Índice de Capítulo

    Do outro lado da cidade, dois homens saltavam sobre os destroços das casas destruídas pelos Wyverns. Ágil como o vento, o capitão da guarda real, Sam Haras, movia-se com olhos atentos nos céus, tentando identificar as feras aladas. Ao seu lado, Agnus deslizava sobre uma pista de gelo que ele invocava com suas luvas, seu ARGUEM. Ambos observavam os céus, e foi Agnus quem viu as duas bestas descendo ao longe, quase nas muralhas por onde os cidadãos tentavam escapar.

    Sem necessidade de comunicação, ambos seguiram determinados na direção dos Wyverns. A dupla xingou quando percebeu que eles se separaram nos céus. Um dos wyverns seguiu para as muralhas, cuspindo fogo e queimando tudo à sua frente, os gritos das vítimas sendo abruptamente substituídos pelo crepitar das chamas. O outro wyvern desceu sobre uma rua quase esquecida pelo reino, mas não por Sam e Agnus.

    — Aquele local — começou Sam, aproximando-se de Agnus. — É onde estou pensando?

    — Sim — respondeu Agnus, mantendo os olhos à frente. — É o abrigo secreto dos nobres. E por que alguém da sua laia sabe sobre o local? — falou Agnus com desdém.

    — Eu protejo a família real — respondeu Sam, com calma na voz apesar do desdém de Agnus. — Faz parte da minha função saber de um local como esse.

    — Temos agora duas opções: ou vamos para as muralhas, já que os príncipes e aquele bando de merdinhas não devem saber do abrigo, ou vamos para onde o esconderijo fica, na esperança de que eles tenham percebido os nobres que não foram com o resto do povo para as muralhas — argumentou Agnus.

    — Mas se formos para o local secreto, e os príncipes não estiverem lá, as chances de eles sobreviverem nas muralhas é quase nula — rebateu Sam.

    — Onde quer chegar? — indagou Agnus.

    — Entre os nobres haverá quem tenha ARGUEMs para ao menos acionarem a passagem secreta e correrem para a segurança, mas os aldeões e povo comum, graças às leis de Lyberion, não podem ter armamentos. Não sei se só os meus subordinados darão conta de um Wyvern.

    Ambos pararam de se mover. Eles tinham que decidir para onde iriam.

    — É muito arriscado irmos para qualquer local. Um erro pode custar a vida deles. — Concluiu Sam. — Embora não possamos derrotar um Wyvern separados, eu posso segurar um até ter a certeza se os príncipes estão lá ou não.

    — Fale por você, eu lidei bem contra os dois ao mesmo tempo. Contra apenas um, pode ser difícil, mas eu consigo. — Falou Agnus apertando as luvas na mão.

    — Então a melhor estratégia é que você vá para as muralhas. — Continuou Sam, focado em seu raciocínio estratégico, ignorando a arrogância de Agnus. — Eu vou para o leste.

    E assim eles se separaram.

    Em um beco esquecido onde os nobres haviam escondido uma passagem secreta para um refúgio subterrâneo, destinado a protegê-los do ataque do Wyvern, uma traição inesperada aconteceu. Uma mulher selou a passagem antes que todos pudessem se salvar, deixando os príncipes do reino, sua guarda pessoal e algumas dezenas de nobres presos no beco, com a fera alada cuspindo fogo em seus calcanhares.

    — Corram, eu seguro a fera! Mantenham os príncipes a salvo! — comandou Marco, sua mão indo rapidamente para a espada.

    — Espere, Marco. — Redgar, ao seu lado, pôs sua mão no ombro do companheiro, o anel em seu dedo do meio irradiando um brilho cinza. — O poder do seu ARGUEM não é útil contra feras. Deixe que eu cuido disso.

    — E você não consegue controlar o seu! — respondeu Marco rispidamente. — Temos que fazer algo!

    — Vá logo. — Os olhos de Redgar abandonaram a habitual imparcialidade do mundo ao redor, e ganharam um leve brilho de determinação. — Não fale mais nada, você sabe que tem um lado de minha magia que tenho maior facilidade de atingir que as outras.

    Marco tentou contestar, mas sabia que o companheiro estava certo. Qualquer hesitação poderia consumir segundos valiosos.

    — Está bem — falou Marco, correndo na direção dos príncipes e a jardineira que estavam logo atrás de si. — Vamos voltar à carroça e tentar fugir!

    Como se a criatura dos céus pudesse entender seus planos, uma rajada de fogo vinda de sua boca incinerou o veículo, os cavalos fugindo em pânico com as cordas queimando em suas viseiras.

    — Droga! — exclamou Marco, vendo sua rota de fuga desaparecer em chamas.

    Redgar deu um passo à frente, a aura de mana ao seu redor crescendo como uma tempestade iminente. Ele retirou o peitoral da armadura, revelando apenas uma camisa marrom, agora manchada de suor e poeira. Seu olhar, sempre neutro, transformou-se em uma máscara de raiva e ira e a cor do anel em seu dedo mudou de cinza para o vermelho.

    — Magia Emocional, — Rugiu Redgar, sua voz reverberando como um trovão. — IRA!

    Com um salto que parecia desafiar a própria gravidade, Redgar alcançou o Wyvern no céu. A força de seu pulo criou uma cratera no chão, uma prova de seu poder bruto que deixou os nobres boquiabertos.

    — O que aquele garoto tolo pensa que está fazendo? — perguntou um nobre, descrente. — Ele acha que vai fazer o que com um golpe de mãos limpas contra uma fera daquele tamanho?!

    A pergunta foi respondida de forma estrondosa quando o soco de Redgar atingiu o focinho da criatura com a força de uma avalanche. O impacto lançou o Wyvern para trás, um estrondo ecoando nos céus como um trovão divino. A fera, atordoada, recuou, suas asas batendo descontroladamente enquanto tentava recuperar o equilíbrio.

    O Wyvern, confuso e furioso, ergueu-se mais alto no céu e canalizou chamas que transformaram o ar ao seu redor em um inferno abrasador. O calor intenso fez o chão rachar e as árvores ao redor incinerarem instantaneamente.

    Redgar, alimentado pela ira, lançou-se novamente ao céu, seus punhos estendidos como se pudesse voar. O Wyvern, numa tentativa desesperada de deter o jovem, cuspiu uma torrente de fogo direto em sua direção. As chamas eram tão intensas que pareciam capazes de derreter até mesmo o aço, mas Redgar não hesitou.

    Ele atravessou a barreira de fogo com uma determinação inabalável, seu corpo repleto de queimaduras e ferimentos, mas seu avanço imparável. A cada segundo, sua força parecia crescer, alimentada pela raiva que queimava dentro de si.

    Os nobres assistiam, incrédulos, a cena épica que se desenrolava diante de seus olhos. Redgar, uma figura implacável, alcançou o Wyvern mais uma vez. Com um rugido que parecia ressoar nas próprias fundações do mundo, ele desferiu um soco no peito da fera.

    O impacto foi cataclísmico. O Wyvern rugiu de dor, o som reverberando pelo campo de batalha enquanto sangue escarlate caía dos céus como uma chuva carmesim. A criatura lutava contra a força imensa de Redgar, suas asas batendo descontroladamente enquanto tentava se livrar do assalto furioso.

    Mas Redgar não dava trégua. Cada golpe era uma explosão de pura força, cada impacto uma demonstração do poder da ira canalizada. Os nobres, que antes duvidavam, agora assistiam em silêncio reverente, testemunhando um espetáculo de força sobre-humana e determinação indomável.

    A fera, finalmente, em um último ato de desespero, balançou a cauda como um chicote e lançou Redgar contra o chão com uma força esmagadora. O jovem caiu como um meteoro, criando uma cratera profunda ao impactar o solo.

    Redgar havia perdido a consciência com o impacto e o Wyvern percebeu e preparou mais uma torrente de fogo na direção do jovem soldado.

    Any, com um salto, se pôs à frente de Redgar, o protegendo com o próprio corpo. Suas costas queimaram, sua pele foi totalmente carbonizada os ossos de sua coluna e costelas ficaram aparentes.

    — Any!! — Gritou Marco preocupado.

    A soldado se levantou após proteger Redgar, seus órgãos e pele se regenerando a uma velocidade absurda e a deixando nova em folha. Suas vestes por outro lado, com exceção da cintura para baixo, onde havia partes de armadura, haviam sido completamente incineradas. Com um movimento rápido ela retirou a blusa de Redgar e a pós em si, tampando seu corpo.

    — Estou bem. — Falou a mulher enquanto pegava Redgar nos ombros, a voz parecendo decepcionada.

    Os nobres por fim, perderam as esperanças. Até que, em meio a eles, uma mulher de cabelos longos e olhos puxados, e de pele branca gritou em meio a eles:

    — O que vocês pensam que estão fazendo, nobreza de Lyberion?! — Gritou a chefe dos curandeiros do palácio, Karine Silva. — Irão ficar apenas olhando esses soldados, que nem deveriam possuir ARGUEMs segundo nossas leis, lutarem e dar suas vidas para nós proteger?

    As dezenas de nobres olharam para Karine enquanto ela continuava:

    — A elite de Lyberion, não é assim que vocês se chamam? A maioria aqui tem poder, não por merecimento, mas apenas por status e nome. E quando chega a hora de usá-lo vocês ficam apenas olhando?

    — Cale a boca mulher! — Gritou um nobre, provavelmente da família de terceira linhagem dos Havilfort. — Acha que não sabemos disso? A realidade é que por mais que tenhamos esses Armamentos de Guerra Mágicos, nós nunca lutamos de verdade contra uma ameaça! Nunca houve sequer uma sombra de necessidade de aprendermos a lutar de verdade! Sabemos o suficiente para uma apresentação de combate, mas nada que possa ser útil numa situação como essa!

    A vergonha assolou os olhares de todos no ambiente. As palavras chocantes de desabafo do nobre chegaram também aos ouvidos dos príncipes. Helick e Cassian mesmo sendo novos e sabendo que as palavras não foram direcionadas para eles, também sentiram um senso de responsabilidade.

    Nastya apertava o braço de Helick contra si, como se buscasse proteção, e isso mexeu com o príncipe. Ele se levantou e bradou:

    — Vocês têm poder. — Começou Helick. — E mesmo que não saibam como usá-lo em campo de batalha a necessidade chegou!

    Os nobres ouviam, atentamente as palavras do príncipe mais jovem.

    Cassian que sentia o mesmo que o irmão também falou:

    — Honrem seus títulos e lutem! — Bradou o herdeiro — Não serei hipócrita com vocês, portanto… — Falou Cassian pondo a mão dentro de sua blusa e retirando sua fiel adaga. — Lutarei com vocês!

    Os nobres se sentiram inspirados, alguns até se emocionaram com as palavras de seus príncipes.

    Um brilho começou a emanar do local. Dezenas de Armamentos começavam a irradiar uma luz azul de pura mana.

    — Por Lyberion! — Gritou um erguendo sua espada para o céu, a lâmina fina brilhando, seu ARGUEM brilhando em meio aos gritos de determinação que surgiram.

    A fera rugiu e seu rugido foi respondido por uma saraivada de flechas, não de vários arqueiros, mas sim de um único nobre que possuía um arco como ARGUEM. No centro do arco dourado um cristal azul pálido brilhava, e mesmo sem ter cordas, quando era mirado, o arco disparava uma chuva de flechas certeiras.

    As flechas batiam e ricocheteavam nas escamas endurecidas do wyvern. O rei dos céus desceu, sua investida foi um rasante lateral na qual ele fez sua asa direita varrer o chão. Vários foram pegos no ataque, mas o restante não se abalou.

    Aproveitando a descida da fera, cinco nobres montaram em suas costas e a esfaquearam com lâminas encantadas com magia de choque.

    Helick e Cassian correram em direção ao Wyvern em uma velocidade tão grande que Marco nem teve a chance de tentar impedi-los. Os irmãos saltaram com as adagas em mãos, tentando acertar um golpe na criatura que voava baixo.

    Eles sentiam muitas coisas, medo, insegurança, ansiedade, mas mesmo assim avançaram sem deixar esses sentimentos negativos o segurarem.

    Cassian pensava em toda a expectativa que todo um povo tinha para com ele e como ele nunca se importou com isso, sempre mantendo seus pensamentos egoístas. De certa forma ele se sentia culpado por não estar preparado para defender essas pessoas que gritavam e morriam durante o ataque. Se ele ao menos tivesse conseguido concluir o despertar… Os pensamentos de Cassian só podiam ser calados com atitudes, e ele sabia disso e foi nisso que se apoiou para ter a convicção em seu ataque a besta alada.

    Helick por sua vez pensou no medo que sentiu quando aquele arrepio percorreu sua espinha, o alertando da ameaça e quando o primeiro Wyvern desceu dos céus. Ele ficou paralisado e sem reação, algo que o envergonhava profundamente. Alguém na posição que ele ocupava não podia sentir esse tipo de coisa. Ele não podia sentir medo quando na realidade ele quem deveria proteger aqueles tomados por este sentimento. Ele sempre pensou assim, quem está no topo deve proteger aqueles que estão mais baixo. Foi isso que ele aprendeu admirando e treinando com Sam.

    Os irmãos atacaram, gritando com determinação e bravura. Para os nobres que visualizaram de longe, o ataque coordenado dos príncipes, cada um mirando um olho, parecia mágico. As gemas das adagas brilharam enquanto golpeavam como se respondessem a vontade dos irmãos.

    O Wyvern estremeceu quando seus olhos foram partidos e voltou a subir aos céus, suas asas ecoando como um trovão pelo balançar abrupto. Os nobres nas costas da criatura saltaram antes dela subir muito e conseguiram se safar.

    Os príncipes caíram rolando agilmente no chão e se reposicionando para se prepararem para os próximos movimentos.

    No solo Karine se juntava com os discípulos de Sam, tratando das feridas de Redgar que continuava inconsciente. O soldado que ostentou tamanha força, capaz de ferir um wyvern com as mãos limpas, estava com ferimentos graves. Queimaduras tostaram a camada superior de sua pele e suas costelas estavam quebradas.

    — Droga! — Xingava a curandeira socando o chão trincado e queimado pela batalha. — Não posso usar minha magia nesse cenário! Sem alimento para que possam se recuperar após a minha magia de cura, eles morreriam igual. Me sinto tão impotente!

    — Você conseguiu estabilizar Redgar sem uso de magia, isso mostra que você é útil mesmo sem o seu poder. — Confortou Tály.

    — Isso não está indo bem. — Comentou Marco. — Aproximadamente 100 nobres ficaram para fora quando Cecília selou a passagem, incluindo crianças. A luta começou a um minuto e temos menos de 20 que ainda podem lutar.

    Marco apertava o cabo da espada, a frustração correndo tão fundo em seu peito que era como se espinhos invisíveis perfurassem seu coração.

    — Os príncipes se jogaram no meio da luta, e conseguiram cegar a fera. Isso mostra que não podemos depender apenas de magia! Mesmo sem mana podemos fazer coisas incríveis! — Falou Tály, apertando suas luvas de metal no punho. — Eu sou a lutadora aqui, se alguém vai ser lembrado por dar um bom murro na cara daquela besta, serei eu.

    — Você tem razão. — Falou Marco, sacando a espada e ficando apostos, esperando a criatura descer mais uma vez.

    O wyvern nos céus rugia. Um rugido de ódio e dor ecoava pelo local. Sem visão a fera parecia ter sido consumida pela raiva. Suas escamas começaram a se arrepiar enquanto brilhavam com um vermelho mágico. Uma aura vermelha estava envolta da fera, até parecia que ela iria liberar um ataque mágico.

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