. Eu não quero que o Duque tenha tempo para arquitetar coisas quando estiver de costas. O máximo possível, quero que você tenha cuidado para não deixar essa informação chegar aos ouvidos dele.” 

Mesmo que ele se esforçasse para fazer isso, era apenas uma questão de tempo até que essa informação chegasse aos ouvidos do Duque, dado que fora discutida durante a reunião dos Sete Reinos para o Tratado de Paz. No entanto, em vez de apontar isso, Riftan assentiu e levantou-se da cadeira. 

“Farei questão de ter isso em mente.” 

“Eu não disse que você poderia se levantar ainda.” 

O rei Ruben resmungou enquanto usava uma expressão carrancuda. 

Riftan se inclinou e se curvou respeitosamente. 

“Desejo trocar minhas roupas encharcadas de chuva e encerrar nossa conversa aqui. Sua Majestade permitirá que seu humilde súdito descanse?” 

O queixo do rei começou a tremer como se estivesse prestes a se ofender, mas logo acenou com a mão em resolução. “Está bem. Eu divulguei tudo o que pretendia dizer, você está dispensado.” 

Riftan assentiu uma vez e pegou seu casaco que estava pendurado na parede e saiu do quarto. O som da chuva ficava mais alto a cada momento. 

Usarei a chuva como desculpa para me afastar por um dia ou dois. 

Ele olhou para o céu enevoado através das janelas do corredor e acelerou o passo. Parecia que o inverno seria rigoroso novamente naquele ano.