O sol nascia preguiçosamente sobre as torres de Lyberion, lançando um brilho dourado sobre o palácio. O grande dia do despertar de Cassian finalmente havia chegado. A ansiedade e a expectativa permeavam o ar enquanto o jovem príncipe se preparava para a cerimônia que roubaria seu destino.

    Cassian acordou cedo, seus pensamentos um turbilhão de ansiedade e nervosismo. Ele vestiu suas roupas cerimoniais, um manto prateado que representava as cores de Lyberion. No peito, destacava-se a figura de um leonzir, o animal símbolo de Lyberion. O leonzir, uma criatura majestosa com a face, patas dianteiras e juba de leão, patas traseiras e cauda de águia, e um par de asas imponentes nas costas, era um símbolo de força e nobreza.

    Helick entrou no quarto, também trajando roupas cerimoniais, mas em um tom azulado, sua cor característica. Seus olhos brilhavam com orgulho e preocupação enquanto olhava para o irmão mais velho.

    — Está pronto, Cass? — perguntou Helick, sua voz calma.

    Cassian assentiu, tentando esconder a tensão que sentia.

    — Pronto. Vamos fazer isso.

    Os dois irmãos caminharam lado a lado pelos corredores do castelo, passando por guardas que os saudavam respeitosamente. Curiosamente, após a chegada da imperatriz na noite anterior, o rei deu a Any, Marco, Tály e Redgar outras tarefas que não incluíam a escolta dos príncipes. Quem os acompanharia neste dia seria o próprio capitão da guarda real que aguardava na entrada para o salão principal do palácio.

    O local estava repleto de pessoas das três grandes famílias nobres de Lyberion, anões das quatro grandes guildas das Montanhas de Patrock e servos do palácio, todos ansiosos para testemunhar o despertar do futuro líder.

    Uma mulher trajando os mais finos panos de seda prateada, Cecília Havilfort, membro da terceira linhagem de Helisyx, ostentava com orgulho as joias nos anéis em seus dedos, enquanto pegava uma taça de vinho da bandeja de um dos criados que passava. Cecília, com sua pele clara, traços finos, cabelos castanhos e olhos escuros, exalava uma aura de nobreza e arrogância.

    — Espero que esta cerimônia não se arraste por muito tempo — comentou Cecília, com um olhar desdenhoso para os criados que se moviam diligentemente pelo salão. — É um desperdício de tempo precioso, o porto não vai se administrar sozinho.

    Ao seu lado, seu marido Carl Havilfort concordava, ajeitando seu manto de veludo escarlate. Carl, também de pele clara e traços finos, com cabelos castanhos e olhos escuros, compartilhava do mesmo ar de superioridade de sua esposa.

    — Concordo, minha querida. Mas devemos manter as aparências. Afinal, é nosso dever apoiar a família real, mesmo que tenhamos que dividir o espaço com… pessoas menos dignas.

    Cecília soltou um leve suspiro de exasperação, observando os outros nobres.

    — Pelo menos Cassian e Helick são jovens promissores. Espero que Cassian prove estar à altura de seu legado. E talvez essa seja uma oportunidade para nós nos aproximarmos da imperatriz Rhyssara e firmamos alguns contratos para usarmos suas rotas fluviais.

    Nesse momento, Lorenzo e Madalena Fitzroy entraram no salão. Lorenzo, com sua postura digna e cabelos brancos, ostentava uma bela espada embainhada em uma bainha de couro branco com linhas douradas na cintura, que combinava com suas roupas brancas e azuis. Madalena, com um ar sereno e seus olhos âmbar atentos, parecia bailar conforme caminhava com seu vestido branco e azul longo com babados nas bordas. Em seu pescoço um colar brilhante tremeluzia com brilhos metálicos. Os nobres foram recebidos pelos servos com taças de vinho. Os Fitzroy, em contraste com Cecília e Carl, tratavam os servos com gentileza e gratidão.

    — Muito obrigado, meu caro — disse Lorenzo a um servo, esboçando um sorriso cordial.

    Os outros nobres, no entanto, olharam desdenhosos para os Fitzroy, uma família que um dia fora a mais próxima da família real, mas que perdera todo seu prestígio após a traição de Vermilion Fitzroy, há 21 anos, quando ele tentou um golpe de estado para usurpar o trono.

    Medicci e Maia Silva, com seus cachorros-tigre de estimação, observaram a chegada dos Fitzroy com interesse. Os animais, com seus dentes que pareciam lâminas, rosnavam baixo ao ver a família desonrada.

    Cecília, vendo uma oportunidade, se aproximou dos Fitzroy com um sorriso venenoso.

    — Lorenzo, Madalena, que surpresa vê-los aqui — disse Cecília, sua voz carregada de falsa cordialidade. — Imagino que ainda seja difícil para vocês frequentar eventos da corte depois do… incidente com Vermilion.

    Lorenzo manteve a compostura, respondendo com cautela.

    — É sempre um prazer servir ao reino, Cecília. O que meu irmão fez foi imperdoável, mas longe de ofuscar tudo o que os Fitzroy já fizeram pelo reino.

    Cecília deu uma risada baixa e insistiu:

    — Sim, se não fosse a misericórdia de Aquiles, guiada pelos conselhos de Helena, todos vocês estariam empalados nas torres de observação de suas casas.

    Madalena deu um passo à frente e respondeu, mantendo a compostura:

    — Isso já faz duas décadas, Cecília. Desde então, nós, os estrategistas militares de Lyberion, temos provado nossa lealdade à coroa inúmeras vezes. — Madalena ergueu a taça de vinho, tomando um gole antes de continuar — E quanto à sua família? A terceira linhagem de Helisyx ainda está se mantendo? Espero que não estejam recorrendo a… métodos questionáveis para preservar a pureza do sangue e o pouco prestígio que ainda têm.

    Cecília ficou vermelha com a afronta e quando estava prestes a responder, mais uma presença chegou no local.

    Agnus Havilfort, irmão do rei Aquiles Havilfort, da linhagem principal dos descendentes de Helisyx, entrou no salão com uma armadura de couro e prata, o símbolo do leonzir rugindo estampado no peito.

    — Peço a atenção de todos para a chegada da prestigiada família real, — anunciou Agnus em alto e bom tom, fazendo uma pausa antes de acrescentar com um leve tom de sarcasmo — acompanhados pelo capitão da guarda real, o não tão prestigiado Sam Haras.

    Com o pequeno insulto ao capitão os Havilfort riram.

    Sam entrou no salão junto dos príncipes, e enquanto passaram por Agnus que reverenciava os sobrinhos, o capitão falou baixo:

    — Rhyssara decidiu afrouxar a coleira em você? — Falou Sam sem se dar o trabalho de olhar para Agnus. — Fiquei sabendo que ela conseguiu calar essa sua boca, realmente, um feito e tanto.

    Agnus estreitou os olhos ao ouvir a provocação, mas manteve o semblante firme, não permitindo que os outros vissem a irritação em seu rosto.

    — Cuidado com suas palavras, Sam — respondeu Agnus em um tom igualmente baixo, mas carregado de autoridade. — Lembre-se de sua posição.

    Enquanto isso, Helick e Cassian adentravam o salão, com os olhares de todos voltados para eles. A presença dos príncipes trouxe um silêncio respeitoso ao ambiente, e os murmúrios dos nobres cessaram momentaneamente.

    O salão principal estava organizado em setores, cada um destinado a uma das grandes famílias nobres de Lyberion. Flâmulas com as bandeiras das famílias e seus animais símbolos estampados marcavam claramente cada área. A nobreza estava em peso, com cada família acompanhada por seus membros, todos trajando suas melhores roupas e exibindo insígnias de suas casas.

    Cassian, embora ansioso, manteve a postura ereta e digna, enquanto Helick, ao seu lado, exibia um semblante de confiança. Ambos sabiam que aquele momento era crucial não apenas para eles, mas para todo o reino de Lyberion.

    Agnus, voltando sua atenção para os príncipes, ergueu a voz para anunciar:

    — Com grande honra, apresento-lhes os príncipes de Lyberion, Helick e Cassian Havilfort!

    O salão irrompeu em aplausos e saudações, enquanto os príncipes avançavam para tomar seus lugares de destaque. Cecília e Carl Havilfort, em sua área adornada com a flâmula do leonzir, trocaram olhares avaliando cada movimento dos herdeiros, enquanto Lorenzo e Madalena Fitzroy, em seu setor marcado pela águiowl, observavam com um misto de esperança e preocupação.

    Medicci e Maia Silva, na área identificada pela bandeira da borbelha, mantinham-se em silêncio, com seus cachorros-tigre sentados obedientemente ao lado, os olhos atentos a qualquer sinal de perigo.

    Cassian tomou uma respiração profunda, sentindo o peso das expectativas sobre seus ombros. Helick, percebendo a tensão do irmão, colocou uma mão reconfortante em seu ombro e sussurrou:

    — Você está pronto, Cass. Mostre a todos do que você é capaz.

    Enquanto isso, Cecília, ainda sentindo o ardor da resposta de Madalena, observava a aproximação dos príncipes com um olhar crítico. Por mais que desejasse se aproximar da nova geração do ramo principal dos Havilfort, não podia deixar de sentir a constante rivalidade e a necessidade de se afirmar.

    A nobre se aproximou de Agnus com um sorriso interessado.

     — Agnus, onde estão o rei Aquiles e a imperatriz de Ossuia, Rhyssara? — perguntou, sua voz carregada de expectativa.

     Agnus, sem sequer olhar nos olhos de Cecília, respondeu secamente:

    — Apenas se sente e aguarde o início da cerimônia do despertar.

    Cecília, sentindo o desprezo na resposta, mordeu o lábio para conter qualquer réplica, voltando para seu lugar ao lado de Carl. Todos os nobres se acomodaram em seus respectivos assentos, cada família sob suas flâmulas, aguardando o início da cerimônia.

    O silêncio que se seguiu foi interrompido por um brilho súbito e um zumbido baixo. Um círculo mágico começou a surgir no chão do salão, seus contornos brilhando com uma luz etérea. Os nobres assistiam com atenção, alguns deles sussurrando entre si com curiosidade e admiração.

    De repente, o chão sob seus pés começou a se elevar, lentamente no início, mas ganhando velocidade rapidamente. A plataforma mágica se ergueu do salão e deslizou suavemente até os portões de entrada do palácio. Lá fora, todo o povo de Lyberion aguardava ansiosamente, seus olhos voltados para o céu, onde o espetáculo se desenrolava.

    No alto, em pleno vôo, destacando-se contra o horizonte, estava o rei Aquiles em sua armadura real prateada. Sua capa vermelha esvoaçava com o vento, juntamente com seus cabelos grisalhos. Ele cessou o vôo e se sentou em um trono colocado um pouco acima das cabeças dos nobres, dando-lhe uma visão privilegiada de toda a cena.

    Ao lado dele, um segundo assento de veludo vermelho flutuava, ostentando a imperatriz de Ossuia, Rhyssara BloodRose. Com seus olhos azuis como o céu e uma presença imponente, ela parecia uma figura saída de uma lenda. Sua presença ao lado do rei simbolizava que a guerra não chegaria, ao menos não agora.

    Enquanto a plataforma mágica flutuava em direção ao povo, uma onda de aplausos e aclamações surgiu da multidão. A cerimônia do despertar estava prestes a começar, e todos estavam ansiosos para ver o futuro de Lyberion se desenrolar diante de seus olhos.

    Nota