Capítulo 2 – Despertar
Acima da cidade, o Enviado abriu os olhos revelando duas galáxias. “Parece que mais alguns embriões vão despertar!” comentou o Enviado, para o vazio.
Toda a visão abaixo dele se desfez, como o fim de uma ilusão. Prédios, casas, ruas e pessoas. Tudo havia desaparecido, como se aquela cidade jamais tivesse existido.
Onde antes havia construções, agora estendia-se um vasto campo silencioso, dominado por árvores negras de aparência inquietante. Seus galhos retorcidos sustentavam frutos estranhos, que vibravam suavemente.
Alguns desses frutos brilhavam com mais intensidade, liberando uma aura gélida que fazia o ar ao redor parecer quase palpável, como se o ambiente ficasse levemente mais denso. E foi nesse momento que a membrana de uma delas começou a rachar, com fissuras silenciosas se espalhando lentamente até que, “ploop”, a casca se rompeu, e uma luz abrasadora explodiu do interior.
Sem noção alguma do tempo, um pequeno resquício de consciência acendeu dentro Kai. O processo foi lento, sua consciência era arrancada à força das profundezas de um abismo, como se mãos invisíveis o puxassem do fundo de um oceano calmo onde ele preferia permanecer submerso.
“Onde… eu tô?” sussurrou, a voz rouca e sem força, soava distante e estranha que parecia até outra pessoa falando.
Seus olhos entreabertos tentavam decifrar o ambiente, mas ainda desorientado, tudo era confuso e distorcido, como se estivesse olhando por trás de um vidro embaçado.
Que lugar é esse? Eu… não me lembro de nada! pensou, completamente perdido.
Sua mente, desesperada, vasculhando o escuro, atrás de fragmentos de memória para entender o que tinha acontecido, mas os pensamentos escapavam, escorregando como água entre os dedos.
Após minutos… ou talvez horas, quem saberia dizer? O tempo parecia congelado, preso naquele instante eterno.
Então, sem aviso prévio, uma sequência de imagens começou, lentamente, a se recompor. Como peças de um quebra-cabeça. As memórias emergiam uma a uma:
O quarto girando… a dor lancinante… e então, o apagão. Num lampejo rápido, tudo voltou claro e vívido. Kai sentiu cada lembrança pulsando forte, como se quisesse lhe mostrar algo urgente.
Só a duas explicações para o que esta acontecendo comigo. ponderou, sobre os possíveis eventos que haviam se desenrolado.
A primeira: Eu morri naquele quarto. Mas isso soou contraditório. Como poderia estar ali, consciente, se estava morto?
Tudo havia sido tão vívido que sua memória ainda latejava, como uma ferida recente que recusava cicatrizar para respondê-lo de que ainda existia.
Veio então a segunda conclusão, acompanhada de um suspiro pesado, como quem tenta expulsar junto com o ar algo mais.
Acho que vou ter que me desculpar com o Will… Se é que ainda posso. A imagem de seu amigo surgiu entre os flashes de memórias, e, por um instante, algo apertou seu peito, não sabia se era saudade ou arrependimento. O pensamento o fez refletir sobre a conversa deles sobre o Enviado.
Então, aquilo tudo era verdade? Kai pensou. Eu realmente ascendi a um reino superior? Mesmo com a memória em ordem, a dúvida persistia. Era difícil confiar em algo tão surreal e, ao mesmo tempo, tão intenso.
Mas se tudo que vivi foi uma mentira, uma ilusão como ele vivia dizendo, por que ainda consigo me lembrar de cada detalhe?
Os sentimentos…
As lembranças…
Os sabores… Humm. Lembrou de um prato especifico que adorava saborear. No instante seguinte, balançou a cabeça de leve, como se o movimento bastasse para espantar os pensamentos desnecessários.
“Não vou chegar a lugar nenhum desse jeito!” murmurou. Voltando a atenção para o ambiente ao seu redor, agora visível, e o que viu, o fez estremecer.
“Onde eu fui parar!” exclamou, em choque.
Este lugar… parece o fim do mundo, um verdadeiro apocalipse! pensou, observando o ambiente.
Diante dele, erguiam-se várias árvores ou algo do gênero, que mais parecia uma criatura vegetal saída de um filme de ficção.

O tronco retorcido e escurecido lembrava o de uma árvore comum, mas apenas à primeira vista. Suas raízes grossas se estendiam como veias vivas sobre o solo cinzento, pulsando de maneira quase hipnótica, absorvendo a energia ao redor. Não havia folhas nos galhos secos, apenas a deformidade. À medida que se alongavam, suas extremidades mudavam de forma, transformando-se em frutos que pareciam mais um casulo. Eram ovais, envoltos por uma membrana negra, e o interior, de um vermelho semi translúcido, exalava uma estranha luminosidade.
Fascinado, Kai focou sua visão neles e percebeu que cada um parecia conter um cristal hexagonal em seu interior. Ramificações semelhantes a veias se espalhavam como pequenas correntes levando energia para o que parecia ser o núcleo dos frutos, onde liberava pequenas ondas de energia que ritmicamente aumentava e diminuía, lembrando os batimentos cardíacos.
“Meu Deus… que viajem é essa?” Kai exclamou, sua face se distorceu diante da bizarra cena.
Ele ficou ali, imóvel, absorvendo a realidade diante de seus olhos, algo que desafiava qualquer explicação ou lógica humana.
Rezo para que isso não seja o inferno, pensou, juntando as mãos em prece, como se uma oração pudesse ajudá-lo naquela situação.
De repente, um vulto estranho chamou sua atenção ao completar o seu gesto.
“Eita, que merda é essa?!” exclamou, com um pulo recuou assustado. Mas logo notou seu engano.
“Espera… isso é minha mão?” disse, olhando para o braço que se movia a sua frente.
“O que fizeram comigo?” Somente agora notou que havia mudado.
Seu corpo, antes familiar, agora não passava de uma massa de energia escura ramificada por uma aura azul que serpenteava por toda a extensão daquela forma humanoide.
Agora eu imagino como o Hulk se sentiu ao mudar de forma pela primeira vez. pensou Kai, ao se interessar pela nova aparência. Apalpando o corpo, notou que não havia carne, ossos ou qualquer traço humano de sua antiga forma.
“Eu… não tenho olhos, nem ouvidos… nem boca!” Tentou falar, mas notou que o som não vinha de sua garganta.
“Mas… como estou enxergando? Como consigo… falar?” exclamou, as dúvidas não paravam de surgir, mas sem resposta imediata. Ele continuou a explorar seu corpo.
“O único detalhe que se diferencia do resto dessa massa de energia, é este cristal!” comentou, apalpando o cristal hexagonal no peito, igual ao que viu dentro do fruto segundos antes.

Xiiiiiii…
De repente, um chiado estranho, seguido de um pulso de luz à sua direita, chamou a sua atenção. Induzido pelo distúrbio, virou a cabeça, e viu a membrana da fruta de uma daquelas plantas prestes a se romper.
Agora posso verificar se a minha teoria estava certa ou não! Ele fixou seu olhar para não perder nenhum detalhe.
Após a explosão de luz inicial, ela foi se retraindo lentamente, a medida que sua visão voltou ao normal presenciou uma forma humanoide exatamente igual a dele ser expelida da fissura, deixando para trás uma película murcha, sem vida, do que antigamente ele considerava aquela fruta ou o quer que seja.
Então é mais ou menos como eu imaginava! ponderou, ao ver o desenrola da cena, levando a mão ao queixo.
Como se pensasse em algo, olhou para trás e encontrou uma daquelas árvores bem próximas de si. Voltando sua atenção para cima, deparou-se com os restos do que deveria ter sido o seu casulo.
“Então era isso, eu era apenas uma larva no casulo esperando para eclodir.” Soltou um meio sorriso, como quem ri da própria loucura.
“Então era isso que ele queria dizer com nova vida ou verdadeira vida. Mas e agora…” perguntou para si, entretanto antes que pudesse terminar seu comentário foi interrompido por uma voz distante, carregada de uma certa imponência e autoridade.
“Parece que todos os que estavam prontos, já acordaram! Então podemos começar.”
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