Índice de Capítulo

    De longe, avistei a pequena multidão aglomerada na entrada da arena da universidade. Conforme meu grupo avançava, percebia os olhares, os cochichos e as mãos que me apontavam. Os burburinhos se intensificavam à medida que nos aproximávamos.

    Não podia negar que estava com medo. Um frio na barriga constante me incomodava, mas mantive um sorriso nos lábios e acenei de volta para alguns. Aprendi com os Vulkaris que demonstrar medo era o primeiro passo para a derrota. O medo precisava ser transformado em combustível, algo que nos mantivesse atentos e motivados.

    Nosso grupo seguia junto: Selune, Nix, Karlom, Jorjen, Gérard, Claire, Joaquim e Joana. Os holofotes pareciam estar todos sobre nós.

    Quando finalmente entrei na arena, senti a areia sob meus pés e olhei ao redor. Atrás de mim, nas arquibancadas, estavam meus amigos, reunidos e ocupando um espaço que parecia isolado de todos os outros. No lado oposto, o setor reservado à Casa Vulkaris e suas aliadas estava repleto. Entre eles, identifiquei minha mãe e Cassiopeia. Nos lados da arena, reconheci vários rostos do baile e da celebração na mansão Vulkaris. Membros de outras Casas, participantes do torneio e curiosos estavam presentes, atentos ao que estava por vir.

    Sob tantos olhares avaliativos, me senti exposto, quase nu. Pequenas vaias ecoavam vez ou outra, mas do meu lado, Nix gritava. Entre incentivos para mim e impropérios dirigidos aos que ousavam me hostilizar, sua voz se destacava.

    Quando Roderick entrou na arena, o estrondo dos aplausos e gritos dos presentes me pegou de surpresa. Por um instante, senti o impacto, como se as ondas sonoras quisessem me esmagar. Eu estava preparado para o duelo, mas não esperava o que veio a seguir. Nosso pai o acompanhava.

    Roderick caminhou até o lado oposto da arena e se posicionou. Meu pai, em um gesto carregado de simbolismo, removeu a capa dos ombros do meu irmão e, desembainhando sua própria espada, entregou-a a ele. Aquilo me abalou profundamente. Nunca recebi nenhum gesto de apoio ou afeto do meu pai. Para ele, eu sempre fui um intruso, um pária. Minha mãe e Cassiopeia eram meus únicos aliados naquela família. Engoli em seco, sentindo o rancor queimando dentro de mim, e me forcei a transformá-lo em motivação.

    Meu pai avançou para o centro da arena, assumindo o papel de padrinho de Roderick. Jorjen, como meu padrinho, fez o mesmo. Ambos se encontraram no meio do campo e começaram a conversar. Percebi os gestos enfáticos, ora concordando, ora discordando, enquanto negociavam os termos do duelo. Após alguns instantes, apertaram as mãos e se afastaram. Meu pai voltou até Roderick, enquanto Jorjen caminhava até mim para transmitir as regras acordadas.

    — Será um duelo até a morte — disse ele, com um tom grave que refletia o peso da situação. — Mas o vencedor terá a opção de conceder clemência ao derrotado. Como você sugeriu, as armas serão de escolha pessoal. Vale tudo. Não há limite de tempo, só termina com a derrota de um dos duelistas.

    Assenti em silêncio, determinado a derrotá-lo sem recorrer a condições que pudessem ser interpretadas como favorecimento.

    Jorjen se afastou e posicionou-se cerca de dez metros atrás de mim, segurando um lenço vermelho no alto. Do outro lado, meu pai fez o mesmo atrás de Roderick. A arena mergulhou em um silêncio sepulcral. Era o momento de nos preparar.

    Me concentrei em mim mesmo, afastando Roderick de meus pensamentos. Circulando minha mana, comecei a preparar meu corpo para o que estava por vir. Nesse momento inicial, qualquer feitiço era permitido, desde que não tivesse natureza ofensiva.

    Conjurei uma pequena esfera azul brilhante que começou a girar rapidamente ao meu redor. Murmúrios de surpresa cortaram o silêncio da arena. Todos reconheciam aquela magia: uma técnica defensiva de terceiro círculo, famosa por suas propriedades únicas. Em teoria, ela exigia uma runa complexa e intrincada, composta por três partes, algo inalcançável para alguém como eu, capaz de manipular apenas runas simples.

    Mas essa era uma adaptação. A versão original da magia criava três esferas protetoras, enquanto eu, graças ao aprendizado obtido com as lembranças de Mahteal, consegui decompor a magia em runas simples e conjurar apenas uma. Para os meus propósitos, isso bastava.

    Completei meu preparo com algumas magias de aprimoramento no corpo, sentindo a energia percorrer cada músculo e fibra. Assenti para Jorjen, que abaixou o lenço vermelho e ergueu um lenço verde, sinalizando que eu estava pronto. O lenço verde de Roderick já estava levantado, e ele partiu imediatamente em minha direção.

    Esperando por isso, movi-me com uma velocidade maior do que a esperada para alguém de terceiro círculo, mantendo distância enquanto conjurava magias para atrasá-lo e desgastá-lo. Jatos e lanças de areia saltavam do chão em sua direção, forçando-o a esquivar e bloquear. Seu ímpeto inicial foi contido, e aproveitei a oportunidade para conjurar duas chamas fantasma atrás dele. Eram feitiços básicos, com pouco dano direto, mas irritantes, já que perseguiam o alvo constantemente. Além disso, eu tinha uma surpresa reservada para aquelas chamas.

    Roderick continuava sua perseguição, claramente incomodado pelos truques com a areia. Ele estava acostumado a enfrentar especialistas corporais como ele, mas ter de lidar com um mago estava atrapalhando seu estilo mais do que eu imaginava. Quando notou minhas chamas fantasma, bufou, desdenhoso, e deixou que uma delas colidisse contra seu corpo.

    Foi então que sorri. No instante em que a chama fantasma o alcançou, alterei sua runa à distância, algo considerado impossível para a maioria. Era uma técnica que havia aprendido com Mahteal e treinado até a exaustão com Selune.

    A chama fantasma se transformou em uma bomba de fogo, e a explosão surpreendeu Roderick e todos os presentes na arena. O impacto foi violento, e o silêncio que se seguiu foi quase palpável. O que eu acabara de fazer seria motivo de meses de debates e discussões.

    Roderick se levantou, metade de seu corpo ainda fumegando. Sua roupa estava esburacada e enegrecida em vários pontos, enquanto marcas de queimaduras e arranhões cobriam sua pele. Apesar disso, ele parecia bem o suficiente para continuar, mas seu rosto estampava raiva e frustração. Era evidente que ele não esperava tanta resistência de minha parte.

    Minha outra chama fantasma fazia uma curva em sua direção, mas ele havia aprendido com o primeiro ataque. Não iria permitir que ela se aproximasse, o que era perfeito para mim, já que o obrigava a manter parte de sua atenção dividida.

    Conjurei outra chama fantasma, enquanto me mantinha em constante movimento. Continuava manipulando a areia da arena, que o atacava incessantemente com jatos e lanças, atrapalhando sua mobilidade e lhe infligindo pequenos ferimentos. Contudo, minhas reservas de mana já estavam quase na metade, e o desgaste começava a pesar.

    Com um grito furioso, carregado de frustração, Roderick saltou, se livrando das lanças de areia e das chamas fantasmas ao mesmo tempo. No ar, ele desferiu dois cortes em minha direção. Reconheci os ataques instantaneamente; eram os mesmos que havia visto através de Shade.

    Se eu não estivesse preparado, aquilo poderia ter encerrado a luta. Consegui desviar do primeiro corte, mas o segundo vinha diretamente em minha direção. Quando o ataque estava prestes a me atingir, a esfera brilhante que girava ao meu redor colidiu com ele, desviando-o para o chão. Um corte profundo se formou onde o ataque atingiu a areia, deixando claro o dano que poderia ter me causado.

    Senti minha mana sendo drenada com o impacto, e trinquei os dentes. Cada defesa custava caro, e eu sabia que não poderia manter aquele ritmo por muito tempo, mas ele também não.

    Percebi a frustração e o cansaço estampados em seus movimentos. Ele viria para o tudo ou nada, apostando nos seus ataques mais poderosos para me eliminar rapidamente. Um erro que eu não deixaria passar.

    Mais uma vez, ele tentou me atingir à distância, mas, ao desviar, fui surpreendido por um movimento inesperado. Deixando uma de minhas chamas modificadas explodir contra suas costas, ele usou o impacto para impulsionar seu corpo em minha direção. Sua expressão era de dor, frustração e, principalmente, raiva. Era uma jogada desesperada para se aproximar.
    Com sua espada preparada para o golpe final, percebi o mana recobrindo a lâmina. Seria um ataque fatal. Assim como ele, minhas reservas de energia estavam no limite.

    Posicionei-me para o embate, optando pelo que ninguém esperava. Saquei a espada presa à minha cintura, e a pequena esfera que me rodeava colidiu com a lâmina, revestindo-a com sua energia. Um feito que, mais tarde descreveriam como impossível em uma taverna qualquer.

    A espada de meu pai, empunhada por Roderick, encontrou minha lâmina. Coloquei meu treinamento à prova. Ele não previa meu movimento, e, aproveitando a abertura, com um giro no punho de minha espada, consegui desarmá-lo.

    Toda a arena parou, incluindo meu irmão, para assistir ao voo da espada de nosso pai. A lâmina escapou das mãos de Roderick, subiu em um arco elegante sobre nossas cabeças e pousou firme em minha mão esquerda. Ao mesmo tempo, minha mão direita já apontava a outra espada diretamente para sua garganta. Em um movimento fluido, cruzei as duas lâminas, uma sobre a outra, criando um efeito de tesoura.

    Quando seus olhos se desviaram do trajeto da espada e focaram nas lâminas pressionadas próximas ao seu pescoço, ele arregalou os olhos.

    — Me rend…

    — Você me daria a clemência? — perguntei. Então, com um gesto preciso e rápido, puxei ambas as espadas, fazendo um pequeno corte na lateral de seu pescoço, dos dois lados. O gesto era claro: sua vida estava em minhas mãos.

    As arquibancadas mais distantes, incapazes de perceber o detalhe sutil, explodiram em murmúrios e gritos, acreditando que o golpe havia sido fatal.
    — Aceito sua rendição — declarei, a voz firme e fria. Sem olhar para trás, virei-me e caminhei em direção aos meus amigos que me aguardavam.

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