Índice de Capítulo

    Dica para leitura: aspas simples são para pensamentos internos, que é esse símbolo: ’
    Aspas duplas para conversa mental: “
    Travessão para falas em voz alta: —

    Suas mãos suavam enquanto o vento fazia seus cabelos esvoaçarem, o corpo estava leve, a magia atuando sobre a gravidade. Músculos tensos e a preocupação martelando sua mente, a ansiedade o deixando impaciente. 

    A floresta era o último lugar que faltava ele procurar, certo? Tinha que ser. Mas era como procurar uma agulha em um monte de feno: como encontraria uma criança sob aquelas densas copas de árvores?

    O medo se instalara em seu peito. Pensamentos sobre o pior cenário rondavam sua mente como urubus sobrevoando um animal moribundo.

    “Estamos longe demais, não acho que ele tenha vindo tão longe… ainda mais sendo uma criança. Ele não conseguiria se mover tão rápido pela floresta. Acalme-se, ele está bem, Flügel.” Nytheris tentou acalmar sua mente acelerada.

    Flügel parou seus inúmeros pensamentos e refletiu um pouco. Era verdade. A floresta era densa e difícil de se mover nela. O mais lógico seria pensar que Elijah não teria se movido muito depois de ter adentrado a floresta. O único problema era que a área de busca era gigantesca, e encontrar uma única pessoa era incrivelmente difícil.

    Flügel parou no ar, o olhar varrendo toda a extensão de árvores à sua frente e, ao longe, a cadeia de montanhas. Era perigoso. O Lich poderia atacá-lo durante a busca. Ele não seria capaz de fazer muito contra todo o exército dele, e contra o próprio Lich sozinho.

    No entanto, a preocupação que apertava seu peito era pior do que correr esse risco. O medo de que aqueles olhos ingênuos de Elijah fossem manchados por horror, medo ou até mesmo ficassem sem vida… Era o que o fazia se mover sem pensar muito nas consequências.

    A escuridão da noite era total, e a lua, escondida por uma grossa camada de nuvens, não oferecia sequer um vislumbre de luz. O breu da floresta se tornou mais assustador. O som da vida selvagem parecia mais alto e mais próximo. 

    A falta de luz transformava a busca em algo quase impossível, e cada minuto que passava sem encontrar uma pista, o desespero aumentava. A certeza de que seu irmão estava em apuros apertava seu peito. A escuridão era uma tela em branco para todos os seus piores temores.

    Ele decidiu voltar algumas centenas de metros, desceu e aterrissou na terra úmida. Faria o caminho a pé por enquanto.


     

    A floresta se fechou sobre ele, e a escuridão se tornou absoluta. Olhou para as mãos, agora visíveis à fraca luz da fogueira, e as viu manchadas de respingo de sangue, a pele suja de lama. Uma lágrima escorreu por seu rosto, e o choro que havia paralisado antes voltou à tona com a força de uma tempestade.

    Ele sentiu o peso do que havia feito e se arrastou até o tronco de uma árvore. 

    Sua camiseta estava rasgada, e o corte profundo no braço, feito pelas garras de um dos goblins, doía e ardia. Encolheu-se em uma posição fetal, o corpo tremendo de uma exaustão que parecia ir além do físico. As lágrimas que escorriam agora eram de pura tristeza. Chorou pelo que havia feito, pelas vidas que havia tirado e pela inocência que havia perdido.

    O mundo que ele imaginou, cheio de honra e glória, era uma mentira. Não havia cavaleiros de armadura brilhante, apenas assassinos desesperados. 

    Matavam pela glória de vencer uma batalha, pelo dinheiro ou até mesmo pela diversão. Mas não havia mais motivos para que ele desejasse aquilo. Ele havia matado apenas por medo; com receio de ser morto, foi obrigado a tirar a vida daqueles goblins que, ao contrário dele, matavam por prazer.

    A dor que sentia não era física, mas a dor da alma, uma dor de ter feito algo que nunca imaginou ser capaz. Ele não tinha mais medo da vida selvagem, mas tinha medo de si mesmo.

    Com a mente turva, fitou o “acampamento”, se é que uma simples fogueira era suficiente para chamar aquilo de acampamento. 

    O fogo, que antes simbolizava lar e alegria para os goblins, agora era apenas a única luz a iluminar um palco de morte e desespero. O cheiro de carne queimada, outrora um aroma reconfortante para aquelas criaturas, transformara-se no fétido odor de cadáveres.

    Levantou-se, cambaleante, sentindo cada centímetro do corpo doer e ainda escutando o grito de dor e raiva em seus ouvidos. Não sentia fome ou sede, apenas a necessidade de se afastar daquele lugar. Precisava de ar fresco, de um lugar para enterrar o que havia feito. A mochila parecia ter ficado vinte vezes mais pesada.

    Ele pegou o pedaço de carne que um dos goblins estava comendo, uma ação nojenta, já que a carne estava suja e quase queimada, mas necessária para garantir sua sobrevivência. 

    E, com a espada de madeira em uma mão, moveu-se para a escuridão, para um destino incerto, esperando conseguir sair perto do muro que cercava Tournand ou até mesmo diretamente em um dos portões.

    Ele era um gênio, mas a única coisa que sabia de verdade agora era que o mundo era implacável e que o preço da vida era a perda da sua própria alma. A ambição de se tornar mais forte e ser digno de uma família se transformou em um trauma profundo.

    Após ter conseguido se acalmar depois de uma longa caminhada e se curar com magia de cura, sua mente estava ficando mais clara. Ele estava conseguindo montar um plano para sair vivo da floresta, sem precisar matar mais monstros. Procurava uma boa árvore para escalar, com a orbe de luz pairando ao seu lado, ajudando-o a enxergar.

    — Cabelos cinzas… Qual o seu nome, garotinho? — Uma voz estranha ecoou na floresta, parecendo ter muitas pessoas falando ao mesmo tempo.

    Elijah quase soltou um grito, mas conseguiu abafar o som com a mão. Parou de procurar pela árvore e olhou em volta. A orbe de luz tremulava como se também estivesse assustada. O som vinha de todos os lados, a voz era estranha, e o coração dele saltou no peito.

    Elijah engoliu em seco, o som áspero ecoando em seus ouvidos. A voz da criatura, um coro arrepiante, o paralisava. Ele tentou responder, mas as palavras ficaram presas na garganta. Sua voz, quando finalmente saiu, foi apenas um sussurro frágil.

    — E-Elijah… Aurion… Handels. 

    Ele se encolheu, temendo que a criatura não o tivesse ouvido. O silêncio que se seguiu pareceu uma eternidade, preenchido apenas pelo farfalhar das folhas e pelo bater descontrolado de seu coração.

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