Índice de Capítulo

    Pondo a criança por cima do cavalo, agora amarrada por um lenço para que não pudesse ouvir seus choros, cavalgou a galope em direção à grande cidade enquanto aquela mulher, já recomposta, atravessava a porta, vendo o cavalo que carregava seu filho se perder no horizonte das colinas. Tentou correr, mas tropeçou e caiu, erguendo o rosto enterrado na areia enquanto elevava os braços aos céus, clamando por uma intervenção divina.

    — Por favor, meu Deus, traga o meu filho…

    O vento soprou-lhe as vestes, sussurrou seus ouvidos, levantou folhas e afagou as pastagens, desaparecendo assim como seu filho não estava mais ali.

    Depois de algumas horas, finalmente o homem avistava a cidade, um muro fortificado, selado por um portão e guardado por dois soldados, protegendo seu interior. Como havia forçado o desmaio da criança, não teve dificuldade em passar, embora os guardas verificassem alguns sinais de lágrimas, não deram importância quando reparam que a criança era a cara do homem, pressupondo ser algum tipo de parente, o que foi confirmado, ainda que tivesse passado dali antes.

    A primeira vista, a cidade era movimentada, possuindo barracas cônicas e quadradas espalhadas ao longo da estrada pavimentada de blocos. Pessoas caminhavam de um lado para o outro, carregando consigo cestas e animais domésticos, outros jumentos e caravanas.

    O homem foi cavalgando ao som daquele ambiente familiar aos seus ouvidos, quando no meio do caminho, numa rua que dividia quarto estradas e no seu centro estava assente uma fonte, esbarrou com um homem barrigudo com colares dourados ao redor do pescoço e anéis de prata e ouro nos dedos. Ao redor da sua cintura, seu cinto era formado por sacos de moedas.

    — Ainda bem que te encontro. — Trocava olhares, enquanto afagava sua barba. — Cadê o dinheiro que me deve? Se não me engano, o prazo termina depois que o sol se pôr.

    — É, mas o sol ainda está ali. — Seus olhos foram direcionados ao sol entre as nuvens, reduzindo sua intensidade até formar uma sombra em alguns pontos.

    — Eh, quanta confiança… — O homem se aproximou do cavalo e notou a criança, soltando um sorriso malicioso enquanto cutucava o nariz com o medinho. — Ah, já entendi… o motivo.

    — Tse, vai querer o dinheiro ou vai questionar sua proveniência? Convenhamos, você não é nenhum santo.

    O homem esticou a mão e mexeu os dedos ligeiramente.

    — Só quero dinheiro na minha mão, se não… — Arrastou o polegar rente ao pescoço, movendo-o como se estivesse decapitando alguém com uma espada.

    Ele engoliu em seco e pôs-se a caminhar, resolvendo logo a questão da dívida que havia feito para alimentar seu vício por apostas, numa tentativa fácil de atingir a riqueza.

    Depois de ter entrando pelo caminho reto oposto a fonte, passando por uma rua com casas nobres de blocos e madeira, encontrou uma construção eclesiástica com uma cúpula por cima, seus vidros coloridos ostentando imagens que retratavam a antiguidade quando ainda usavam túnicas e mantos como roupa.

    Havia uma grande fila de crianças acompanhadas de seus encarregados, entre alguns adultos, que desejavam, naquela casa, ter o conhecimento de sua magia. Custava cerca de quarenta moedas de prata, justo o que o homem tinha para a certificação.

    A criança acordou, clamando por “mamãe” um pequeno sussurro que se transformou em um choro, que começou a incomodar as pessoas por ali. Como a criança era parecida com o pai, descartaram a hipótese de que ela tivesse sido raptada, porque era mesmo algo que acontecia com uma certa frequência.

    Comércio infantil de escravos. Ainda assim, a criança clamou: “socorro, mamãe” e o pai teve que mentir, alegando que a mãe jazia no pó da terra. Então, chegando sua vez, ele depositou a mão da criança na esfera de cristal, como o homem de vestes eclesiásticas havia instruído. Depois disso, era só aguardar segundos que a máquina emitia um papel com tudo relativo ao garoto escrito. Ela funcionava através da absorção de mana, mana essa que continha informações genéticas.

    Depois de alguns segundos, antes de mais nada, o homem responsável devia ler e, se tudo estivesse correto — isso implicava magia proibida —, entregava ao encarregado e permitia sua saída daquele recinto. E assim aconteceu, mas com um olhar de tédio, indo contra todas as expectativas que o pai tinha naquele momento, já que esperava algo grandioso derivado da combinação da magia de sua ex namorada e da dele.

    — Magia de canto. O que é isso?!

    No papel vinha que era uma magia que fazia dançar quem quer que escutasse seu som e mais nada. Isso deixou o homem indignado, porque não tinha nenhuma diferença com um simples cantor que cantava para que as pessoas dançassem.

    — Maldito! Viu o que você fez?! Você gastou minhas moedas para nada!

    Irritado com a criança, ele acabou dando um cascudo na sua cabeça em um beco onde ninguém o podia ver abusando daquela criança e também onde seu choro pudesse ser abafado pelo silêncio. Batendo os pés como um tic-tac, ele pensava no que faria.

    Seu plano de vender a criança estava frustrado, ela não tinha nenhuma magia tão anormal ao ponto de ser querida no mercado negro. A única coisa que ele podia fazer era apenas tentar a sorte e ver se encontrava um cliente antes do pôr do sol, ou então teria que fugir da cidade.

    Passando horas, tentando achar um comprador, eis que finalmente surgiu alguém nos subúrbios daquele mercado sombrio, um homem gorducho e alto, com dentes dourados, correntes no pescoço e saco de moedas ao redor da sua cintura, algo que lembrava seu agiota.

    — 60 moedas de ouro.

    Ele estava devendo 100 moedas de ouro, então faltariam mais 40 moedas de ouro. Ele persuadiu o comprador, alegando que a magia do garoto era uma magia poderosa, que mais tarde teria a especificação sonorizada da mãe e da dele, que é manipular com o estalar de dedos os braços do oponente, e conseguiu vendê-lo ao preço de 105 moedas de ouro, ficando ele com o lucro de 5 moedas de ouro

    — Adeus, filho. — Com um sorriso malicioso, ele atirava o saco de moedas de ouro enquanto apreciava seu filho, cuja boca selada por um pano, sendo levado por aquele homem.

    Já era o entardecer quando a mãe do garoto chegou à cidade, acompanhada de alguns vizinhos e um soldado que apanhou na cidade, procurando sua criança e seu ex namorado, que neste momento se encontrava em um bar, bebendo até se fartar depois de um negócio bem-sucedido e da dívida quitada.

    A criança agora estava presa em uma jaula, bem como algumas outras crianças e feras enjauladas que lhe faziam companhia. Ela não parava de chorar, clamando por sua mãe.

    — Cale-se. Jamais verá sua mãe. Você a partir de agora será fonte de renda com sua magia, vou colocá-lo a trabalhar num círculo ou será que num palco?

    Assim, a criança permaneceu ali enjaulada, lembrando-se da sua mãe que dizia que em momentos de desesperos como esse, ela deveria cantar, que a música era um bálsamo para alma. A criança cantou, alegrando e depositando confiança nas outras com sua voz elogiada por elas, que tinham o poder de trazer paz.

    Até o dia em que sua magia ativou, fazendo o comprador dançar com as chaves até a cela. Ao encostar nas grades do garoto, ele tomou a coleira de chaves presa à cintura e abriu para si e para todas as crianças, que puseram seus pés a correr sem olhar para trás. No entanto, sendo Sond a última criança a sair, sua mana havia se esgotado a passos da porta e o feitiço quebrou-se, e ele ficou em apuros, deixando o homem tão irado que jurou que ele nunca mais voltaria a cantar, cortando a língua e o traumatizado com cada tipo de ataque verbal misturado com vômitos de saliva contra sua cara.

    Desde esse dia, a criança, ainda que tivesse se recuperado e o comprador estivesse preso, ficou com uma cicatriz cravada que o impediu de cantar novamente até a data presente. Toda vez que ia cantar, travava, pensando no momento em que ficara sem sua língua, em que tentou cantar e clamar e não conseguiu.


    — Sond, você está chorando… — Theresa murmurou, enquanto fitava as lágrimas deslizarem pela bochecha daquele jovem.

    — Mamãe…

    — Mamãe?

    Apesar de não compreender, Theresa sabia muito bem que isso estava ligado a um trauma e ficou o observando por um pouco tempo, notando-o tocar sua língua tremelicante. Seus olhos foram tão assertivos que notaram ainda haver algumas rachas na sua língua, a magia de cura usada não havia sido tão eficaz.

    — Sond… Abra a boca…

    — Hum?

    Quando Theresa viu a aproximação daquela criatura, gritou.

    — Abra a boca depressa!

    Sond abriu imediatamente a boca, mas quando tentou aplicar sua magia, deu-se conta de que ela não estava funcionando e lembrou-se de que estava em um mundo onde magias especiais não funcionavam.

    Naquele momento, o desespero bateu à porta do coração de Theresa, uma batida tão agonizante que trazia consigo profundo temor. Depois de curtos segundos, impondo sua mão no peito, deu um longo suspiro, mantendo a calma que lhe caracterizava.

    — Sond, me escuta… Eu não sei pelo que você passou, mas eu quero que saiba que você pode ultrapassar isso. — Enquanto falava isso, Theresa alternava entre a aproximação do monstro que agitava a água, aliado ao barulho provocado pelos monstros acima. — Neste momento, eu não posso usar magia de cura, mas eu prometo que quando isso acabar, curarei todas suas feridas e te farei esquecer dessa dor, então cante, por favor… — Encurvou a cabeça, puxando um pouco as vestes do ombro, não sabia mais o que dizer.

    Então, Theresa sentiu uma mão afagar seus cabelos e lançou seus olhos sobre Sond, que deu um sorriso em meio a algumas gotas de lágrimas.

    — Eu… — Veio a sua mente a imagem dos seus amigos e da sua mãe, que na altura tentou lhe proteger do pai e, em seguida, visualizando aquele monstro como sendo seu pai tentando mais uma vez lhe judiar, rangeu os dentes e abriu sua boca contra todo trauma que sentia, lançando um grito que foi se suavizando até formar uma melodia melancólica.

    Aquela criatura não resistiu àquela voz de clamor e cessou os movimentos, não só, as abelhas e os ursos imediatamente deixaram sua postura hostil e adotaram uma postura de lamento.

    — Você conseguiu… você conseguiu! Eu sabia! — Theresa deu um tapa nas costas do Sond com um sorriso. — E que voz é essa, hein?

    Sond limpou as lágrimas dos olhos e deu um sorriso triunfante.

    — Agora vamos sair daqui e vamos dar uma lição na senhora da música, quital?

    — Muito obrigado… — murmurou. E Theresa deu um sorriso, emitindo, enquanto chocava o punho contra seu coração: — Foi tudo graças a você.

    Sond deu um sorriso caloroso.

    Assim, triunfantes, eles saíram daquelas águas, exprimindo parte das suas vestes que estavam encharcadas. Passaram por aqueles animais lamentosos sem nenhuma preocupação e avançaram em direção à árvore onde estava sua oponente, mas nem precisaram chegar ali.

    Atravessando a ponte de pedras enquanto carregava sua flauta na mão direita, senhora da música deu um sorriso diante daquelas duas figuras que haviam subjugado seus animais.

    — Interessante… Sonata da tristeza, um som que faz os animais ficarem imóveis de melancolia. Vocês são mesmo interessantes.

    — Não é à toa que você se auto intitula senhora da música, conseguiu saber direitinho o que aconteceu. — Theresa deu um sorriso confrontador.

    — Claro. E os congratulo por esse feito, mas… — Senhora da música elevou a flauta aos lábios. — Isso ainda não acabou, neste jogo vence quem tiver a melhor música. Por isso… — enquanto dizia isso, Theresa manteve uma postura ofensiva e avisou para que Sond preparasse sua melhor música, porque a verdadeira batalha estava prestes a começar. — Ativar segunda sonata da música.

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