Índice de Capítulo

    O vento sibilante arremessava os nossos cabelos contra o ar. Estávamos cada vez mais próximos da terra firme. Os telhados das casas ficavam mais nítido e as pessoas deixavam de parecer formiguinhas ambulantes.

    Não fazia ideia de onde estávamos agora.

    Perguntei se Zernen podia usar sua magia de explosão para nos manter flutuando no ar por mais algum tempo e ele disse que a mana que havia absorvido daqueles aventureiros havia se esgotado. Olhei para aquelas duas, com certeza também não podiam fazer nada a respeito da nossa situação atual.

    Bem, mais bem próximos do chão, o golem fechou o punho que nos segurava, nos deixando no escuro.

    Sentimos apenas um tremor e vozes ressoando do lado de fora. Eram pessoas murmurando sobre a súbita aparição do golem vindo do céu. No entanto, sem mais tardar, o golem começou a correr enquanto nos encobria em sua mão.

    Alguns gritavam: chamem os aventureiros e os soldados!

    É, não os culparia. Afinal, golems eram tidos como monstros selvagens que habitavam as profundezas da terra. Contudo, este era diferente, este era um golem feito pela magia do Alecrim.


    Depois de algum tempo correndo, os passos do golem começaram a desacelerar. Era o indicativo de que ele havia alcançado o seu limite. Sua mão abriu, revelando aquela forte luz vinda do sol.

    Investigando as casas ao redor e o aspecto da cidade, não tínhamos mais dúvidas de que estávamos no distrito de Gallen.

    Por sorte, estávamos em uma rua pouco movimentada, então dei ordens para que o golem se escondesse em um dos becos antes que o seu corpo volumoso começasse a chamar atenção. Ele fez como eu disse e correu para um dos becos. Depois, nos largou no chão atenciosamente.

    — Já pode encolher — ordenei. Ele encolheu no tamanho de uma miniatura.

    — Gaia é bem prestativo — disse Theresa, segurando o golem na sua mão.

    Meredith sorriu e olhou para mim.

    — E agora? Qual caminho tomaremos para chegarmos a oficina desse tal ex-aventureiro rank S?

    — Podem deixar que eu conheço uns atalhos! — Zernen se ofereceu, colocando o polegar contra o peito.

    — Perfeito! — Meredith sorriu.

    Zernen nos guiou por seus caminhos um tanto quanto duvidosos, no entanto, muito rápidos. Só que, é um dos caminhos; um beco estreito, acabamos nos deparando com uma gangue de quatro homens.

    Eles possuíam algumas cicatrizes nas caras e usavam roupas um pouco rasgadas ao redor do corpo, como se fosse a moda deles. Não, na verdade, era a moda deles!

    — Ei, vocês… Passem tudo o que têm agora! — disse um dos homens, criando fogo em sua mão.

    — Aí, ladrões… — murmurou Theresa.

    Meredith que observava aquela gangue, cerrou os seus punhos.

    Isso me lembrou um dia em que eu e os meus amigos do meu mundo atravessamos um bairro bastante perigoso apenas para visitar um amigo da escola que havia ficado doente. Foi uma aventura, fomos assaltados e espancados. Mas no final, quando ele se recuperou, pedimos que ele restituísse o que havia nos sido roubado pela gangue da rua dele.

    E ele o fez, afinal de contas, a gangue conhecia muito bem ele.

    Só que agora…

    —… Eu não vou deixar isso se repetir novamente.

    Zernen colocou as mãos nos bolsos do seu macacão e avançou.

    — Eai, amigos… — Ele colocou uma de suas mãos no ombro do homem, que segurava uma bola de fogo. — Eu acho melhor é vocês passarem tudo o que têm para mim!

    “O que? Assalto reverso?”

    — Você endoidou?

    O cara, que era mais alto que Zernen, fez uma cara assustadora que até me arrepiou.

    — Ele só pode ter perdido a noção do perigo! — Um baixinho com cara de batata acrescentou e os outros dois começaram a rir.

    — Acaba logo com esse esquisitão!

    — Vamos ficar com essas roupas maneiras que ele tem e vender!

    — Vocês conhecem o Gar? — questinou Zernen.

    — Tá falando do chefe? — Era o mais alto, ao qual o braço do Zernen esticado ao limite segurava o seu ombro.

    — Ei, o que tem o nosso chefe, seu imundo? — Indagou o cara de batata.

    — Eu estava um pouco preocupada, mas vejo que podemos deixar isso com ele — disse Meredith, relaxando seus punhos.

    — Como assim?

    — Não é óbvio? — disse Theresa. — Se ele tá encarando, é porque pode vencer!

    ” Isso não faz sentido!”

    — Gar foi um ex-aventureiro que eu e o meu grupo derrotamos em uma das nossas missão. Ele não era lá tão forte e usava métodos covardes. Se esses ladrões têm Gar como chefe, os níveis deles devem ser muito inferiores.

    — Aquela cicatriz no olho direito dele é um presente meu!

    O mais alto e os seus demais companheiros arregalaram os olhos diante da afirmação ousada que Zernen havia feito.

    “O que?!”

    — Viu só? Até o Zernen já derrotou ele!
    A propósito… — Meredith levantou a mão, atraindo a atenção daqueles quatro. — Eu deixei uma no olho esquerdo dele!

    — O que?! — Os quatro arregalaram os olhos.

    — Isso é tudo uma invenção vossa! Não têm como vocês terem conseguido deixar uma cicatriz no rosto dele, não com esse nível tão baixo de magia!

    — Quer pagar para ver?

    — Maldito! — O mais alto lançou a bola de fogo contra Zernen, mas ele se distanciou e absorveu aquela bola de fogo.

    — Vamos! Mandem mais do seu ataque!

    — Absorveu…? — Ele rangiu os dentes.

    — Maldito! — O outro lançou um raio amarelado. E os outros dois; uma bomba de água e uma esfera de vento, mas tudo isso foi absorvido pelas palmas das mãos do Zernen.

    — O que? Impossível!

    — Como ele absorveu a minha bomba de água?!

    Os quatro procuravam resposta, mas não achavam.

    — Mandem cumprimentos ao seu chefe! E digam que o Zernen, o neto de um ex-aventureiro Rank S, mandou cumprimentos!

    — Quê?

    — Neto de um…

    — Aventureiros Rank S?

    Bye! Bye! Explosão de mana!

    Uma explosão arremessou aqueles quatro homens para alguns metros longe de nós. Depois, levantaram-se e correram para bem longe com o rabo entre as pernas.

    — Mandou bem, Zernen!

    — Eu sempre mando bem! — Zernen levantou o polegar, com um sorriso no rosto.

    Depois daquele indecente no beco, Zernen nos levou a oficina do seu avô. Entramos bem rapidinho para que não chamassemos atenção.

    A primeira vista, contemplamos o Sr. Alexodoro, que estava como sempre polindo suas armaduras.

    — Bem-vindos a… — Nossos olhos se encontraram e ele não pôde evitar o espanto diante da presença daquelas duas estranhas. — Zernen? Jarves? E… Minhas noras?

    — Quê? Não! — Balancei a cabeça freneticamente.

    — O que deu nesse velho? — Theresa sussurrou no ouvido da Meredith e ela deu um sorriso torto.

    — Brincadeira!

    — Vovô, esses são—

    Antes que pudesse terminar sua fala, Zernen levou um soco no abdômen. Ele cuspiu saliva e arregalou os olhos enquanto caia de joelhos.

    Meredith e Theresa ficaram espantadas com aquela ação. Pelas expressões que faziam, deviam estar se perguntando se estavam no lugar certo.

    Os olhos severos do Sr. Alexodoro deixaram o corpo do Zernen no chão e subiram de encontro aos meus.

    — Podem me dizer o que significa isso? — Ele retirou um papel do seu bolso, revelando o rosto do Zernen a um preço de 1000 moedas de ouro. — Hã?

    Que medo! Não sabia se tinha mais medo do rosto do Zernen ou do rosto que o Sr. Alexadoro fazia enquanto segurava aquele papel.

    — Sr. Alexodoro, eu posso explicar.

    — Estou todo ouvidos.

    — Acontece que… — Dessa vez, me senti no lugar da Meredith, não estava achando palavras.

    Contudo, Theresa me salvou. Ela explicou tudo para o Sr. Alexodoro. Ela tinha talento para explicar as coisas seguindo uma linha temporal fácil de entender.

    Como esperado da Theresa.

    — E foi isso que aconteceu.

    — Por que você não me contou que tinha esse tipo de poder? — Sr. Alexodoro estreitou os seus olhos.

    — É… Eu não sabia se deveria contá-lo. — Brinquei com os dedos, desviando os olhos dele. Ele me ignorou e focou na Meredith.

    — E você é a Meredith, não é?

    — Sim.

    — Entendo. Esperem um pouco… — Sr. Alexodoro colocou a mão sobre o queixo.

    Ele sempre dizia isso quando queria assimilar uma determinada situação. O que o tornava um aventureiro hábil era que ele se dava tempo para pensar em como resolver um problema.

    — Parece que vocês se meteram em uma situação bastante difícil. Fugiram da prisão logo após terem dito que Hengracia seria destruída por monstros. De fato, sua informação, segundo os livros, possui um pouco de credibilidade. Mas para o rei e os outros, não passa de uma lenda de milhares de anos. Sabem o quão difícil é acreditar numa coisa passada? Deveriam ao menos ter reunido provas da possível existência desses seres milenares antes de chegarem ao rei.

    É, nós não havíamos cogitado isso.

    — Devo dizer que vocês estão condenados.

    Ele foi direto demais.

    — O senhor não poderia usar sua influência como ex-aventureiro para persuadir os outros aventureiros a persuadirem o rei de que essa informação deve ser tomada em relevância?

    — Se nem você que é a princesa conseguiu, imagina eu?

    — Ah… — Meredith não teve palavra.

    — A vossa intenção foi boa, mas o que vocês fizeram foi grave, meninos. Antes de terem tomado essa decisão, deveriam ter me procurado antes. Agora, não poderei fazer mais nada, já que a situação chegou a esse ponto.

    Meredith começou a refletir sobre isso e viu o quão falha foi em tomar decisões com base nas emoções. Não só ela, eu também havia falhado miseravelmente.

    Eu pensei que tinha tudo sobre controle, mas, na verdade, eu era quem estava sendo controlado pela situação.

    — Contudo, não fiquem tristes. Já que a princesa, a farmacêutica e o meu neto acabaram envolvidos, eu vou ajudá-los.

    — E eu?

    — Você é o maior culpado de tudo isso, Jarves. Com grandes poderes vem grandes responsabilidades, sabia disso?

    Eu já havia ouvido essa frase no meu mundo, mas nunca pensei que ela fosse fazer tanto sentido, como estava fazendo agora.

    — Mas enfim, aprender com os erros já é um passo para não voltar a cometer erros semelhantes.

    Meus olhos desceram ao Zernen que havia começado a acordar, seu corpo se remexia naquele chão.

    — Por agora, eu vou enviá-los ao norte do reino de Hengracia.

    — O quê? Não! — Zernen protestou por algum motivo.

    — É o único lugar seguro onde podem ficar sem ser alvos de perseguições.

    — Tudo menos isso, vovô! — Zernen ajoelhou-se e juntou suas mãos em oração. — Eu não quero voltar para lá tão cedo!

    — Isso é culpa sua e do seu amigo, arquem com as consequências.

    — Não… — Ele parecia um bebê chorão.

    — Bem, antes de tudo, eu preciso visitar a minha família — disse Meredith, olhando para o Sr. Alexodoro.

    — Não lhe aconselharia a fazê-lo.

    — Por quê?

    — A mansão deve estar vigiada. Lá, é o lugar que eles esperam que você volte.

    — Mas ainda assim, eu preciso vê-los.

    Por longos minutos, Sr. Alexodoro tentou persuadir Meredith a não voltar para sua mansão, mas no final a teimosia da Meredith venceu. Ela queria ver a família a todo custo, pelo menos, uma última vez antes de partir para o norte de Hengracia.

    — Hum, você é a cara do seu pai.

    — Você conhece o meu pai?

    — Quem não conhece? Afinal, ele era o príncipe! Hahahaha!

    — Não, é porque eu já ouvi meu pai falar sobre um senhor chamado Alexodoro.

    — Deve ser outro. Enfim, comeram algo? — Sr. Alexodoro mudou de assunto de uma maneira impressionante.

    — Eu estou com fome! — Zernen e eu levantamos as mãos.

    — Não, vocês não comem. Estão de castigo para pensarem no que fizerem.

    — Não pode ser… — dissemos em um uníssono, enquanto nossas barrigas roncavam.

    — Srta. Meredith e Srta. Theresa, podem vir comer. Acabei de assar uma ótima carne de javali!

    — Obrigada! — agradeceu Theresa e Meredith sorriu, enquanto olhava para nós com uma expressão de pena: — Vai mesmo deixá-los sem comida?

    — Sim. — Depois, nossos olhos se encontraram com os do Sr. Alexodoro. — E só para não ficarem à toa, quero que façam mil flexões!

    — Mas vovô…

    — Agora! — Seus olhos ficaram frios. Nós começamos a fazer as tais mil flexões, enquanto as meninas iam comer na cozinha da oficina do Sr. Alexodoro. — Um, dois, um, dois!

    — É, parece que estamos ferrados.

    — É tudo culpa de quem mesmo?

    — Minha… — murmurei e Zernen arregalou os olhos. Ele não esperava que eu fosse admitir assim tão fácil, mas aquelas palavras proferidas pelo Sr. Alexodoro me fizeram refletir o quão longe a minha burrice e presunção haviam me levado.

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 0% (0 votos)

    Nota