Índice de Capítulo

    No 5º dia quando a chuva decide começar a deixar o palco dessa trama amargurada, um homem e uma mulher acompanham as buscas que estão sendo realizadas pelo Rio dos Rumores. Um dos guindastes começa a içar seu cabo de aço, o núcleo azul que fica no painel do motorista, e serve como bateria para toda aquela máquina, intensifica seu brilho, demonstrando que dessa vez algo mais está vindo.

    Uma van começa a se fazer presente sobre as águas encardidas, o úmido ar que paira pela região, parece afogar aqueles dois em mais do que tristeza. A chuva decide fazer um ato de despedida em forma de uma leve garoa, as gotículas despencam suavemente sobre a terra, algumas são tão afiadas que conseguem perfurar a pele e molhar até fundo da alma.

    No 3º dia após os corpos serem achados, aqueles jovens estão prontos para enfim voltar para o ciclo interminável da vida.

    O ar gélido insiste em persistir, mesmo com a luz do astro-rei que enfim voltou a atuar, pintando o céu de um azul tão tênue que aparenta ser possível pegá-lo com os dedos como se fosse um tecido. Todos ali vestem a cor mais nobre de todas, menos ela. Seu pai está ali como um ato simbólico, somente observa os olhares caídos, as lágrimas secas e os lenços enxarcados, ele também avista um homem ao fundo, vestindo cinza e olhando para a cova aos seus pés, ele até recita alguma coisa sobre almas e pureza, mas Júlio não se toca por essas palavras.

    Um pouco distante dali, com sua bicicleta pedalando em um ritmo lento, ela vai trilhando o caminho que sempre fez, porém agora mais doloroso e até tortuoso. A torre se apresenta mais escura do que de costume, e por vários minutos em silêncio, só observando as aves voando plenamente no alto daquele fino tecido.

    O vento toca e bagunça ainda mais seu cabelo, sua camisa cinza chacoalha de forma sutil sobre seu abdômen, os braços rígidos com o apoio das mãos no metal, revelam o toque gélido do ar que faz os pelos se arrepiarem. Tudo ali está em seu devido lugar, cumprindo seus papéis e funções, mas por dentro algo ainda ecoa, um vazio toma sua alma, e de forma inconsciente ela busca entender como seguir em frente.

    Os dias continuam seu fluxo eterno, por onde quer que vá, Sarah está só, seja na torre, ou na escola. As semanas logo vem e vão, um mês se passa sem que ela tenha conseguido sorrir novamente.

    Agora vê seu mundo terminando de afundar, agentes batem na porta de sua casa, a notícia logo ecoa por toda a sala infinita, Leila está dada como desaparecida. Não que Sarah não se importe, mas já está passando por tanta coisa, que essa foi mais uma gota no oceano em tempestade que está mergulhada, lágrimas não escorrem, somente o silêncio permanece.

    Júlio por sua vez, chora muito, os médicos receitam vários remédios, drogas e alguns N2 em formato de máscaras para o olho, que ajudam ele a pegar mais facilmente no sono. Sarah inicia sua visita ao psicólogo, mas mesmo após algumas seções, o laudo é de que está lidando bem com a situação, que essa é a reação encontrada.

    Meses se passam e Leila é dada como morta por Júlio, as autoridades mantém o paradeiro dela como desaparecida, já Sarah nem toca no assunto, pensativa, anda pelos cantos procurando ainda em seu interior a resposta para seu problema.

    Em algum lugar no subterrâneo da periferia de EVA.

    — Vamos começar nossa reunião mensal! Júlio, nos deixe a par da situação — Um homem de terno todo branco e cabelo loiro comprido direciona as conversas.

    — Como vocês sabem, a menina escapou e os outros dois estão mortos. A equipe que contratamos também estão todos mortos.

    — E sua esposa?

    Um terceiro homem se intromete na conversa.

    — Lúcio, se me permite, ela chegou a invadir nossas instalações, mas o Guarda chefe a capturou, precisamos decidir o que fazer com ela. —  Pablo, um homem alto, branco de cabelo preto e olhos amendoados — Resume a situação.

    — Minha falha, eu resolvo pessoalmente. — Júlio estrala os dedos de uma das mãos enquanto fala, seu semblante fechado se destaca.

    — Tudo bem, próximo tópico. — Em um pequeno caderno, Lúcio desenha um sinal de correto do lado do tópico nomeado “Sequestro da escola 47” — Pablo, como está a situação das filiais?

    — Pelo último relatório dos encarregados, a última filial no Sudeste terminou de aplicar os procedimentos de reforço de segurança.

    — Já foi tudo encoberto na filial 12? — Lúcio volta a direcionar seus questionamentos para Pablo enquanto solta seu corpo para trás na cadeira.

    Pablo passa a mão na sua cabeça raspada e dá um leve suspiro antes de responder — Quase tudo, porém ainda não foi identificado o responsável pela invasão, além disso, algumas das crianças escaparam de lá, pelo menos não encontramos nenhum dos corpos, logo assumimos que foram levadas.

    — Isso é problemático… precisamos relatar para Ottawa esse problema.

    — Ele provavelmente vai querer sair por aí caçando até que encontre o responsável, devemos evitar conflitos com os humanos por enquanto. — Júlio reflete um pouco sobre o pensamento de Lúcio.

    — Você tem razão, vamos enviar um mensageiro até Atlântis para relatar os problemas diretamente para Jacarta e ver quais procedimentos irão ser tomados. — Lúcio rapidamente toma uma decisão.

    — Eu mesmo irei, vou só estabilizar as coisas com a Sarah e logo partirei. Pablo, prepare um relatório completo para ser entregue a Jacarta, tudo bem?

    — Sim, vou fazer uma visita as filiais, e o quanto antes prepararei um relatório — Ele termina a fala e volta seu olhar para Lúcio — E sobre a garota?

    — Não acredito no testemunho que retiraram da garota, mas é bom ficar de olho por um tempo. — Ele puxa um punhado de ar e logo vai soltando. — Como ela está? — Ele direciona seu olhar atento para Júlio.

    — Até o momento, ela não desconfia de nada, está em um estado depressivo, não vai mais servir para o uso que os nobres da família Susia planejavam — Júlio termina a fala enquanto se deixa relaxar um pouco na cadeira.

    — Isso é uma pena, teremos que devolver aquele dinheiro todo e ainda enviar algum presente de desculpa. Bom, que seja, melhor do que fazê-los virem até aqui pra nada.

    — Eu soube que alguns guerreiros das famílias de Áia estão partindo em uma nova jornada com mais um grupo composto por outros guerreiros das outras famílias. — Pablo começa a contar algumas fofocas.

    — Mais uma expedição em busca de relíquias? — Lúcio indaga ao ar repentinamente.

    — Provavelmente! Sabemos que Ayda é complicado, o número de sobrevivente está diminuindo cada vez mais. — Pablo termina sua fala enquanto cruza os braços em cima da mesa.

    — Tóquio… — Júlio sussurra bem baixo.

    — O que foi que você está resmungando aí Júlio — Lúcio solta um sorriso para o alto enquanto encara o teto.

    — Só estava pensando o quanto ele deve ter evoluído nesse tempo todo.

    — Não só ele, todos que sobrevivem as quests em Ayda acabam se tornando muito fortes, provavelmente eles estão em outro nível, como sempre! — Então Lúcio ri um pouco descontrolado — Não que eu me importe.

    — Relaxa Júlio, você ainda vai ter sua chance um dia de retornar para o exército. Por enquanto, foque na nossa missão. — Pablo vai soltando as palavras enquanto se levanta e passa perto de Júlio, colocando a mão no ombro dele por um instante. — Aliás, precisamos nos preparar, pois provavelmente eles passaram por aqui antes de seguir para o Deserto da Criação.

    — Mais um motivo para inspecionarmos tudo novamente! — Lúcio se levanta da cadeira e começa a andar em direção a uma abertura no chão — E… Júlio, não esquece das flores em! — Ele começa a sumir pela abertura enquanto solta gargalhadas descontroladas.

    — Eu sei. — Júlio também se levanta da cadeira enquanto se vira para Pablo — Conto com você! — Logo ele vai sumindo por outra abertura que também tem ali perto no chão. Pablo só o observa partir e após alguns segundos encarando o lugar por onde Júlio saiu, com um olhar distante, como se seus pensamentos viajassem, ele se direciona para uma terceira abertura que tem ali por perto no chão.

    Apoie-me

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 0% (0 votos)

    Nota