Capítulo 14: Magia da verdade
— Espera. Espera. — Estiquei os dois braços para frente. — Como eu sei que isso vai funcionar?
Com isso devo ter ganho um pouco de tempo.
Geralmente, nas histórias, as habilidades eram explicadas com mais detalhe e informações, então…
— É bem simples. — Ele ergueu a palma da mão que continha a esfera branca giratória. — Quando a esfera ficar verde, você terá falado a verdade. Quando a esfera ficar vermelha, você terá mentido.
— É só isso? Não tem uma lógica por detrás?
— Magia não precisa de lógica, meu jovem.
“Os magos discordam disso.”
— Jarves, não é? — Ela bateu o leque, sorrindo com malícia. — Está tentando ganhar tempo para inventar uma desculpa por acaso?
— Não! Não! Longe de mim! — Balancei a cabeça freneticamente.
— Jarves, mostra para eles! — Meredith levantou os dois punhos, enquanto sorria com confiança.
— Vamos, não tenha medo — disse Zik. — Apenas fale o que você viu no futuro da Srta. Istar.
“Vejo que não tem outro jeito se eu quiser que acreditem nas minhas palavras. Terei que ferir um certo alguém com palavras duras.”
“Mas pouco importa, não é? Afinal ela falou mal com a minha personagem favorita!”
— Princesa Istar, não é?
Trocamos olhares.
— Você vai morrer.
— O-o que? — Ela arregalou os seus olhos escarlates, deixando cair o leque. Seus olhos haviam sido direcionados para a esfera, que estranhamente não havia mudado de cor. Nem para verde, nem para vermelho. — Zik, o que significa isso? Esse louco por acaso fala a verdade?!
— A esfera não havia se comportado assim antes. — Zik mostrou uma expressão num misto de espanto e curiosidade.
— Será que é por causa de ser uma verdade futura? — Indagou Meredith, colocando a mão no queixo. Sua prima apenas tremia de pavor.
— Muito pouco provável. Pelo que aprendi em meus muitos anos de estudo, a verdade é um conceito que transcende o tempo e o espaço. Ou seja, ela é absoluta. Sempre está lá.
— E então, Zik! Explica porquê a bola continua branca!
Istar ainda tinha seus olhos cravados na esfera branca que girava na palma da mão do Zik. Aquela expressão em seu rosto… Era como se ela estivesse rezando para que a esfera se tornasse em vermelha.
— Só tem uma opção para esfera não ter mudado de cor. — Zik fechou o punho, desfazendo a esfera. — Provavelmente, o meu poder esteja entrando em divergência sobre o que é verdade e o que não é. Ou seja, ele pode estar acreditando piamente na mentira, que é uma suposta verdade que ele mesmo criou, mas que não seja a verdade absoluta.
— Não entendi nada. — Istar semicerrou os olhos.
“Muito menos eu.”
— Nesse caso, o seu poder seria tão limitado que não sabe discernir entre verdade e sinceridade?
“Só a Meredith para entender isso.”
— É, pode ser que seja isso.
— C-com certeza é mentira! — Ela cruzou os braços, fazendo uma expressão emburrada. — Humph! Zik, vamos embora daqui!
— Certo, Senhorita.
Istar pegou o seu leque e saiu andando de braços cruzados. Seus passos ressoavam com ecoo naquele calabouço.
— Eu ainda vou ficar de olho em você. — Zik começou a andar, mas travou quando Meredith chamou pelo seu nome.
— E quanto a intercessão?
— Receio que terá que esperar até o julgamento. — Zik saiu caminhando enquanto Meredith gritava pelo seu nome, para que tomasse a indecisão do seu poder em relevância. Mas, ela recebeu nada mais que sons de passos se distanciando cada vez mais dali.
— Droga! Por que eles não escutam?! — Meredith observava daquelas grades, aquela parede totalmente escura. A única luz que tínhamos era a pouca que conseguia penetrar daqueles quadradinhos acima da parede, que chamávamos de janelinhas.
— É assim que funciona mesmo. Tem que ter pessoas que não acreditam.
— Mas não deveria ser assim. Não deveria assim!
— Só uma perguntinha, Meredith. — Atrai os seus olhos azuis.
— Hã?
— Quanto tempo será que ficaremos até o julgamento?
— Pela gravidade do crime que cometi, é uma burocracia que nem sei explicar. Eu chuto por aí um mês.
— Não dá para ficarmos esse todo tempo aqui. O reino das trevas invadirá isso tudo aqui dentro de três meses e algumas semanas.
— Eu sei, mas não temos como sair daqui.
— Temos sim.
— Como? Toda essa prisão é vigiada por soldados habilidosos. Desse jeito não dá, vão nos pegar.
— Eu meio que quando te contei já prévia que uma situação dessas pudesse ocorrer, então informei ao Zernen que se eu não voltasse até no prazo de dois dias depois da minha saída, que ele viesse me visitar na prisão.
Meredith fez uma expressão de espanto.
— Você viu o futuro de novo?
— Não — eu ri. — Eu só fiz uns cálculos que fizeram minha cabeça doer.
Nunca pensei que usaria o meu cérebro tanto assim na minha vida para fazer uma previsão precisa do que iria acontecer caso eu dissesse ou fizesse algo que interferisse na história original e, no final, acabar acertando.
— Quanta genialidade — Meredith elogiu. — Mas não acha que confiar no Zernen para vir nos libertar seria cruel demais?
— Vai ficar tudo bem. Afinal, ele é o neto de um ex-aventureiro rank S.
— Tudo bem, mas supondo que consigamos fugir…
“Ela não tem mesmo fé no Zernen.”
— O que faríamos depois? Eu não planejo deixar esse reino!
— Não é óbvio, Meredith? Vamos levar a sua família junto conosco! Sua família e seus conhecidos!
— Será uma missão difícil.
— Ficar e lutar também está fora de questão.
— O exército do reino das trevas é mesmo tão forte assim?
— Na minha visão, os aventureiros rank S fugiam todos com o rabo entre as pernas ao verem seus companheiros sendo mortos.
— Então quer dizer que não tem para onde fugir e em quem nos proteger? Estaremos só ganhando tempo antes de sermos completamente aniquilados.
— O que foi que eu disse?
— Hã? Como assim?
— Em um minuto tudo pode acontecer. Tenho a certeza de que esse tempo que ganharemos será o suficiente para a humanidade conseguir se opor ao exército das trevas!
— É, você tem razão.
“Sim, você será a heroína que criará a maior guilda de todos os tempos.”
Três dias depois
Três dias se passaram e nada de comida nessa prisão.
“Eles por acaso estão querendo nos matar de fome antes do julgamento?”
— Isso só pode ser obra da Istar. — A voz da Meredith ressoou cheia cansaço pelos meus ouvidos. Sua expressão abatida e seus lábios secos, revelavam sua imensa fraqueza por falta de alimentação.
— Ela não tá pegando pesado demais? Tudo bem que eu disse que ela morreria, mas isso não é o normal para todo ser humano?
— Ninguém gosta de ouvir isso. O ser humano… Não está preparado para morrer. — Após dizer isso, Meredith desmaiou. Sua cabeça se encostou sobre o meu ombro direito.
— Droga, desse jeito eu também não vou aguentar… — Eu estava me sentindo meio sonso. — A minha garganta já está seca também.
Seria nesse momento que o Zernen deveria chegar com pão e comida para nós… Espera, eu estava delirando ou estava vendo ele mesmo? Com uma cesta de pão, enquanto o soldado abria a porta da prisão.
— Você está bem!?
Apesar da minha visão turva, o Zernen estava muito estranho. Seus lábios estavam muito vermelhos e seus cílios muito grossos.
— Zernen, é você mesmo…?
— O que?
Os meus olhos se fecharam.
Apaguei.
Depois de ter tido mais um pesadelo com o Faisal, eu acabei acordando. Por algum motivo, dessa vez ele gritava:
” O meu pão! O meu pão!”
Que medo!
O que eu fiz para merecer isso?
Eu precisava procurar a Theresa e perguntar a ela se tinha uma poção mágica para curar pesadelo.
— Você está bem?!
Eu levava tapas na face. Quando a minha visão havia ficado mais nítida, me deparei com o rosto de uma linda mulher de olhos verdes e cabelo castanho. Pude reconhecer aquele rosto. A primeira princesa na linhagem de sucessão desse reino, Alexandra Theodoria Hengracia.
— Estou. Eu acho.
— Coma isso. — Ela ofereceu pão para mim. Depois, percebi que também estava coberto por um manto suave. Me senti tão quentinho. A Meredith repousava num outro manto confortável com um travesseiro sustentando a sua cabeça.
Eu trincava o pão enquanto apreciava aquele rosto belo me fitando.
— Quer… casar comigo?
— Casar? Você por acaso está delirando? — Ela tocou na minha testa. — Ainda deve estar com febre.
— Eu falo sério mesmo. — Comecei a rir. — É que você é um anjo!
— Ah! Obrigada! Mas é que eu já estou comprometida!
Essas dolorosas palavras perfuraram o meu coração como uma flecha.
“Lá se vai a chance de me casar com uma princesa de verdade, tão boa e gentil quanto essa, diferente da Istar.”
— É realmente uma pena.
— Bem, eu não vou poder ficar muito tempo aqui. Deixei comida, poções de cura e cobertas por aqui. Qualquer coisa designarei uma empregada para que venha aqui, certo?
— Certo.
“É assim que se trata prisioneiros reais.”
— Voltarei quando puder para visitá-los, por enquanto fiquem bem. — Ela se levantou e seguiu caminhando para a porta, que logo foi fechada pelo soldado que a acompanhava.
Que princesa mais encantadora. Pena que partiu o meu coração ao dizer que ela era comprometida.
A personalidade dela não foi tão aprofundada assim quando eu li os livros e vi a série. Na verdade, ninguém nesse reino havia sofrido um aprofundamento.
O que acontecia era que após assassinar o seu noivo, Meredith fugia e só mostravam as partes da família dela se lamentando, do rei ordenando as buscas, da princesa Alexandra conversando com a Istar sobre esse assunto, e só isso. Tudo passava bem rápido.
Mas, vendo, por outro lado, não me arrependia de ter contado a Meredith sobre a destruição desse reino.
Esse mundo deixou de ser apenas um livro, era real e eu estava nele.
“As pessoas daqui são verdadeiras e tem suas dores. Então, se eu puder ajudar de alguma forma com o conhecimento que tenho, assim farei.”
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.