Capítulo 77: A união faz a força
Nossas vestes foram as primeiras a ressentirem-se do efeito. Começaram a se desfazer pouco aos poucos, um calor sufocante pingando por nossa pele e adentrando aos nossos pulmões.
— Precisamos fazer alguma coisa… — Meus olhos pousaram sobre Theresa. Droga, tinha me esquecido dela. Minhas bochechas ficaram vermelhas quando me deparei com aquela visão, suas vestes revelando a delicadeza de seu corpo.
— Não, não!! Isso não pode ser! Não olhem!
Ela se abraçou, ficando cada vez mais constrangida, sem saber o que fazer. Por respeito a ela, viramos o rosto, mas minha curiosidade me levou a revirar os olhos. Aquilo foi fatal. Uma seringa passou pela minha bochecha e sangue flutuou.
— Eu disse para não virar!!!
— Mas eu não virei! Foram os meus olhos! E droga, onde você arranja tanta seringa?!
Afaguei a parte afetada, estava doendo muito. Ela, por caso, não tinha noção do perigo? Ah, é mesmo, acho que ela não tem, já que é médica e poderia me curar facilmente.
— Não fiquem tão agitados assim…
Quando o irmão da Frida falou, me vi com novas vestes. Theresa também estava sorrindo, tanto que chegou a dar um abraço no seu salvador.
— Caramba, eu me esqueci de que você podia fazer isso!!! Mas…
Nossas vestes novas começaram a derreter.
— Precisamos agir rápido.
No mesmo instante em que Theresa disse isso, nossos corpos começaram a afundar naquela carne grudenta. E no meio desse cenário caótico, sereia não demorou para aparecer. Ela caminhava por cima daquela carne com o seu rosto todo feioso que não seduzia a ninguém, ainda que tentasse desfilar a moda das modelos estilosas.
— Vocês estão em meu domínio, eu avisei. Assim que forem pulverizados por esse ácido, viraram meus nutrientes.
Naquele momento, algo ficou bastante claro para nós. Na verdade, aquele polvo fazia parte do seu corpo, não, era o seu corpo. Droga, droga, droga! Nem o irmão da Frida estava conseguindo fazer roupas novas para nós naquele ambiente em que estávamos totalmente de mãos atadas, literalmente.
— Theresa, você não tem ideias?
Ela era a nossa esperança. Qualquer coisa que ela dissesse, eu com certeza seguiria à risca.
Ela fez uma cara de preocupação e olhou para a sereia: — Vamos dialogar?
— Dialogar?
— Isso, vamos pôr em mesa os nossos interesses e depois vamos negociar, um negócio que beneficie ambas as partes.
— Me dê um motivo para eu negociar com uns feiosos como vocês, seres fracos. O que de valor vocês poderiam me dar em troca?
Theresa ficou quieta. Decidi entrar nessa também e ajudar nessa negociação.
— Liberdade, o que acha?
— Liberdade?
— Isso, você não precisa ficar confinada nesse lugar.
— Do que você está falando? Quem disse que eu não me sinto bem aqui? Esse é o meu domínio!
— No mundo lá fora, há muito mais para ver, muito mais do que você imagina.
Tudo bem que ela não passava de uma marionete daquilo que uma vez foi uma sereia de verdade, no entanto, seus sentimentos ainda poderiam estar vivos nas profundezas de seu coração.
— Escuta, você também merece ser feliz.
— Feliz?
Pouco a pouco, ela estava vindo para o nosso lado. Lágrimas fluíram dos seus olhos e ela não sabia dizer o que era, isso, não se deixe dominar.
— Eu… — Ela pressionou a mão no peito e encurvou a cabeça. — Me salvem…
Eu sabia! Eu sabia que ela tinha esse lado!
No entanto, como nem tudo que é bom dura muito tempo. É, é o que dizem, alegria de pobre dura pouco. Nossos sorrisos não demoraram para desaparecer quando uma dor de cabeça surgiu nela e uma insígnia de serpente apareceu no seu peito.
— Parece que subestimei vocês.
A voz dela parecia meio grossa.
— Rei dos bandidos, é você, não é?
Dei um sorriso.
— Escuta aqui, por que você está se intrometendo? Essa luta aqui é nossa, entendeu?
Theresa emitiu com os punhos cerrados enquanto lhe olhava severamente.
— Não se preocupem. Eu só vinha vos congratular por terem subjugado essa magia através de palavras. É um feito a ser reconhecido, não?
— Tá, mas e daí? Você vai complicar as coisas e fazê-la voltar a ser malvada? Estamos atentos. Saiba que eu conheço muito bem essa jogada.
Porque normalmente os vilões clichês costumavam fazer esse tipo de jogada.
— Não, até vou dar um pouco de vantagens para vocês.
“Vantagem?”
Ele estalou os dedos e o corpo começou a se dissolver enquanto emitia suas palavras.
— O receptáculo desapareceu. Só precisam quebrar aquela pedra e já venceram, o que acham? Fácil, não é?
— Se você quer nos dar vantagem de fato, nos livra disso!!!
— Bem, isso é por conta vossa.
Depois disso, sua voz desapareceu.
— Vantagem uma ova, isso sim. Ele temia que aquela sereia nos ajudasse. Não tem como chegarmos lá quando estamos aqui presos.
Theresa tentou se debater, inutilmente.
— Tem sempre a opção de desistir, não é?
O irmão da Frida sugeriu. Mas essa opção com certeza estava fora de cogitação. O que precisamos agora era de…
— Meredith!!!
De repente, o interior do corpo daquele polvo estremeceu tanto que balançamos e conseguimos nos descolar um pouco, pelo menos, a parte dos braços.
Eu gritei por ela, mas poderia muito bem ser o Zernen, ou melhor, os dois.
— Escuta, acabei de ter uma ideia. — Theresa voltou sua atenção para o irmão da Frida. — Consegue fazer aparecer uma coisa que transmite a minha voz em bom e alto som?
— Sim, mas o que vai fazer com isso?
Bem, essa também era minha pergunta.
— Apenas faça.
— Tudo bem. — Ele assentiu, fazendo aparecer um megafone em sua mão. Quando ele o entregou a Theresa, ela sorriu e observou o teto daquela criatura. Enquanto isso, nossas roupas continuavam sendo dissolvidas.
Bem que ele poderia nos dar uma armadura…
— Isso, uma armadura! Você consegue trazer uma armadura para nós?! — Olhei para ele com um sorriso, na expectativa de que ele dissesse sim, mas…
— Não, infelizmente.
Droga, por que não podíamos ficar com as melhores coisas? Enfim, me concentrei na Theresa que estava prestes a falar algo.
— Meredith, se me escuta, quero que pegue o Oceano e os demais e fuja daqui imediatamente!!!
— Quê?
— O quê?
Ok, com certeza isso foi muito estranho, ainda mais vindo da Theresa. Fiquei mais aterrorizado quando ela aumentou mais lenha na fogueira, dizendo aquelas palavras…
— Iuaq arap onoaceo ertiA!!!
Ela repetiu aquilo um monte de vezes, aquela língua estranha. Depois que ela parou de gritar no megafone, imediatamente coloquei minhas mãos nos ombros dela e pedi explicação para ela, mas fui confrontado com uma resposta fria.
— Não me chateie.
— O quê?
— É isso, eu só a única que está pensando aqui. Têm noção de como tenho me sentido, sendo o único cérebro?
— O quê? Você não pode estar dizendo isso… Quando nós também temos contribuído, principalmente o irmão da Frida que nos deu roupa nova!
— Isso, e eu acho que não é hora para discutirmos isso. Na verdade, eu acho que você está tentando nos distrair do foco, não é? Me diga, qual é a sua agenda, médica?
O irmão da Frida me abriu os olhos.
— O que é isso que você não pode nos contar? Por favor, somos companheiros! Não podemos nos esconder nada!
— Aí, vocês estragaram tudo. Era para o chefe dos bandidos não ouvir. Mas fazer o quê? Até ele já deve ter percebido.
— Bem, se for assim, não precisa nos contar.
— Concordo. Estaremos dando vantagem ao chefe dos bandidos.
— Não, eu vou contar.
— Tem mesmo a certeza?
— O meu plano está ali.
Quando Theresa apontou para o teto, vimos um corpo de estátua cair em nossa direção enquanto se desfazia pela quantidade de ácido produzido naquele espaço. Seus cabelos azuis ficaram à mostra, suas vestes negras… Sem dúvidas, era ele.
— O quê?
O irmão da Frida arregalou os olhos. Bem, não era para menos, eu também estava boquiaberto.
Assim que suas pernas se desfizeram, ele pousou na superfície e sequer afundou.
— Bom trabalho.
Ele lançou seus olhos laranjas tão ferozes como os de um tigre para nós.
— Então era isso que você estava pensando?
Theresa deu um sorriso triunfante.
— Fabuloso. Mas como sabia que o ácido dissolveria a pedra?
Uma bela pergunta a do irmão da Frida.
— Eu não sabia, é tudo teoria. Só apostei nisso, já que o ácido iria nos dissolver, por que não poderia dissolver pedra? Afinal, tudo está conectado.
— A famosa teoria da Frida. Hum, quem diria que aquela baixinha seria de grande ajuda no nosso raciocínio sobre as dimensões?
— Bem…
Nossos olhos focaram-se no oceano que num zás chegou onde estava o cristal. No entanto, o interior do corpo não perdoou, lançando mais ácido enquanto retirava mãos em formato de carne que buscaram caçar Oceano, mas todas elas foram imediatamente destruídas por forças invisíveis, caindo pela superfície, enquanto despejavam sangue.
Com apenas uma mão esticada, Oceano destruiu aquele cristal. Milhares de estilhaços caíram por terra. A moça sereia caiu nos seus braços. Aquela cena realmente ficou parecendo aqueles filmes na qual a mulher caía nos braços de seu amado toda desacordada.
[Parabéns, vocês passaram da quarta prova! Criança 4 liberta!]
Não tardou, segundos depois daquela voz, a mulher nas mãos do Oceano começou a se desfazer em purpurinas ao mesmo tempo que o interior daquele monstro. Naquele mesmo instante, eu consegui ver uma mulher, meio transparente, enquanto acenava para mim, proferindo aquelas delicadas palavras que ficaram presas nos meus ouvidos.
” Muito obrigada!”
Como não vi nenhuma reação dos demais, decidi perguntar só para confirmar.
— Vocês ouviram isso? Vocês estão vendo o que estou vendo?
— O quê?
— Hã?
— Ah, deixa estar.
Só eu podia ver mesmo. Nem acredito que eu estava vendo uma daquelas cenas clássicas de uma despedida única e secreta de uma donzela. Que privilégio eu senti naquele momento.
— Vocês não entenderiam.
— Ih, já começou… — Theresa murmurou.
— Está ficando louco?
— Vocês não entenderiam.
— Hein?
— Vocês jamais entenderiam.
Fiquei com um sorriso bobo e, quando me dei conta, estávamos em terra firme, a água havia desaparecido, havia ficado tudo seco. Agora não passava de uma simples caverna. Mas o mais importante era que todos havíamos voltado ao normal e mais uma criança havia sido salva, nos braços da moça da Guida.
— Caramba, o que raios aconteceu aqui?
Fred coçava sua cabeça.
Um portal apareceu logo em seguida.
— Não me diga que vocês conseguiram fazer isso sozinhos?
Analista voltou com suas dúvidas.
— Sim! Foi tudo graças a nós! — Meredith entrelaçou seus braços ao meu pescoço, aproximando meu corpo do dela, transmitindo um calor que incendiou meu coração, gerando sequenciais de badum, badum, badum. Fiquei corado e muito incomodado. — Não é, Jarves?!
— Em especial destaque a Theresa…
Quando olhei para lá, vi Theresa cuidando dos ferimentos do Zernen que permanecia desacordado. Ele também era um guerreiro. Theresa garantiu que ele estava fora de perigo, mas precisava descansar muito e também comer para repor suas forças e energias.
— Está mais do que provado que a união é que faz a força. — Oceano deu um sorriso e encurvou a cabeça numa atitude inesperada. — Por isso, o meu muito obrigado a todos vocês! Sem vocês, nada disso seria possível. Espero que continuemos trabalhando desta maneira nas próximas provas. Conto com vocês!
— Isso mesmo, agora somos membros de um mesmo corpo — Frida acrescentou. Sond balançou a cabeça afirmativamente.
— Gostei dessa!!! — Fred cerrou os punhos. — Mas dessa vez, prometo não ser mais pego desprevenido! Acho que perdi muita coisa e vou querer mais detalhes sobre tudo!
— Desculpem por interromper toda essa animosidade, mas acho que o portal está se fechando.
Meredith apontou para ali e eu concordei com a cabeça.
— Eita, o que acontece quando o portal fecha?!!
Fred perguntou, mas ninguém queria ficar ali para saber. Nos apressamos e começamos a correr desesperadamente rumo a quinta prova com sorrisos no rosto, agora mais unidos do que nunca, para o que der e vier.
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