Índice de Capítulo

    Depois de ter escapado da sala principal, Theresa encontrava-se nos corredores, batendo os pés enquanto fornecia apoio à ruiva, calçando sua cintura a um dos seus braços. Seus olhos alternavam entre as laterais, demonstrando profunda preocupação. Bem, ela estava sendo perseguida. Podia sentir de perto o cheiro sufocante que poluía a pureza da água quanto mais aquela criatura se aproximava.

    Theresa correu tanto que encontrou o fim do corredor, cuja lateral levava a uma das salas seladas com pilares em seus quatro pontos cardeais. Ela não teve escolha senão entrar na sala, que, assim como outros cômodos, estava inundada de água. Não tardou alguns segundos, a criatura vermelha apareceu na entrada, vagueando seus inúmeros olhos por aquele espaço, encontrando de imediato suas presas.

    Sua boca, que revelava inúmeros dentes, fora aberta, expondo um abismo enevoado de sangue. Aquelas duas com certeza não queriam estar ali. Theresa lançou seus olhos severos enquanto colocava uma das mãos no jaleco. Enquanto isso, Meredith posicionava sua espada com olhos que lembravam uma águia prestes a cravar suas presas em sua caça.

    — Meredith, espere…

    Os apelos de Theresa pareciam não ter chegado aos ouvidos da ruiva. Rangendo os dentes, franzindo o cenho, deslizou sua espada com suavidade e uma ligeira rapidez, criando ondas que se irradiaram por todos os lados, inclusive, transpassando a criatura.

    — Turbilhão de cortes!

    Ao proferir o nome de sua técnica mais famosa, num zás, vários cortes foram capazes de atravessar diversas camadas daquele monstro, retirando pedaços de carnes que espalharam mais sangue por aquele espaço, uma visão vermelha poluindo os olhos de quem via.

    Meredith foi novamente tomada por um sentimento de frustração, um desapontamento que percorreu sua espada ao ponto de a fazer liberar algumas rachas. Na verdade, não podia mais suportar tantos ataques, havia chegado ao limite.

    E o monstro irracional não queria entender isso, apenas queria devorar, devorar e devorar aquela deliciosa carne, lisa e bem passada, que o deixava babando loucamente. Num zás, uma velocidade muito além do que os olhos da Meredith puderam processar, aquele animal estava na sua frente, prestes a trincá-la com seus enormes dentes afiados.

    No entanto, antes que isso fosse possível, Meredith sentiu uma mão na sua gola, puxando-a para trás enquanto o monstro parecia ter devorado um objeto de pedra que havia sido lançado logo em seguida.

    Mas nada disso foi capaz de parar aquela criatura. Os cortes começaram a desaparecer como se nunca tivessem existido, como se um remendo perfeito lhe fosse aplicado.

    Ela suspirou de alívio, observando Theresa, que lhe lançava uma cara de repreensão.

    — Você precisa mesmo deixar de agir com impulso.

    — Me desculpa, mas eu não podia ficar parada, esperando ele nos devorar apenas.

    — Ah, mas eu tinha um plano — Theresa suspirou e afagou seus cabelos. Logo em seguida, apontou para aquela criatura que permanecia imóvel enquanto girava seus olhos. — Veja.

    Quando os olhos da Meredith se encontraram com a criatura, um crescente vermelho tomou conta daqueles olhos dourados, algumas partes começaram a se deformar enquanto seu corpo emitia sons de destruição. Como se uma muralha houvesse finalmente caído.

    De repente, uma explosão aconteceu. Milhares de pedaços desmontados abruptamente do corpo daquela criatura, incluindo seus olhos, se espalharam por aquele espaço, carregando consigo inúmeras quantidades de sangue que mancharam aquelas duas mulheres.

    Um cheiro nauseabundo passou a tomar conta do ar enquanto aquele líquido carmesim viscoso deslizava pela superfície de sua pele, de seu corpo, as deixando ensanguentadas.

    Mas aquilo era o de menos quando Meredith atingiu uma visão inesperada. No lugar de onde havia explodido o monstro, estava uma criatura volumosa e pedregosa que ela bem conhecia. Seus olhos verdes fundos e um sorriso largo que formava um rugido acolhedor a deixaram confortável no meio de toda aquela aflição.

    — Como isso é possível? Pensei que o Golem estivesse dormindo.

    — E estava, mas eu o despertei.

    — Como? Se não me engano, ele precisava de comer muitas pedras de manas.

    — Lembra da pedra que o Zernen comeu por engano?

    Ela balançou a cabeça positivamente.

    — Bem, acontece que ela acumulou muita quantidade de energia dos ataques do dragão, o que consecutivamente gerou uma explosão pela pedra estar saturada.

    — Entendi, então, naquele momento da cirurgia… — Meredith murmurou com um ligeiro espanto enquanto se lembrava daquele exato momento.

    — Isso mesmo.

    — Genial.

    — Nem tanto, afinal…

    Antes que Theresa terminasse sua fala, o Golem começou a cair mais fundo, ficando estagnado no chão, com os braços e pés imóveis.

    — Ele é inútil na água — finalizou, pousando seus olhos sobre ele.

    — Eita, e agora?

    — Primeiro, vamos sair daqui. Por enquanto, não temos chances contra aquela sereia, então precisamos… — Theresa teve que interromper sua fala, porque, de maneira súbita, a bolha que cercava o rosto da Meredith acabou desaparecendo, dando brechas para que aquela enorme quantidade de água a asfixiasse.

    — Droga, eu já deveria saber que isso poderia acontecer. — Theresa cerrou os dentes, observando Meredith soltar bolhas pela boca enquanto segurava seu pescoço, afundando mais e mais ao encontro do Golem.

    Ela não perdeu nem mais um segundo e nadou com rapidez a amiga, calçando um de seus braços à cintura. Neste momento, ela havia perdido a consciência, seus olhos estavam fechados e seu rosto com uma expressão calma.

    Theresa vagueou seus olhos por aquele espaço, pensando numa solução para sair dali rapidamente, porque percorrer os corredores era extremamente arriscado e possivelmente não daria tempo para salvar a ruiva. Foi então que ela percebeu que a resposta estava na sua cara. Ela ordenou que o Golem voltasse à sua forma normal e o pegou, arremessando-o contra o teto enquanto implorava por mais uma transformação assim que atingiu o ápice da cobertura.

    Um grande buraco foi aberto pelo Golem assim que ele se transformou, milhares de rochas caíram na água. Theresa abriu um sorriso de triunfo ao observar aquela brecha. O Golem voltou a sua forma de miniatura antes que fosse arrastado pelo seu peso ao fundo e retornou ao seu lar, os bolsos de Theresa.

    Sem mais tardar, ela bateu ambos os pés, começando a subir a superfície onde estava o barco. Nadar como nunca nadou, contra o tempo que roubava cada vez mais a vida de sua amiga, cujo corpo havia sido entupido por água.

    Como se não bastasse aquela corrida que ela exercia, Theresa sentiu seu coração acelerar quando contemplou mais monstros à sua procura. Tinham aspecto de tubarões e eram rápidos, em questões de segundos com certeza a alcançariam.

    Aquela mulher, verdadeiramente, pretendia as aniquilar. No entanto, Theresa jurou que jamais aceitaria que isso acontecesse, arremessando com um grito de guerra dado o Golem, que novamente se transformou, agredindo aquelas criaturas. Seu peso os esmagou e os levou ao chão rapidamente, enquanto Theresa não parava de nadar, agradecendo ao sacrifício que Gaia estava fazendo ali.

    Prometeu retornar para buscá-lo com lágrimas que se misturavam com um sorriso.

    Arrastando milhares de águas ao emergir sua cabeça na superfície, Meredith finalmente pôde respirar o ar puro que por ali passava, ainda assim, não sendo o suficiente para a despertar. Theresa a colocou no barco e conferiu se seu coração estava batendo e, para sua alegria, estava, ainda que fraquinho.

    Ela iniciou imediatamente sua massagem, pressionando a mão no peito com vista a retirar a água em excesso do corpo. Cogitou respiração boca a boca, mas parece que não foi preciso, a água estava saindo a cada pressão, até que Meredith acordou, levantando subitamente enquanto tossia e vomitava água.

    Theresa bateu nas suas costas delicadamente enquanto ela, encurvada, agarrava seu pescoço, continuando a retirar mais água do seu interior.

    — Pensei que fosse morrer, mas você me salvou, Theresa! Muito obrigada!

    Meredith ofereceu um abraço, embora com a garganta um pouco aderente pelo refluxo que sofrera, ela mantinha seu sorriso de agradecimento.

    — Isso eu jamais iria permitir. Jarves me mataria.

    — Digo o mesmo. Nenhum dos nossos amigos deve perecer nesta luta.

    — Isso mesmo. — Theresa assentiu. — Agora, precisamos pensar em um plano para derrotar aquela sereia e salvar nossos amigos antes que seja tarde.

    — Sobre isso, acabei de lembrar de algo sobre o conto do Jarves.

    — O quê?

    — Sereias gostam de águas limpas e são alérgicas a substâncias tóxicas.

    — Tá, mas onde vamos arranjar esse tipo de substância?

    — Ali. — Meredith apontou para os barris. — Há muito vinho ali. Se jogarmos na água, com certeza ela poderá ficar toda contaminada.

    — Você até que tem razão, mas não podemos esquecer do fato de que ela pode muito bem com estalar de dedos purificar a água antes que ela seja atingida. Falo isso porque ela conseguiu controlar o sangue daquele monstro.

    — Tem razão, nem tinha pensado nisso.

    — Mas, é como Frida disse, tudo isso está conectado. — Theresa se levantou e andou ao leme. — Tudo aqui existe para ser usado, nada está aqui por acaso. — Ela tocou no leme. — Acabei de ter uma ideia.

    — Ideia?

    — Exato. Como diria Jarves, vamos vencer isso a estilo pirata.

    — No que você está pensando? Não tem como navegar…

    Meredith interrompeu sua fala, tendo a mesma ideia que Theresa.

    — Você não tem magia de peso à toa, não é? Isso mesmo, Meredith, quero que afunde esse barco.

    — Mas só afundar, espera, não me diga que você pretende levar o barco ao centro do castelo?

    — Vejo que estamos alinhadas. A partir daí, você vai afundar esse barco. Mas antes, quero me certificar de algo.

    — O quê?

    — Quanto tempo consegue ficar sem respirar de baixo da água?

    — Ah, isso. Não se preocupe com isso. Eu aguento até derrotamos aquela monstra.

    — Tem certeza?

    — Não duvide de mim.

    — Tudo bem, estou confiando em você. — Theresa começou a velejar segundo as coordenadas que havia visto naquele mapa, observando alguns destroços que flutuavam. Enquanto isso, Meredith se concentrava em pose de lótus, detectando a aura daqueles quatro para que não falhassem em hipótese alguma o centro do castelo.

    — Certo, aqui!

    Com essa confirmação, Theresa parou de velejar e entrou em um dos barris conforme o combinado, tendo que enfrentar aquele cheiro insuportável que a deixava com vertigens, mas entendia que sacrifício era necessário.

    Meredith imediatamente ativou sua aura, expandindo por todo barco. Com um grito, o barco afundou em rápida velocidade depois que ela preencheu sua boca com muito ar.

    Tão rápido que o telhado foi derrubado, levantando inúmeros destroços de pedras que flutuaram sobre a água, uma tremenda e profunda força de gravidade rodeando a área em que Meredith sentava em pose de lótus.

    Com as sobrancelhas cerradas, Meredith observou aquela mulher acariciando seus amigos com um sorriso maroto. Mas logo aquela felicidade caiu por terra, assim que seus olhos se cruzaram com aquela devastação.

    — O QUÊ?!

    Ela ficou boquiaberta. Meredith não perdeu tempo, chutou os barris contra a sereia, realizando furos com a sola de suas sandálias, que deixaram transbordar enormes quantidades daquele líquido vermelho. Em instantes, temendo a ameaça, ela abandonou o trono e nadou até um dos pilares, manipulando com os dedos, o vinho que se propagava na água, enquanto rangia os dentes de indignação.

    — Como ousa?! Como ousa?! Eu sabia, eu sabia, eu deveria ter te eliminado muito antes… Espera?! Onde está aquela mulher?!

    — Toma!!!

    Meredith chutou um dos barris que foi imediatamente parado com uma barreira que ela exercia sobre a água.

    O barril quebrou-se, liberando inúmeras porções de vinho carmesim, que cegaram a atenção da sereia para o verdadeiro alvo. Theresa apareceu subitamente na sua lateral e a deu um grande abraço, transferindo todo aquele líquido pegajoso para a pele daquela mulher.

    — No fim das contas, você e eu sempre temos algo em comum…

    Ela arregalou os olhos, começando a gemer desesperadamente com soluços enquanto tremelicava o corpo. Theresa teve que se afastar imediatamente enquanto ela não parava de gritar como uma louca, sentindo os efeitos daquele líquido que a transformavam em uma criatura horrenda e bizarra.

    Havia ganho um formato gigante de mais ou menos três metros enquanto sua boca se alargava, revelando seus dentes de tubarão. Cada madeixa de seu cabelo acabou por se transformar em espinhos bem afiados enquanto seus olhos tomavam uma coloração vermelha que expressava profundo ódio. Sua cauda era repleta de escamas cortantes e batia sobre a água, criando ondulações.

    Ela ergueu uma de suas garras, unhas de escamas, e rasgou seu rosto enquanto formava um sorriso travesso.

    — Chegou a hora de jantar!!!

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