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    Ross abriu a porta do CSR e desceu junto de Celina e Haron.

    O ar naquele lugar parecia diferente, denso, pesado, quase vivo.

    Quando seus pés tocaram o solo branco e frio do esconderijo subterrâneo, a Toca de Ferro, um arrepio atravessou sua espinha. Não era medo. Era algo mais antigo e instintivo, uma reação do corpo diante de algo que o cérebro ainda tentava compreender.

    À frente deles, na fronteira entre o luxo e a podridão, estava o homem que muitos chamavam de lenda, outros de maldição.

    O Traficante de Verdades.

    Alto, de postura serena e expressão insondável, Blando parecia mover o ar ao redor sem sequer se mexer.

    Os cabelos castanho-acinzentados caíam com natural elegância, presos parcialmente atrás da nuca. A barba curta, meticulosamente aparada, conferia-lhe um ar de nobre decadente. Mas eram seus olhos que chamavam mais a atenção: um negro como breu, o outro branco leitoso, ambos vivos, ambos atentos, ambos julgando.

    O manto que vestia tinha costuras prateadas que formavam desenhos sutis, quase rúnicos, refletindo a luz com um brilho frio.

    No peito, pendia um medalhão rachado de Lyberion, lembrança de um juramento quebrado.

    E no dedo, um anel com uma rosa de espinhos aberta para dentro. Ross reconhecia aquilo, era um dos maiores símbolos de poder em Ossuia, o anel que era dado a alguém quando ela chegasse ao Conselho do Imperador. O que não podia ser verdade já que o homem era o mais procurado do continente. Ele ter aquilo só mostrava o nível que ele era capaz de infiltrar e obter qualquer informação ou objeto que desejasse.

    Ross sentiu, pela primeira vez, o que era estar diante de alguém que não emanava apenas força ou poder físico, mas algo muito mais profundo: a própria definição de aura. Havia em Blando uma autoridade silenciosa, uma energia que dobrava o ar ao redor.

    Não era o tipo de poder que destrói, mas o que cala apenas no ato de existir em sua presença. E Ross, instintivamente, soube: aquele homem era poderoso. Ele era perigoso.

    A voz de Blando, rompeu o silêncio novamente:

    — Me acompanhem. — A voz era suave, mas mesmo assim, intimidadora.

    A porta por trás dele se abriu, revelando uma escadaria em “Z” que descia ainda mais para o subsolo e em seu final dava a passagem para uma grandioso e monumental ponte suspensa.

    Blando guiou-os pela ponte suspensa com passos leves, como quem atravessa a sala de sua própria casa. A passarela gradeada rangia pouco sob o peso do grupo, os metais tratados com técnica moderna, sustentavam trilhos e cabos que cruzavam um espaço vasto o suficiente para abrigar uma cidade inteira. Abaixo, setores industriais e galpões subterrâneos se estendiam em camadas: forjas, bancos de condensadores azuis, bancos de peças mecânicas empilhadas em blocos regulares e esteiras que vomitavam estruturas metálicas semiacabadas. Tubos de vidro lotados de um fluido luminescente serpenteavam como veias pela instalação.

    Ross olhava sem disfarçar a surpresa e o reconhecimento. Cada conjunto de maquinários, cada painel de controle, tinha a mesma lógica, às vezes até um passo à frente, do que ele lembrava do Departamento de Pesquisa e Estratégia da Cidade de Ferro. Havia ali soluções que o DPE ainda guardava como segredo; e havia, também, ideias que pareciam ter nascido justamente para supera-las. Não era apenas tecnologia: era uma engenharia de pensamento, uma arquitetura de invenção que não aceitava fronteiras.

    — Impressionante — murmurou Ross, incapaz de esconder a admiração. — Vocês têm níveis aqui que… se não superam o DPE, pelo menos rivalizam com as melhores iniciativas deles.

    Blando esboçou um sorriso sem humor, sem orgulho, o tipo de sorriso de quem não conseguia comemorar as conquistas do presente, apenas focar em qual seria a próxima.

    — Eu sempre disse que os poderosos desperdiçam mentes. — respondeu, a voz calma, precisa, mas com um leve fio de escárnio. — Há os que se recusam a trabalhar sob correntes… e há os que preferem forjar correntes mais elegantes. Aqui, meus Vagalumes de Ferro constroem soluções para quem não aceita pedir permissão. Tudo em nome da verdadeira batalha que se aproxima.

    — Vagalumes de Ferro… — repetiu Ross, intrigado. — Um nome interessante. Sempre quis saber o que significa.

    Blando olhou para o vazio por um instante, como quem saboreia a lembrança de uma ideia antiga.

    — Ah, os vagalumes… — começou, num tom quase professoral. — Insetos que voavam como pequenas vespas e produziam luz própria. Foram extintos há séculos, muito antes da raça humana se libertar da escravidão. Alguns acreditam que nunca existiram, que não passam de lendas. Fascinante, não acha? Um ser que brilha sozinho, sem magia… apenas por natureza. — Ele fez uma breve pausa, o olhar agora fixo em Ross. — É isso que meus Vagalumes de Ferro são. Luzes que não precisam de feitiço para brilhar. E, se tiverem magia… brilharão mais que qualquer um, pelo nosso propósito.

    O sorriso voltou, quase imperceptível.

    — Nem os dragnaros, nem os elfos… nem mesmo os anões conseguirão extinguir esses vagalumes que eu criei.

    O silêncio reinou por um breve momento após as falas de Blando. Celina manteve-se na retaguarda, os olhos cortando as costas de Ross, medindo sua expressão corporal, pronta para ser rápida e letal se fosse necessário.

    Haron, ao seu lado, não escondia o brilho nos olhos, a sede por máquinas novas era quase infantil. O lugar despertava nele um misto de cobiça e pertencimento, não importava quantas vezes ele o visitava.

    Blando parou ao lado de uma seção onde alguns homens e mulheres realizavam inspeções em equipamentos defeituosos. A sua frente uma porta de ferro maciço com mais de vinte centímetros de espessura  chumbados na rocha se encontrava. Ele olhou para o mais novo convidado antes de começar:

    — Fiquei feliz em saber que considerou e aceitou minha proposta, Ross. — A afirmação soou mais observação do que cumprimento.

    Ross desviou o olhar por um instante, um gesto mínimo. Quando voltou a encarar Blando, a expressão já estava calculada.

    — Acredito na sua luta — disse ele, com voz firme, por baixo do capacete de soldado que ainda lhe vinha por costume. — Nos ideais que me mostrou naquele dia… Só isso.

    Houve uma pausa. Blando estudou Ross como quem verifica um mecanismo antes de dar corda.

    — Farei o que for preciso para deter os verdadeiros inimigos. — completou Ross, colocando na voz o peso de quem já tomara uma decisão.

    Blando assentiu, um movimento quase imperceptível, como se fechasse um acordo selado por olhares em vez de papel.

    — Ótimo. — A resposta foi simples, quase fria. — Então você já sabe o preço caso passe por essa porta a minha a frente.

    — Minha espada será sua. — Ross respondeu firme, sem hesitar.

    Blando soltou um riso breve, desprovido de humor, antes que o olhar lhe escurecesse, sombrio, quase demoníaco, como o de um demônio à beira de selar um pacto com alguém disposto a vender a própria alma.

    — Disso eu não tenho dúvidas, de um jeito ou de outro, sua lâmina vai me servir.

    Com um estalo, a porta se abriu.

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