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    — Bem, alunos! — Hisako chamava a atenção, animada — alguns podem ter achado esse segundo desafio uma perda de tempo, ou até sem sentido, mas saibam que ele foi de suma importância para o procedimento a seguir. Para começar, preciso que se aproximem.

    A fileira curva e um pouco desordenada atendeu às orientações da instrutora.

    — Excelente. Agora, farei uma breve convocação.

    A turma inteira entendeu o momento crucial em que estavam naquele exato momento. A sensação era de que, se o seu número fosse chamado, já seria motivo prévio da vitória.

    Zero Oito! Venha ao meu lado! — O pedido foi forte, o chamado de um campeão.

    — … Eu sabia — reclamou Kyoko, fazendo corpo mole ao andar.

    — A baixinha? — indagou Akemi — por que escolheu ela? Só porque é parente?

    Nikko extravasava empolgação. — Não sei, só sei que torcerei muito por ela! Vai lá, Kyozinha!

    De frente para a garota que caminhava sem o mínimo esforço, Hisako mostrou seu sorriso orgulhoso. — Kyo! Minha linda princesa. 

    Kyoko levou dedos aos olhos. Se pudesse, sumiria ali mesmo. — Princesa?! Ah, é cada coisa que eu tenho que me submeter — murmurou ela, logo olhando para a bisavó — diga logo o que você quer de mim, anda.

    Quando sua convocada chegou perto, Hisako aproximou o braço para trazê-la ainda mais próxima de seu corpo. — Oh, Kyo, não seja assim com a sua velhinha… — ela a envolveu com uma das mãos, massageando seus ombros — você era tão doce quando bebê, foi só crescer um pouco que já pegou toda a braveza de um adolescente problemático. Mas você sempre será a minha princesa.

    — Desde quando você achou uma boa me chamar de… princesa? — O apelido foi entoado com nojo.

    Hisako soltou a bisneta e girou as rodas para frente a uma distância mínima, seus olhares aos céus relembravam memórias. — Você já se esqueceu? Quando era criança, você adorava brincar de reinado. Você era a princesa, e eu, a sua rainha. Era tão divertido… — As lembranças aqueceram o coração da veterana.

    — Para de pensar besteira, isso já faz mais de uma década.

    De cabeça erguida, Hisako continuava de costas para a jovem. — Exato. Desde então, você nunca mais quis brincar comigo, nem cogitou me visitar. Isso machuca, sabia?

    A garota recuou as mãos e fechou os olhos, sem remorso. — Eu não tenho culpa, você foi pra guerra e eu tive que crescer. Não teríamos tempo de forma alguma-

    — Kyoko, quando você realmente sente apego ou o mínimo amor que seja por um membro da mesma família, você pelo menos envia cartas, procura saber como ele está. Você não sabe o quão isso pode melhorar o dia de uma pessoa nos estágios finais da vida.

    A baixinha suspirou antes de olhar sério para a sua progenitora. — Haaah… Certo, quer que eu me desculpe? — Pof! Em um movimento brusco, ela curvou-se por completo e colou a testa no chão de terra molhada.

    A militar girou a cadeira para o lado, o bastante para jogar de relance o seu olhar levemente atônito à garota no chão.

    Mas Kyoko não deu brecha para qualquer ponderação. — Altíssima Digníssima Tenente-Coronel Hisako Shimizu! Veterana de Guerra deste tão prestigiado Exército Asahiano! Peço perdão pela minha falta de companhia! Como sua herdeira, deveria prestar o mais alto reconhecimento! Novamente, peço mil perdões! — Apesar da longa descrição, sua voz não estava de brincadeira.

    Hisako observava, surpresa e um pouco risonha. — He ho ho! Você é uma figura, Kyoko. Definitivamente é uma integrante do clã Mizu — seguidamente, ela começou a levar a cadeira na direção da garota. — Entretanto, infelizmente não posso aceitar esse simples tipo de pedido de desculpas.

    Ao escutar a negação, Kyoko tirou a testa do chão, assim encontrando o rosto rejuvenescido da bisavó se aproximando. Embora naturalmente franca na seriedade, a garota estava minimamente receosa. — Então… o que você quer que eu faça?

    Perto o suficiente, Hisako colocou suas mãos nas bochechas da bisneta, acariciando-as. Sua amabilidade conquistaria o coração de qualquer admirador dos valores familiares. — Você, como a boa menina que era, irá brincar de reinado comigo… mais uma vez. Você será a princesa, e eu, a rainha.

    A que tinha as bochechas apertadas não entendeu direito o pedido. — Bom… A gente pode fazer isso depois. Eu ainda tenho aquele castelo de brinque-

    Crsssh!

    A boca de Kyoko foi tampada por um pedaço de gelo semelhante a uma mordaça.

    — Ooh, shh shh shh shh shh… Apenas… fique tranquila… — O rosto de Hisako recebeu um sorriso que seria dado como macabro a qualquer um que visse de perto — eu tenho o meu próprio castelo!

    Ffuuuuuuuuuuussssshhhhh… 

    Uma corrente nevada rodeava todos os presentes. Novamente, aquela tempestade voltava, mas como o olho de um furacão, trazendo pedaços do gelo cristalinos que embelezavam a vista, ou talvez, preocupasse.

    Um pequeno terremoto açoitou o solo, tanto a terra, quanto o gelo. O tremor fez com que os alunos, que escutavam toda a conversa dos Shimizu, tentassem se manter em pé, uns atentos, outros… extremamente preocupados.

    — Que besteira elas estão fazendo?! — indagou Kentaro, irritado.

    — Não sei, mas certamente isso é fruto da instrutora! — informou Teruo, segurando os óculos para que não voassem.

    A GENTE VAI SER CONGELADO DE NOVO???!!! — gritou Akemi, quase caindo.

    Um ambiente ainda mais gélido era formado, o chão onde havia terra exposta voltava a ser tomado pelo gelo.

    — Ei, fica calmo! — chamou Nikko — nenhum instrutor faria nada de mal com a gente! Só tome cuidado com os pé- — BRUUUUUUM!!! Uma imensa plataforma de gelo ergueu todos às alturas — –ÉÉÉÉÉÉÉZ!!!

    A força da gravidade pegou Akemi desprevenido, derrubando-o no chão.

    — Se segura, garoto bisonho!

    Para o rapaz, tudo tremia. Então, ele decidiu fechar os olhos e aceitar o aumento de sua frequência cardíaca, encolhendo o corpo, protegendo a cabeça. — Ah! Eu não aguento mais esse chão gelado, assim eu vou vomitar! Faz ela parar!

    Rum!

    Bruscamente, o solo se firmou. Mas a visão de Akemi seguiu turva.

    — Ow, levanta! — Nikko tentou ajudar, puxando o braço do caído.

    — Ahm… Espera… minha cabeça dói… — O mundo ao redor girava enquanto Akemi tentava se levantar, seu corpo tremia sob o efeito da tontura.

    — Ai, vamos, para de ser mole! 

    — Eu sei! Não é a primeira vez que me pedem isso! — Quando o garoto ficou de pé, seus olhos firmemente fechados e mão na cabeça realçaram o desconforto que sentia. Porém, quando finalmente os abriu, o que viu o deixou sem palavras. Seus lábios se moveram, mas nenhum som saiu à princípio. O cenário diante dele não seria imaginável nem nos mais profundos sonhos, ou quiçá pesadelos. — … Nikko… onde diabos estamos…?

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