Capítulo 65: Shymphony
Aquela voz rouca continua a ecoar entre prateleiras.
— Folhas escarlates o ceu pintarão,
Refletindo junto de si a vontade em seu coração,
Não importa onde estarás, lá eu também estarei.
Enquanto no céu o sol brilhar,
Meu amor contigo estarás,
E se mesmo assim o sol não for capaz de enxergar,
Então se lembrará de no luar me procurar.
Por vários minutos Sarah se esgueira pelas ruas e becos do palácio. Passando por locais onde pessoas se reúnem para comer, para debater ardentemente, ou simplesmente ficarem juntas bebendo algo em canecas de madeira com um som instrumental animado ao fundo enquanto riem sem motivo. Seus olhos brilham com os novos descobrimentos e os novos tipos de pessoas. Conforme ela vai adentrando para o castelo, se vê obrigada a subir algumas pequenas e íngremes ruelas.
Ao virar para a esquerda após subir mais um pouco, a sua frente, surge um pequeno beco com uma ruela que ao invés de subir, segue reto como se fosse adentrar a terra como uma boca de caverna. Conforme ela se aproxima, o ar vai ficando mais frio e a iluminação parece esvair suavemente. Sarah se depara frente a frente com um túnel escuro com uma brisa gelada contornando seu corpo e uma leve vibração zonzando em seu ouvido.
O olhar dela fica distante por um instante, mas impulsivamente o primeiro passo é dado e o seguinte e logo uma suave caminhada se inicia adentrando a escuridão. Porém, não dura muito, pois uma grande porta de madeira duas vezes o seu tamanho de altura se apresenta a sua frente.
Ao chegar perto e puxar as argolas presas na madeira, um ranger incomodo surge no ar e consigo uma fresta de luz corta a escuridão entre a madeira inundando a face de Sarah. Seu olhar vai se abrindo e suas pupilas dilatando. Ao abrir o suficiente para seu corpo passar, o vento gelado assopra contra sua face carinhosamente, trazendo consigo uma leve umidade que se faz notar, constante em volume, porém volátil em suas direções.
A frente, um corredor alto e um pouco largo. Ao fundo, uma cachoeira despenca lá de cima e adentra uma abertura no chão que é feito de tijolos em um tom vermelho bem escuro e coberto de musgos em várias regiões, musgos que se estendem pelas paredes também feitas desses mesmos tijolos. Somente duas portas de metal na cor cinza, uma de cada lado, bem no meio do corredor, interrompem essa linearidade.
Mas o que realmente impacta sua visão é o fato de no teto ter uma abertura arredondada por onde se entra uma luz dourada que desce em formato de cone, e quando toca o pé da cachoeira, reflete em algo ainda mais dourado em um canto. Conforme Sarah começa a caminhar, percebe que o corredor é inclinado suavemente na direção da cachoeira. Um passo de cada vez para não escorregar e deslizar, e ela avança em direção aquele brilho que vai ganhando mais detalhes.
Pequenos fios de água surgem escorrendo pelas paredes e deslizando corredor a frente de forma tortuosa tortuosos entre as fissuras dos tijolos. Após alguns segundos de passadas sorrateiras, Sarah chega tão perto dela que consegue sentir a vibração da água despencando, e da serenidade da figura ali sentada de olhos fechados.
Cabelo dourado que sacoleja de forma suave com o vento gerado da queda d’água. Armadura fina e dourada que deixa exposto a pele cor de pêssego do ombro até um pouco abaixo do cotovelo. Logo outro pedaço desse metal agora menos fino e ainda dourado retorna, em formato de um pequeno escudo alongado que cobre a parte de fora do braço direito. Seu rosto sereno e olhos fechados completam os contornos de uma mulher sentada e encostada na parede com a cabeça largada para lado.
Sua respiração suave conforta Sarah de uma forma que ela não ousa dar nem mais um passo ou se quer fazer algo que a desperte. Então decide se encostar na parede do lado oposto e se sentar de pernas cruzadas enquanto apoia sua cabeça na mão esquerda que está com o cotovelo apoiado na coxa do mesmo lado. Sua face levemente direcionada para a mulher, somente a contempla em silêncio. O som da água caindo naquele ambiente estreito é o único que se perpetua pelo corredor e se desfaz pela pequena abertura entre a madeira. Após alguns minutos, Sarah acaba pega no sono sem perceber.
Quando ela volta a abrir os olhos, a mulher não está mais ali. Seu olhar então se vira ao chão junto de sua face, e sua mão que antes apoiava sua cabeça, agora corre por seu rosto de cima a baixo como se quisesse tirar algo que não existe dali. Quando seu olhar se volta para frente e para baixo, uma bota marrom se apresenta inesperadamente, ao correr seu olhar por ela enquanto vai subindo. Uma face serena com um olhar violeta penetrante a observa silenciosamente.
Seus olhares se cruzam e por alguns segundos permanecem estáticos, serenos e silenciosos. O rosto de Sarah se cora juntamente com o da mulher a sua frente. As duas desviam seus olhares por um instante, e logo sutilmente se põem de pé. Então voltam a se encarar por mais alguns segundos.
Uma mão se estende lentamente para frente em busca de reciprocidade, na face de Sarah um leve sorriso de boca fechada surge enquanto também levanta sua mão em busca de retribuição. Outro sorriso de boca fechada surge ao contato.
— Prazer! Me chamo Shymphony! — Uma voz rouca, marcante e ao mesmo tempo suave, massageia o fundo dos ouvidos de Sarah. Seu olhar violeta a encara sem hesitar.
— Eu me chamo Sarah! — Sem titubear em seu olhar centrado na face de Shymphony ela retorna.
— O oque faz aqui? — Já com as mãos voltando para seus espaços, Shymphony se adianta.
— Estava explorando o palácio! Quando me dei conta, cheguei aqui! — Sarah responde enquanto olha para a porta de madeiro ao fundo do corredor por um instante e retorna para Symphony.
— Você chegou a pouco, certo? — Shymphony a indaga novamente enquanto lança um olhar sutil para um dos braços de Sarah e retorna para a face dela.
Sarah só consente com a cabeça.
— É raro encontrar alguém aqui! —O olhar de Shymphony se lança para a cachoeira enquanto sente o vento gelado tocar sua face. — Por isso gosto de vir aqui!
— Não quis incomodar! Mas também não pude resistir. — Sarah lança um olhar observador em Shymphony de baixo acima. Então volta sua face também para cachoeira.
As duas encostadas nas paredes, voltam a ficar em silêncio por mais alguns segundos enquanto observam as gotículas de água que se desprendem da cachoeira.
— Você gosta de livros? — Shymphony com seu olhar distante joga um convite ao vento que faz seu papel de carregá-lo até Sarah. Que por sua vez em um gesto natural de conforto e segurança, fecha os olhos e encosta a cabeça na parece, enquanto vai fechando os olhos e se perdendo em imaginação.
— Como não gostar? — Um sorriso de boca fechada surge no rosto de Sarah.
Inesperadamente Sarah sente uma pegada quente, firme e forte, mais forte do que esperado agarrando sua mão esquerda e a puxando pelo corredor. Sem resistência, ela só se deixa ser levada. Esse toque não dura muito, logo ao chegarem onde as portas de metal se encontram, Shymphony a solta.
— Espere aqui por favor! — Shymphony a deixa enquanto se direciona para a porta de entrada.
Sarah a observa se distanciar com um caminhar fluido. Alguns segundos depois, ela sente as correntes de ar mudar suas direções. E lá na frente Shymphony começa a retornar enquanto vai sendo iluminada novamente pela luz acima da cachoeira.
Dessa vez Sarah repara em como ela é atlética e tem uma postura centrada.
— Vem! — Shymphony joga sua fala na direção da porta de metal a direita enquanto começa a se apoiar com as duas mãos, uma de cada lado da porta.
Com uma súbita mudança de postura, sua perna esquerda vai para trás e a direita se dobra levemente a frente, fazendo seu centro de gravidade se abaixar. Uma sutil, porém, marcante vibração toma conta do ambiente ali ao redor. Seus braços levemente dobrados, agora se esticam para frente revelando desenhos de músculos sob a pele na parte de traz de seu braço e antebraço. A porta de metal então começa a se mover e a se abrir para dentro enquanto arrasta sutilmente em um piso batido todo cinza. Ela se abre o bastante para que cada uma delas passe uma de cada vez.
— Vamos! — Shymphony novamente a chama.
— … — Sarah somente a companha, enquanto observa na larga espessura daquela porta, mas logo seu olhar não resiste em rapidamente fazer uma corrida pelo ambiente que se revela.
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