Capítulo 564 - Perdendo o controle
“Eu só estou dizendo a verdade… Até onde você consegue ir levando um ferido antes de ser encontrado? Já estamos sem Poções de Cura. A última impediu que eu sangrasse até a morte, mas isso é tudo.” falou, com dificuldades. “Além disso, você já está no limite e ainda temos civis para proteger.”
Logo atrás dos dois homens, um pouco mais afastados, haviam mais cinco pessoas, caminhando com dificuldade. Uma delas era Keiren, o Mago usuário de Magia de Terra, supervisor da Guilda Construtora Pedra-Broca, uma das que havia sido contratada pelos Leões Dourados para reforma da cidade e construção de algumas instalações externas.
“E que diabos eu deveria falar para a Emily? Que abandonei o namorado dela para morrer no meio do nada? Que agora ela é uma viúva antes dos vinte anos? É isso que você realmente quer?”
Ao ouvir tudo isso, Ronald ficou em silêncio, sem se atrever a retrucar. Mesmo sabendo que estava atrasando seu amigo, a verdade é que ele não queria morrer naquele lugar. Pensar no rosto de Emily o fazia querer viver, mesmo que talvez estivesse arrastando seu amigo para a morte nessa situação. Esse era um pensamento egoísta e ele sabia muito bem disso.
“É melhor você calar a boca, se não quiser que eu te coloque para dormir, bem gentilmente…” falou, de forma ameaçadora.
O homem na maca improvisada balançou levemente a cabeça, sorrindo, estava claro que Noah não iria ouvi-lo, independente do que ele dissesse.
Você é um bom amigo, Noah. pensou, consigo mesmo. Por mais que o sujeito tivesse se tornado um pouco difícil de lidar no último ano, muitas vezes pensava nos seus companheiros mais do que em si próprio.
Logo atrás, Keiren tinha uma expressão levemente preocupada e estava suando frio, nunca tendo imaginado que acabaria precisando fugir por sua vida dessa forma.
Nunca deveríamos ter aceitado esse maldito trabalho. Onde estávamos com a cabeça? Aceitar construir em pleno fronte de guerra de uma Legião que sequer pode nos oferecer segurança?! esbravejou em sua mente.
“S-senhor Keiren, até onde nós vamos? Mal conseguimos escapar daqueles malditos monstros, mas se continuarmos a andar assim sem rumo, no meio da floresta… Eu mal consigo enxergar alguma coisa.” Um dos homens exclamou, preocupado.
Diferente de Magos e Militares que dominavam magias, eles não podiam enxergar no escuro, se não fosse o fraco brilho do luar, mal poderiam se mover naquele breu.
“Apenas aguentem mais um pouco.” O Mago disse, tentando exalar confiança. “Em breve estaremos em casa, eu garanto!”
Apesar de dizer isso, nem ele mesmo acreditava em suas palavras. Antes haviam quase cem homens de sua Guilda Construtora, além de dezenas de Soldados, mas no fim só haviam restado sete pessoas.
Durante a confusão, as criaturas atacaram de todos os lados, matando vários deles e se alimentando de seus corpos. Eles só haviam conseguido fugir porque muitas delas se distraíram com os mortos, enquanto outras pareciam assustadas com algo, com poucas se atrevendo a persegui-los na floresta.
“Nós realmente podemos confiar nessas pessoas? Olha a situação em que estamos! Além disso, só sobraram dois militares e um deles está praticamente morto.” Outro trabalhador cochichou, tendo certeza de manter sua voz baixa.
“Ei, acredito que o que nos atacou antes eram Carniçais.” Outro homem disse, sussurrando.
“Carniçais?”
“Sim, são algumas das Criaturas das Trevas mais comuns no Sul.”
“Merda, saber disso não nos ajuda em nada! Por que está falando disso agora?!”
“Espera, me ouçam. Ouvi dizer que Carniçais são bons em rastrear e sentem cheiro do sangue de suas presas a uma grande distância. Sendo assim, o que acha que vai acontecer se continuarmos a manter aquele cara moribundo conosco?” comentou, apontando para o homem sendo puxado na maca de pano improvisada.
Quando essas palavras foram ditas, alguns deles engoliram em seco. Mesmo Keiren, que tentava manter uma atitude mais confiante, não pôde evitar de tremer ao pensar na mera possibilidade de ser perseguido por aqueles monstros terríveis novamente.
“Ei, seu bando de filhos da puta. Eu consigo ouvir toda essa merda que vocês estão falando! Se continuarem a falar porcaria, vou deixá-los para trás!” Noah falou, a frente, com uma voz irritada.
Ronald, que estava sendo puxado, riu suavemente. Com seu Físico atual, ele também poderia ouvi-los com facilidade, mas não estava com raiva, pois entendia que eram apenas pessoas assustadas e desesperadas para sobreviver.
“Eles não estão errados Noah. Se o que ele disse for verdade…”
Keiren, que estava atrás, andou um pouco mais rápido.
“Oficial Noah, eu entendo que o senhor Ronald é seu amigo, mas estamos falando da vida de muitos outros aqui. Realmente vale a pena, arriscar a vida de seis pessoas devido a um único indivíduo? Além disso, se ele ficar para trás, pode até ganhar algum tempo para nós…”
Assim que o homem disse isso, Noah parou seus passos, então soltou delicadamente o pano amarrado na madeira, sobre o qual Ronald estava e virou-se em direção ao sujeito, caminhando até ele.
O Mago ficou feliz por um momento, acreditando que suas palavras haviam o convencido, mas sua expressão mudou no momento seguinte, quando foi subitamente agarrado pela sua camisa.
“Escuta aqui, seu monte de merda, ele está nesse estado porque arriscou a vida dele para resgatar vocês! No lugar de serem gratos, estão me pedindo para abandoná-lo, como se fosse uma isca de carne, para ser devorado vivo?!” Noah gritou, furioso. “Vocês estão ouvindo a si mesmos?!”
No instante em que o Oficial levantou sua voz, todos os trabalhadores, bem como Keiren, tremeram.
“O-oficial Noah, por favor, não fale alto!” Os homens imploraram, temendo que algo na densa escuridão pudesse ouvi-los.
“Mais uma palavra e eu deixo todos vocês para trás!”
Quando Noah disse isso, Keiren ficou inicialmente assustado, mas logo sua expressão ficou escura.
“Nos deixar para trás? Que direito acha que tem de dizer isso? O seu dever, ou melhor, o dever da sua legião, era nos proteger e olha como isso terminou!” exclamou, apontando para os poucos trabalhadores que restaram. “Nossa Guilda sofreu devido à incompetência de vocês!”
Ao ouvir isso, as veias do homem loiro saltaram em sua testa.
“Incompetência? Eu perdi dezenas de homens para salvá-los! Nós poderíamos simplesmente tê-los abandonado e talvez alguns dos meus Soldados ainda estariam vivos, mas ficamos até o fim, cumprindo o nosso dever!”
“Isso mesmo, o seu ‘dever’, essa era sua função, afinal!” O Mago retrucou, com um olhar frio. “Não fizeram nada mais do que o acordado e ainda sim falharam miseravelmente na sua obrigação.”
No momento em que Noah ouviu isso, uma fúria intensa o atingiu, então suas mãos, que estavam agarradas a camisa do sujeito, subiram, indo em direção ao pescoço do homem, apertando-o com força.
“O-oficial Noah, o q-que está fazendo?! Ficou louco!” Keiren disse, enquanto o aperto em sua garganta aumentava, ele tentava, desesperadamente, se libertar. “E-eu sou o Supervisor da Guilda Pedra-Broca, contratado pela sua legião e tenho um contrato de proteção com vocês! Você ousa me matar?!”
Ronald, que estava deitado, quase imóvel, ficou assustado ao ver seu amigo tão cheio de ira.
“Noah, acalme-se. Não vale a pena!” pediu, sem poder levantar, para intervir.
“Os militares querem nos matar!” Um dos trabalhadores exclamou, caindo para trás. “Eles vão nos matar para esconder seu fracasso!”
Um dos homens correu sozinho pela floresta, escapando. Enquanto os outros ficaram paralisados pelo medo, sem se atrever a sair do lugar. Mesmo com dois deles segurando ferramentas de construção para se proteger, sabiam que era inútil contra um Oficial de uma Legião.
Todos os seus músculos tremerem, enquanto Noah estava sentindo-se inundado de um sentimento de raiva.
O Mago agora tinha um rosto vermelho como tomate e seus olhos estavam ficando cada vez mais saltados, Noah pensou que simplesmente deveria acabar com o mesmo ali. Se ele quisesse, poderia quebrar o pescoço do homem tão facilmente quanto quebrar o de uma galinha.
No entanto, antes que fizesse isso, algo veio a sua mente. ‘Os que estão acima sempre são os responsáveis… Independente se o resultado for bom ou ruim, aqueles cujas vidas foram perdidas não voltarão.’. Essas palavras de Fernando ecoaram em sua cabeça, fazendo-o largar involuntariamente o homem.
Tosse! Tosse!
Segurando seu pescoço, o Mago de Terra tentou recuperar seu fôlego.
Olhando para o sujeito, em uma situação lastimável e pensando em como quase o matou por causa de algumas palavras, Noah sentiu-se angustiado.
Desde quando me tornei assim? questionou-se, sem entender como havia mudado tanto. De alguém simpático e que era bom em fazer amizades, ele havia se tornado alguém ranzinza e que perdia a calma tão facilmente. Isso não está certo… Preciso me conter.
Inicialmente ele estava furioso com o homem devido ao adiamento em voltar para a cidade, se tivessem feito isso, todos estariam vivos naquele momento. Porém, percebeu que a culpa não era apenas do Supervisor da Guilda, mas também dele próprio, que havia concordado com tudo isso.
De certa forma, ele estava apenas jogando suas responsabilidades para outra pessoa, assim como Fernando havia dito a Trayan no dia do ataque aos Ciclopes. As palavras do jovem Tenente se encaixavam perfeitamente em sua situação atual.
Respirando fundo, o sujeito loiro voltou para a frente do grupo, preparando-se para levantar novamente a maca.
“Eu não vou matá-los, mas é melhor não dizerem mais bobagens, ou não sei do que sou capaz…” advertiu.
Um dos trabalhadores, apesar de hesitante, fez uma pergunta.
“E… Quanto ao Waller, ele saiu sozinho…” falou, apontando na direção que o homem fugiu.
“Isso não é mais da minha conta, ele foi embora com as próprias pernas, não tenho a obrigação de cuidar de ninguém que não quer a minha proteção.”
“Não!”
Noah mal havia terminado de falar, quando ouviu um grito ao longe, vindo da direção que o sujeito fugiu.
Sem hesitar, tirou sua espada e escudo, preparando-se para lutar.
“E-estamos acabados, eles nos ouviram. Eu avisei!” Um dos trabalhadores falou, tremendo.
Tac! Tac!
Som de passos e galhos quebrando soou, quando uma figura surgiu da escuridão. Ao ver aquilo, os olhos de Noah e dos demais se arregalaram.
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