Capítulo 279 - Proposta
A sala ficou silenciosa, logo a partir do portal negro uma figura gigantesca, com pele verde e um único olho surgiu, multiplos tentaculos moviam-se de forma independente, quase como se cada um tivesse vida própria.
O grande globo ocular da criatura varreu a sala, seu olhar frio e arrogante causava arrepios em todos.
Theodora ficou surpresa, ela já havia usado o anel antes, quando precisou mandar um comerciante malicioso para dentro, quando o sujeito saiu, estava aterrorizado e cheio de pavor. Outrora também viu a criatura após a batalha contra a Guilda Massacre, mas na época a mesma era muito menor e parecia ser menos ameaçadora.
Raul franziu a testa ao ver a ‘coisa’, lançando um olhar questionador para Fernando, que manteve-se calmo e em silêncio.
“Garoto, é melhor me dar uma explicação sobre esse monstro, ou então…” disse, empunhando a espada com firmeza. Mesmo que confiasse no jovem, isso estava muito além do senso comum.
O Beholder virou seu grande olho em direção a Raul após a ameaça, seus tentáculos dançavam suavemente no ar, como cobras, serpenteando e analisando sua presa. Apesar disso, parecia cauteloso, como se temesse o humano. Pequenos arcos elétricos serpenteavam entre os tentáculos, como se estivesse pronto para atacar.
Vendo isso, a expressão de Raul ficou solene, o aperto em sua espada ficou mais firme.
“Parece com isso, Brakas, esse é meu mentor.” Uma voz gelada, mas calma soou.
Ao ouvir isso, o grande olhou virou-se em direção ao jovem, então seus tentáculos que pareciam agressivos, acalmaram-se.
“Entendido, mestre.”
Ouvindo isso, tanto Raul, quanto Argos tinham expressões chocadas. Mesmo Theodora ficou levemente surpresa, mas parecia acostumada às estranhezas de seu jovem líder.
Lançando um olhar calmo para Raul, Fernando então falou.
“Este é Brakas, um Beholder, ele… Meio que trabalha para mim.”
A expressão de Raul mudou inúmeras vezes, como se estivesse confuso com a declaração do jovem.
Vendo que apenas isso não saciaria as dúvidas do homem, contou sobre como conheceu o Beholder e o capturou.
“Então essa coisa está sob seu controle?” Raul disse, andando calmamente em torno da criatura, observando-a, apesar de parecer mais calmo, não soltou o aperto de sua espada, que balançava em sua mão conforme andava.
Fernando assentiu em resposta.
“Garoto, você é estranho em muitos sentidos. Já ouvi que domadores domam muitos tipos de criaturas, mas nunca um Beholder… Pelo contrário, Beholders são conhecidos por escravizar e não por serem escravizados.” Raul disse, surpreso. “Se está sob seu controle, então tudo bem, mas recomendo não mostrar isso na frente de outras pessoas, sua cabeça pode acabar rolando.”
Fernando tinha um rosto calmo mesmo após ouvir isso, ele sabia que não deveria exibir Brakas levianamente.
Apesar da aparência calma e seu rosto inexpressivo, a verdade é que Fernando estava realmente surpreso com algo. O tamanho de Brakas havia quase dobrado desde a última vez que o tirou do Anel de Aprisionamento. Atualmente ele era tão grande que mesmo quatro homens de mãos dadas teriam dificuldade de ficar em torno dele.
O que ele anda comendo dentro desse anel? perguntou-se, perplexo. Se ele próprio não fosse o responsável por mandar alimentos e poções para o Beholder, pensaria que a criatura havia fugido e se alimentado de outras coisas.
“F-Fernando, pelos tempos em que lutamos juntos, tenha misericórdia. Pelo menos me mate antes de me usar como alimento para esse monstro.” Argos disse, tremendo.
Fernando ficou surpreso com isso, essa foi a primeira vez que viu o sujeito demonstrar tanto medo. Algo contrastante com o Argos calmo e confiante com o qual sempre lidou.
“Líder, eu concordo. Não acho que seu Beholder vá gostar de devorar esse traidor.” Theodora disse.
Argos olhou para trás, surpreso com o fato da mulher cruel ter compaixão nesse momento. Pela primeira vez ele pensou que havia se enganado em seu julgamento.
As aparências enganam. pensou.
“Aqui, talvez assim fique melhor.” Theodora disse, movendo o pulso e tirando um frasco de sal, então começou a jogar pitadas na cabeça de Argos. “Agora sim, bom apetite.”
Argos ficou pálido, arrependendo-se de ter dado uma centelha de confiança a essa mulher vil.
Fernando balançou a cabeça com a provocação de Theodora.
“Humph, não tenho interesse em carne humana.” Nesse momento, uma voz envelhecida soou, era Brakas.
Todos ficaram surpresos com isso, um Beholder que sabia a linguagem humana!
Theodora ficou em silêncio por um momento, então moveu o pulso, tirando algo.
“Tem certeza? Eu tenho alguns temperos aqui, dariam um sabor diferenciado.” disse, balançando alguns frascos de tempero que comprou na cidade.
Colocando a mão na cabeça e suspirando, Fernando deu alguns passos à frente. Então parou na frente de Argos. Seu par de olhos gelados, somado ao comentário anterior de Theodora fizeram seu coração tremer e seus cabelos se arrepiarem.
“Vou te dar duas opções, trabalhe para mim, ou seja alimento do meu Beholder.” Fernando disse, com um rosto frio.
“Mestre, eu já disse que não como carne humana.” Brakas insistiu, mas foi ignorado.
Ouvindo isso, Raul franziu a testa, mas logo entendeu o objetivo de Fernando. Se matassem Argos ou o entregassem como traidor, o Pelotão Lazuli seria implicado, sendo investigados e talvez acusados de traição, e mesmo que inocentados, todo o pelotão seria desmanchado. Tudo isso iria contra o objetivo do jovem.
Atualmente o que Fernando mais precisava no momento era mão de obra. Depois de perder mais da metade de seus homens na batalha de Belai e ainda ser promovido a Tenente, ele precisava desesperadamente recrutar pessoas para fechar a lacuna aberta, mas em plena guerra onde iria achar pessoas para recrutar? Era uma situação complicada e que o deixou numa situação desconfortável. Entretanto, agora surgiu a oportunidade de engolir os remanescentes do Pelotão Lazuli. Pensando nisso, Raul não pôde deixar de se surpreender com os planos do jovem.
Esse garoto está ficando cada vez mais sinistro!
Fernando, que estava em silêncio, estava completamente inconsciente dos pensamentos de Raul. A verdade é que ele não estava preocupado sobre recrutar pessoas no momento, o que ele queria realmente era o próprio Argos!
Por mais que nunca tivesse confiado no homem, tinha que admitir que a liderança do sujeito e suas habilidades de combate eram impressionantes. Se tivesse que enfrentá-lo mano-a-mano e ambos tivessem os mesmos atributos, dependendo apenas de técnicas e maestria em combate, Fernando duvidava que venceria.
Além disso, pelo interrogatório, percebeu que a habilidade de Argos em reunir informações e trabalhar com inteligência era algo que ele próprio jamais seria capaz. Na maior parte do tempo, as informações que conseguia reunir vinham de Theodora, mas sentiu que era inadequado fazê-la assumir essa tarefa, afinal ela já tinha muitas atribuições e ele não queria sobrecarregá-la.
Argos, que ouviu as palavras do jovem, ficou sem fala por um momento, num estado de confusão.
“Escolha!” Fernando repetiu, com uma voz calma, mas que continha uma frieza indescritível.
Se Argos escolhesse servi-lo, isso significava trair os Lobos de Batalha, se recusasse, então ele era leal aos mesmos, nesse caso Fernando o mataria.
Nesse ponto, a expressão de Argos mudou, olhando em volta, viu o olhar de Raul e sentia Theodora o observando por trás. Além disso, o olhar da criatura que o jovem convocou também parecia indiferente. Percebeu que praticamente todos ali o queriam morto, exceto por Fernando. Após considerar por algum tempo, decidiu-se.
“Eu aceito, aceito servi-lo.”
Ouvindo isso, Fernando manteve-se com a mesma expressão, como se o fato dele aceitar ou recusar não o afetasse.
“Brakas, prepare um contrato.” disse, olhando para Argos.
Depois de ouvir o comando de seu mestre, o Beholder começou a conjurar algum tipo de magia, sussurrando num idioma desconhecido, balançou um dos tentáculos. Então duas projeções de luz surgiram, uma à frente de Fernando e outra à frente de Argos.
“C-contrato?” O homem exclamou, sem entender.
“Isso é um Contrato de Vassalo, ao concordar você deverá servir seu mestre até que o contrato chegue ao fim, a penalidade por tentar traí-lo é a morte. Além disso, se o Mestre morrer, o Vassalo também morre.” Brakas disse.
“Contrato de Vassalo?” Raul exclamou, perplexo. “Já ouvi falar disso, soube que antigamente os Elfos costumavam usar isso para manter seus inimigos sob controle, mas durante a Grande Guerra pelo continente de Avalon, os Alto Elfos e Anões estabeleceram uma aliança e um dos requisitos é que essa magia fosse banida, desde então nunca mais se ouviu falar sobre alguém usando ela.”
Fernando ficou surpreso com isso, ele imaginou que essa magia fosse uma criação dos Beholders, não dos Elfos.
Vendo o olhar interrogativo de seu mestre, Brakas falou.
“Da mesma forma que nós, Beholders, podemos roubar conhecimentos dos Anões por meio de estudos, os orelhas pontudas podem fazer o mesmo.” falou.
“Entendo.” Fernando respondeu, assentindo. Então olhou para Argos, vendo-o levemente hesitante, pensou em algo. “Ajuste o contrato para 10 anos. Depois de me servir por 10 anos, você estará livre para fazer o que quiser.”
Ouvindo isso, Argos arregalou os olhos, cheio de perplexidade. Ao levar em conta que ele era um traidor, só a oferta de escravidão ja era uma forma de piedade, mas o mesmo ainda o libertaria de suas obrigações depois de um periodo de tempo.
Por que ele está sendo tão generoso? O que ele está pensando? Argos pensou, cheio de dúvidas.
A verdade é que Fernando não era tolo, mesmo sob o contrato, Argos poderia acabar traindo-o a preço de sua própria vida, qualquer um que fosse escravizado por longos períodos ficaria ressentido e pensaria em formas de traição. A melhor forma de resolver isso era dar um incentivo, se o mesmo sentisse que valia a pena servi-lo e que havia mais benefícios que malefícios, jamais o trairia.
“Basta tocar no contrato e inserir seu mana e o acordo será firmado.” A voz envelhecida do Beholder soou.
Ouvindo isso, Argos levantou-se. Dessa vez Theodora não o impediu nem o ameaçou.
Tocando sua palma sob os símbolos estranhos feitos de magia, inseriu seu mana. Do outro lado, Fernando fez o mesmo.
Crack! Bang!
A projeção de luz da magia se rompeu, lançando particular por todos os lados, que logo adentraram no corpo de Mestre e Vassalo.
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