Índice de Capítulo

    “Como as coisas tinham ficado assim?”

    Com as mãos suadas agarradas à barra de terra, Akemi percebia que sua vida tinha tomado um rumo inusitado — e possivelmente sem volta.

    Atrás dele, Nikko o segurava pelas escápulas, enquanto Kyoko… bem, essa estava claramente irritada, o que nunca era um bom sinal.

    — Agora me expliquem uma coisa! Por que eu tenho que carregar esse saco de batatas nas costas?! Os pés dele estão quase no chão! Ele nem precisa pular pra alcançar a barra!

    — No três, Kyoko! — disse Nikko alegremente, ignorando completamente o tom da baixinha.

    — Pessoal… — Akemi tentava argumentar — eu não sei se a Shimizu realmente precisa fazer isso…

    — Claro que precisa! Ela estava ali justamente para deixar o exercício mais divertido!

    — Divertido? — Akemi piscou confuso — o que você quer dizer com isso?

    — Você irá levantá-la junto com você!

    QUÊÊÊÊ???!!! — gritaram os outros dois, com o olhar de “isso só pode ser piada!”.

    — Comeu merda, garota?! — exclamava Kyoko — quer me fazer passar mais vergonha é só me colocar uma maquiagem de palhaça!

    — Olha, isso não seria má ideia — refletiu Nikko com um sorriso malicioso, provavelmente visualizando a cena.

    — Nikko! — Akemi a olhava desesperado — eu mal consigo levantar o meu próprio peso, quem dirá o dela! Tem certeza de que isso é uma boa ideia? Se o instrutor nos pegar…

    — Relaaaxa! Vai ser rapidinho! Além disso, a Kyoko é leve como uma pena.

    — Pena?! Eu vou arrancar sua língua, sua-

    — Certo, certo! Vamos nessa! Um… dois… três!

    Agh! MINHAS COSTAS!!! — berrou Akemi, desesperado enquanto era içado como um bebê prestes a ser batizado.

    — Ah, para de drama! Baixinha, tira os pés do chão!

    Era cada bizarrice — reclamou Kyoko, dobrando os joelhos para destocar o solo.

    Akemi, pendurado, se agitava no ar como uma minhoca em desespero. “Por que eu me permito envolver nessas coisas?! Eu preciso mesmo passar por isso?! Só tem maluco aqui!”

    — Para de tremer os braços, garoto! — auxiliou Nikko, tentando guiar a confusão — lembre-se da respiração!

    — Respiração? Não tem como… Agh! Parece que a Shimizu fica mais pesada a cada segundo!

    — Tá me chamando de gorda, moleque?! — Kyoko lançou um olhar mortal.

    — Não! Claro que não! Até porque… é… isso seria… sem sentido pro seu corpo?

    — A-… — Kyoko travou, sem saber o que responder àquele comentário completamente aleatório.

    — Mais alto, Akemi! Ia, ia, ia!

    Akemi subia lentamente, tentando contribuir com o mínimo que conseguia. — Eu tô tentando, mas dói… tudo! — Porém ele estava mais quebrado emocionalmente do que fisicamente.

    — Vai! Agora é só passar o queixo!  — gritou Nikko, uma empolgação ridiculamente fora de contexto.

    — Se você não passar esse queixo em cinco segundos, eu te derrubo! — ameaçou Kyoko, cheia de fúria.

    Num último esforço — ou melhor, com uma ajudinha nada discreta de Nikko — Akemi finalmente passou o queixo pela barra.

    EU CONSEGUI!!!

    Por alguns segundos gloriosos, Ele sentia-se invencível. As nuvens pareciam ao alcance de suas mãos, o céu azul nunca tinha sido tão bonito. Seu universo estava em perfeita harmonia ao ver o quão o céu era azul. “Agora sim, minha vida faz sentido…”

    — Alguém pode me dizer que p#rra é essa? — uma voz interrompeu o momento épico.

    Nikko soltou Akemi num piscar de olhos e girou sobre os calcanhares com um sorriso nervoso. — Ah! Major Yura! Hehe… — Ela prestou continência de imediato, tentando disfarçar o pânico enquanto a poeira da sua chegada repentina ainda flutuava no ar.

    Mesmo trêmulo, o garoto seguiu pendurado, com o pescoço acima da barra, contemplando os céus como uma dádiva nunca antes vista.

    Mas Kyoko não parecia confortável com a situação. — Já deu! — Ela soltou-se das pernas de Akemi e tentou se distanciar com passos apressados, porém…

    — Volte aqui, Zero Oito — chamou Yura, sua voz estranhamente aguda estava serena.

    — Preparada, senhor! — Kyoko retornou imediatamente e prestou continência ao lado de Nikko.

    — Vocês duas, trinta flexões. Agora.

    — Positivo, senhor! — responderam as duas, já começando as flexões.

    Enquanto as outras se movimentavam no chão, Yura avançou lentamente até Akemi na barra. — Que bagunça é essa, Zero Um? — Seu tom, embora calmo, era amedrontador.

    — Eu… consegui uma, senhor — Akemi, apesar de tudo, estava genuinamente feliz.

    — Desce logo daí.

    — Eu… não consigo, senhor. Meus músculos travaram.

    — Ah é? — Yura levantou uma sobrancelha. — Então, deixa que eu te dou uma mãozinha.

    Akemi sentiu o peso de uma grande mão se aproximando, parecia que finalmente uma boa ajuda seria bem-vinda. Só que… “Espera! Ele tá agarrando a gola atrás da minha nuc-”

    Poff!

    Akemi foi jogado no chão, levantando poeira ao bater as costas. Sua coluna já nem possuía mais estoques de dor.

    — A PRÓXIMA VEZ QUE EU OS VER FAZENDO QUALQUER MACAQUICE! EU VOS ARRANCAREI AS PERNAS COM OS DEEENTEEEEES!!!

    “Ah… então é assim que termina de novo… comigo no chão…”


    – Último exercício: Burpees –

    — PRESTEM ATENÇÃO, SEUS INÚTEIS! AGORA VAMOS FAZER O FAMOSO “SUGADO”… TAMBÉM CONHECIDO COMO BURPEE! PARA AQUELES QUE NÃO SABEM, VOU EXPLICAR!

    O Major levantou as mãos, pronto para demonstrar os movimentos.

    — VOCÊS SE AGACHAM ASSIM! EM SEGUIDA, VÃO PARA A POSIÇÃO DE FLEXÃO! — Ele esticou as pernas para trás, ficando em posição de prancha. — FAÇAM UMA FLEXÃO COMPLETA E SUBAM DE NOVO! — A flexão foi feita, leve como uma pena, subindo logo em seguida. — E AQUI É A PARTE QUE SUGA A ALMA DE VOCÊS! VOCÊS PULAM O MAIS ALTO POSSÍVEL, TOCAM AS MÃOS NO CÉU, E REPEEETEM!!!

    Yura saltou, bateu uma palma no ar, e ao pisar no chão, fez uma pausa dramática para encerrar a demonstração.

    — ISSO É UM BURPEE! O ÚLTIMO EXERCÍCIO DE HOJE QUE IRÁ ACABAR COM AS FORÇAS DE VOCÊS MAIS RÁPIDO QUE QUALQUER OUTRO! VAMOS! 5 SÉRIES DE 20! E VOCÊ, ZERO UM! MELHOR REZAR PARA SOBREVIVER A UM SÓ!

    “Eu quero ir pra casa…”

    COMECEM AGOOORA!!!

    Akemi nem disfarçava o pânico que tomava conta de sua expressão; seus músculos, que já haviam se transformado em geleia, pareciam inexistentes. No entanto, agachou-se junto aos outros. “Eu já estou destruído… e agora isso? Como uma simples respiração vai me salvar disso?!” Ele fechou os olhos por um instante, tentando abafar a exaustão que consumia seu corpo como um fogo lento.

    — Você consegue, Akemi — a voz suave porém firme de Nikko chegava até ele — apenas controle a respiração. Isso te ajudou a se manter na barra, e vai te ajudar agora.

    “Apenas respirar…” O garoto inspirou profundamente, esforçando-se para seguir as instruções. Mas a ideia de repetir aquele movimento explosivo dezenas de vezes parecia um terror sem fim.

    — VAMOS, ZERO UM, MEXA-SE! OU QUER QUE EU FAÇA VOCÊ ENGOLIR A TERRA DESSE CAMPO NOVAMENTE?!

    Com um suspiro resignado, Akemi começou o primeiro burpee. Ele se agachou com dificuldade, suas pernas ameaçando ceder a qualquer momento. Ao se jogar no chão para a flexão, cada músculo em seu corpo protestava e queimava, mas mesmo tremendo, ergueu-se novamente, e quando pulou… foi um salto patético, mal levantou os pés do chão.

    “Isso… está acabando comigo…”

    — DE NOVO! — gritou Yura, impiedoso.

    O segundo burpee foi ainda mais desafiador.

    “Respire… mantenha o foco!”

    Mas focar era difícil, cada movimento parecia que era feito em um mar de lama. 

    Contudo, Antes que Akemi desabasse completamente…

    — Vamos fazer juntos! — Nikko o chamou, ainda abaixada em meio a uma flexão —  Devagar a gente consegue! — O sorriso dela era um raio de luz em meio ao caos, olhos verdes brilhavam com uma confiança que Akemi mal podia compreender.

    A garota saltou e recomeçou os burpees, em um ritmo estável.

    Akemi tentava acompanhá-la, seguindo o ritmo dela e ajustando sua respiração, movendo-se de forma mais coordenada. Ainda assim, seu corpo reclamava a cada repetição, enquanto tentava não pensar na distância entre seu esforço e o fim do exercício.

    Os dois continuavam juntos, completando repetição após repetição.

    — Você está indo bem, Akemi! Só mais alguns.

    No ritmo de Nikko, o jovem percebeu que o corpo tremia menos. A respiração controlada, como ela havia sugerido, de fato fazia diferença.

    Yura continuava rondando como um falcão.

    Para surpresa de Akemi, o olhar de desespero que sempre o acompanhava no rosto estava sumindo. Ele estava fazendo.

    E então, algo que ninguém jamais esperaria aconteceu.

    — EXCELENTE, ZERO UM! FINALMENTE TÁ FAZENDO ALGO DIREITO! — gritou o Major.

    Para qualquer um, aquilo soaria como mais uma bronca, mas para Akemi, foi quase um elogio.

    “Um elogio? Vindo do instrutor? Será que estou sonhando?”

    Nikko incentivava com olhares e sorrisos. — Tá arrasando, garoto!

    Sem entender como, Akemi conseguia manter o movimento. Cada burpee ficava um pouco menos insuportável.

    — “Eu… eu consigo…”

    Pela primeira vez naquele dia, Akemi sentiu que estava acompanhando os outros. Não era mais o mais fraco… pelo menos por um instante.

    — BASTA! — gritou o Major.

    Os alunos pararam o exercício. Alguns permaneceram de pé, indiferentes. Outros, com as mãos nos joelhos, lutavam para recuperar o fôlego. Akemi, por sua vez, desabou de joelhos, suado e ofegante, mas com um pequeno sorriso de satisfação no rosto.

    Ao lado dele, Nikko também estava esgotada, mas sorria genuinamente.

    — Você foi muito bem, Akemi! — disse ela, sentando-se — ufa! Esse exercício é brutal! Depois de tudo isso, até eu senti o impacto — ela passou a mão na testa e riu baixinho.

    Akemi, ainda recuperando o fôlego, sorriu de volta, mesmo com a respiração descompassada. — Uff… Já acabou? Uff…

    — Acabou? Ah, Akemi… essa foi só a primeira série! Ainda faltam mais quatro para completar as cinco de vinte.

    — … Ainda faltam… quatro… de vinte…? — A visão dele começou a embaçar. O campo, antes nítido, tornou-se um borrão de cores indistintas. As vozes ao redor pareciam vir de um túnel distante, enquanto seu corpo inteiro cedia.

    Até que, sem aviso, seus joelhos finalmente cederam.

    Poff!

    Akemi tombou como uma marionete cujos fios foram cortados e desabou na terra seca, desmaiado de cara no chão, o que era inevitável. 

    Nikko observou a cena, e ainda sorrindo, balançou a cabeça. — É… eu tentei…

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