Capítulo 55: A companhia que me acalma
Após vários minutos de caminhada, Sarah chega a um lugar que não tinha ido até então. Uma pequena planície de mato ralo se estende aos seus pés. Enquanto caminha, seus pés se escondem entre as folhas dos mais variados formatos. Observando tais formas, uma salta aos olhos. Chegando mais perto para confirmar suas suspeitas, estende a mão para mexer em uma.
Nesse momento, Sarah fica estática, e suas mãos começam a ficar trêmulas. Caindo de joelhos sobre o mato, ela começa a puxar a planta para cima e suas raízes vem junto. E junto das raízes, vem algo que a faz lacrimejar. Sua boca se abre de incrédula. Saiu para procurar comida e achou foi “ouro”. Ou melhor Batatas. Poucos minutos se passam e a mochila já se encontra toda estufada. Algumas batatas até tentam fugir, caindo e rolando, mas logo são capturadas e devolvidas para dentro. O zíper reclama aos ventos como se fosse desistir de seu trabalho a qualquer momento.
Passando pelo rio, se lembra de ter visto um bambuzal rio abaixo. Então se direciona até ele para cortar alguns. Depois de algumas horas de caminhada pela margem, chega de volta para a arvore. Já vai colocando gravetos no local da fogueira. Os bambus cortados no meio, já estão um do lado do outro sobre o local, apoiados por um arranjo de galhos. Sarah despeja água sobre os compartimentos.
O fogo é aceso. As batatas são picadas e colocada nos bambus.
Sem muito o que fazer enquanto espera. Ela se deita sob a árvore de mãos dadas por trás da cabeça. Após vários minutos de olhos fechados, começa a olhar para cima, para seu abrigo. Então se lembra do que tinha acontecido mais cedo. Se levantando, começa a escalada depois de jogar mais uma olhada para o fogo.
Ao chegar no local, seus olhos estáticos demonstram que avistaram algo incomum. Mais incomum do que tinha visto até ali.
Onde antes tinha uma fera negra. Agora repousa um homem grande de pele negro, corpo definido e cabelo baixo. Ele está nu, e ao olhar mais atentamente, um rabo de pelagem negra sai da parte superior da bunda. E no topo da cabeça, orelhas negras de felino, substituem as orelhas humanas.
Sarah pega sua adaga e a ativa juntamente com sua presença. Imediatamente o homem dá um rolamento lateral, e outro frontal, saltando caindo de pé no canto oposto do local, e de frente para ela. Suas unhas são afiadas. Presas aparecem em sua boca. Seus olhos são iguais a do jaguar que ali estava. Em postura de ataque com uma das mãos no chão e a outra levantada com as unhas apontadas para Sarah. Ele demonstra a mesma hostilidade da fera que ali estava.
— Você me compreende? — Sarah tenta uma improvável interação com o ser a sua frente. Enquanto aponta sua adaga para ele.
Ele acena positivamente com a cabeça, Sarah fica aliviada e baixa sua guarda. Então ela dá um passo em direção a ele, que instintivamente dá um passo para trás e mostra ainda mais suas presas. Sarah então oculta sua presença e guarda sua adaga.
— Calma. Eu não vou te machucar. — Ela fala isso enquanto se senta de pernas cruzadas na frente dele.
Aos poucos ele vai se tranquilizando e abaixa sua guarda enquanto dá uma grande espreguiçada. Em seguida se senta de frente para ela e de pernas cruzadas.
— Eu te entendo! — Uma voz grossa, firme e tranquila ecoa pelo ambiente, e acariciando os ouvidos. — Só…. Tenta não me matar, tudo bem?
— Eu não vou te matar. — Sarah o responde com um leve sorriso.
— Não é o que a sua energia dizia agora a pouco. Sinceramente? Meu instinto me garantia que eu ia morrer. Independentemente de correr ou não, mas do nada sua energia muda. Curioso! Quem é você?!?! — Ele a encara fortemente enquanto seu coração pulsa acelerado em um misto de medo e entusiasmo.
— Eu sei quem eu sou, me chamo Sarah, mas. Não tenho certeza do que sou. Mão mais. — Ela segurando a adaga com força, e a encara enquanto responde.
Ele coloca a mão em seu queixo e acaricia uma pequena barba rala ali. Seus olhos a encaram, sua face demonstra claramente uma inquietação.
— Eu me chamo Adão. Sou um dos filhos primordiais de segunda geração. Como você pôde ver, eu sou uma fera que pode virar um humano. Ou algo parecido, ou o contrário… Não sei bem também, não que importe.
— Você sabe o nome desse lugar? — Sarah o indaga enquanto volta seus olhos para ele.
— É uma ilha no meio do oceano. — O olhar dele percorre a paisagem do lado de fora.
Sarah o observa com seus olhos levemente fechados.
Após alguns segundos de reflexão, ele retoma.
— Pelo que eu me lembro. Minha mãe, a mãe de todas as coisas. Citou algo uma vez. Que ela era o que os humanos chamavam de mundo, planeta. Há sim, eu me lembro! Estamos na mãe.
— Me explica melhor isso? — Sarah com a face de total dúvida joga as palavras ao ar enquanto o encara.
Após vários minutos de uma história que fez Sarah se questionar sobre sua veracidade, mas que não duvida muito devido a todas as experiências que teve e está tendo.
— Então na verdade o Planeta é um ser vivo. Ela tem consciência e se comunica com seus filhos através de uma Árvore que fica em uma cidade?
— Hoje deve ser uma grande cidade. A última vez que eu a vi, já estavam construindo um palácio. Os filhos de primeira geração viviam com ela. Eles estavam desenvolvendo o local para se tornar o centro do mundo, onde todos poderiam visitar. Com certeza hoje deve ser uma grande cidade.
— Em que ano estamos? — Sarah volta a questioná-lo.
— Aqui na ilha não marco o tempo como fazíamos em casa. O que eu sei é que a primavera se foi mais uma vez. E o festival das flores de Atlântis aconteceu novamente, e eu não presenciei. Já fazem 600 primaveras agora que não vejo minha mãe e suas folhas escarlates. Acho que no próximo eu vou.
Os olhos de Sarah se arregalam ao ouvir o nome de tal cidade. Porém, não lembra de algo sobre o festival.
— Onde fica essa cidade?
— No meio de um lago, bem no meio de um gigantesco deserto.
Sem dúvidas é a mesma Atlântis que ela conhece.
— E como você vai até lá?
— Eu mando um recado escrito através de uma ave todo ano. Para uma família específica de mercadores que atravessa os mares, e levam suas mercadorias para serem vendidas durante o festival. Se a ave chegar até eles com algo amarrado nas patas. Quer dizer que tem bastante frutas e mantimentos na ilha. E então, no final de cada inverno que a ave chega com tal recado, param aqui para abastecer. Na verdade, você apareceu aqui pouco depois deles partirem. Se perdeu deles?
— Não, minha história é um pouco mais complicada que isso. — Sarah murmura olhando para baixo.
— Conte-a. Talvez eu possa lhe ajudar.
Então Sarah narra os acontecimentos desde que saiu de Niang. Fala até das datas. Do momento que chegou naquele vortex e veio parar nesta ilha.
— E de onde você vem, nunca ouviu falar de Atlântis? — Curioso ele indaga.
— Tem uma. Mas nunca ouvi falar desse festival. E ela é governada por androides que até pouco tempo escravizavam humanos. — Seu olhar distante se perde por um momento atrás de Adão.
— Androides? Oque é isso? — Ele indaga enquanto franze a testa.
— … — A face de Sarah se transforma levemente como se tivesse tido um esclarecimento e logo volta ao normal. — Como posso explicar. — Ela para pôr alguns segundos enquanto olha para as folhas, galhos e bambus no alto. Então retoma. — Eles são parecidos com humanos. Porém, mais fortes, mais rápidos, alguns mais altos. Mas por dentro eles são diferentes, fios e tubos substituem nervos e veias…
— … — Nunca vi nada assim. E olha que eu vaguei por muitos lugares. Vi dragões, e acredite se quiser. Humanos de pele igual a minha e cabelo vermelho que podiam se transformar em dragões… — Seu olhar distante por um momento comtempla as arvores ali do lado novamente. Então volta sua face para Sarah
— Mas nada parecido com o que você descreveu. — Então ele olha para o baixo. — Será que aconteceu alguma coisa com a mãe e os irmãos… — Ele então lança o olhar para Sarah novamente. — As coisas que você narrou. Barcos, aviões, vortex, nunca ouvi falar. Esse mundo deve ter evoluído muito desde a última vez que sai da ilha. — Ele para novamente por um momento, respira profundamente e retoma. — Marcos não me disse nada disso da última vez.
— …. — Sarah não sabe o que dizer, só permanece em silêncio enquanto repara Adão conversar com sigo mesmo.
— Bom. Você está aqui e agora. Enquanto você não encontra respostas. Vou te mostrar a ilha e te ensinar os melhores lugares para se alimentar.
Sarah acena positivamente com a cabeça para ele.
— Em troca. Me conte mais sobre você e essa sua aura. Tudo bem?
Ela acena positivamente com a cabeça.
— Aliás! Você gosta de batatas? — Um sorriso meio sem jeito surge do rosto dela enquanto começa a descer da arvore.
— O que é isso? Batatas?
Os dias vem e vão. O sol, a lua, as estrelas, a chuva, o vento, e ondas. Tudo segue seu ciclo. Sarah se desafia ao surfar em uma prancha improvisada, talhada de um tronco que caiu após uma tempestade. Ela também ensina Adão a surfar, o que rende boas gargalhadas. Semanas de aventuras entre pedras e sobre cachoeiras. Meses de aprendizado sobre caça, muitos dias de ensinamento sobre a presença, e muito papo furado sobre histórias aleatórias dos dois. Assim quase um ano se passou e a mariquita o voo levantou.
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