Capítulo 13 – Um ser misterioso
A pressão da serpente quase esmagou os ossos de Kai, sua visão já havia se turvado há algum tempo e a sua consciência estava preste a se apagar, ele sentiu seu fim chegar. A boca colossal da criatura se abria, pronta para engoli-lo inteiro.
No instante em que seus maxilares desceram para selar seu destino. O chão tremeu levemente, e as raízes gigantescas da floresta estremeceram, como se despertassem de um sono profundo. Lentamente, começaram a se mover, deslizando pelo solo com um som estridente.
Antes que a serpente pudesse concluir seu ataque, dezenas de raízes se ergueram, entrelaçando-se ao seu redor, impedindo seu avanço contra o jovem. Sua mandíbula foi contida com tamanha força que impossibilitou qualquer reação ou meio de contra ataque. O rugido abafado ecoou entre as copas, fazendo todas as folhagens ao redor tremer. Mas, por mais que se debatesse, o corpo escamoso foi lentamente afastado do jovem desfalecido.
Kai, já sem forças, mal percebeu o que acontecia. Sua mente se rendeu ao escuro, e o último som que ouviu foi o estalo das raízes se movendo pela floresta.
Então… tudo ficou um completo silêncio.
…
“…corda!” De repente, um som suave atravessou o abismo. No início, era quase inaudível, como um sussurro que não pertencia àquele lugar.
Kai tentou reagir, mas seu corpo não respondia. Apenas o eco daquela palavra se repetia, ganhando força a cada instante. Então a voz sou novamente:
“Acorde minha criança.” Aquelas exatas palavras despertaram uma sobrecarga de hormônios, fazendo seu corpo reagir.
“Vovó” murmurou Kai, os olhos semiabertos. “Só mais um minuto… Já vou levantar!” respondeu, automaticamente, ainda desorientado, como se tivesse voltado no tempo.
O silêncio se prolongou por um instante, e, ao mesmo tempo, algo dentro dele começou a latejar. Não era apenas memória. O núcleo em seu peito reagia, emitindo pulsos fracos de energia que se expandiam pelo corpo.
Uma risada suave, terna, ecoou no vazio. Por um breve instante, não parecia um simples chamado, mas sim o calor acolhedor da avó que sempre o despertava nas manhãs preguiçosas.
“Está na hora de acordar de verdade.” duas vozes soaram ao mesmo tempo, uma doce e familiar de sua antiga avó e a outra carregada de um tom que não era humano.
Seus olhos se abriram de repente. O mundo ainda girava, mas ele sentiu o peito inflar, como se tivesse emergido de um mar profundo. O ar pesado entrou rígido em seus pulmões, e ele percebeu: estava de volta com o seu corpo. Inteiro.
“Onde estou?” disse, ainda com a voz embargada, apoiando as mãos no chão.
Ao se por sentado, notou que o ambiente não era o mesmo de antes. Olhando ao redor, imaginou estar dentro de uma caverna… mas não era uma caverna comum. As paredes pulsavam em tons esverdeados, cobertas por musgos luminescentes que iluminavam suavemente o espaço. Do teto, raízes grossas desciam até tocar o solo, e delas escorriam gotas cristalinas que se juntavam em pequenos riachos.
O lugar continha um ecossistema próprio: pequenas plantas de cores vivas brotavam entre as pedras, e, em alguns pontos, flores abertas exalavam fragrâncias suaves. Era como se uma floresta inteira tivesse se escondido sob a terra, preservada do mundo exterior.
Kai se levantou devagar, tateando o solo firme. Seu corpo doía, mas nada comparado ao aperto mortal que sofrera anteriormente. Virou-se instintivamente, procurando pela serpente, mas não encontrou vestígios dela.
“Isso não faz sentido…” murmurou, caminhando alguns passos. “Eu estava… prestes a morrer.”
“Não se preocupe, minha criança, não há nenhum perigo aqui!” disse a voz, que parecia emergir do nada.
Kai arregalou os olhos e recuou um passo.
“Quem está aí?” disse, olhando em todas as direções, a voz carregada de desconfiança. Mas não havia ninguém. Apenas a vegetação e, no centro da caverna, uma árvore colossal. Seu tronco era tão largo que parecia sustentar o teto inteiro, e suas raízes, entrelaçadas como serpentes adormecidas, moviam-se sutilmente, quase imperceptíveis.
“Não tenha medo!” respondeu uma voz suave, doce e calma. “Fui eu quem te libertou do bestial!”
Kai engoliu em seco. O aroma que se espalhou a seguir, fresco, adocicado, como pétalas recém-abertas, percorreu o ambiente, e de certa forma relaxou sua apreensão. Seus ombros se soltaram quase contra a vontade, como se uma presença maternal o envolvesse.
“Você…?” hesitou, olhando para o tronco da árvore. Somente agora, ao se focar na direção da voz, percebeu algo estranho. A casca parecia se mover, e um brilho percorreu as linhas naturais do tronco.
Num estalo profundo, como madeira viva se rearranjando, a copa tremeu e se ergueu. Galhos imensos se dobraram, assumindo contornos de braços. As raízes que antes repousavam como serpentes se enroscaram no solo. Em poucos instantes, a árvore colossal revelava sua verdadeira face: uma planta humanoide gigantesca, com olhos luminosos e expressão serena, que o observava de cima como uma mãe contempla o filho.
“Está dizendo que foi você quem me salvou daquela serpente?” perguntou Kai, engolindo em seco, a voz vacilante entre desconfiança e reverência.
“Exatamente, minha criança!” respondeu à entidade, com o mesmo tom suave e calmo.
Kai sentiu uma profunda conexão entre os dois. O modo como a criatura se portava, a serenidade no olhar e até a suavidade de sua voz… tudo lhe despertava lembranças antigas.
Porque ela lembra tanto a minha avó. pensou, o peito apertando. O jeito de falar… até mesmo o rosto, com pequenos traços familiares.
Por um instante, a estranheza daquele ser colossal se dissolveu, substituída por uma sensação acolhedora. Um calor suave percorreu sua essência, como se fosse envolvido por um sentimento fraternal.
Foi então que percebeu.
“Aquele sentimento… aquele chamado que senti ao chegar aqui…” murmurou, levando a mão ao peito, sobre o núcleo. “Era você.”
A figura se inclinou levemente para observá-lo de mais perto. Seus olhos verdes cintilaram como gemas vivas, refletindo algo que ia além das palavras.
“Sim, criança. Pode me chamar de Ygdraw!” respondeu à entidade, sua voz ecoando com suavidade, mas também com a firmeza de quem carrega eras de existência. “Senti sua chegada a este reino e tentei conduzi-lo até mim. Mas não esperava que fosse tão fraco e desatento a ponto de ser capturado pelo simples bestial.” Kai franziu o cenho, absorvendo as palavras.
Ygdraw percebeu sua expressão sabendo o que passava em sua mente e, sem esperar pela pergunta, completou:
“Os animais deste universo são conhecidos como Bestiais. Não são como as simples criaturas frágeis que você conhecia no Sonho Eterno. Aqui, cada um deles é moldado e nutrido pela essência que flui em toda a criação: Éther.” explicou Ygdraw, sua voz reverberando como se fosse parte da própria caverna. “Para sua sorte, ela não utilizou nenhuma habilidade.”
“Habilidades!” Kai respirou fundo, o corpo ainda dolorido lembrava bem a força que o sobrepujara. “Todos os anim… bestiais possuem habilidades?” perguntou quase retoricamente, o olhar fixo nela, como se imaginasse tal ideia.
Kai engoliu em seco. Se aquela serpente foi capaz de me esmagar apenas com a força física… então o que seria de mim se ela tivesse usado uma habilidade? Um calafrio percorreu sua espinha.
“Não pense que isso é um privilégio apenas dos Bestiais.” prosseguiu Ygdraw, sua voz mais seria. “Os Despertos também podem. O núcleo que carrega no peito é a chave. Mas enquanto você não aprender a senti-lo e a harmonizar-se com ele… será tão vulnerável quanto esteve há pouco.”
Kai ergueu os olhos, exalando um brilho diferente. Não era apenas reflexo da luz verde que emanava da caverna, mas algo mais profundo, vindo de dentro de si, reagindo ao que acabara de ouvir.
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