Capítulo 36: Batalhas paralelas
Enquanto segurava sua mala, Theresa tinha os olhos fitos naquele homem de porte forte que carregava Zernen em um dos seus ombros.
— Hahahaha! — Wase não conseguia segurar suas risadas diante da declaração repentina que Theresa havia feito. Ela seria sua oponente? Era algo tão engraçado de se dizer, já que Theresa não era focada em combates.
Wase parou de rir quando percebeu que Theresa não reagia, sua expressão séria deixava claro de que ela não estava brincando.
— Olha, médica, por respeito à pessoa que um dia já ajudou um dos meus pequenos, eu não quero te ferir, então vou fingir que não ouvi o que você disse e você dará meia volta para onde estava. Eu até posso mover os pauzinhos para te colocar a salvo dessas perseguições como forma de agradecimento.
— Acha que eu não sou capaz de te vencer?
Ele balançou a cabeça.
— De fato, mas eu não viria aqui se eu não tivesse um plano em mente. Eu sou uma médica, sabe? Tenho vários truques na manga.
— Hum, revelando que tem truques na manga. Acha mesmo que irá vencer assim?
— É porque eu já venci.
— Você é engraçada demais, médica. Acho que ter passado tanto tempo a cuidar de pacientes também te deixou biruta da cabeça.
— Tá duvidando? — Theresa retirou uma bola enfaixada do jaleco. — Então vamos para prática.
Wase pousou Zernen no chão e bateu com o punho na mão.
— Eu não quero ter que bater em mulher, então pare enquanto há tempo.
Com os lábios cerrados, Theresa jogou aquela bola enfaixada. Ao entrar em contato com o chão, ela liberou uma fumaça negra que subia ao céu e se expandia no meio do ar.
Wase colocou o braço contra o nariz enquanto observava a fumaça negra se tornando cada vez mais espessa ao ponto dele ter dificuldades para visualizar sua oponente.
— Bomba de fumaça, é? Planeja me derrotar com isso?
Theresa retirou mais bombas de fumaça e jogou contra o chão, aumentando ainda mais aquela névoa. Nem mesmo ela agora poderia identificar seu oponente.
— Sinto muito a informar, mas isso não irá funcionar.
” Karin estava certa, então ele tem o escudo perfeito ativo.” Theresa agachou e abriu a mala, retirando duas tampas de panela dela. Tendo isso, ela começou a bater as tampas de panela, causando um som estridente e irritativo aos ouvidos de quem ouvia. Ela só não era afetada porque usava dois algodões como tampão de orelhas.
— Você enlouqueceu mesmo. Primeiro a fumaça, agora esse som irritante? Planeja o que? Estragar os meus ouvidos? — Wase continuava caminhando por aquela fumaça, ele sequer inalava já que o seu escudo perfeito lhe protegeria de resíduos que fossem tóxicos. A única coisa que lhe causava irritação era aquela onda de som que penetrava sua defesa e adentrava seus ouvidos. — Bem, vou acabar logo com isso!
Theresa recuava a passos lentos enquanto Wase se aproximava.
Tap! Tap! Tap!
Era o que se podia ouvir em meio ao breu enevoado.
— Agora está fugindo?
Um inseto pousou perto dos ouvidos de Theresa, emitindo som de zumbido. E foi neste instante em que ela parou de bater, atirando aquelas duas tampas de panela contra Wase, que apenas avançava sem se importar com aquela investida. Bem, não é como se as tampas pudessem causar algum dano à sua barreira perfeita.
Wase coçou sua cabeça enquanto as tampas caíam por terra após terem acertado sua testa. Ele suspirou e desceu seus olhos pelas tampas prateadas que eram encobertas por fumaça.
“Aquela mulher com certeza está louca.” Era o que passava por sua mente.
Theresa retirou uma caneta.
— Mas o que? — Os olhos arregalados do Wase foram atraídos por um enxame de insetos que pousavam no seu ombro.
“Quando eles haviam chegado?” Wase se perguntava. Era uma multidão de insetos que percorriam todo seu corpo, se acumulando em seus ombros e no seu traseiro.
— Mas esses insetos são da Karin… O que eles estão fazendo aqui?
” Karin me traiu?” Wase balançou a cabeça negativamente, buscando outra resposta. Não era possível que ela o tivesse traído, sequer havia motivo para isso, já que, além de serem irmãos, ambos compartilhavam do mesmo objetivo.
— Ei, médica, o que vem a ser isso?
A fumaça enfim se dissipou e os olhos deles se encontraram.
— Esses insetos vão comer toda sua mana se não se apressar — disse Theresa colocando a caneta em sua boca e usou o seu dedo indicador para apontar para uma pessoa familiar que o esperava assim que virasse.
Os olhos do Wase se encontraram com o de uma mulher vestida de empregada. Possuía olhos vermelhos como os seus e cabelos negros como contraste. Uma expressão triste preenchia seus traços enquanto se observavam.
— Desculpa, Wase.
Quando Karin disse isso, Wase sentiu uma agulha acertar seu ombro esquerdo. A defesa havia sido penetrada, sangue jorrou da parte afetada, mas isso e nem mesmo a dor que ele sentia naquele momento se comparava a traição que havia sofrido.
— Por que fez isso?!
— Não há mais motivos para lutarmos, sabe? Eles vão nos dar o dinheiro para sustentar o nosso orfanato.
Os traços de Wase se contorceram. Ele mais uma vez foi acertado no seu ombro, mas ainda assim, continuava de pé.
— Você é durão, não é?
Veias espreitaram as extremidades da testa do Wase, sinal claro do seu descontentamento quanto à traição feita por sua irmã. Lembrou-se do papel que continha o desenho daquele rapaz que atendia pelo nome de manipulador charlatão e não hesitou em direcionar sua raiva para aquela mulher… Aquela mulher que pertencia ao mesmo grupo que o manipulador charlatão.
— Com certeza eles fizeram algo com a sua cabeça, mas não se preocupe, eu… irei… — Seus olhos se fecharam enquanto ele caia de joelhos. Os insetos que o consumiam retornaram para dentro do corpo da dona.
— Viu só como funcionou? O meu plano perfeito.
Theresa sorriu, mas Karin, em profundo silêncio, apenas correu até seu irmão agora deitado e chorou contra seu corpo enquanto pedia desculpas.
Theresa recolheu sua mala e começou a caminhar em direção ao corpo do Zernen.
No meio do caminho, os olhos das duas se encontraram.
— Espero que mantenham a palavra e deem o dinheiro de que precisamos.
— Claro.
” E agora?” Theresa observava o corpo do Zernen no chão. ” Acho que terei que ir buscar a caravana, não vou conseguir carregá-lo.”
“Ah…” Theresa suspirou pelo trabalho que havia de ter, havia estacionado a caravana um pouco longe.
Theresa correu com todas as suas forças até onde havia colocado a caravana. Quando retornou com ela, minutos depois, encontrou alguns dos aventureiros que haviam acordado, tentando levar o corpo do Zernen. Karin agora estava inconsciente, havia sido nocauteada por um deles.
” Só me falta essa…” Theresa colocou as mãos nas rédeas e a galope foi em direção a esses aventureiros na pretensão de os atropelar. Pelo caminho, ela retirou uma bomba de fumaça do jaleco e atirou contra eles. Alguns começaram a cambalear, enquanto outros que tentavam se manter firme caíram com os espinhos que Theresa lançou em alguns pontos de seus corpos.
Com todos derrubados, Theresa pôde carregar Zernen para a caravana. Ela notou que mais pessoas estavam acordando, então saiu dali a toda velocidade antes que fosse derrubada por aventureiros, já que os seus espinhos e bombas de fumaça haviam acabado.
Uma névoa tão branca quanto uma nuvem havia se formado perto a um dos edifícios agora em pedaços após a colisão do cientista em seu corpo gigantesco.
Os olhos azuis da ruiva deixaram de observar o homem agora adormecido que soltava roncos para ali e para cá enquanto tinha a mão pousada contra a barriga. A ruiva agora tinha a atenção voltada àquela névoa que aos poucos se dissipava, revelando o corpo gigantesco do cientista em meio aos destroços.
Quando o corpo começou a reduzir de volume, ficando cada vez menor, Meredith preparou a espada e semicerrou os olhos num ato de prontidão contra qualquer investida que àquele homem tentasse fazer.
— Então você chegou…
Meredith observava uma pequena silhueta em meio à fumaça, se levantando do chão enquanto falava.
— Meredith…
— Há quanto tempo, Nikolas.
Passando pela fumaça, os olhos marrons de Nikolas se encontraram com os azuis da Meredith.
— Como sempre, você chega para acabar com a minha diversão. Eu ainda não me esqueci daquele dia, sabia?
— Hum? Que dia?
— O dia em que eu deveria me tornar um aventureiro rank C! Naquele mesmo dia você atrasou o meu avanço… E o terrível é que além de você ter roubado a minha glória, você a rejeitou!
— Hããã… Aquele dia… — Meredith baixou sua espada e colocou uma das mãos contra o queixo. — Mas já faz tanto tempo desde que aquilo aconteceu, Nikolas.
— Maldita, não fale como se não fosse nada!
Meredith sorriu.
— Você não muda mesmo, Nikolas. Mas fique sabendo que não há razão para guardar ressentimentos, porque, como vê, eu não passo de uma aventureira rank F e você um rank B. Veja, você conseguiu chegar mais alto que eu como aventureiro.
— Isso não é o suficiente para apagar o passado. Gar era meu oponente! Meu! E você chegou e roubou-o de mim!
— Era uma missão conjunta, não era a minha atenção.
— Não era a sua intenção, não é?
Um sorriso largo nos lábios daquele homem deu origem a risadas que deixavam Meredith duvidosa quanto a sanidade mental do Nikolas.
— Agora acabei de lembrar de algo…
No entanto, Meredith decidiu entrar no clima e se juntou ao mar de risadas.
— Que bom que o seu humor melhorou. Agora podemos dialogar como bons parceiros de longa data, não é?
— No final das contas, você é uma assassina, Meredith. Os valores que o tolo do seu pai te passaram caíram por baixo e agora você não passa de uma homicida perseguida. Logo você, Meredith, que tanto tentou passar uma imagem bem limpa!
— É verdade que sou uma assassina, mas isso não tem nada a ver com você, Nikolas. Suma daqui agora.
— Ah, como o tolo do seu pai se sentiria sabendo que você matou seu próprio noivo para ficar com um mendigo de rua?
— Eu não vou cair nas suas provocações, então poupe suas palavras imundas e suma daqui! — Meredith disso isso, mas, na verdade, estava se segurando para não agredir Nikolas naquele momento. Seu braço direito, que fazia sua espada tremer, evidenciava isso.
— Parece-me que o tolo do seu pai não só lhe passou os ensinamentos — Nikolas colocou um dedo indicador de cada mão por cima da cabeça —, mas também aquelas duas coisas que ficam na cabeça e te fazem dizer muuuuu!
— Já chega… — As sobrancelhas de Meredith cerraram. Com a última gota d’água derramada, Meredith que transbordava de fúria, avançou com a espada em direção ao Nikolas. — Eu tolero que insulte a mim, mas não ouse manchar a honra e a dignidade do meu pai! Nikolas, se o que pretendia com isso é morrer, tratarei de realizar o seu desejo agora mesmo!
— Perfeito, é assim que eu quero acabar com você… Uma rells aventureira rank F… Tenha um fim miserável tal como seu pai, Meredith!!!
Nikolas retirou uma seringa com líquido vermelho do jaleco e aplicou contra o seu braço.
Quando Meredith estava mais próxima com a espada preparada para fatiá-lo, milhares de braços saíram de tudo quanto é canto do corpo do Nikolas. Meredith teve que recuar, encurtando um pouco a distância entre ela e ele.
A multidão de mãos balançava de um lado para outro, como se fosse um polvo balançando seus tentáculos.
— Isso vai além de suas habilidades… O que você fez com o seu corpo?
— Eu sou um ser num plano superior, vocês meros mortais jamais entenderão a essência do meu ser. Veja, ser inferior, como fui capaz de superar até o maior dos prodígios com a minha mente brilhante!
— Ainda estou disposta a dialogar com você, prefiro não ter que matá-lo e fazer jus a minha reputação de assassina novamente.
— Hahahaha! É mesmo? Acha mesmo que pode me matar? Uma aventureira rank F contra um aventureiro rank B do meu nível? Não me faça rir!
— Só que tem uma coisinha que você acabou esquecendo, Nikolas…
Nikolas levantou uma de suas sobrancelhas.
” O que seria?” Era o que ele se perguntava, já que havia se certificado de colher todas as informações referentes a Meredith e seus companheiros.
— Hã?
— Que enquanto eu estiver balançando uma espada ninguém me segura.
— Ah, era só isso? Bem, aqueles tempos acabaram, Meredith. Sendo prodígio ou não, você não tem chance contra mim, porque eu estou em um plano superior ao dos prodígios. Em menos de três meses, eu até serei muito mais forte que os aventureiros rank S!
— Ah, é? Então sinto muito por ter que estragar os seus sonhos. — Meredith avançou com a espada em direção ao Nikolas, mas antes que pudesse chegar perto para decapitá-lo, ele usou alguns dos seus braços para recolher milhares de pedras dos escombros dos dois edifícios e atirá-los contra as laterais da Meredith.
Com aquele ataque massivo vindo dos dois lados, ela dificilmente poderia se desviar.
Meredith parou no meio do caminho, observando todos aqueles pedregulhos vindo contra o seu corpo.
Meredith subiu seu capuz para cima e colocou a espada contra o rosto.
— Eu não queria ter que usar isso, mas…
O cientista rangeu os dentes ao observar que suas pedras eram destruídas e caíam por terra quando tocassem no capuz da Meredith. Algumas, que tentavam passar para o rosto, não conseguiam por conta da espada contra o rosto da Meredith.
— Maldita magia!
A magia de Meredith nada mais era que manipulação de peso dos objetos, ou seja, Meredith poderia manipular o peso de qualquer objeto existente, sendo capaz de endurecer e tornar leve.
Com isso, ela havia tornado o capuz pesado ao nível de um ferro metálico que ela havia tocado.
Uma das condições para que Meredith usasse essa magia era essa, que ela só podia endurecer ou tornar leve um objeto com base nas propriedades que sua mana absorvia de um determinado objeto.
O único empecilho nessa habilidade era que, se o usuário usasse a habilidade em suas vestes e não fosse forte o suficiente para suportar o peso, corria o risco de ter seu corpo totalmente despedaçado. E para Meredith não era exceção, seus músculos estavam no ápice de tanto suportar aquele peso.
Ela teve que desativar a habilidade rapidamente, antes que fosse consumida. Seu corpo agora rangia de dor, por isso ela não gostava de usar essas habilidades em si.
Meredith suspirou ofegante. A umidade invadia sua pele de pouco em pouco.
— Hahahahah! Mesmo depois de tanto tempo essa habilidade continua inútil, forçando seu corpo a se submeter a uma intensa dor!
Meredith mal conseguia responder as zombarias dele. Ela estava mais preocupada em tentar recuperar suas forças perdidas após ter suportado aquele peso.
— Mas a pergunta que eu faço é: será que você é capaz de suportar o próximo ataque?
Quando Meredith enfim se recompôs, contemplou uma enxurrada de pedras vindas em sua direção, prontas para esmagá-la. Dessa vez, estavam vindo de frente, o que significava que não só ela estava em perigo, mas também os que estavam atrás dela.
— Ainda que possa suportar esse ataque, seu amigo sofrerá danos. E agora, tola inferior, o que irá fazer agora que a morte está diante dos seus olhos? Vai continuar balançando a espada? Ou será que vai clamar pelo papai?
Meredith entrou em trase e arregalou os olhos. Estava presa àquela visão. Não sabia o que fazer diante da rápida aproximação daquelas pedras.
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