Índice de Capítulo

    São tantos acontecimentos se sobrepondo num curto espaço de tempo que mal pude parar para raciocinar direito. 

    A vítima ser o Takashi, um assassinato a luz do dia e o caso mais preocupante de todos… nem de longe ele foi esfaqueado.

    Olho para o peito do cadáver e para a vidraça da janela quebrada.

    Não preciso ser nenhum perito para observar isso: Uma arma de fogo foi usada.

    Aproximo-me do corpo e confirmo que ele não está respirando. Olhando mais de perto constato que nem mesmo preciso averiguar seu pulso, pois o seu coração foi acertado em cheio.

    — Tu conseguiste testemunhar o que aconteceu por aqui em detalhes? Se sim, poderia nos deixar a par do ocorrido? — Mikoto pergunta para a garota.

    A garota apavorada nega com a cabeça e diz.

    — Eu e-estava no corredor ao lado, ouvi o barulho e vim até aqui — desvia o olhar para baixo — Mas ele já estava m-morto — gagueja enquanto explica.

    — Entendo — Mikoto suspira — Podes deixar ele conosco.

    Pude notar certa carga emotiva em sua fala. No fundo, por mais que as suas ações rudes demonstrassem o contrário, ela certamente possuía consideração por seu leal subordinado.

    A garota ainda com os olhos arregalados assente com a cabeça, dá alguns passos para trás e finalmente deixa o local.

    Definitivamente isso torna tudo muito mais problemático, com o assassino tão bem armado estamos em uma enrascada sem fim.

    17h26

    O mesmo dia que começou tão tranquilo em comparação aos últimos três dias, tornou-se extremamente desgastante. Se ao menos eu pudesse voltar atrás e impedir tudo isso…

    — Então os boatos são verdadeiros, Jocchi? — pergunta Manabu.

    Os rumores sobre o incidente em questão espalharam-se rapidamente pela escola, mas não havia o que ser feito para tentar encobrir esta morte. No máximo poderíamos atrasar o fluxo de informação repreendendo a testemunha, entretanto seria um esforço inútil. 

    Por mais que tenha um silenciador na arma, o barulho de uma janela quebrando foi o suficiente para atrair estudantes que estavam no bloco, e aí a informação foi sendo passada adiante desenfreadamente.

    — Sim, o assassino está com uma arma de fogo com silenciador — respondo.

    — Meu Deus, que situação amedrontadora — diz Miyu se descabelando em nervosismo.

    Como previ, a notícia espalharia certo pânico entre os estudantes. O que resta saber é se a anomalia irá compensar isto daqui pra frente… talvez possamos tirar algum proveito deste desvio comportamental. 

    — Fique tranquila, Miyu-chan. Estou aqui para te proteger — comenta Shou.

    Conseguimos identificar a trajetória do projétil e, por conseguinte, o local de disparo, no caso o bloco ao lado. Todavia, o atirador foi cuidadoso para não deixar nenhum rastro. Sinto que estamos lidando com alguém que sabe muito bem o que está fazendo, é como se tivesse muita experiência nisso, em outras palavras um profissional. Não é algo que possa ser esperado de um mero aluno do colegial.

    E agora estamos mais uma vez no saguão, e a responsabilidade cairá sobre a Mikoto-senpai.

    A probabilidade de o assassino ser da alta cúpula do conselho continua em pé, então não podemos confiar plenamente em Haruki, enquanto Natsuki está quebrada desde o primeiro dia.

    — Eu sei que todos estão assustados, mas acalmem-se, por favor, neste momento difícil precisamos permanecer unidos — Haruki tenta acalmar a plateia desesperada à sua frente.

    Mikoto permanece calada olhando para baixo, acho que nestas circunstâncias nem ela sabe o que fazer. Bem, quem poderia imaginar que um estudante teria uma arma de fogo? Ainda mais no Japão, onde são ferramentas de difícil acesso para civis. Entretanto, mesmo abaixo de tanta pressão, é impressionante como ela ainda consegue manter a calma para raciocinar em uma estratégia.

    — Ei, admitam! Ele tem uma arma de fogo! — um estudante grita.

    — Estamos todos perdidos! — outro exclama.

    — Podemos ser mortos a qualquer momento!

    Rapidamente gritos e murmúrios tomam conta do ambiente de modo que Haruki não consegue mais controlar.

    Mikoto dá alguns passos à frente e então a revolta cessa parcialmente para dar ouvidos ao que ela tem a dizer.

    — Sim, é verdade. O assassino possui uma arma de fogo e em momento algum negamos ou tentamos ocultar tal incidente. Aliás, como já deve ser de vosso conhecimento, a vítima foi um amigo meu de longa data, o vice-presidente Tanaka Takashi. Portanto, posso compreender totalmente como vós sentis-vos — a bela presidente responde em tom sereno.

    O carisma intrínseco da sua fala foi suficiente para acalmar os ânimos de parcela do público, entretanto, alguns mais revoltados continuam com o embate.

    — Até já sei onde isso vai acabar. Será o mesmo papo de que tentarão resolver tudo. Você disse isso da última vez e aqui estamos nós de novo, não vejo porque agora seria diferente. O conselho fracassou! O que faremos a respeito?! Ou melhor, o que vocês farão a respeito?! Sejam objetivos! — exclama uma estudante.

    Esta voz me é familiar, será que a conheço de algum lugar? Não pode ser… seria ela?

    — Ninguém poderia imaginar que ocorreria tal calamidade. A presença de uma arma de fogo mudou todo o escopo do jogo, portanto não creio que possa ser considerado como falha nossa não prever o imprevisível. Agora tratando de eventos futuros, não temos escolha além de vasculhar o pertence de todos os estudantes, e confinarmos todos em um ambiente fechado até o fim do tempo estipulado — replica Mikoto.

    Na verdade era o que deveria ter sido feito desde o começo, me surpreende o fato dela e do Takashi não terem aplicado essa visão mais cedo.

    Ela parece querer prosseguir com o discurso, mas é cortada mais uma vez pela garota que a confrontou anteriormente.

    — E por que devemos confiar em vocês? Os dar mais poder? — dirige-se para o público — Nunca passou pela cabeça de nenhum de vocês que o assassino está dentro do próprio conselho estudantil?!

    Desta vez consigo alcançar o ângulo para distinguir quem está falando, então descubro quem é a precursora desta revolta.

    Ailiss?! Eu sabia que já tinha ouvido essa voz antes. O que diabos você está tentando causar? Um tumulto? 

    O comentário dela parece ter sido efetivo, e com isso mais murmúrios brotam do meio da multidão. Ela atacou uma ferida que não queríamos expor, foi um golpe certeiro.

    — Não sejas ridícula, mantemos vigilância tão grande entre nós quanto aos demais alunos. Se houvesse qualquer movimentação suspeita internamente ao conselho, devido ao nosso protocolo interno, já teria sido exposta instantaneamente.

    — Pode até ser verdade. Mas caso o assassino de fato esteja infiltrado no conselho, não acha que seria muito conveniente para ele se vocês restringissem a nossa liberdade de nos defendermos? Não é um risco que gostaríamos de correr, pois seria morte certa. Por nossa própria segurança não podemos centralizar ainda mais o poder em suas mãos.

    O blefe da presidente não parece que vai nos tirar desta enrascada. A Ailiss continua colocando mais lenha na fogueira. Por que ela está fazendo isso? Ela tinha dado a entender que permaneceria passiva. A não ser que minhas suspeitas subconscientes estivessem corretas…

    — É! Eu acho que a garota tem razão! — um estudante se manifesta.

    — Eu também concordo com ela! Podemos nos defender por conta própria!

    Ailiss conseguiu o que queria, transformou esta assembleia de esclarecimentos em um completo caos. Parcelas de estudantes começam a se organizar e bater boca uns contra os outros.

    Mikoto nem possui condições de respondê-la com tanta desordem no local. Esta já se tornou uma batalha completamente perdida e nos resta apenas recuar e em seguida lamentar pela derrota.

    — Pessoal, não sejam tão precipitados. Estamos todos de cabeça quente, vamos nos sentar e conversar — Haruki tenta amansar a massa de gente a sua frente, porém não obtém nenhum resultado. 

    No final das contas, a manifestação pendeu para o lado da Ailiss, e não há nada a ser feito. Se havia alguém que pudesse abalar o espírito de liderança de Mikoto, com certeza seria ela.

    19h34

    O sol assim como a soberania do conselho se pôs. Com um cenário completamente anárquico a escola divide-se em pequenas tribos, as quais eventualmente poderão entrar em conflito entre si. Agora além de tomar cuidado com o assassino, precisamos tomar cuidado em não parecer ser ele e então sermos atacados no impulso por alguma dessas tribos.

    Apesar de sequer ter ideia de por onde começar, meus pensamentos deveriam estar focados em como reverter este problema, mas tudo no que consigo focar é nesta cena intrigante que observo na penumbra da noite.

    A rainha que acabou sendo destronada apresenta um olhar distante para o céu estrelado. É uma imagem que nunca poderia conceber, no fundo, até os indivíduos mais especiais são frágeis de certa forma. E assim como um falcão de asas cansadas, ela pousa em melancolia nesta terra.

    Finalmente, após alguns minutos desse cenário enigmático, ela decide quebrar o silêncio.

    — Eu não tenho a menor ideia de como a nossa informação foi vazada, todavia estou certa de que o assassino não é o Hasegawa-kun. Bem como não está infiltrado no conselho estudantil.

    Ao que tudo indica é isso mesmo. Nós estávamos “errados” o tempo todo. 

    — Então, o que deseja fazer? Vamos abandonar o barco e esperar que tudo tenha se resolvido dentro do tempo limite ou deseja partir para a sua segunda suspeita? — falo ao mesmo tempo em que me dirijo para sentar ao seu lado.

    — Se as nossas vidas não estivessem em jogo, creio que a neutralidade fosse a melhor saída. Entretanto, como jogadores, nunca deixaremos de ser alvos do assassino e terceiro jogador. Tu já deves ter ligado os pontos e sabes bem de quem me refiro. É ela, não é?

    Sim, o Japão possui uma forte política de desarmamento. Não seria tão fácil para um colegial conseguir ter acesso a uma arma de fogo. Eu havia entrado em um estado de negação, não queria acreditar de modo algum nisso. Talvez isso seja parte da anomalia comportamental, ou quem sabe por não querer confrontar uma das poucas pessoas com quem simpatizei logo na primeira conversa. Mas é um fato inegável o envolvimento de Ailiss neste jogo.

    — Quando percebeu? — também olho para o céu.

    — Desde o princípio, ela era definitivamente a figura mais suspeita dentre todas. Isto era uma verdade auto evidente. Porém, não consigo entender bem o porquê me esquivei tanto de culpá-la. Então a partir desta hesitação agarrei-me ao vazamento de informações numa tentativa desesperada para desviar o foco dela para outro possível suspeito. No caso, Hasegawa-kun — suspira — O porquê de eu fazer esse malabarismo inconscientemente? Ainda não compreendo bem. Nunca foi um hábito meu agir de modo tão irracional, eu não consigo descrever o que houve comigo.

    Posso dizer o mesmo. Também não sei ao certo porque comecei negar tanto que ela fosse a culpada. Uma breve conversa não deveria ter me sugestionado tanto assim.

    Uma brisa de ar frio balança gentilmente os seus longos cabelos pretos de modo que prende minha visão por alguns segundos.

    A fitando desta maneira, sou capaz de entender claramente o porquê de todos ficarem enfeitiçados por seu charme. Não sei dizer se ela age de modo tão encantador de modo proposital ou se é simplesmente de sua natureza. Quando menos se espera, você já está completamente dominado por ela. O mesmo deve ter ocorrido com Takashi e com todos os outros que se devotaram a presidente do conselho estudantil.

    — Mikoto, vamos para dentro. Você vai pegar um resfriado se ficarmos aqui fora até tarde em pleno inverno.

    Ela assente, sorri serenamente em minha direção e prossegue fitando-me em silêncio.

    — O que foi? — pergunto desajeitado.

    — Não é nada — volta o olhar para o céu — Apenas surpreendeu-me uma preocupação alheia vinda da tua pessoa. Normalmente isso não é do teu feitio.

    — Você e os outros têm uma impressão muito ruim a meu respeito, né?

    — E estamos errados? — ri.

    — Não. Infelizmente estão certos — sorrio.

    — Todavia, não fiques mal. Escolhi-te como meu aliado independentemente disso.

    — Não há ninguém para testemunhar a sua peça. Então pode parar de tentar me constranger.

    — Ora, estou falando a verdade — fecha os olhos — Agora, como tu mesmo sugeriste, vamos para dentro.

    Levantamo-nos e em seguida nos dirigimos para o bloco principal. Porém, durante o nosso trajeto do pátio ao bloco, mais uma eventualidade ocorre.

    — Johann-kun! — um grito chama a nossa atenção.

    Viro-me e vejo Miyu e Manabu correndo intensamente em nossa direção.

    — O que foi desta vez? — pergunto.

    — Mais um estudante… mais um estudante foi baleado! — exclama Manabu ofegante.

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