Capítulo 61 - Ajuda
O topo do castelo, tomado pelo frio, servia como palco para um desafio inesperado.
Os grupos, exaustos e feridos, encontravam-se em um impasse: Kentaro havia sido derrotado, e mesmo com a chegada de novos integrantes, a situação permanecia instável. Rin Kurosawa, a autoproclamada última barreira do desafio, observava-os de cima, entediada ao ter de lidar com um jogo que, em sua cabeça, aparentava já levar como vencido.
Mayumi, pragmática, optava por esperar de joelhos os próximos passos, enquanto Kinyoku mantinha sua postura fria de inviabilidade à qualquer investida precipitada ao lado de Hikaru em sua meditação.
Nihara literalmente ardia, suas chamas soltavam-se em baforadas quentes a cada respiração pesada. Contudo, seus instintos ofensivos não davam continuidade, não havia intenção de golpe. Ele parecia ferido demais para confiar na própria força, uma ideia que seria ridícula para alguém tão convencido. Seu foco não saia da garota de cabelos e mãos tingidos de roxo, uma figura silenciosa e imóvel que não demonstrava qualquer nervosismo na frente de um Miyazaki enfurecido. Ela esperava, não só por ele, mas pelos outros colegas de classe, que naquele momento, eram seus inimigos.
— Tenho a impressão de que vocês vão demorar pra tomar uma iniciativa, então, irei esperar atrás do meu… “esconderijo” — disse Rin, enquanto caminhava para atrás do trono — me avisem quando tiverem vontade de voltar aos andares de baixo.
Entretanto, existiam aqueles cuja a índole sempre evitava intrigas ou qualquer atividade que pudesse causar dor. Estes em questão, talvez de forma irônica ou potencialmente punitiva, estavam no grupo de Nihara Miyazaki.
Sho foi até Akemi para averiguar sua situação, e sua irmã, Aruni, enfrentou a timidez e dirigiu-se a Nikko.
— Eh, Senhorita Ichikawa, o que está acontecendo aqui? O que a Kurosawa falou… é sério? E… o-o que aconteceu com esse garoto apoiado em você!?
— Ah, oi, Arunizinha! Pelo visto realmente teremos que enfrentar aquela menina para podermos salvar a Kyozinha. Sobre o Minoru, ele tá-
Outro problema surgiu, o ferido fraquejou: após um gemido, seus joelhos dobraram e o corpo empalideceu.
— Suzumura?! — A que o ainda apoiava se alarmou e o segurou com mais força.
A batalha que ainda nem havia começado entrou em uma encruzilhada desesperadora.
— Eu… estou sem forças… — Minoru nem tinha energia para falar direito.
Aruni apertou o coração. — Senhorita Ichikawa, o que ele tem?!
O jeito divertido de ser que sempre acompanhava Nikko, não estava mais ali. — Não, não, ele está perdendo a consciência… Ruivinha! Você sabe o que é isso!?
Mayumi, meditativa, sequer abriu os olhos. — Como avisei, o efeito da minha aura está passando.
— Então faz de novo! Usa sua aura de sangue!
— Infelizmente, não posso — a calmaria continuava alheia da desorientação no pedido feito — se eu usar mais, meu sangue pode se tornar um corpo estranho para ele. Isso pode trazer complicações piores. Ele precisa de um médico de verdade.
— … Argh, quem disse que o mundo ainda precisa contar com samurais… — o sussurro sufocado aumentou a preocupação. “Alguém precisa ajudá-lo, ele não pode continuar assim! Eu queria ter habilidades médicas, mas como uma lutadora de uma família das montanhas, não posso salvar alguém em estado tão grave. Nem todo dinheiro do mundo poderia salvar uma vida em riscos tão complexos. Só que eu não posso desistir dele!” Nikko mordeu os dentes de ansiedade, esperando qualquer coisa indicar vestígios de esperança enquanto o chão frio roubava o calor que resistia no corpo. — Aguenta firme, Minoru! Vamos arrumar um jeito de te ajudar!
Mas o que podia ser feito ali, no meio daquele tão chamado “inferno congelado”?
A alternativa correta poderia ser os médicos da instituição, porém, pelo olhar cético de Hisako, nada seria paralisado até que alguém desvendasse o desfecho do desafio.
A solução precisava estar em um dos alunos…
Aruni, apesar do tremor visível em suas mãos, aproximou-se e ajoelhou-se perto do problema. Quando as ataduras improvisadas amarradas no torso de Minoru foram examinadas, algo dentro da garota se firmou. — Senhorita Ichikawa, por gentileza, sente-o e tire este pano do peito dele — sua voz não era receosa — eu vou tentar ajudar.
Nikko surpreendeu-se com a mudança de agir da outra, mas não reclamou. Ela se deixou cair ao lado do companheiro, e cuidadosamente, puxou-o para si, apoiando suas costas contra o próprio peito. Seus dedos firmes desataram o tecido encharcado de sangue.
As pálpebras de Minoru tremularam. Sua respiração se tornava mais lenta.
Aruni abriu ainda mais os olhos quando finalmente viu o ferimento. “Ele foi perfurado no coração? Não, nenhum ponto vital foi acertado, se não ele não estaria aqui. Mas… será que eu posso?” Por um momento, a velha insegurança ameaçou tomar conta, porém, não era momento para desconcentrações: uma solução precisava ser achada, e rápido.
A tímida lutava contra o medo que insistia em rastejar por sua mente. Ela podia não aparentar ser uma combatente nata, podia ser frágil comparada aos outros, entretanto, sabia de uma coisa: ela não queria deixar Minoru morrer ali. — Eu consigo!
— Tem certeza disso, Arunizinha? — perguntou Nikko, sua preocupação era evidente.
Aruni estendeu as mãos sobre o peito ensanguentado de Minoru e inspirou fundo para afastar a sombra da hesitação. “Eu posso fazer isso nessas condições… Sim, eu posso!” Seu coração acelerado ameaçava atrapalhar a concentração, mas ela se forçou a manter a calma, mesmo que o tempo não estivesse a seu favor.
Minoru resfolegou e seus olhos se tornaram apenas fendas turvas. Nikko, ainda o segurando, foi tomada pela impaciência.
— Aruni…
— Só mais um instante! — A jovem concentrada soou mais firme do que esperava.
Sorrateiramente, um brilho tênue começou a cintilar na palma de sua mão. Primeiro foi um rosa pálido, como pétalas em um amanhecer, depois, pequenos pontos brancos surgiram, como vaga-lumes presos em uma brisa leve.
Nikko arregalou os olhos. “Essa… é a aura dela? Que lindo… é mesmo cura? Que injusto… Eu também queria poder ajudar assim!” Ela balançou a cabeça. “Não, Nikko, não é hora pra isso! O que importa é que isso funcione!”
O ferimento de Minoru, ainda visível entre as roupas rasgadas, pareceu reagir ao toque brilhante de Aruni. A carne dilacerada pulsou, e com uma lentidão quase mágica, começou a se unir.
Aruni forçou as sobrancelhas, o suor que escorria por sua testa era o tremor de seu corpo com o esforço. “Vamos, feche, por favor…” Ela colocou mais força na aura, e então, diante dos olhos perplexos de Nikko, a ferida se fechou por completo.
A respiração de Minoru passou a ter um ritmo tranquilo.
Aruni ofegou quando puxou a mão de volta e a passou pela testa. O suor foi varrido, e no lugar, o alívio nasceu. — Consegui… — Seus olhos subiram até Nikko, que ainda permanecia incrédula pelo novo estado do garoto apoiado contra o próprio peito. Não sobrou sequer uma cicatriz.
— Suzumura… — chamou Aruni, receosa — como se sente?
Repousando, Minoru moveu os lábios. — Hmmm… sério, me sinto ótimo! — Embora relaxado, um belo sorriso se abriu em seu rosto. — Tipo… além de não sentir mais dores, sinto-me como se eu estivesse com um puff gigante atrás da cabeça…
— … Pera aí… — Nikko perdeu sua alegria para o rubor nas bochechas. — O que acha que tá dizendo, ô, garoto!? — Sem pensar, ela se levantou bruscamente.
— O-opa! — Minoru arregalou os olhos ao sentir a falta de apoio, mas conseguiu se segurar no próprio reflexo. — Coé, isso é jeito de tratar um homem que acabou de escapar da morte?
— Me poupe! Eu te carreguei esse tempo todo preocupada e você dá uma dessa?!
— Tá bom, tá bom, foi mal… — o rapaz levantou-se, e sorridente, amparou uma mão nos ombros da aliada irritada. — Valeu pelo suporte.
Nikko cruzou os braços e desviou o olhar. — Hum…
— Pessoal… — chamou Aruni — devemos mesmo enfrentar uma aluna agora?
Animado, Minoru bateu os punhos e olhou para Nihara, a fúria em chamas. — Rá! Não sei como eu posso servir sem poder usar a minha aura, mas com certeza eu estou pronto para ajudar aquele ali a acabar com essa palhaçada!
— Ele com certeza não vai querer a sua ajuda.
— Ué? Quem disse isso? — O recém-curado procurou pela voz serena até encontrar Teruo Kenzo, que ajeitando seus óculos especiais, também observava o ígneo.
— Se tem algo que aprendi nessa jornada, é que um Miyazaki jamais precisa de ajuda para sobreviver e evoluir. São mais fortes, mais rápidos, e altamente inteligentes… Ou pelo menos é isso o que o ilustre Nihara Miyazaki insiste em acreditar.
— Haha, a passagem de vocês deve ter sido interessante — ironizou Minoru.
— Ah, se foi. Inclusive ele ama me escutar — em seguida, Teruo levantou a voz — e então, caro Miyazaki, meus deperecimentos já não tem chances de surtir efeito em você sem me causar efeitos colaterais. Está ferido e incapacitado de lutar sozinho. Vai aceitar o auxílio de seus companheiros, ou continuará se enxergando como um lobo solitário?
— Cala a boca…
— Vejamos, parece que você reaprendeu a falar.
Nihara virou-se e caminhou bravamente, expelindo chamas até parar na frente de Teruo. — Eu já disse pra ficar calado — a acidez em sua voz era a de alguém farto a ponto de nem conseguir mais gritar — como eu imaginei, você e essa dupla de palermas seriam inúteis para derrotar todos aqueles monstros e obstáculos ridículos. Vocês deveriam me agradecer por ter aniquilado tudo e carregado vocês até então.
Teruo mantinha-se inexpressivo. — Fomos inúteis porque sua brilhante estratégia consistiu em nos relegar ao papel de espectadores enquanto você era derrubado por estruturas de gelo até por algum milagre notar os pontos fracos que eu identificava desde o primeiro instante. Se tivesse a humildade de ouvir as minhas observações e principalmente aceitar as minhas habilidades de deperecimentos, já teríamos resolvido isso há muito tempo.
Nihara mordeu os dentes, ser um egocêntrico e receber tantas verdades contra as suas decisões era difícil de engolir.
Aruni notou o clima quente e tentou esfriar os ânimos. — S-Senhor Miyazaki, se os métodos do Senhor Kenzo não forem do seu agrado, eu posso tentar te ajudar. E-eu prometo que não será doloroso e nem estranh-
Ffu-wooff! — EU NÃO PRECISO DE AJUDA!!! — Labaredas explodiram, um dedo indicador sobrava para todos os lados. — Eu não preciso de você, nem de tu, e nem daquela ali! NÃO PRECISO DE NINGUÉM AQUI!!! — Ele deu meia volta e preparou um salto. — VOCÊS IRÃO VER, DAREI UM FIM NISSO AGORA!!! — Wooff! Impulsionado pelas chamas, seu corpo começou a voar pelos ares em direção ao trono…
— Credo — expressava-se Nikko ao rapaz do lado — por que será que aquele garoto é sempre assim? Como consegue ficar perto dele?
— Uma longa história — respondeu Minoru, observando o fogo nos ares. — Apenas entenda que certas cobranças são tão pesadas que nos fazem agir como um touro cego em uma busca desesperada pelo objetivo, mesmo que o percurso seja num campo minado…
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