Capítulo 97 - Um inferno na terra. X
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No momento seguinte a isso, a única coisa que o estudante pôde pensar era em como a vida daquela mulher em sua frente tinha sido um inferno. Ela teve que passar por muitos infortúnios para chegar onde chegou, e conseguir relatar sua história com tanta resiliência.
“Que coragem. Se eu estivesse em seu lugar, teria desabado a muito tempo.”
O estudante declarou em pensamentos, sem conseguir tirar os olhos da vidente. O homem-fera que estava ao seu lado também não parecia em suas melhores condições, haviam gotas de água formando-se em seus olhos, e seu semblante parecia dizer: “Você não merecia passar por tudo isso”.
A vidente então continuou a explicar sua história. Ela comentou brevemente que quando Dmitry foi coroado príncipe herdeiro, ela teve que passar por uma pressão absurda para ser educada apropriadamente. Foram alocados diversos professores e nobres da alta realeza para auxiliá-la nesse processo como princesa herdeira.
Embora estivesse sobrecarregada pela educação rígida dos seus pais e professores, Dmitry também passou por uma época em que considerou como um período de trevas. Lições, deveres, tarefas, aulas, etiquetas imperiais e modos como se comportar e reagir a situações atípicas, o que apagou completamente a personalidade de Tyrant e Dmitry.
Eles tiveram que passar por vários anos daquela forma, vivendo em uma bolha e como robôs, criados por seus pais e rodeados por um nome de nobreza que não os deixava viver livremente.
Sem amor.
Sem apoio emocional.
Sem forças.
— Não conseguia mais suportar viver. — Ela comentou devagar, sem esconder a expressão de medo e angústia. Tudo que estava contando nesse exato momento parecia um livro aberto, mas um livro que contava uma história terrivelmente amarga.
Rei e Kazuki ficaram perplexos por aquela notícia. Momentos depois eles não conseguiram esconder a surpresa em seus rosto, após notarem que uma figura tão importante como Tyrant, havia abdicado de sua posição social, estando agora bem à sua frente.
Inadvertidamente, um pensamento surgiu no estudante nessa hora: “Kazuki também é um príncipe herdeiro que abdicou do trono, e Tyrant parecia ter um passado semelhante. Que situação complexa…”
— Como você conseguiu fugir?
O estudante perguntou com o rosto para baixo, sentindo-se um pouco triste com tudo que acabara de ouvir.
— …
Houve um silêncio, antes que ela pudesse comentar. Tyrant, que estava perdida em flashbacks, balançou a cabeça para Rei, que esperava uma resposta.
— Eu não fugi, jovem. Fui resgatada. — Ela sorriu involuntariamente, apenas a própria Tyrant sabia o que ela suportou enquanto reprimia seus sentimentos do passado, embora estivesse magoada, triste e se sentindo injustiçada.
— Um ano antes de ocorrer o meu casamento, antes de completar 16 anos de idade e me tornar uma adulta de acordo com as leis do reino, eu fui salva. Isso ocorreu graças ao meu mestre, a pessoa a quem devo a minha vida, e quem me guiou por esse mundo.
Ela explicou brevemente, sem dar ênfase em como foi salva e o motivo por trás desse acontecimento. Havia somente um ligeiro sorriso em seu rosto enquanto contava dessa parte em diante.
— Quando estava na capital, em uma das minhas incontáveis tentativas de fuga, eu acabei parando em uma área afastada da cidade. Eu sabia que assim como nas outras vezes, eu não conseguiria fugir sozinha, mas não pude tirar da cabeça o pensamento de liberdade. Pensei que dessa vez seria diferente, pois os guardas que estavam me acompanhando, se distraíram e eu pude escapar sem grandes dificuldades.
— Era a minha chance, ou foi o que pensei… Corri sem olhar para trás, sem pensar em nada e vivendo o momento. Até chegar nessa parte isolada da cidade com casas tão frágeis que pareciam cair a qualquer momento. Neste lugar, fui abordada por alguns homens que perceberam que eu estava perdida, eles viram as minhas roupas nobres e me levaram com eles à força.
A cada momento em que prosseguia, o rosto de aflição de Rei e Kazuki podiam ser sentidos. Até mesmo o timbre da voz da vidente não parecia cooperar, ficando ainda mais conflituoso e depressivo.
— Eu tentei. Eu tentei resistir ao máximo, mas não tinha forças e nem poder para fazer isso. Eles me levaram até um beco isolado e me bateram, tiraram as minhas jóias e todos os meus acessórios de valor. Arrancaram meus brincos à força e minhas pulseiras.
— Eles tentaram se aproveitar da minha inocência, suas mãos estavam tocando as partes do meu corpo. Eu sentia como se insetos estivessem rastejando por minha pele e não tive forças para gritar, a minha voz, ela não saiu. Chorando e com dor pelos socos e toques agressivos, eu apenas fechei os olhos.
— Perto da dor de me considerar uma existência patética, negada e não tendo alguém a quem pudesse me apoiar ou recorrer, talvez aquilo não tenha sido nada. O egoísmo apaga a minha existência, enquanto o altruísmo tem pena de mim.
— Nesse momento, lembro-me de ter ouvido uma voz dizendo: “Tudo vai ficar bem”. Ele me abraçou com força, mechas do seu cabelo caíram sobre o meu ombro. Ele tinha o perfume do ar após um longo dia de chuva.
— Com o rosto quente e úmido e sem saber bem quando comecei a chorar, senti um alívio. Enquanto aquele desconhecido me abraçava, ele me disse repetidas vezes que tudo ficaria bem e que ele estava lá, e que as coisas iriam melhorar.
— Não sei por quanto tempo ele me abraçou ou por quanto tempo fiquei chorando, mas lembro que ele me disse: “Pode não ser o ideal agora. Ainda pode demorar um pouco. E tudo bem. Mas algum dia, sem saber exatamente quando, nem porquê, nem como aconteceu, você estará feliz”.
— Quando abri os meus olhos, todos aqueles homens grandes estavam derrubados no chão, e o senhor que me abraçava disse: “Não pense neles. Cuide de si mesmo. Você fará isso?” Eu tentei falar, mas tudo que consegui foi acenar com a cabeça.
Continua…
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