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    — Não, eu ainda não falhei, prometo que resolverei tudo. Dê-me outra chance, somente mais uma chance, por favor! Yukihara-san! — apavorado aproxima-se dela e estende seu braço para tocá-la no ombro.

    — Tanaka-kun, jamais passou pela minha cabeça que tu foste tão estúpido — dá um tapa na mão dele o afastando — Primeiro te acalme, não suporto a tua conduta enquanto está alterado. Agora, diga-me, como tu pretendes lutar utilizando uma arma branca contra dois jogadores equipados de uma arma de fogo? Não há nada que tu possas fazer contra eles, aceita a realidade. Tu fracassaste, se tiveste tido o mínimo de cuidado em vigiar a entrada do bloco, não estarias nesta situação.

    “Dois”? Ela sabe que estou aqui?

    — Capturarei a garota, e depois quando eu encontrar o segundo jogador os mato simultaneamente. Deixe-me ao menos tentar, assim posso provar que consigo ser útil para você! Por favor, Yukihara-san dê-me esta chance, juro que não falharei — continua falando alterado.

    — Não há a necessidade de encontrar ninguém. Vejo que tu és tão incompetente que não percebeste a presença dele — suspira — Eu sei que tu estás escondido atrás dessa caixa, Johann. Apareças — diz Mikoto.

    Como ela me descobriu? Deste ângulo estou certo que ela não pode ter me visto. Em todo caso, isto não importa mais. Mas devo expor-me? Primeiro devo consultar Ailiss para não fazer nenhuma besteira.

    Olho para Ailiss e ela assente com a cabeça. Então me levanto, dirijo-me até o lado dela e permaneço em guarda para auxiliá-la no que for preciso.

    — A metralhadora que roubamos! Onde está ela? Com ela posso matá-los facilmente para você — fala Takashi.

    — Sabia que tu necessitarias dela, então a trouxe em minha bolsa — abre a bolsa exibindo a grande metralhadora que roubou de Ailiss.

    Ailiss concentra sua mira na arma, provavelmente com intuito de disparar para desarmá-los.

    — Obrigado, Yukihara-san. Não irei decepcioná-la novamente.

    Mikoto pega a arma e a estende para Takashi. Neste momento, Ailiss arregala os olhos e abaixa sua mira ao premeditar o evento seguinte.

    Quando Takashi ia tocar na arma, Mikoto a rotaciona na direção dele e num piscar de olhos puxa o gatilho gerando um forte estrondo. 

    Em uma cena horrenda, o projétil atravessa a barriga de Takashi rasgando todo o seu interior. A potência do disparo faz com que jorre sangue por toda a parede que está atrás dele.

    Assustado ele afasta-se alguns passos dela e observa arregalado o sangue fluindo de seu abdômen aberto.

    — Por quê?! Eu fiz tudo o que você mandou! Cumpri tudo à risca! Você prometeu que me amaria de volta se eu fizesse tudo. Então, por quê?! — fala enquanto se afoga no próprio sangue.

    O que ela está fazendo? Ela desfez-se do próprio aliado como se não fosse nada.

    Ele se escora na parede e desliza até o chão com o rosto cabisbaixo.

    — Durante todo este tempo no qual tu serviste-me, não foste capaz de perceber algo tão simples e banal? — replica Mikoto ao mesmo tempo em que posiciona a arma para um segundo disparo — Eu minto às vezes.

    E desta vez ela o finaliza com um tiro diretamente na cabeça. Tornando o cadáver dele mais agonizante ainda de se observar.

    Não posso acreditar. Takashi certamente era um doente mental que merecia morrer, no entanto, esta bela garota de aparência angelical que é um verdadeiro demônio.

    — Então Takashi estava apenas seguindo ordens. Desde o começo a mentora por trás da série de assassinatos era você? — pergunto.

    — Admitamos, não era tão difícil chegar nesta conclusão, achei que seriam mais rápidos. Veio a calhar que o vice-presidente do conselho estudantil, Tanaka Takashi, possuía fortes tendências de psicopatia ocultas. Ao mesmo tempo em que nutria um amor doentio por minha pessoa, neste caso ele jamais recusaria um pedido meu para chacinar outros estudantes.

    Talvez seja por isso que sempre achei que havia algo de errado com ele. Entretanto, apesar de não possuir nenhuma empatia por Takashi, ainda assusta-me o fato dela se desfazer tão facilmente do seu louco, porém, leal subordinado.

    — Será que apenas ele possui tendências psicopatas? Qual foi a necessidade de matá-lo?

    — Se eu não aparecesse, ele seria morto por vós de qualquer forma. Por que tu estás incomodado com isso?

    — Realmente, ele estar seguindo ordens era irrelevante. Ele deveria ser julgado pelos seus crimes independente disso. Mas ele era seu aliado… por que descartá-lo como se fosse lixo?

    — Ele demonstrou que não se faz mais necessário para mim. Por que eu deveria guardar uma ferramenta inútil? — replica sem demonstrar emoções — Acreditas que tudo o que precisei dizê-lo é que o recompensaria após o jogo entrando em um relacionamento com ele? — ri levemente — Homens deixam-se enganar tão facilmente, estava tão entusiasmado que esqueceu que os matando ele morreria também, logo jamais seria recompensado de qualquer forma. Estava preparando uma mentira sobre magia negra, da qual eu poderia usá-la para revivê-lo, porém ele nem se deu ao trabalho de questionar-me sobre esta contradição em meu pedido.

    Ela não precisou responder a minha primeira pergunta explicitamente para confirmá-la, está num estado total de psicopatia, até maior do que o de Takashi.

    — Chega de papo. O que diz respeito ao seu subordinado não me interessa nem um pouco. Não sei como você descobriu onde a escondia, mas entregue já minha metralhadora — diz Ailiss exibindo um olhar mortal.

    — Deixe-me ver se entendi o teu ponto. Tu exiges que eu te entregue o meu único meio de defesa para vós, meus adversários? Ficaste louca? Por que eu colocar-me-ia em desvantagem propositadamente? — sorri de forma irônica.

    — Não vai obedecer? Já que você é teimosa, acho que não terei outra esco-

    Ailiss é interrompida por Mikoto.

    — Eu sei o que planejas. Pretendes disparar em minhas mãos para me desarmar. Sinto te desapontar, todavia, diferente de ti, estou disposta a assumir as consequências de matar-vos — fala enquanto também ameaça disparar.

    — Ainda que tenha intenção de matar, sou plenamente capaz de desviar de uma amadora.

    — E quem disse que eu planejo disparar em ti especificamente? Tu até podes ser capaz, mas ele não será — aponta a arma para mim.

    — Tsc. Ela não está blefando — Ailiss resmunga.

    Eu teoricamente acabaria trazendo problemas para a Ailiss. Felizmente, o que a Mikoto não sabe é que eu já vim até aqui com a intenção de morrer. Não fará a mínima diferença ela ameaçá-la desta forma.

    — Isto mesmo, agora abaixe a tua arma caso não queiras que o Johann morra.

    Ailiss submete-se a ordem de Mikoto.

    Ela abaixou? Por quê?

    — O que você está fazendo?! Não desista de derrotá-la por minha causa, viemos até aqui preparados para isso! — exclamo.

    — Cale a boca, não te meta em minhas decisões.

    — Mas isso não faz sentido!

    — Não me faça repetir — encare-me irritada e me segura pela gola.

    Nossa discussão é interrompida por Mikoto.

     — Muito bem, larga a arma no chão que vos deixarei em paz por hora. Não quero vencer tão facilmente, pois não seria nada divertido.

    Ailiss atende novamente ao seu pedido e solta a arma.

    Mikoto também abaixa a sua arma e então caminha em direção às escadarias da outra extremidade do corredor.

     — Vemo-nos mais tarde, Johann, Ailiss — fala deixando o local.

    14h27

    Depois de que Mikoto deixou o local, andamos até os estudantes presos que Takashi estava torturando. Suas condições são péssimas, com hematomas e cortes por todo corpo.

    — Se eles continuassem sendo espancados nesta intensidade, provavelmente morreriam ainda hoje — comenta Ailiss.

    Os toco na tentativa de acordá-los, no entanto não obtenho respostas. Como estão desmaiados não temos outra escolha senão levá-los daqui.

    — Sem a enfermaria funcionando, não podemos tratá-los adequadamente. Mas é interessante que nós os salvemos para tentar conseguir algum apoio contra a soberania de Mikoto — respondo.

    Ailiss assente com minha proposta e então carregamos o menino e a menina em questão até o pátio da escola, onde poderíamos procurar por algum conhecido deles. Neste trajeto avisto Miyu, Manabu e Shou que estavam encarregados de vigiar a entrada.

    Miyu está fazendo curativos em ambos. 

    Quase havia me esquecido deles. Mas para que Mikoto tivesse entrado no armazém só pode significar que passou por eles e aparentemente foi através do uso da força.

    — Ailiss, pode levá-los sozinha? Gostaria de saber o que aconteceu com Manabu e os outros.

    Ela novamente concorda e então vou até eles.

    — Ah, Johann-kun. Foi terrível, a Kaichou chegou até a entrada acompanhada de vários seguidores do conselho estudantil. Manabu e Shou tentaram detê-la, mas não tiveram chance — Miyu comenta ao me ver.

    Em menor número e provavelmente com um físico mais fraco que os seus adversários, levaram uma surra tão grande que dói só de olhar para eles. Sinto-me um pouco culpado por isso. Eles lutaram até o fim, mesmo sabendo que iriam perder, por minha causa. No fim são bons amigos.

    Agora pensando melhor, percebo que é bem possível que o barulho que chamou a atenção de Takashi tenha vindo de um dos dois apanhando.

    — Foi mal Johann, não conseguimos cumprir a missão — diz Shou.

    — Não tem problema, as circunstâncias mudaram completamente. E julgando pelos seus ferimentos, acredito que deram o máximo de si. Muito obrigado — respondo.

    — Juro que não falharei na próxima — fala Manabu.

    Espero que não precise de uma próxima vez.

    — Ninguém antes dela tentou entrar? Ela já veio de cara acompanhada de tantos membros do conselho estudantil?

    — Não, foi a única tentativa de entrada — diz Miyu.

    Estranho… se ela já veio acompanhada na primeira tentativa, significa que sabia antecipadamente que iríamos atrás de Takashi. Nossa informação poderia estar sendo vazada de alguma forma? 

    A única pessoa que poderia ser responsável por isso seria Keiko. Mas é provável que não seja o caso. Keiko não sabia que Ailiss escondia a metralhadora naquele local, e mesmo assim Mikoto foi capaz de prever nossas ações. Então, talvez exista outro método.

    — Sinto muito pela insensibilidade de não fazê-los companhia em sua recuperação, mas eu tenho um assunto a tratar. Por hora, tratem de repousar — respondo e despeço-me dos três.

    Após isso, encontro-me com Keiko. A qual utilizando da testemunha dos estudantes que resgatamos pretende conseguir puxar parte do corpo discente para o nosso lado.

    — Será difícil convencer alguém que a Kaichou seja a culpada de algo. Até eu tenho dificuldades de aceitar isso, mas farei de tudo que estiver ao meu alcance para estabelecer esta virada. Se eu começar procurando apoio entre os amigos das vítimas, talvez seja mais factível — diz Keiko.

    — Obrigado por nos ajudar. Será uma batalha difícil, e precisaremos de todo o apoio necessário. A propósito, se não for pedir muito, pode dar uma mãozinha para a Miyu também? Aqueles dois levaram uma surra dos seus colegas e estão num estado deplorável — explico.

    — Bem que eu reparei que a Kaichou saiu com um excesso de guarda costas… Pensei em avisá-los, todavia não daria tempo. Ademais, pode contar comigo.

    Despeço-me de Keiko e volto a minha atenção para Ailiss, a qual está dispersa fitando o além. Essa série de eventos acabou fazendo-me deixar de lado o incidente mais chocante do dia, e agora ele me veio à mente.

    — Ailiss — desvio o olhar — sobre aquilo que você fez…

    — Esqueça imediatamente. Ou pelo menos finja que nunca aconteceu — responde com um olhar mortal.

    16h54

    Depois do ocorrido nos armazéns da escola, o natural seria ir direto para o esconderijo com Ailiss, o local mais seguro para mim. Sabendo agora que Mikoto é minha adversária, eu jamais deveria confrontá-la em público.

    Mas a conversa que tivemos no terceiro dia ainda está martelando em minha cabeça. Eu não lembro bem os detalhes, mas recordo que ela fez referência a coisas que viriam a acontecer, talvez isto seja alguma espécie de pista que ela quis deixar para mim.

    Por isso pensei que ela estivesse sendo obrigada a agir daquela forma hostil com a Ailiss por causa do Takashi, em outras palavras, uma refém. Mas não aparenta ser o caso, visto que ela o baleou sem nenhum remorso há algumas horas.

    Logo pedi a Keiko para me ajudar a acessar a sala do conselho estudantil quando apenas Mikoto deveria estar por lá e obviamente omitir este pedido de Ailiss. Ela não aprovou muito a ideia inicialmente, porém cedeu às minhas insistências.

    Abro lentamente a porta da sala do conselho estudantil e deparo-me com ela sentada em sua mesa.

    — Estou estupefata. Tu tens a mínima noção da encrenca na qual te meteste ao adentrar o meu território? Se ao menos entrasses sigilosamente para tentares um ataque surpresa, eu entenderia. Mas apareceres na minha frente desta forma? Não preciso nem citar o fato de estares sozinho e desarmado. Ailiss ainda teria chances de escapar, mas o teu caso é deplorável. Basta eu estralar os dedos e meus subordinados o prendem no mesmo instante.

    — Posso falar? Há alguns pontos que não ficaram muito claros para mim, então quero lhe fazer algumas perguntas. Prometo que serei breve — falo.

    — Pois bem, já que teves a audácia de vir até aqui nestas condições. O mínimo que posso fazer é ouvir o que tens a dizer, confesso que estou até curiosa em saber o que levaste a tomar uma decisão tão pouco cuidadosa. Até onde me consta, a demência não costuma se manifestar em pessoas jovens — joga uma mecha de cabelo para trás.

    — O que a nossa conversa de três dias atrás significou? Você parecia fazer menção a eventos futuros, possivelmente a tudo o que ocorreu até aqui, desde os assassinatos dos outros estudantes até o nosso conflito no armazém. Você é a mesma Mikoto de antes?

    — Se eu sou a mesma de antes? Só pode ser uma piada — ri por alguns segundos — Eu estava apenas brincando contigo. Do mesmo modo que alterei o padrão de funcionamento desta realidade, a qual Ailiss deve ter te informado, todas minhas ações tinham como fundamento desequilibrar meus adversários. Isto não esteve óbvio para ti? Baseada em teu histórico escolar, pensei que fosse mais esperto do que isso — volta a encarar-me.

    Então, por mais que seja um absurdo, segundo Ailiss, ela de fato foi capaz modificar as propriedades do jogo? E desta forma gerou tais estranhezas?

    — Bom desempenho em disciplinas teóricas, não me faz bom em algo que parta de interação interpessoal. Contudo, ainda sim noto que alguma coisa não bate no seu relato. Não consigo entender aonde você quer chegar com tudo isso. O que vai ganhar com este palco que supostamente montou?

    — Tu não precisas entender, não sabes como eu realmente sou, nunca soube. Falas como se fossemos amigos de longa data, todavia quantas vezes conversamos antes do jogo? Uma? Duas? A verdade é que sou uma sacerdotisa, fui eu quem conjurou este jogo, fui eu quem o aperfeiçoou para bagunçar a memória dos outros jogadores. Tudo não passa de uma grande oferenda para a Morte, bem como uma forma de testar o meu poder. Mas é a primeira vez que aplico numa escala tão grande quanto uma escola. E pela má vontade que vós apresentais em sereis adversários dignos, provavelmente não será a última.

    Todo este horror que você nos fez passar foi meramente um teste? 

    A observando eu percebo que há algo errado, ela não é este monstro que está se rotulando. Realmente ela matou seu aliado a sangue frio há poucas horas, mas parte de mim não consegue aceitar isso como real. 

    — Nestas horas eu deveria estar com vontade de pular para cima de você e esganá-la até morrer. Mas, apesar de tudo o que você fez, só sinto pena quando te olho. Por que tudo está tão confuso?

    — És mais influenciável do que imaginei. Conversamos umas duas vezes na vida antes deste jogo, você não tem nada de especial, apenas calhou de seres sorteado para o jogo e posteriormente adulterei tuas lembranças para desequilibra-lo. Estou quase me arrependendo disso, praticamente quebrei o jogo desta forma, pois ele não terá a menor graça assim — suspira — Será tão fácil derrotar-vos se continuares emotivo assim… 

    Talvez seja só isso mesmo. Ela parece ter razão, estou vendo coisas demais. Estas emoções são falsas.

    Devo então deixar meus sentimentos supostamente implantados de lado e preparar-me para o nosso confronto. Afinal, há alguém que eu prezo ainda mais com a vida em risco. Para salvar Ailiss, eu abro mão de qualquer coisa, inclusive de te entender.

    — Compreendo. Quem sabe as coisas sejam mesmo desta forma… — respondo cabisbaixo.

    — Agora que finalmente conseguiste inserir isso na tua cabeça. Dá o fora logo daqui. Se demorares um minuto sequer, retirarei a regalia que cedi a vós, e te tratarei como um alvo a ser eliminado imediatamente — cerra os olhos.

    Sem mais vontade de discutir, apenas acato a sugestão dela. Assinto, dou as costas e deixo a sala do conselho estudantil. 

    A luz que podia notar em seu interior está cada vez mais fraca, fazendo-a emergir na escuridão.

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