Capítulo 238 - Relações
Por um dia e uma noite o trem se movimentou, parando apenas ocasionalmente em algumas pequenas cidades com estações ferroviárias para que os soldados se alimentassem e fizessem suas necessidades.
Numa dessas paradas Fernando observou a equipe da locomotiva, mesmo sendo um maquinário tão grande, apenas cerca de trintas pessoas eram responsáveis por operá-la. Iniciando uma conversa com um dos funcionários, descobriu que além do maquinista, que conduzia a locomotiva, eram necessários dois magos com um fino controle sobre o elemento fogo para operá-la corretamente. Esses magos eram responsáveis por monitorar os circuitos rúnicos, garantindo que eles estejam sempre em funcionamento.
O restante dos membros da equipe, eram todos magos de pelo menos nível Subtenente, responsáveis por fazer a guarda da locomotiva, bem como outras tarefas relacionadas. Essa informação foi extremamente chocante para Fernando, afinal uma força tarefa de 27 magos de nível Subtenente ou maior era algo muito assustador.
“Ei, você não acha que está perguntando demais? Só te disse um pouco a respeito porque você parecia interessado em locomotivas, mas é melhor não exagerar.” O homem disse, desconfiado.
Fernando logo entendeu, essa grande força tarefa de magos não era algo à toa. A empresa por trás de uma linha férrea lucrava muito com o transporte e muitas vezes levariam mercadorias muito valiosas. Então ser atacados ou emboscados por ladrões era algo que sempre estavam preocupados sobre.
As locomotivas que transportavam pessoas não eram diferentes, ele havia descoberto que a taxa de transporte geralmente ficava na casa de 1-5 moedas de prata, dependendo do ponto de embarque e destino. Ele não conseguiu evitar imaginar quanto Dimitri havia pago para transportar 9 mil pessoas, deveria ser um valor assustador.
“Eu apenas sou um entusiasta de trens, que tal me falar mais a respeito?” Fernando disse, entregando um punhado de moedas de prata para o sujeito.
Ao ver isso, o homem ficou surpreso, olhando para os lados ele rapidamente pegou o saco de moedas e guardou discretamente.
“Bem, se você é um fã, não tem muito o que eu fazer, vou responder suas perguntas.”
Depois disso, Fernando fez uma série de perguntas, a respeito das taxas de transporte, formas de operação e muitas outras coisas. O homem respondeu prontamente a maioria delas. Apenas quando chegou no tópico de circuitos rúnicos que o mesmo se negou a comentar, já que se tratava de um segredo comercial.
Apesar de não poder aprender muito sobre circuitos rúnicos, achou a conversa extremamente rentável. Ele planejava usar tudo que aprendeu na Linha Negra quando retornasse a Vento Amarelo.
Logo o trem partiu novamente, sentado no canto do vagão, ao lado de Karol, Fernando observou silenciosamente seu pessoal. Nesse ponto os soldados não se incomodavam tanto com ele, nem ficavam lançando tantos olhares quanto antes.
Enquanto observava todos, Karol sorriu ao seu lado.
“Olha só para eles.” disse, apontando em uma direção.
Seguindo seu dedo, Fernando olhou para um ponto do vagão. Ronald e Emily estavam recostados um no outro.
Enquanto Ronald parecia calmo, Emily gesticulava e falava, como se ambos estivessem brigando, essa cena já era algo habitual que ele próprio havia visto inúmeras vezes.
“O que tem de mais?” Fernando perguntou, sem entender.
Em resposta a sua pergunta, Karol deu-lhe um olhar estranho.
“Normalmente você é tão esperto e inteligente, mas sobre algumas coisas… Você é bem tapado.” Karol respondeu, rindo.
Fernando ficou aturdido, sem entender o que ela queria dizer com isso.
“Olhe de novo, olhe para suas mãos.”
Quando Karol disse isso, ele olhou novamente. Só então notou algo estranho, apesar de ambos parecem estar brigando, sobre o velho cobertor que usavam para se proteger do frio da manhã, estavam na verdade de mãos dadas!
“Você viu? Acho que a Emily e o Ronald talvez estejam juntos.”
Essa informação pegou Fernando desprevenido, ele realmente não esperava por isso, ainda mais daquele par inusitado. Apesar de surpreendente, rapidamente aceitou a situação. Se ele, um deslocado na sociedade na Terra, achou seu amor nesse mundo, por que outras pessoas não deveriam?
“Sabe, quando as coisas estiverem mais tranquilas, deveríamos chamá-los para um jantar em casais.” Karol disse, brincando.
“Eu não me importaria…” respondeu, sem jeito.
De repente ele lembrou-se de uma situação inusitada, no passado, quando todos haviam bebido demasiadamente, Emily estava inconsciente no chão da sala da mansão com o vestido levantado. Ao tentar ajudá-la, Ronald acabou os flagrando e entendeu a situação errado. Não só isso, mas naquela mesma noite a ruivinha havia beijado-lhe enquanto estava embriagada.
Ao pensar nessas duas cenas, Fernando suspirou consigo mesmo, envergonhado. Agora que Ronald estava junto a Emily, ele torcia para que tivesse esquecido sobre aquilo.
Quanto a Emily, Fernando sentiu-se feliz por ela. A verdade é que desde aquela noite, ele sempre soube dos sentimentos da pequena ruiva a seu respeito. Mas infelizmente ele já tinha alguém que amava e jamais poderia correspondê-la, então saber que ela havia seguido em frente tranquilizou seu coração e mente.
Pensando nos diversos transtornos e mal-entendidos que ele passou por causa da pestinha, não conseguiu evitar de sorrir consigo mesmo.
Depois de olhar mais algumas vezes ao redor, Fernando notou mais uma dupla incomum. Theodora e Tom pareciam conversar. Na realidade Tom parecia ser o único a falar, enquanto Theodora apenas lançava um sorriso provocador e falava algo ocasionalmente.
Vendo aquele sorriso, ele não conseguiu evitar de balançar a cabeça, a mulher amava provocar, então ao ver o rosto de Tom avermelhado-se hora e outra, ele conseguia imaginar o tipo de coisas que estava ouvindo.
Boa sorte, soldado. Fernando pensou consigo mesmo, com um olhar de piedade.
“Você não acha que está encarando demais? Se quiser pode ir até lá.” Karol disse, soando estar emburrada.
Foi só então que Fernando percebeu que realmente tinha encarado demais, o que deu a entender que ele estava observando Theodora. Ele sabia que Karol tinha um leve ciúmes da mulher.
“Eu não tenho nada a falar, por que iria até lá? Já tenho a pessoa que quero ao meu lado.” Fernando disse, com um raro sorriso.
Karol ficou levemente corada ao ouvir isso, já que Fernando era o tipo que evitava demonstrar muito de seus sentimentos, era raro vê-lo falando algo assim, ainda mais com um sorriso.
“Humph! Ainda bem que você sabe.” respondeu, num tom brincalhão.
Assim a viagem seguiu calmamente, o clima era tão agradável que nem pareciam estar rumando para a guerra, mas indo para um acampamento de férias. Fernando logo entendeu o motivo, essa era a primeira vez em muito tempo que todos eles tinham um tempo para relaxar.
Apesar de respirar o ar de calmaria, sabia que isso era temporário, depois da calma solene, sempre viria a tempestade e ele sabia disso muito bem.
Durante a noite do segundo dia, devido ao movimento veloz do trem, junto ao clima frio, ventos gelados sopravam em todo vagão. Os soldados estavam encolhidos e agrupados, enquanto se cobriam com cobertores, tentando reunir todo o calor possivel.
Desde que seu Físico melhorou, Fernando sentiu-se menos afetado por variações climáticas, mas mesmo ele estava com frio. Porém, sua situação era muito melhor que a dos outros. Próximo a ele e Karol, um rapaz solitário estava tremendo tanto, que o som de suas mandíbulas chocando-se era nítido. Ele não se recordava naquele momento o nome do jovem, mas sabia que era alguém do Pelotão Zero.
Vendo aquilo, Karol não conseguiu suportar mais.
“Oi, tudo bem?” disse, aproximando-se do jovem rapaz.
O garoto ficou em choque ao ver aquela mulher falando consigo. Ele já sentia-se extremamente pressionado pelo fato de ficar tão perto do Oficial Fernando nas últimas horas, mas sua mulher havia vindo conversar com ele, deixando-o imediatamente nervoso, isso somado ao frio, fez suas mandíbulas tremerem ainda mais.
“O-olá, senhora.” respondeu, respeitosamente.
“Você parece estar com muito frio, eu tenho esse cobertor extra, pegue.” Karol falou, com um tom gentil.
“Não posso aceitar, como eu ousaria?” O jovem respondeu, alarmado.
“Vamos, pare de bancar o durão.” Karol disse, rindo.
O jovem não sabia o que responder, então olhou para o Oficial Fernando, ao ver aquele par de olhos frios e rosto inexpressivo, seu coração pulou uma batida. O olhar assustador de seu Oficial era algo bem conhecido e comentado no Pelotão Zero.
“Aceite.”
De repente ouviu uma voz calma e indiferente. Ao ver que se tratava do Oficial Fernando, ele não ousou recusar novamente.
“S-sim senhor, a madame é muito bondosa, obrigado.” respondeu, cheio de cordialidade.
Desde que o relacionamento do Oficial com Karol se tornou público no Pelotão Zero, ninguém ousava destratá-la.
Vendo isso, Karol sorriu ironicamente, seu namorado era simplesmente intimidador demais.
BOOM!
Quando Karol estava prestes a voltar ao lado de Fernando, um tremor brusco em todo o vagão a jogou para o canto. Não só ela, todos no vagão se viram sendo jogados para um lado.
Tentando levantar-se apressadamente, Fernando puxou Karol para seu lado, os tremores e os balanços bruscos rapidamente os jogaram no chão. Mesmo que seus atributos fossem melhores, nessa situação eram inúteis.
“Todos no chão! No chão! Estamos sob ataque!”
O mago que fazia parte da equipe do trem gritou em plenos pulmões. Como se para confirmar seus gritos, mais explosões foram ouvidas. Era possível ver grandes labaredas de chamas nos vagões à frente.
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