Capítulo 649 - Grande Irmã
“Ruiva…” Raul disse, com uma voz áspera, quando subitamente colocou a mão no peito de Fernando, afastando o jovem Tenente para trás, como se estivesse o protegendo da maior ameaça que já havia encarado em toda sua vida.
“E-eu sei!” Lerona respondeu, gaguejando nervosamente quando, de forma súbita, agarrou Fernando com força, erguendo-o para o alto e jogando-o em seus ombros.
“E-ei, o que você est-”
O rapaz mal teve tempo de falar, quando a Capitã disparou em máxima velocidade, usando sua Magia de luz para lançar um grande fulgor cegante em todo o local.
Swish!
Com seus olhos ardendo, sem enxergar, Fernando não entendia o que estava acontecendo e não teve escolha senão deixar que Lerona fizesse o que queria.
Logo a voz de Raul ressurgiu ao lado.
“Não está nos perseguindo, mas continue correndo!” gritou, com todas as suas forças.
O corpo de Fernando foi jogado de um lado ao outro, quando de repente o sentiu levitar. Eles estavam voando!
“Senhor Raul, Capitã Lerona, o que está acontecendo?!” indagou em voz alta, mas nenhum dos dois respondeu.
Apesar de ainda sentir sua mente estranha e levemente entorpecida, Fernando não estava completamente alheio à situação. Ele sabia que Ezella não era Humana, porém, não sentiu qualquer má intenção vindo dela.
Após alguns minutos de voo intenso, eles finalmente pararam. Nesse ponto, apesar de ainda se sentir ofuscado devido à Magia de Lerona, o jovem Tenente já conseguia enxergar melhor.
Fernando sentiu a mulher finalmente colocá-lo no chão e enquanto protegia seus olhos da claridade, vislumbrou os dois Capitães olhando para ele, parecendo hesitantes e assustados, então Raul o empurrou em uma pedra no chão, fazendo-o cair sobre ela.
“Senta aí.” declarou, com uma voz ríspida. “Moleque, o que exatamente aconteceu lá?”
Fernando foi pego de surpresa com o questionamento. Ao pensar sobre o beijo e como quase havia ido além com Ezella, o rapaz ficou em silêncio.
“I-isso…”
“Desembucha!” Raul gritou, com uma expressão escura.
Vendo a forma incomum do sujeito de agir, apesar de envergonhado pelo seu quase deslize, decidiu contar sobre o que havia acontecido.
Enquanto Fernando relatava tudo, contanto detalhe após detalhe, com o rosto um pouco avermelhado de vergonha, as expressões de Raul e Lerona foram mudando, ficando cada vez mais espantadas.
“Então, aquilo apenas te deixou ir?!” O sujeito perguntou, perplexo, quando ergueu a voz. “Isso não faz o menor sentido!”
Mas Lerona, que parecia mais calma, interveio.
“Ele não está mentindo. Se ela não permitisse, nenhum de nós teria escapado vivo. Você sabe bem disso.”
Apesar de um pouco fora de si, o sujeito moreno murmurou levemente, concordando.
A mulher ruiva então aproximou-se do rapaz, olhando seu rosto e abrindo um pouco seus olhos.
“Suas pupilas estão um pouco dilatadas. Ele sem dúvidas está sob o efeito de algo, mas deve passar logo. Sua vida não parece estar em risco.” Lerona falou, avaliando-o, enquanto suspirava, aliviada.
Nesse momento, Fernando não aguentou mais, quando afastou a mão da Capitã.
“Eu falei o que vocês queriam, então me digam exatamente o que está acontecendo!”
Raul e Lerona se entreolharam, quando o sujeito moreno tomou a palavra.
“Moleque, você por acaso sabe o que era aquela coisa?”
Em resposta a isso, o jovem Tenente negou com a cabeça. Apesar de ter certeza de que Ezella não era Humana, não sabia exatamente à qual raça pertencia. Mesmo que ela lembrasse vagamente uma Alta Elfa, ela era muito baixinha para isso, além de ter sua cor de pele atípica, dum dourado semelhante a pé metálico.
“Pele dourada como o sol, assim que a vi eu a reconheci pelas descrições. Aquilo era uma Ninfa, mais precisamente uma Ninfa da Floresta, também conhecida como Dryad.” falou, com uma voz severa. “Você ainda parece um pouco alto, então vou ser bem claro. Por algum motivo você a recusou e isso provavelmente salvou sua vida. Você sabe o que as Ninfas da Floresta fazem com um homem depois que ele termina de se satisfazer com ela?”
Novamente, o rapaz negou com a cabeça.
“Olhe para lá. Nós conseguimos sair, mas a partir dali é território dela, ou talvez delas, afinal, uma Ninfa da Floresta nunca fica sozinha.” disse, quando apontou para longe.
Voltando-se na direção que Raul indicou, Fernando apertou os olhos, quando olhou com atenção.
A partir de determinado ponto, a floresta parecia estar mudando. As árvores ficavam mais altas e majestosas, com galhos e troncos mais vividos e imponentes, até o verde de suas folhas era mais forte e chamativo. Mas isso não era o que mais chamava a atenção e sim as protuberâncias em torno dos troncos das grandes árvores.
Em torno de todos os grandes troncos, o rapaz viu diversas figuras na madeira, como se tivessem sido entalhadas de dentro para fora. Seus corpos estavam em várias posições, mas algumas tinham mãos esticadas, como se estivessem tentando escapar de dentro da árvore, causando-lhe um arrepio na espinha. Muitas delas tinham aparências que se assemelhava a Humanos, outras de Orcs, Elfos e muitas outras raças que ele sequer conseguia identificar.
Ao ver aquilo, a expressão de Fernando mudou completamente.
“O que é isso?!” perguntou, assustado com aquela visão aterradora.
“Depois de dormir com uma Ninfa da Floresta, um preço deve ser pago.” Lerona explicou, com uma voz nervosa. “Todos os homens se tornam nutrientes para a floresta, elas os transformam em algo como elixires vivos, eternamente aprisionados nas árvores, provendo mana e nutrientes.”
“I-isso, então se eu…”
“Se você tivesse cedido, esse seria o seu destino, moleque.” Raul falou, olhando para longe, cheio de incerteza e medo. “Eu tenho certeza de que tomei esse mesmo caminho há alguns dias e não havia nada aqui. Parece que as lendas sobre o território das Ninfas da Floresta se mover continuamente de lugar é real. Além disso, ela de alguma forma nos atraiu para dentro de seu território, já que não notamos nada. É um milagre que tenhamos saído de lá vivos, já que até um Major não seria nada além de um brinquedo em suas mãos. Mesmo Generais às vezes viram adubo se entrarem no território de uma Ninfa de forma descuidada.”
Quando Fernando ouviu tudo aquilo, sua mente, que ainda estava levemente nebulosa, finalmente voltou a si, quando se levantou da pedra de uma única vez. Ele finalmente se deu conta do perigo que havia estado.
Ezella, ela ia me matar? indagou-se, atordoado, mas logo se deu conta da verdade. Não, ela ia me dar um destino pior que a morte! concluiu, aterrorizado, enquanto sua mente clareava cada vez mais.
Ao lembrar-se do beijo que deu nela e ao associar que aquela beldade poderia matar até mesmo Generais, imediatamente fez todo seu corpo estremecer, cheio de medo.
Então percebeu algo, em sua mão direita, fechada, ainda estava a flor que a Ninfa lhe presenteou.
O rapaz pálido tentou abrir a mão e jogá-la fora, mas imediatamente parou.
A Capitã Lerona disse que ela nos deixou ir. Isso significa que… ainda pode estar nos observando. Se eu descartar o presente que ela me deu, ela pode ficar furiosa. pensou, fazendo seu melhor para manter uma expressão calma em seu rosto. Então calmamente moveu o pulso, guardando a flor. Vou manter isso comigo por hora.
“Você parece estar melhor, então vamos andando. Não quero ficar perto do território dessas coisas.” Raul falou, parecendo afetado com tudo que havia acontecido.
Tac! Crack! Shhh!
De repente, toda a floresta começou a fazer barulhos estridentes, quando as gigantescas árvores pareciam estar se movendo.
“Vamos!” Lerona, gritou, alarmada.
Logo os trio partiu, afastando-se rapidamente do local.
Em uma gigantesca árvore, um par de olhos dourados observou tudo com atenção.
“Grande Irmã, você pediu para trazermos os Humanos até você, então por que os deixou ir?” Uma voz quase infantil soou, quando a partir da árvore, uma pequena garota, de pele dourada, saiu.
Sua aparência era semelhante a de Ezella, porém carregava um charme juvenil e inocente.
A mulher apenas olhou para longe, parecendo intrigada, mas logo pareceu entender algo.
“Aquele Humano tem um cheiro diferente, eu pude sentir no momento que ele pisou nos arredores do Jardim. É por isso que não deixei que vocês o pegassem, mas pedi que o trouxessem para mim. O aroma dele era tão peculiar… Talvez ele seja parte daquilo…” falou, de forma ambígua, como se ela próprio não tivesse certa sobre o que estava falando.
A pequena Ninfa olhou para Ezella em dúvidas, então olhou para o lado.
“Do que a Grande Irmã está falando?”
A partir da mesma árvore, outra garota, que parecia ser um pouco mais velha, surgiu.
“Eu não sei, mas parece divertido.” disse, com uma voz alegre. “Vamos brincar!”
Logo, a partir de várias partes do tronco, assim como das árvores ao redor, dezenas de garotas e mulheres de pele dourada surgiram, observando Ezella. Quando um canto suave começou a entoar.
“Ouuah! Oh, oh, ah!”
Uma melodia que se misturava a densidade etérea da floresta começou a ecoar a partir das Ninfas, que se reuniram em um coro único, cantando e brincando.
Ezella continuou olhando para longe, quando sorriu.
“Um fruto verde não deve ser colhido prematuramente, ou o sabor não será tão bom. Tenho certeza que você voltará um dia, então eu poderei provar seu néctar.” disse, de forma confiante. “Nessa hora, você me mostrara o que é o ‘amor’, Fernando?”

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