Capítulo 12: Vendo o sol aos quadradinhos
Depois de algumas andanças ali e aqui, passando por corredores extensos e pisoteando os famosos pisos de mármore, finalmente chegamos às portas que davam acesso à sala do trono do rei.
Dois soldados abriram aquela porta prateada. Nossos olhos contemplaram, à primeira vista, um longo tapete carmesim que levava ao trono onde o rei estava assentado. Seus longos cabelos loiros carregavam uma coroa dourada com pequenos diamantes adornando o redor dela. Seus olhos azuis fitavam-nos enquanto ele encostava o seu braço assente no braço do seu trono, na bochecha.
Começamos a caminhar por aquele tapete carmesim, enquanto olhos severos eram direcionados para nós. Eram alguns dos soldados que estavam rente aos pilares enquanto seguravam uma lança em suas mãos.
Meredith e eu encurvamos as nossas cabeças em respeito ao rei.
— Minha sobrinha Meredith, como tem passado?
— Bem, vossa majestade. — Levantamos nossas cabeças.
— Isso é bom. Como vão os preparativos para o casamento com o Faisal?
“Que tipo de resposta será que Meredith dará?”
Olhei para ela. Seu rosto estava bem sério.
“Espera… Por que eu estou pensando nisso, se a resposta é óbvia?”
— Lamento informá-lo, mas não haverá mais casamento.
“O quê?!”
Eu pensei que ela iria inventar uma desculpa qualquer, não que diria a verdade.
“Mas não se precipite, Jarves. Talvez a Meredith tenha algo em mente.”
— Hã? Por que?
O olhar daquele rei ficou mais frio. Seu punho contra a bochecha direita realçava ainda mais sua postura gélida.
— Eu o matei.
— O quê?
“O quê?!”
— O quê?
Muitos “o quê” puderam ser ouvidos naquela sala. Os soldados ao pé dos pilares revelaram espanto e perderam a compostura, junto do seu rei, que arregalou os olhos.
— Tem noção do que está dizendo, Meredith?
— Tenho e estou disposta a assumir as consequências das minhas atitudes.
— Então era esse o motivo da emergência, Meredith?! — O rei bateu o punho no braço do trono enquanto franzia o cenho. — Para me dizer que assassinou o seu noivo!
— Não. Eu não roubaria o seu tempo com um assunto tão trivial quanto esse.
“Meredith, você não está ajudando.”
— Trivial?
— Sim. O que venho tratar com o senhor tem a ver com a futura destruição do reino.
— Hã? — O rei ergueu uma de suas sobrancelhas. Os soldados ao lado dos pilares acompanharam o espanto do seu monarca, contorcendo seus traços em uma expressão estupefata.
— Esse reino será destruído pelas forças do exército do reino das trevas que invadiram este reino dentro de alguns meses.
— Reino das trevas? Nunca ouvi falar.
Porque até então isso não passava de uma lenda para o seu reino e toda a humanidade. Afinal, os heróis do passado selaram esse reino há milhares de anos até essa presente era.
— Este homem… — Ela apontou os braços para mim. — Ele tem o poder de ver o futuro e com os seus olhos viu o destino terrível que o reino de Hengracia irá sofrer.
— E você acha mesmo que irei acreditar nisso?
— Perdão, meu rei. Mas o senhor precisa acreditar.
— Deixa eu ver se eu entendi… — O rei começou a afagar sua barba dourada — Você vem para cá, diz que assassinou o seu noivo e depois diz que este rapaz que eu mal conheço viu um futuro em que Hengracia é destruída. E quer que eu acredite em suas palavras?
— Sim, infelizmente. — Meredith balançou a cabeça positivamente.
— Se tudo que disse é verdade, por que os deuses não me informaram?
“Porque não existem, ué.”
— Não acha que faz tanto tempo que os deuses abandonaram o nosso reino?
“Para começar, eles já ajudaram em algo?”
Comecei a rir internamente. Embora essa parte da conversa não estivesse no original, me rendeu algumas risadas.
— Já ouvi o bastante. — O rei direcionou os seus olhos aos guardas nas laterais, perto dos pilares. — Soldados! Prendam a princesa Meredith!
— Não… — Meredith trocava olhares com o rei enquanto eu fitava os soldados se aproximando de nós. — Por favor! Eu sei que abordei o assunto do assassinato do meu noivo de forma tão banal, mas peço que tome em relevância as minhas palavras de alerta.
— Nos vemos no julgamento. Lá, você terá todo tempo para falar e se explicar como deve. Por enquanto, vá descansar na prisão.
Parece que a situação fugiu um pouco do meu controle. Com os eventos mudando dessa forma abrupta, desse jeito não terei como prever o que vai acontecer.
É… Eu realmente tomei uma decisão errada em contar sobre a destruição do reino para Meredith.
— Não me toquem! — Meredith ordenou aos soldados, que pretendiam colocar as patas sobre ela.
Parece que terei que intervir mais uma vez.
— Vossa majestade, Rei Argahen Zhur Hengracia, peço humildemente que me escute!
Encurvei o meu rosto.
— Fale.
Os soldados pararam. Meredith olhou para mim com os olhos esperançosos.
“Só espero reunir palavras suficientes para não piorar ainda mais nossa situação.”
— Veja bem… Meredith está tão nervosa e confusa que não soube escolher as palavras certas para abordar esses dois assuntos tão importantes. Então, com a vossa anuência, eu poderia explicar?
— Prossiga.
“Perfeito!”
Na verdade, nada do que eu disse há pouco eram as minhas palavras, mas sim as do herói.
Uma vez, quando a Meredith acabou ficando nervosa e confusa, fazendo uma salada de informações, o herói acabou falando essas palavras que aplanaram o mau-humor do rei.
“Muito obrigado, herói!”
— Tudo começou quando… — Primeiro, contei sobre mordomo assassino que tentou tirar a vida da Meredith. Depois, contei sobre a ligação entre o mordomo e a mandante do assassinato, que no caso era a finada Graziela.
Depois disso, comecei a dramatizar mais do que devia a cena em que Meredith encontrou a Graziela e o Faisal no flagra numa casinha.
Eu desfigurava o meu rosto em uma expressão triste para deixar o rei mais comovido.
— Então se entendi, você usou essa sua habilidade de ver o futuro para mostrar a traição da Faisal contra minha sobrinha?
— Isso mesmo.
— E essa mesma habilidade de ver o futuro viu a destruição do reino de Hengracia?
— Infelizmente.
— E quer mesmo que eu acredite nisso?
“De novo isso, mesmo eu tendo explicado tudo detalhado.”
— Quero.
Acabei soando imperativo e deve ser por esse motivo que o rei não só ordenou que prendessem a Meredith, mas também a mim.
Ela até tentou sair em minha defesa, insistindo que o rei acreditasse nas minhas palavras e nas delas, mas de nada adiantou.
Os soldados acabaram por usar a força para nos levar à prisão. Um deles golpeou a Meredith na nuca e a colocou em seus ombros. Enquanto isso, o outro soldado me mandava marchar com a espada apontada contra as minhas costas.
Passamos pelos corredores e fomos levados até o calabouço real, onde ficavam confinados alguns membros da família real.
Bem… Pelo menos ficaríamos num lugar muito confortável; com comida ao nosso dispor, diferentemente de pessoas normais…
“Ok, parece que eu me enganei.”
Aquela definitivamente não era a prisão dos meus sonhos, estava tudo vazio e escuro. Com apenas uma janelinha que deixava escapar pequena luz por aquelas quatro grades.
É, eu estava vendo o sol aos quadradinhos.
— É sério que vocês vão nos deixar aqui?
Um dos soldados começou a rir enquanto o outro abria a sela, afugentando alguns ratos e baratas que estavam por ali.
— Não é nada contra você, garoto. Mas espero que, no tempo em que passarem aqui, você e a princesa deixem de ser lunáticos — dito isso, ele me conduziu para dentro da prisão enquanto o outro pousava a Meredith com leveza no chão.
Pelo menos os soldados desse rei eram um pouquinho pacíficos. Um deles fechou a porta da cadeia e seguiu caminhando ao lado do seu companheiro, deixando um aviso no final:
— Nem tentem fugir, a segurança aqui é forte. Temos ordens para ferir qualquer um que tente deixar essa prisão.
Aquilo me deu medo.
Com o corpo contra aquela parede fria, encostei a cabeça da Meredith nas minhas coxas, passando a minha mão sobre os seus cabelos escarlates.
“Parece que estamos ferrados.”
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.