Capítulo 183 — Pilar da Força I

— Corrigir? — Morgan se pôs de pé diante de Celsio Fahrenheit. — Um desertor não pode corrigir ninguém, mestre. — A última palavra foi cuspida com deboche.

O semblante de Celsio vacilou por um momento, migrando de incredulidade pelas palavras a uma raiva contida.

— Desertor?!  —  Celsio avançou violentamente — Você ficou maluco de atribuir tal palavra a minha pessoa, seu moleque?!

Morgan também avançou contra ele, de frente.

A espada gigante de Celsio arrastava a ponta no chão enquanto ele a empunhava com apenas uma mão, e quando ele a balançou em direção a Morgan fogo subiu do chão, em direção ao IronFist.

Morgan sabia que não podia sequer sonhar em parar um golpe sério de Celsio, mesmo com seu ARGUEM. Usou então a velocidade: gingou as pernas, fingiu avançar pela direita e, no instante em que o alvo foi definido, mudou bruscamente para a esquerda.

O golpe de Celsio passou em branco e Morgan aproveitou o momento de desequilíbrio dele para atacar com seu punho esquerdo a face do antigo professor.

Mas Celsio não havia caído no jogo de pernas de Morgan. Não, ele o havia ensinado a fazer aquele tipo de movimento. Então, com o peso da própria espada que havia atacado em branco ele girou pelo próprio eixo e escapou do golpe de Morgan já contra-atacando com um chute poderoso que atingiu o quadril de Morgan. A força do golpe o arremessou para o lado.

Morgan rolou pelo solo quente antes de cravar o punho no chão e se forçar a ficar de pé. O impacto ainda vibrava em seu quadril, e o ar lhe faltou por um breve instante.

A lava ao redor deles borbulhava com mais violência, como se reagisse ao choque dos golpes. O eco da última troca ainda ressoava, misturado ao som áspero da respiração de Morgan.

Celsio não avançou.

Ele apenas o observava, a espada baixa, o corpo firme, como se estivesse medindo algo além da força bruta.

O silêncio que se formou foi mais opressor que qualquer ataque.

— Levante direito, Morgan. — disse Celsio, por fim. — Não aceitarei ofensas sem fundamento como essa. Se vai me chamar de desertor… então ao menos fique de pé quando o fizer.

— E o que mais você seria?! — A fala veio levemente alterada, como um desabafo. — Abandonou seu posto de Pilar da Força de Ossuia assim que descobrimos sobre os navios ancorados no Mar de Monstros. Desertor seria elogio. Você não passa de um covarde!

Celsio não aceitou aquelas palavras. Seus dedos se fecharam com força no cabo da espada, o metal rangendo sob a pressão.

— É isso o que você acha? Que eu reneguei minha posição por medo das outras raças? Treinou comigo tantos anos e não aprendeu absolutamente nada sobre mim?

O rosto de Morgan era uma máscara amargurada quando ele respondeu:

— Aprendi várias coisas sobre você. Eu te admirava mesmo você deixando claro que só me treinou por ordem da Imperatriz, que nunca havia desejado um aprendiz e nem gostava da ideia. Mas mesmo assim… Você foi a primeira imagem de um pai que eu tive. E você manchou essa imagem se acovardando!

O silêncio que se seguiu às palavras de Morgan durou menos que um piscar de olhos.

O IronFist avançou.

Não houve conjuração. Não houve aviso.

A mana simplesmente explodiu de dentro dele.

O ARGUEM de Morgan irrompeu em azul intenso, pulsando de forma irregular, violenta, como se estivesse sendo forçado além do que suportava. Seus pés esmagaram o solo enquanto ele avançava sem qualquer técnica refinada, apenas força, ódio e tudo que havia guardado por anos.

— ARGH! — o urro de fúria era tudo que ele podia entoar naquele momento.

O primeiro soco veio de baixo para cima, rasgando o ar e explodindo em energia

Celsio reagiu por instinto, erguendo a lâmina no último instante. O impacto gerou um clarão azul e vermelho tão intenso que a arena pareceu pulsar. A espada foi empurrada vários metros para trás, e pela primeira vez os pés do antigo Pilar recuaram um passo, abrindo sulcos incandescentes na rocha.

Morgan não parou.

Ele não podia parar.

Veio o segundo golpe.

E o terceiro.

E o quarto.

Ataques desordenados, brutais, cada um acompanhado por explosões de mana azul que colidiam com o calor da espada de Celsio, fazendo a lava ao redor subir em ondas violentas.

Celsio contra-atacou.

A lâmina formou um arco horizontal, liberando uma rajada de calor capaz de derreter aço, mas Morgan atravessou o ataque à força, a pele dos braços queimando, a armadura redirecionando os danos para outras partes do corpo, os Demolidores rangendo sob o impacto.

O soco que veio em seguida não acertou em cheio, mas obrigou Celsio a recuar mais um passo.

A expressão do ex-Pilar mudou.

Não havia mais correção em seus olhos.

Nem ensino.

Apenas atenção absoluta.

— …Então é isso. — murmurou Celsio, cravando a espada no chão para conter o avanço seguinte. — Você está lutando com o coração em chamas… mesmo que isso te cegue.

— Eu vou te derrotar aqui e agora, e mostrarei para a imperatriz que posso ocupar a vaga que você deixou vazia e limparei a desonra desse título.

Morgan avançou novamente, os olhos tomados por um brilho azul instável.

E, por alguns instantes perigosos, Celsio Fahrenheit foi forçado a apenas se defender.

— Mas não pense que fúria cega vai te colocar acima de mim.

Celsio interceptou o avanço seguinte com precisão absoluta, usando a lâmina para desviar os golpes de Morgan e, com um único movimento firme, forçá-lo para trás.

Sem pressa, o antigo Pilar levou a mão ao ombro e retirou a veste de peles que cobria seu peitoral largo e definido, deixando o calor da arena tocar sua pele.

— Você sequer sabe o que significa ser o Pilar da Força?

Então, algo fora da lógica daquele lugar começou a acontecer.

A lâmina de duas cores da espada de Celsio vibrou levemente antes de mudar. O vermelho incandescente recuou, como fogo sendo sufocado, enquanto um azul profundo e denso tomava seu lugar.

O ar estalou.

E, contra toda expectativa, a temperatura começou a cair.