Índice de Capítulo

    — Você por acaso, já viu alguém usando um anel parecido com esse? — Berequias vira o dorso de sua mão direita para ela, com os dedos apontados para a esquerda. No dedo indicador, um anel todo preto com algumas inscrições em prata se revela.

    Helvetia se aproxima quase ao ponto de parecer querer beijar a mão dele. Inspecionando cada detalhe, repara em algumas falhas ali, outras aqui. E como o anel parece ser mais antigo do que qualquer coisa que já viu.

    — Sinto muito. É a primeira vez que vejo uma velharia de tal elegância. — Ela executa suas palavras até com certo respeito por ele.

    — Era de se esperar. — Ele volta sua mão para perto do corpo enquanto vagueia com o olhar entre ela e o Carvão de Sangue. — Existem sete anéis como esse. Cada um, parte de um poema. Que quando lido por completo face ao espelho negro. Abre uma porta para a “casa do demônio”. — Ele termina sua fala voltando seu olhar para o anel por um momento.

    — Casa do demônio. E por que alguém ia querer abrir uma porta para tal lugar? Já não temos perigos de mais por aqui? — Ela vai se aproximando da bancada presa a parede. A sua frente, algumas pontas de lança extremamente finas, feitas de alguma madeira branca repousam a sua frente.

    — É um problema de família, se sabe como é. Difícil de explicar, mais ainda de entender. — Ele passa a mão por traz da cabeça coçando a nuca. Então ele se vira para observa-la mais um pouco.

    — Família é complicado. — Mais um sussurro do que uma fala se desfaz no ar junto de seu olhar saudoso para aquelas pontas. E em um movimento sutil ela as junta na mão e se direciona até Berequias. — Um presente por ter guardado meu segredo.

    Estendendo a mão com a palma para cima, ela as oferece para ele. Que ao observá-las, já começa a se perder em pensamentos mesmo antes de tê-las em posse.

    — Isso será de grande ajuda para onde estou indo! Muito obrigado. — Ele termina sua fala já com elas em sua mão enquanto as faz dançar um pouco com um movimento sutil e sequencial de dedos que se fecham e abrem.

    — Espero que sim. Elas foram difíceis de serem feitas. Mais ainda de conseguir a matéria prima para fabricá-las. — Helvetia vai se aproximando da porta que separa esse quarto da parte principal de seu estabelecimento. Do outro lado da porta é possível ver a parte de trás do balcão principal. — Vamos! Preciso encontrar um certo alguém para prosseguir com meu trabalho.

    Consentindo com a cabeça, ele começa a segui-la para fora.

    — Espero que tenha sorte em sua busca Berequias Aatral. — Ela joga palavras ao ar já de costas para ele, enquanto se afasta pela rua.

    — Lhe desejo o mesmo com relação ao seu trabalho! — Respondendo a altura, ele começa a caminhar na direção oposta.

    “Eu realmente vou precisar” — Helvetia sente seu coração pulsar um pouco mais forte que o normal.

    ==========================================================================

    Sede da Guilda dos Pescadores. Zona Central da ilha.

    Homens, mulheres, e até crianças se enfileiram em duas colunas a frente do balcão principal de atendimento. Duas mulheres loiras de peles bronzeadas, se apresentam em pé do lado de lá para tal serviço. A da esquerda ostenta um olhar esverdeado que vaga entre o caderno a sua frente, sobre a madeira cinza do balcão e um homem de aparência desgastada, franzino e com vestes cinzas, simples com alguns rasgados.

    — Pode assinar aqui senhor! — Ela vira o caderno para o lado dele, e aponta para uma linha em branco abaixo de vários outros nomes assinados. A pena com a ponta banhada por uma tinta preta passa da mão dela pra dele.

    — Eu vou pegar uma fera daquela e ficar rico. — Ele explana com confiança com as mãos trêmulas ao ponto de mal conseguir assinar seu nome. — Eu só preciso acreditar! — Essa fala sai pausada enquanto ele se esforça. — Bram! Da pra entender isso moça? — Ele a indaga após devolver o caderno para ela junto da pena.

    — Bram. Perfeitamente senhor! — Com um sorriso gentil de olhos quase fechados ela o responde. — Agora se quiser saber quais são as recompensas que pagamos por cada espécime. É só checar aquele mural. — Ela aponta com o dedo para sua esquerda em direção a uma parede com vários papéis presos a parede com desenhos dos mais variados peixes e outras criaturas aquáticas. — E se quiser se aprofundar mais, no segundo andar, em nossa biblioteca, temos livros com relatos, dicas e tudo mais que você pode precisar para começar a sua jornada conosco. Seja vem vindo Bram. — Ela termina de falar dando uma ultima olhada para o corpo franzino dele.

    — Grato! — Uma resposta tão curta quanto suas passadas ligeiras em direção aquela parede.

    Quando o próximo da fila se apresenta, o olhar da atendente até se serra por um instante.

    — O motivo de todo esse alvoroço! —  Ela observa de relance os braços torneados e a pele bronzeada da mulher que se apresenta.

    — Eai Lyanna!! — Helvetia assume uma postura mais descontraída, com um sorriso bobo na cara.

    — Decidiu vendê-lo? — Lyanna vai logo tentando descobrir o motivo dela estar ali.

    — Tem como falar mais baixo? Não quero causar um tumulto por aqui. — Helvetia se escora no balcão e tenta se aproximar o máximo que pode dela enquanto sua voz sai baixa o suficiente só para as duas.

    — Então me diga logo oque veio fazer aqui? Ele não vai gostar nada de vê-la por aqui. Ainda mais agora. — Lyanna retribui o sussurro enquanto lança olhares para o lado e para trás.

    — Preciso de um favor. — Helvetia franze a testa enquanto lança um olhar de gato abandonado para ela.

     A atendente do lado direito, quando de relance vê a cena, e curiosa, vira a cabeça para observar melhor. Ao ver quem está ali, mal consegue se conter.

    — Só um momento moça. — Ela de forma agitada, vem se aproximando para perto de Lyanna enquanto lança olhares para Helvetia. — Ei, não consegue me arrumar uma escama ou duas? — Sem perder tempo, já vai abrindo o jogo com sussurros tão baixos quanto das duas.

    — Oi Ely! Olhos lindos como sempre. — Helvetia até se perde ao vagar entre o olho esquerdo banhado por um azul celeste com traços negros, e o direito que esbanja um tom esverdeado como o de Lyanna, porém interrompido por alguns traços amarelos.

    — Oh! Tu pode parar. Dessa vez eu não caio nesse papinho não! A não ser que me arrume as escamas. — Ely até levante de leve as sobrancelhas, deixando mais evidente ainda seu olhar único.

    — Depois do pôr do sol. Na taverna de sempre! — Helvetia sorri de forma tímida, enquanto seu olhar foge do dela e se perde no chão amadeirado do local.

    Sem responder nada, com um sorriso genuíno de canto a canto, Ely responde positivamente com a cabeça, e de forma sorrateira vai retornando para seu atendimento.

    — Por que vocês não se assumem logo? — Lyanna corta o clima com suas palavras arrojadas.

    — Tá com ciúmes é? — Agora quem levanta as sobrancelhas é a Helvetia.

    — Não fale besteiras! Você sabe muito bem meus gostos. — Ela tira de ombro, e logo vai lançando mais um olhar para trás. — Qual favor?

    — Eu preciso saber qual foi o material usado pela guilda para fabricar aquela faca. — Os sussurros se tornam mais sorrateiros do que antes. Helvetia até coloca a mão de um lado da boca para evitar que o som se propague muito.

    — Faca? — Lyanna esboça uma expressão de dúvida por um momento, mas logo sua mente traz a resposta. — Ah! Entendi. Eu posso dar um jeito nisso. Mas terei meu preço. — Em uma postura centrada de uma negociadora. Ela até coloca as mãos juntas sobre o balcão.

    — Não esperava menos. — Trocando olhares, elas ficam em silêncio por um momento. — Já sabe onde me encontrar! — Helvetia dá um passo para trás, assumindo uma postura mais em pé e ereta.

    — Combinado. — Lyanna a responde com um sorriso de boca fechada e o olhar serrado como se estivesse em mais um atendimento.

    — Bom, deixa eu ir antes que ele apareça. — Helvetia vai se esgueirando para fora do lugar de forma apressada.

    Alguns minutos depois.

    — Eu juro que senti uma presença incômoda por aqui!! — O senhor de cabelos grisalhos e tecidos largos e marrons chega vindo de trás, e para do lado de Lyanna enquanto observa o alvoroço do ambiente.

    — Tem muitas pessoas hoje. Deve ser por isso! — Ela até respira de forma controlada enquanto lança um olhar para ele e volta para o homem a sua frente. Ele é forte, cabelo marrom e curto. Está vestindo uma armadura de couro.  Porta um escudo nas costas e uma espada negra na cintura.

    — Tudo culpa dela. Um desperdício não tela conosco! — O homem de trajes largos e marrons lança seu olhar cinza pelo salão a sua frente uma última vez e vai retornando para a porta no fundo do local.

    — Ual!! O mestre Troyes em pessoa. — O homem forte mal se contém enquanto lança olhares de admiração para o homem que já quase some pela porta. — Ei, é verdade o que dizem sobre ele? Um príncipe exilado das terras do norte? — Ele indaga ao vento esperando que Lyanna tenha respostas.

    — Humm. Rutnir certo? — Ela retribui a indagação.

    — Sim, isso mesmo. — Ele até assume uma postura de quem está em guarda de algo.

    — São boatos. Não se sabe ao certo de onde ele veio. Mas já ouvi ele sussurrar algo sobre um tesouro distante uma vez, depois de ter bebido mais do que devia. — Helvetia até segura sua fala após isso.

    — Dizem que ele foi o único a capturar um fantasma do norte. — Rutnir até se aproxima novamente do balcão para falar mais de perto.

    — Novamente. Boatos. — Lyanna até se perde na imaginação por um momento, mas logo retoma. — Ele é o fundador dessa guilda. Somos muito gratos. Então peço que tome cuidado com boatos sobre Mestre Troyes.

    — Sinto muito. — Rutnir passa a mão na cabeça por trás da nuca e da uma coçada sem jeito. — Bom, vou indo! Tenho uma escolta para realizar. Obrigado! — Ele se despede meio sem jeito abrindo espaço para o próximo.

    Alguns minutos depois.

    — Vejamos! Você se chama Adão certo? — Lyanna solta suas palavras enquanto observa a pelagem negra e as vestes brancas dele.

    Apoie-me

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 0% (0 votos)

    Nota