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    Depois de algum tempo, finalmente acordei e a primeira coisa que senti foi o conforto de um arbusto enquanto os meus olhos se deliciavam com a visão de ramos, folhas e nuvens, moldando uma paisagem belíssima.

    Quando levantei, contemplei uma pequena fogueira acesa e ao seu redor aqueles três. Sr. Zestas estava assando pedaços de carnes com galhos. E Meredith e Theresa estavam comendo um pedaço de carne. Depois movi os meus olhos para onde ouvia um som estranho. Era Zernen, ele estava amarrado ao pé da árvore enquanto se debatia, tentando soltar palavras de sua boca selada por cordas.

    — Parece que perdi muita coisa.

    — Nada de mais. — Theresa parou de comer, olhando para mim. — Zernen comprou briga com o Zestas e acabou ali. Depois, para aliviar a minha raiva, Zestas caçou carne de javali e me ofereceu um lenço de presente. E por último e não menos importante…

    — Chegamos a Ahrmanica! — completou Zestas, levantando um pedaço de carne.

    — Queeeeee? Quer dizer que chegamos?

    — Jarves, venha comer!

    Meredith chamou e eu fui correndo ao encontro deles. Um segundo a menos e eu poderia falecer de fome.

    — É, mas tenho notícias um pouco tristes.

    — O que?

    Olhei para Sr. Zestas enquanto me sentava ao pé da fogueira crepitante.

    — Os cavalos acabaram machucando as pernas durante a viagem…

    — Então eles não vão mais andar?

    Olhei para os cavalos, que estranhamente pareciam bem. Até estavam comendo a grama sem problema nenhum.

    — Mas a notícia boa é que Theresa os curou! Hahahaha!

    — Ha. Ha. Ha. — Dei uma risada sem graça e peguei um dos galhos que tinha a carne grelhada empalada. Mas quando pretendia comer, lembrei que o Zernen estava ali amarrado. — Vou desamarrá-lo, acho que ele já deve ter compreendido que não pode voltar.

    — Eu não faria isso — Sr. Zestas disse enquanto bebia seu saquê.

    — Eu conheço melhor o meu parceiro de negócio mais do que ninguém!

    — Ele tem razão, Jarves.

    — Você também, Theresa?

    — Jarves, eu também acho que não é uma boa ideia. Veja, o rosto dele não aparenta arrependimento.

    Ignorei as palavras da Meredith e continuei caminhando até ele enquanto comia meu pedaço de carne.

    — Zernen, você não vai tentar voltar ao distrito de Gallen se eu te soltar, não é?

    Ele balançou a cabeça negativamente.

    — Eu sabia que podia confiar em você!

    Terminei de comer a carne e comecei a dessamará-lo, mesmo diante daquelas cordas bem duras que cercavam as mãos e a boca dele.

    Mas com esforço, consegui.

    — Obrigado, Jarves! Muito Obrigado!

    Ele deu um grande sorriso enquanto se esticava.

    — Não tem de quê!

    — Agora, sim, eu finalmente posso voltar para o meu avô!  — Ele me deu um soco na barriga e saiu dali correndo.

    Cai de joelhos enquanto ele fugia.

    “De novo não… Que dor…”

    — Todos concordam que avisamos, não é?

    Quando Theresa perguntou, todos balançaram a cabeça afirmativamente.

    — Tá, pessoal. Agora alguém vai atrás deles — eu disse enquanto segurava o meu estômago.

    — Hum — Zestas sorriu, esticando seus braços. — Magia do álcool, modo ressaca!

    De repente, Zernen começou a ficar lento, cambaleando de um lado para outro. Estava tão tonto que acabou caindo.

    — Apesar de me sentir incomodada, depois de ter percebido que ele não bebe por quer, mas porque é a magia dele, fiquei mais aliviada — disse Theresa.

    — É mesmo uma magia impressionante — Meredith elogiou.

    — A sua é mais, princesa!

    — Quanta modéstia — Meredith sorriu para Zestas.

    Todos estavam animados, menos eu.

    — Por favor… Theresa, me cura…  — clamei, ainda segurando o meu estômago que doía muito.

    — Francamente, Jarves, você tem que passar a me ouvir mais — disse Theresa, se levantando do tronco em que estava sentada.

    — Eu faço o que você quiser, mas me cura por favor! Aí! Aí!

    — Quanto drama — emitiu Theresa.

    Meredith sorriu e disse: — Aí, vocês dois!

    — Bem… — Zestas do nada apareceu ao lado do Zernen, nos deixando fascinados com sua velocidade. — Ainda pretende fugir, pequeno Zernen?

    — O meu avô…

    — Você só vai atrapalhar. Seu avô é muito forte e tenho a certeza de que ele sairá ileso dessa. Agora você tem que se preocupar em seguir o que ele disse.

    — Tá bom. Tá bom.

    — Anular.

    O efeito de álcool passou no Zernen e ele voltou ao normal.

    — Era blefe! — Zernen tirou a língua e começou a correr.

    — Você é bem igual ao seu pai, só aprende na dor!

    Zestas pegou na gola do Zernen e o arremessou contra o chão. Ao embater a cabeça, ele perdeu a consciência. Aquilo com certeza deve ter doído bastante, ainda bem que eu não estava na pele do Zernen.

    — Bem, pessoal. — Zestas colocou Zernen sobre os seus ombros e começou a caminhar até nós. — Vamos parar um pouco na cidade de Ahrmanica, porque preciso resolver umas coisas. E só depois, vamos atravessá-la.

    — Certo — concordamos.

    E então, regressamos a caravana com o Zestas no comando. Era mais fácil atravessamos a cidade com ele no comando do que com qualquer outra pessoa que possivelmente seria reconhecida, ainda que usasse capuz.

    Mais adiante, avistávamos algumas casas que iam aparecendo até o limite do horizonte. Aquele ponto da cidade era lindo e descrito como o ponto mais calmo da cidade, porque depois do centro da cidade, o norte era tudo uma favela com casas bem apertadas e desorganizadas.

    Isso porque Ahrmanica foi a primeira cidade a ser habilitada por Hengracianos e, na época, não havia parcelamento de terreno, então qualquer um fazia sua casa de qualquer maneira. E foi assim que tudo acabou ficando desorganizado. Mesmo se fosse para reassentar essas pessoas e remodelar a cidade, seria bastante difícil, porque esse reino carece de dinheiro.

    — Meredith… Sua mãe não disse que os seus irmãos estavam nessa cidade?

    Theresa puxou conversa enquanto eu observava a paisagem de casas perfiladas da janela, ao som das rodas da caravana que percorriam o chão de tijolos.

    — É, sim. Mas não quero criar expectativas e acabar me iludindo em poder encontrar eles aqui.

    — Quer sim. — Deixei escapar enquanto estava sentado no chão, Zernen havia ocupado todo o banco.

    — É, eu quero! Mas é que quando eu acabo criando expetativas, tudo acaba acontecendo ao contrário!

    — Vai encontrá-los sim.

    — Tomara! Estou com saudades dos meus pequeninos!

    Meredith juntou as mãos em oração, como se estivesse rezando para que isso acontecesse.

    — Já eu também acabei sentindo falta do meu irmão.

    — Um dia você também vai encontrá-lo.

    Theresa sorriu e disse: — Sim.

    — Eu bem de boa porque sou o filho único! — Dei um sorriso enquanto erguia os braços para cima. Mas, na verdade, eu não estava de boa. Queria ter tido um irmão também.

    — Filhos únicos recebem muitos mimos, não é? — perguntou Meredith, enquanto sorria para mim.

    — É, sim!

    Não podia negar.

    — Mas quando são pequenos!

    — Já agora, Jarves, me conte como virou mendigo? O que aconteceu com sua família?

    “Theresa! Theresa! Não queira saber de mais”, pensei. E fiz uma cara triste enquanto afinava minha voz.

    — Bem, acontece que esse assunto me toca um pouco.

    — Own! — Meredith sentiu pena de mim.

    Em contrapartida, Theresa…

    — Own nada! Ainda me lembro daquele dia…

    Ela me olhava com aqueles olhos desconfiados.

    — Que dia?

    — “Nem a pau” foi o que você disse, não é? E me pareceu bem animado quando disse isso.

    — Eu disse isso?

    “Por que mulher tem que ter memória de elefante?”

    — Eu também me lembro — Meredith concordou. — Com todas as letras.

    — Vocês têm razão, mas eu não sou o único. — Apontei para as duas, que sentavam pertinho uma da outra no banco. — Meredith e Theresa, vocês sabem muito bem, não sabem?

    Ambas entreolharam-se e perguntaram.

    — Do quê?

    — Álcool e B e A, isso por acaso as lembra alguma coisa?

    — Do que ele está falando? — perguntou Meredith, olhando para Theresa, que balançou a cabeça negativamente.

    — Eu também não sei. Para começar, como essa conversa chegou a esse ponto?

    “Perfeito!”

    — Se nenhuma de vocês vai se abrir sobre o seu passado, eu também não irei!

    Cruzei os braços.

    — Mudemos de assunto então — sugeriu Theresa.

    — É, acho melhor — disse Meredith. E Zernen finalmente acordou, reclamando de boca selada, mas eu nem liguei.

    Depois dos socos que tomei, que ele ficasse ali.

    Ele direcionou os olhos para Theresa e Meredith, mas elas balançaram a cabeça negativamente. Ele suspirou e começou a chorar com lágrimas de crocodilo enquanto fazia aquela cara triste.

    Nós começamos a rir daquele teatro. Riamos tanto que a nossa felicidade acabou se transformando em espanto quando de repente nos vimos jogados contra a parede lateral da caravana. Não parecia ser o Zestas. A caravana havia sido derrubada e a gente caiu.

    — Pessoal! Vocês estão bem?!

    Era a voz do Zestas. Meredith e eu quebramos com nossas forças a parede da caravana, contemplando a forte luz do sol acompanhada de suas nuvens.

    — Que bom que estão bem! Preparem-se, porque temos visitas.

    Quando demos as caras para fora, vimos cinco pessoas vestidas de roupas iguais em cima de uma pequena ponte, enquanto faziam a pose da mão na cintura. Suas vestes e capas eram bem negras, cingidas de bordados em diferentes colorações, que as deixavam estilosas.

    — Fez um bom trabalho em detê-los, Frida.

    Quem falava era um homem alto, que tinha olhos laranjas iguais a de um tigre, seus cabelos eram lisos e azuis tais como as águas do oceano.

    Os bordados que estavam presentes na sua veste eram gotas de águas.

    Ele olhava para uma garota baixinha, que possuía longos cabelos rosa da cor de pêssego, seus olhos violetas eram tão grandes quanto os de um gato.

    A veste dessa garotinha era marcada por corações.

    — Só não entendo porque um aventureiro rank S está com eles — disse um cara com cabelos laranjas semelhantes à cor das chamas, este possuía olhos vermelhos e tinha a cara de um urso preparado para devorar sua presa.

    Suas vestes eram marcadas pelo símbolo de fogo.

    Ainda bem que eles entendiam que não podiam bater de frente com um aventureiro rank S, sem ter nenhum aventureiro rank S ao seu lado.

    — Mas isso não é problema, já que estamos preparados.  — Um loiro de olhos castanhos com o símbolo de pequenos raios nas suas vestes, se teletransportou para bem perto do Zestas.

    No instante em que ele tocou no ombro do Sr. Zestas, eles desapareceram sem deixar rastros.

    — O que? Para onde o levaram?—questionei, pasmo.

    — Hum, não se preocupem. Ele só foi ter uma conversa com o nosso mestre. Enquanto isso, a gente vai capturar vocês! — emitiu o cara dos cabelos em chamas enquanto sorria maliciosamente.

    — Covardes!

    — Princesa Meredith, há quanto tempo — emitiu o cara dos cabelos azuis, sua pose e maneira de falar passavam um ar de liderança.  — E pensar que a senhorita está envolvida nisso.

    — Creio que possamos dialogar sem recorrer à luta, não é?

    — Claro, no julgamento terão muito tempo para dialogar e até se defender. Vocês só precisam vir conosco, sem oferecer nenhuma resistência, para que tudo corra bem, sim?

    Ele deu um sorriso calmo.

    — Isso será impossível.

    — Pelo apreço que temos pela senhorita, preferíamos não fazer isso, mas não temos escolhas — concluiu ele.

    — Jarves e Theresa…

    A expressão de Meredith estava bem severa enquanto olhava para aquele cara.

    — Tratem de colocar o Golem e o Zernen em condições para lutar caso queiram escapar daqui ilesos.

    “Caramba, agora sim! Essa é a minha Meredith, cheia de atitude!

    Nós assentimos. Theresa retirou o Golem descordado do bolso do jaleco e eu fui desamarrar o Zernen.

    — Isso vai ser tão empolgante — finalizou o cara dos cabelos azuis, enquanto dava um sorriso calmo.

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