Capítulo 555 - Transmissão de Mana
Um dos maiores tabus entre os Magos era a transferência de mana entre pessoas. Isso porque um único erro poderia fazer com que tanto o transmissor, quanto o receptor fossem feridos ou até mesmo mortos no processo, muitas vezes, aquele que recebia o mana forçado em seu corpo o recusava instintivamente, levando a um acidente.
Diferente do processo de cura, onde o mana introduzido era usado pelo Mago de Cura para recuperar as células do corpo, consumindo a energia no processo, ou a sondagem do corpo com mana, onde este seria inserido e rapidamente retirado em seguida, a transferência de mana de um indivíduo para outro, era algo bastante distinto. Era necessário lentamente estabelecer uma ligação entre os dois lados, lançando vagarosamente o mana para que o corpo da pessoa que estivesse recebendo o aceitasse, pouco a pouco se misturando ao seu. No entanto, se uma rejeição ocorresse ou a conexão se tornasse instável, o transmissor corria sérios riscos de sofrer um rebote.
Por isso, apenas Magos experientes se atreviam a ajudar novatos no seu caminho no Sistema de Magia, guiando-os e os ensinando a controlar seu mana, e mesmo assim o risco era tão alto que até aqueles mais confiantes evitavam fazê-lo a menos que fosse um aprendiz excepcional.
Mas o corpo de Fernando parecia funcionar de uma maneira extremamente oposta a isso! Ela nunca tinha ouvido falar de Canais ou Veias de Mana que tomassem a iniciativa de absorver um mana estranho ao seu por conta própria! Pelo contrário, eles deveriam repelir e rejeitar! Anastasia sentiu como se estivesse alucinando, nunca viu algo sequer similar a isso.
O processo de transmissão livre de mana era tema de grandes debates no meio acadêmico. Havia até mesmo alguns estudos públicos de Magistas famosos que haviam trabalhado para descobrir meios seguros de transferir mana de uma pessoa a outra. Caso conseguissem, isso revolucionaria diversas áreas, desde as acadêmicas até as de combate. Entretanto, por mais que estudos e pesquisa tivessem sido realizados, ninguém alcançou resultados satisfatórios e logo o assunto se tornou um tabu. Porém, bem diante de seus olhos, a Maga de Cura estava vendo isso acontecer.
Encostando seu mana naquelas estranhas Veias, a mulher ficou hipnotizada, enquanto via aquilo o puxando e tentando absorvê-lo, era como se estivessem famintas por mais.
Fascinante! É por isso que ele me fez assinar aquele contrato estranho? Não me admira que ele seja tão cauteloso! E se eu deixar isso pegar um pouco do meu mana? pensou, com uma curiosidade persistente. Mesmo que estivesse assustada e com medo do jovem Tenente fazer algo com ela em retaliação ou até mesmo acabar ferindo a si própria no processo, seu lado de pesquisadora também estava sendo atiçado. Só um pouco, acho que não faz mal…
Ao pensar até aí, lançou um leve fluxo de mana livremente ao redor das Veias, lentamente permitindo que fossem absorvidas. Ao fazê-lo, as ramificações se contraíram, puxando tudo ao redor num único instante, a impressionando com a rapidez que aquilo havia acontecido.
Assim que isso ocorreu, Anastasia sentiu uma sensação bizarra, quando seu próprio mana, que ainda estava ligado a ela, foi sugado e em instantes invadiu os inúmeros caminhos dentro das Veias.
O que… é isso?!
Aquele mana frio que estava presente em todo o corpo do rapaz, estava muito mais intenso dentro das Veias, era como se elas e o restante do corpo estivessem separados por um fino velcro que isolava o lado interno e externo e qualquer um que analisasse seu corpo superficialmente apenas veria vagamente os segredos contidos dentro, que já eram extremamente surpreendentes e assustadores por si só.
Contudo, agora, ela havia visto algo ainda mais incrível e apenas conseguiu isso por permitir que seu próprio mana adentrasse nas Veias, algo que era muito arriscado de se fazer, tanto que mesmo ela não acreditava que estava assumindo tal risco. Mas ao fazê-lo, finalmente pôde ver com clareza a diferença.
Anastasia sentiu como se tivesse mergulhado numa piscina gelada e cristalina, com um alto nível de pureza. Em termos de comparação, mesmo um Capitão iniciante não parecia se igualar aquilo. Mas algo parecia estranho, mesmo sendo puro, o mana contido não tinha uma grande quantidade de energia, era como se estivesse adaptado ao nível em que o Tenente deveria estar. Quanto mais ela via aquilo, mais se perguntava como era possível.
Se eu não tivesse inserido meu mana, nunca teria visto essa maravilha! Afinal, o que é essa pessoa, ou melhor, quem é esse monstro? pensou, completamente assustada.
Seja suas Veias, Canais, seu próprio mana ou a capacidade de absorver um mana estranho ao seu, havia algo muito estranho com este rapaz e ela não conseguia entender como alguém assim poderia existir.
Ele poderia ser alguém que possui uma Característica? pensou, impressionada, mas logo percebeu que era pouco provável. Pelo que sabia, Fernando teria vindo de uma pequena cidade do Norte e era um Humano Errante, assim como ela, sendo muito raro que um não-avaloniano desenvolvesse uma Característica.
Na maioria das vezes as Características eram aspectos únicos de uma pessoa, com efeitos anormais e poderosos, as tornando superiores a pessoas normais em alguma área. No entanto, até onde Anastasia havia ouvido falar, pessoas com Características poderosas geralmente possuíam graves doenças ou algum outro problema de saúde, com a maioria morrendo ainda em tenra idade, principalmente os Avalonianos, que não recebiam qualquer tipo de benção da Matriz do Mundo. Todavia, pelo que ela havia observado, Fernando era um indivíduo perfeitamente saudável, então este não deveria ser o caso.
Se ele não tem uma Característica, então por que suas Veias de Mana e seu próprio mana são tão estranhos? questionou-se, intrigada. A mulher começou a tremer, com uma leve excitação. Se eu puder entender melhor o que acontece no corpo dessa pessoa, isso pode me ajudar a me tornar uma Maga de Cura Avançada!
A verdade é que ela sentiu que se pudesse desvendar os segredos por trás disso, mesmo se tornar uma Maga Sênior poderia estar ao seu alcance, mas não se atreveu a sequer imaginar tal cenário distante.
“Senhorita Anastasia, e então? Há algum parasita?” Fernando perguntou, com um semblante calmo, mas sua voz carregava um teor inquisitivo.
Ele próprio havia checado seu corpo e não havia notado nada de estranho, perguntando-se como deveria ser esse tal parasita e se com seu nível de proficiência em Magia de Cura ele seria capaz de identificá-lo. Além disso, também sentiu o mana da mulher ir a vários locais estranhos, o que o fez franzir a testa.
Isso o levou a se perguntar se a mesma viu algo que ele próprio não encontrou, ou se ela apenas havia se surpreendido com as suas particularidades. Lembrando-se dos rostos dos Magos que Dimitri enviou para cuidar dele quando foi envenenado, era natural que ela também ficasse igualmente surpresa.
Com a pergunta, Anastasia, que estava imersa em pensamentos e divagações, rapidamente voltou a realidade, percebendo algo.
O que estou pensando? Estudar essa pessoa? Me tornar uma Maga Avançada? Ele é um sujeito cruel e que me escravizou! Se eu tentar fazer algo e irritá-lo, quem sabe o que ele fará comigo?
“Ah… N-não, realmente não. Você está perfeitamente bem. Chequei por todos os lados e não encontrei nenhum vestígio do parasita. Vou usar minha Magia de Cura agora mesmo.” disse, nervosamente, então começou a ativá-la.
Com os efeitos da Habilidade de Fernando, somado a Poção de Cura Intermediária e agora a Magia, isso potencializou ainda mais o processo regenerativo e logo os ferimentos do Tenente, que estavam se curando rapidamente, começaram a se fechar em instantes.
O jovem pálido sentiu os locais que haviam sido atingidos formigarem e pinicarem, causando um certo incômodo, mas, ao mesmo tempo, a dor estava diminuindo.
“E-está acabado, senhor.” A Maga disse, respirando pesadamente. Não só ela havia usado mana para curá-lo, como acabou desperdiçando um pouco ao investigá-lo.
Ao ouvir isso, o rapaz levantou-se da mesa, então girou levemente o ombro direito em movimentos circulares. Não sentindo qualquer desconforto, assentiu, satisfeito.
Parece que ela realmente foi uma aquisição positiva para o Batalhão. pensou, sentindo-se satisfeito. Ter um Mago especializado em Cura era algo extremamente conveniente. Agora vamos lidar com os problemas que vem a seguir. Eu consegui sobreviver dessa vez, mas como eu faço para chegar até os outros? Mal saímos e quase fomos dizimados…
“Obrigado pela ajuda, senhorita Anastasia.” disse educadamente, enquanto pegava a parte superior da sua Armadura Negra Kinfar. Mesmo que estivesse danificada, não se importou, vestindo-a.
Ele realmente me agradeceu? Isso não parece algo que um sequestrador maluco diria… Anastasia ficou surpresa com a educação e gentileza do rapaz, mas de repente algo veio a sua mente. Espere! Ele não está planejando me induzir a ter uma Síndrome de Estocolmo ou algo parecido, né? Acho que já li sobre algo assim num livro de psicologia, psicopatas gostam de brincar com suas vítimas, fingindo serem bonzinhos e amigáveis e então as transformam em escravas… refletiu, sentindo um arrepio na espinha. Esse cara, ele quase me enganou! Eu não vou cair nessa! De forma assertiva, a garota decidiu ignorar qualquer tentativa de aproximação dessa pessoa. Ela não estava interessada em se tornar brinquedo de um lunático como esse!
“Quanto ao que você viu hoje… Vamos precisar ter uma conversa depois.” Fernando complementou, com uma voz calma.
C-conversa? O que ele quer conversar comigo? Ele sabe que eu estava investigando o corpo dele? Será que ele vai me dar um fim para esconder tudo que vi?!
Enquanto a mulher tinha inúmeras perguntas em sua mente, cheia de medo, o rapaz estava ocupado, colocando sua armadura. Ao passo em que fazia isso, sua expressão mudou, franzindo a testa, quanto mais ele pensava sobre como levar uma equipe de resgate até os sobreviventes, mais seu humor piorava.
“Errr… Eu…” Anastasia gaguejou, tentando dizer algo, mas devido à expressão aparentemente irritada dele, a fez ficar com medo de continuar, com as palavras morrendo em sua garganta.
Apenas quando o jovem pálido partiu é que a garota sentiu algum alívio. Contudo, ao lembrar sobre a tal ‘conversa’ mencionada por Fernando, não conseguiu evitar imaginar-se amarrada em uma cadeira enquanto o rapaz manuseava instrumentos de tortura.
Por que fui ser tão curiosa? Estou acabada!
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