Capítulo 632 - Contrato e concessão
Com um olhar cheio de confiança, o Gerente Sênior tomou a iniciativa.
“Como eu disse Tenente, meu interesse é que nós dois lucremos. A venda desses materiais não foram tão interessante para as Lojas Etéreas, mas nós os compramos a um valor justo e eu pessoalmente acrescentei um bônus, por você ser um parceiro comercial de longa data da nossa filial de Belai.”
Fernando tinha uma expressão séria. Ele não respondeu Diogo, mas sabia que era verdade.
O preço estimado da venda dos materiais que entregou a Rani anteriormente era de 50 a 70 moedas de ouro, porém raramente se conseguia vender os produtos pelo preço avaliado e sendo uma empresa que trabalhava com a revenda, como as Lojas Etéreas, eles pagariam um valor muito menor, para que pudessem ter algum lucro. No entanto, dessa vez haviam pago o preço cheio, parte em ouro e parte em materiais, como acordado.
Mesmo que tivesse tido uma péssima primeira impressão do homem, o jovem Tenente tinha que admitir que ele sabia como demonstrar sua boa vontade quando queria.
As Poções e o dinheiro foram preparados muito antes do encontro, então ele já planejava pagar isso desde o princípio. Mesmo assim, propositalmente agiu daquela forma antes para me testar. Fernando pensou, com rosto inexpressivo, tendo entendido um pouco do jogo do sujeito.
“Eu agradeço a gentileza, Gerente Diogo.” respondeu, sem transparecer muito.
“Quanto ao que eu solicitei antes… Veja bem, senhor Fernando, não é que eu esteja desconfiando de você, mas negócios são negócios. Eu já mostrei minha boa vontade, então seria ótimo se você pudesse fazer o mesmo.” O sujeito de barba por fazer falou, cheio de espontaneidade, muito diferente do seu jeito torrão de antes.
Fernando franziu a testa por um momento, sabendo que o homem estava tentando manipulá-lo, mas não se importou. Movendo o pulso, uma Pulseira de Armazenamento apareceu em sua palma, quando ele despreocupadamente a jogou em sua direção.
Tanto Rani, quanto o próprio Gerente foram pegos de surpresa com essa ação repentina.
“I-isso…” Mal conseguindo agarrar o item em suas mãos, Diogo olhou para o rapaz pálido com uma expressão cheia de entendimento, percebendo que o problema não era a exigência dele em ver a mercadoria, mas a forma como foi feito esse pedido. Contanto que ele tratasse o jovem Tenente de forma respeitosa, o mesmo agiria de acordo.
Parece que eu não deveria ter tentando jogar duro com esse garoto. pensou, se arrependendo da sua atuação anterior. Bem, tanto faz. Agora que sei como sua mente funciona, vai ser muito mais fácil lidar com ele.
Observando o interior da Pulseira, seus olhos se apertaram ao confirmar o conteúdo, quando mesmo ele sentiu seu coração acelerar ao ver algo. Dentro havia enormes pilhas de Cristais devidamente organizadas. Mesmo contando apenas por cima, o Gerente Sênior sabia que havia ao menos 8.000 Cristais, entre Dobats e diversas outras criaturas.
Mas o que mais lhe chamou atenção foi que cada pilha estava separada por tipo de criatura e dentre os grupos menores havia alguns Cristais que se destacavam.
Cristais de Orcs Líderes e Líderes Inferiores. Também tem de Ciclopes e até de Ogros! Como exatamente eles conseguiram colocar as mãos nisso tudo?!
Deve-se saber que quanto mais forte fosse a criatura, mais poderoso e puro era o mana armazenado em seus Cristais e maior era as aplicabilidades que possuíam. Então mesmo se a parte mais valiosa fosse os milhares de Cristais de Dobats comuns, esses mais poderosos também iriam alcançar grandes preços, fora a questão do valor agregado.
“Tudo bem, eu já confirmei tudo.” O homem falou, assentindo com a cabeça. “Rani, o contrato.”
A garota loira não parecia muito satisfeita pelo sujeito estar controlando completamente a negociação, já que isso significava que teria menos créditos para ela e seu pai, mas não havia muito que pudesse fazer, já que Diogo tinha autoridade absoluta sobre sua filial. Além disso, ela não estava mentindo quando disse que essa negociação estava além da capacidade deles sozinhos.
Movendo o pulso, Rani fez uma pequena mesa aparecer entre o lado dela e de Fernando. Então, com outro movimento, uma pequena pilha de papéis apareceu sobre a madeira que ela suavemente empurrou para frente.
“Como acordamos antes, Tenente Fernando, um contrato foi emitido pelo Banco Branco, regido pela Legião Torre Branca. Eles fizeram uma avaliação preliminar para o cálculo da taxa de mediação e definiram que o valor estimado do negócio. Como é necessário um depósito antecipado de 3% do valor do contrato para validação, nós tomamos a iniciativa de arcar com os custos de 12.000 moedas de prata, que serão deduzidos do valor final da venda. Além disso, não precisa se preocupar, a taxa é relativa ao preço de avaliação, mesmo que tenhamos um lucro maior do que isso não teremos que pagar um adicional ao Banco Branco, porém também não teremos restituição de valores caso soframos prejuízo.” Rani explicou detalhadamente, sua fala rápida e cheia de confiança, demonstrava que ela sabia exatamente o que estava fazendo. “Cada um de nós ficara com um contrato, onde cada lado o assinará com sua mana. A partir da assinatura, ele já será totalmente válido e caso um dos lados tenha alguma questão de divergência, poderá entrar com uma solicitação de disputa junto ao Banco Branco.”
Lina, que estava ouvindo tudo, ficou impressionada com a mulher. Em relação a ela própria, que era uma iniciante quanto os trâmites legais e contratuais de Avalon, Rani parecia conhecer o assunto muito a fundo.
Agora eu entendo porque o Tenente queria que eu participasse. Com certeza eu posso aprender muito com essa conversa! pensou, cheia de empolgação e nervosismo. Porém, ao pensar com cuidado sobre as palavras da mulher, notou algo. Espera, ela disse que a taxa do Banco Branco é de 3% do valor da negociação. Se eles pagaram 12.000 de depósito, isso não significa que… Essa negociação vale pelo menos 400.000 moedas de prata!
Ao perceber isso, a garota não conseguiu evitar respirar fundo, enquanto involuntariamente tremia e suava como se estivesse em uma sauna, ficando ainda mais nervosa. Então lentamente virou o rosto e ao olhar na direção de Fernando, tentando entender como essa pessoa conseguiu tantos Cristais. Ela tinha certeza absoluta que o Batalhão Zero não tinha conseguido tudo isso!
O rapaz pálido tinha um olhar calmo, que recaiu sobre os contratos na mesa. Então, sem qualquer preocupação, puxou-os para mais perto. Ao pegá-los em sua mão, começou a folheá-los rapidamente e em instantes os devolveu a mesa, da forma que estavam inicialmente.
“T-tenente Fernando, algum problema?” Rani perguntou, forçando um sorriso, afinal ele apenas folheou as folhas e as devolveu sem sequer lê-las.
O jovem Tenente ficou em silêncio por um momento, mas logo negou com a cabeça.
“Nenhum. O Contrato está praticamente perfeito. Poderíamos até assinar agora mesmo.” declarou.
Essa fala repentina fez Rani e até mesmo o Gerente, ficarem confusos. O rapaz sequer havia lido, então por que estava falando em assiná-los assim do nada?
“Tenente, com todo respeito. Mas você deve ler todo o contrato, para que não tenhamos divergências futuras. Uma vez assinado, os termos são irrevogáveis.” A mulher loira avisou, com uma expressão estranha. Mesmo que quisesse essa assinatura quanto antes, sentiu que o garoto estava sendo leviano.
Fernando olhou para ela com um olhar calmo.
“Senhorita Rani, agradeço o conselho, mas eu já li a totalidade do contrato.”
Quando o rapaz disse isso, o sujeito com a barba por fazer à frente franziu a testa e mesmo Rani parecia descontente com essa reposta.
Não analisar o contrato poderia gerar uma série de dores de cabeça para ambos os lados, principalmente num acordo tão grande como esse.
O Gerente estava prestes a dizer algo, mas Fernando foi mais rápido.
“Os termos que apresentei anteriormente, incluindo a porcentagem de 30% dos lucros para as Lojas Etéreas, bem como a posse da residência da Guilda Valorosos em Belai estão presentes no contrato. Também notei que vocês foram extremamente gentis em dar ao Batalhão Zero direitos de uso a todas as rotas comerciais e participação em caravanas das Lojas Etéreas na Zona Divergente e sou muito grato a isso. No entanto, se há um ponto que me deixou com algum incômodo, é quanto a exclusividade de negociações quanto a Poções e Receitas criadas, ou em posse do Batalhão Zero. Não pude deixar de notar que a cor da tinta nessa parte está levemente diferente do restante do contrato, na verdade, mal secou. O que indica que isso foi uma mudança de última hora e deve ter sido feita há pouco tempo. Eu já tenho uma conclusão do porquê disso, mas ainda, sim, gostaria de perguntar. Isso está relacionado a Sopa Revitalizante?”
Quando o jovem Tenente falou isso, as expressões de Diogo, bem como de Rani, empalideceram, ao mesmo tempo que ambos ficaram completamente chocados.
E-ele realmente leu tudo aquilo naquele único instante? A mulher loira perguntou-se, perplexa.
Fernando havia dado apenas uma olhada, folheando o contrato brevemente. Ambos estavam relutantes em aceitar que ele havia lido algo naquela hora, mas o fato dele mencionar esse detalhe especifico provava exatamente o contrário!
Lina, que viu os rostos de incredulidade dos membros da Loja Etéreas, pessoas que deveriam ser profissionais da área, não pôde deixar de suspirar mentalmente, aliviada. A garota finalmente conseguiu confirmar que ela não era lenta na leitura de documentos, mas que Fernando realmente era um gênio monstruoso!
Ao mesmo tempo que os dois a sua frente estavam em silêncio, tentando assimilar a situação, Fernando tinha um olhar incisivo.
Então era isso que você almejava desde o início, Gerente Diogo Bublitz? pensou irritado, ligando finalmente os pontos e entendendo o porquê do homem mudar sua atitude e ter cedido tão rápido.
Mas não só isso, também percebeu outra coisa, o sujeito era tão ganancioso que havia estipulado um minicontrato dentro de outro contrato! Ou seja, ele tinha em mãos um negócio tão lucrativo quanto a venda dos Cristais, mas mesmo assim já estava almejando outro negócio onde apenas ele ganharia!
Agora que a questão da Sopa Revitalizante havia sido vazada para o público, era evidente que muitos tentariam negociar com ele, já que seus efeitos e gosto se provaram tão bons. E, as Lojas Etéreas, como uma empresa que se orgulhava em ser uma das líderes no setor de Poções, Pílulas e todo tipo de itens e medicamentos raros, não conseguiria se conter em tentar obtê-la para si!
No passado, teria sido difícil para Fernando notar a diferença na tonalidade da tinta, que estava levemente fresca e perceber a mudança feita de última hora. Mas desde que começou a estudar sobre Runas, focando nas visualizações mentais e nos detalhes das inscrições, que no menor deslize poderiam alterar sua função ou eficiência, ele passou a ter um olhar muito mais atento a pequenos detalhes como esse.
Vendo que havia sido pego, o homem não negou, pois já sabia que o rapaz provavelmente perceberia isso mais cedo ou mais tarde e se não notasse, ele apenas ficaria grato por isso.
Mas o fator que mais o deixou sem palavras foi a velocidade que Fernando havia lido tudo aquilo e até identificado detalhes tão minuciosos como a mudança feita naquela manhã.
Esse moleque, ele realmente é Humano? O homem perguntou-se. Em sua visão, só um computador na Terra conseguiria absorver tanta informação naquela velocidade.
“Veja bem, Tenente. Eu fiz uma concessão generosa quanto ao uso das nossas rotas comerciais, caravanas e pagamento de valores dos materiais, bem como assumi o pagamento da comissão do Banco Branco. E por ventura, ouvi falar da Sopa Revitalizante que você possui quando chegamos a Garância e quão estranha e peculiar ela é. Então achei justo que obtivéssemos alguma vantagem em troca disso. Você não sairá perdendo e pagaremos um valor justo caso queira comercializá-la.” garantiu, com um sorriso amistoso.
Ouvindo isso, o jovem pálido lançou um olhar frio ao homem.
“Eu não tenho nenhum problema em negociar a Sopa Revitalizante com as Lojas Etéreas, porém, eu odeio pessoas que tentam me enganar.” falou, com uma voz gelada.
Rani ficou pálida ao ouvir isso.
“T-tenente, não estamos tentando enganá-lo. Isso seria abordado durante a leitura do contrato…” A mulher loira afirmou, quase gaguejando, perdendo totalmente sua compostura de negociante.
Mesmo que ela dissesse isso, estava claro para Fernando que essa questão estava fora dos planos dela e de Aldric, tendo sido, sem sombra de dúvidas, ideia do homem ao seu lado.
“Senhorita Rani. Como vocês alteraram o contrato mais cedo, suponho que não haja nenhum problema em fazer novas mudanças, certo?”
“N-nenhum. Contanto que ambos os lados concordem e os contratos contenham as mesmas alterações.” A mulher respondeu, nervosamente.
Ouvindo isso, o jovem Tenente assentiu.
“Então, eu gostaria de alterar apenas um pequeno detalhe e podemos pular diretamente para a assinatura.” Tanto a mulher, quanto o sujeito, ficaram agradavelmente surpresos ao receberem essa reposta positiva do rapaz, mas seus rostos logo mudaram com a próxima parte. “Quero que seja alterada a questão de ‘exclusividade’ de venda das Lojas Etéreas para ‘preferência’ de venda para as Lojas Etéreas. Como eu disse, não sou contrário em negociar a Sopa Revitalizante com vocês no futuro, contanto que estejam de acordo com os termos e valores que eu estipular. Sendo assim, a oferta prioritária sempre será sua, mas caso recusem ou não sejam capazes de compra-lá, irei oferecê-la a outras pessoas.”
Pela primeira vez desde o início da negociação, o Gerente Sênior Diogo sentiu que estava levando a pior e estava extremamente insatisfeito com isso.
Era uma mudança pequena de apenas uma única palavra, mas que mudava totalmente a relação comercial que possuiriam quanto a esse produto e pela expressão do Tenente, o homem sabia que o rapaz estava totalmente decidido quanto a isso.
Mesmo sendo jovem, Fernando não era alguém idiota e sabia o peso dessa mudança. Enquanto usassem o termo ‘exclusivo’ o Batalhão Zero seria obrigado a vender a Sopa unicamente para as Lojas Etéreas. O que significava que caso eles se recusassem a pagar pelo valor pedido, o Batalhão Zero seria obrigado a baixar o preço caso quisessem negociar. Ou seja, eles estariam totalmente à mercê da outra parte.
Por outro lado, utilizando do termo ‘preferencial’, as Lojas Etéreas sempre seriam consultadas antes de qualquer outra empresa ou organização sobre a compra, ou aquisição da Sopa Revitalizante. Em outras palavras, se eles se recusassem a comprar, por qualquer motivo que fosse, Fernando teria total liberdade para buscar novos parceiros, contanto que oferecessem as mesmas condições de venda.
“Tenente Fernando, como eu disse, eu fiz uma grande concessão a vo…” Diogo estava prestes a argumentar, mas o jovem Tenente rapidamente o cortou.
“Você fala em concessões e benefícios. Com certeza estou interessado no uso das rotas e caravanas e sou grato por isso, mas se esquece que ofereci uma participação de 30% nos lucros. Mesmo se eu oferecesse apenas 10%, tenho certeza que qualquer outra empresa comercial lutaria para aceitar. Não só isso, como ainda estou cedendo a Residência de Guilda em Belai, que tem um alto preço de mercado. Não importa como eu veja a situação, sou eu quem está fazendo as concessões aqui, Gerente Diogo Bublitz. Ou estou errado?”
Quando o rapaz pálido falou isso, o sujeito congelou no lugar, sem saber o que dizer.

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