Índice de Capítulo

    Dica para leitura: aspas simples são para pensamentos internos, que é esse símbolo: ’
    Aspas duplas para conversa mental: “
    Travessão para falas em voz alta: —

    Parado enquanto observava, ele sentiu uma inveja profunda. Aquelas criaturas, apesar de odiadas e caçadas sem piedade, tinham algo que ele não tinha. Eles riam, se divertiam, se pareciam e comiam juntos, como uma família, em total contraste com a sua própria solidão, que apesar de rodeado por uma familia calorosa, se sentia solitário.

    As lágrimas turvaram sua visão. Ele estava chorando, sozinho, na escuridão, enquanto os goblins, mesmo sendo “monstros”, encontravam conforto uns nos outros. O peso de sua própria solidão o atingiu. 

    Como poderia se sentir parte de uma família da qual ele era tão diferente? Não compartilhava a mesma cor de seus cabelos ou a dos olhos. E, pior ainda, não conseguia ter a ferocidade de um predador, a brutalidade que a floresta exigia. 

    Ele era fraco demais para matar, hesitando diante de seres que, apesar de feios e miseráveis, pareciam ter encontrado a felicidade e pertencimento que ele tanto buscava.

    Ele se perguntou se seus pais e irmãos o viam de forma diferente por causa de seus cabelos e olhos, distintos dos da família. Seu corpo, apesar de ser consideravelmente forte, era esguio e sem músculos, o que o diferenciava do físico robusto de Flügel e Mael. 

    A dúvida sobre se estavam preocupados com seu sumiço o invadiu. Ele imaginou se Flügel iria ou não atrás dele, procurando por ele dentro e fora do reino, adentrando a floresta e batalhando contra os monstros que a habitavam como um verdadeiro herói.

    A fraqueza o consumiu. A vergonha de sua própria covardia era um fardo mais pesado que o medo da floresta. Enquanto as lágrimas escorriam por seu rosto, ele fez um movimento sutil, um pequeno passo para trás na tentativa de se afastar, de sumir na escuridão e se livrar do dilema que o atormentava. 

    Foi nesse pequeno movimento que a sola de sua bota encontrou uma raiz exposta. O som de galhos secos se partindo sob seu peso ecoou na quietude da noite.

    As risadas dos goblins cessaram abruptamente. O silêncio que se seguiu foi ensurdecedor. As três criaturas se viraram em uníssono, com os olhos atentos fixos no ponto de onde o som veio. O goblin mais velho, com a lança em riste, soltou um grunhido gutural. 

    Não era um som de aviso, mas de ataque. Ele avançou sem hesitar, sua lança feita de galho apontada para o coração de Elijah. A luta por sua vida estava prestes a começar, e não havia nada de heroico nela.

    Elijah tentou conjurar um feitiço. Ele abriu a boca para recitar a primeira palavra, mas sua garganta estava seca e contraída de pânico. As palavras não saíram. Sua mente, um labirinto de teoria e conhecimento, se tornou uma tela em branco diante do perigo real. 

    Ele se esqueceu de cada lição de esgrima, de cada postura, e principalmente, das palavras corretas para até mesmo uma simples bola de fogo. 

    O tempo parecia se estender, mas o avanço do goblin era rápido, e não lhe dava o luxo de se acalmar para encontrar as palavras. Ele se lembrou da fluidez de seu irmão, Flügel, que era capaz de conjurar feitiços sem palavras, e a sua incapacidade de fazer o mesmo o entristeceu ainda mais.

    Sua espada de madeira não era mais a simulação de uma arma, ferramenta de aprendizado para técnicas e balanços precisos, mas sim um porrete improvisado. 

    O impacto contra o corpo do goblin soou grotesco, um baque surdo que precedeu um grito lancinante de dor, muito distante da nobreza que ele imaginara para um combate. Os outros dois goblins reagiram com fúria selvagem, seus dentes pontiagudos reluzindo na escuridão.

    Um deles saltou sobre Elijah, garras e dentes tentando arrancar um pedaço de sua carne, enquanto o outro o atacava pelas pernas. A luta foi um caos de gritos, grunhidos e golpes desesperados. 

    Elijah se defendia instintivamente, o pânico e o horror do que estava fazendo se misturando em sua mente. Ele sentiu o peso de cada golpe de sua espada, e a dor de cada mordida e arranhão. Os gritos dos goblins não eram mais de fúria, mas de medo e desespero, uma dor patética que rasgava a escuridão da noite.

    Elijah golpeou, desviou e golpeou novamente, um ataque atrás do outro, cada movimento uma luta desesperada para não ser o próximo a cair. A vida se esvaiu dos olhos pretos um por um.

    Quando o último corpo caiu, o silêncio retornou. O cheiro de carne queimada e musgo foi substituído por um odor ferroso de sangue e suor. Elijah estava ofegante, as mãos tremendo, o suor escorrendo pela testa. Ele olhou para os corpos inertes e, no lugar da glória que esperava, sentiu apenas nojo. 

    O brilho do acampamento, a alegria inocente, tudo foi apagado. Os rostos dos goblins, outrora felizes, estavam agora contorcidos em uma agonia terrível. O de pele mais clara não se movia, mas os grunhidos dos outros dois cortavam o silêncio, especialmente o do goblin mais velho, cujo olhar carregava uma raiva e um sofrimento profundos. 

    Eles só queriam um momento de paz, e Elijah, com sua chegada, trouxe não apenas a dor, mas a morte de um deles.

    O grunhido baixo e rasgado do goblin mais velho era um som que perseguiria Elijah para sempre, a prova viva do monstro que ele havia se tornado. O medo o paralisou por um instante, o corpo sujo e exausto recusando-se a obedecer. No entanto, ele sabia que não havia escolha. 

    Aqueles goblins feridos, banhados na luz da fogueira, ainda tinham a força do ódio em seus olhares. Um único passo em falso, e sua própria vida seria o preço de sua hesitação.Elijah, com o estômago revirado, se moveu lentamente.

    Ele ergueu a espada de madeira, o peso agora parecendo o de uma âncora de ferro. Não havia mais raiva ou adrenalina, apenas uma necessidade fria e brutal. 

    Ele caminhou em direção aos dois goblins que ainda se contorciam no chão, movido por uma necessidade fria e brutal. Ele se agachou sobre o mais gordo e, com um único e rápido golpe na cabeça, acabou com seu sofrimento.

    Ele se levantou, cambaleando com a exaustão, e encarou o goblin mais velho, que o encarava com ódio puro. O porrete desceu sobre sua cabeça, não uma, mas três vezes. O primeiro baque foi seco, seguido por dois outros golpes abafados, até que o ódio nos olhos do goblin finalmente se apagou. 

    Um gemido baixo e rasgado foi a única resposta, e o silêncio final se instalou. Ele sentiu o horror e a perda de cada gota de sangue derramado.

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