Capítulo 291 - Um mentor
Normalmente, mesmo que estivesse em seu quarto, ou até vagando por uma área segura, Fernando sempre mantinha uma alta vigilância. Era um costume que ele obteve em Vento Amarelo, depois de ser seguido pelos homens de Jean Armand.
Entretanto, mesmo estando em alerta, se viu simplesmente indefeso para os par de braços grandes que vinham em sua direção. Antes que pudesse fazer qualquer coisa, foi envolto por um forte aperto.
“Bom te ver, garoto.” Raul falou, com um sorriso no rosto, enquanto o abraçava com força.
“Senhor Raul… Que Merd- Ahem, o que você quer?” Fernando perguntou, enquanto afastava o par de braços e se libertava, tentando se recompor do surto de raiva repentino, ser abraçado por um homem era a última das coisas que ele queria.
“Hahahaha, sempre tão sensível. Você sabe, o contato masculino é algo essencial para uma boa amizade entre homens.” Raul disse, rindo.
“Não, obrigado.” respondeu, num tom seco.
“Você é tão frio garoto, nem parece que já dormimos de conchinha antes.”
Ouvindo isso, uma veia levantou-se acima da sobrancelha esquerda de Fernando, mostrando o quão irritado estava.
“Tenen- Capitão Raul, o que você quer?” Fernando disse, ainda não estava acostumado com seu novo cargo ou o de Raul.
Anteriormente, o homem à sua frente, conhecido como ‘Urso Tirânico’ era um Tenente, mas agora o próprio Fernando ocupava esse cargo, enquanto Raul havia subido para se tornar um Capitão.
Vendo o jovem rapaz irritado, Raul não pôde evitar gargalhar, enquanto sentava-se na cama e estirava as pernas.
Minha cama… Fernando pensou, olhando para o par de botas sujas do homem.
“Agora falando sério garoto, terminei de reformar três novos Batalhões e estou partindo amanhã, só vim dizer adeus.” Raul disse, com um rosto calmo.
Fernando foi pego de surpresa com essa informação.
“Mas por que? Não estamos todos sob o General Dimitri? O que houve?”
Ao ouvir a pergunta, Raul franziu a testa.
“Garoto, escuta bem, agora você é um Tenente, uma força reconhecida, não mais um peixe pequeno que abana o rabo por aí e ninguém nota. A partir de agora não vou mais protegê-lo, você está por conta própria e vai precisar começar a entender melhor o que se passa por aí se quiser ficar vivo.” Raul falou, num tom severo.
Fernando ficou em silêncio, não esperando um discurso como esse vindo do Urso Tirânico, alguém que parecia não se importar com nada.
“O General Dimitri está numa situação mais delicada do que pensamos, há algumas facções dentro do alto comando sendo formadas na Legião dos Leões Dourados, um passo em falso e podemos ter não só os Orcs a frente, como as espadas de aliados atrás. Felizmente não chegou a esse ponto ainda.”
Ouvindo isso, a expressão de Fernando mudou.
“Isso está relacionado ao General Supremo Dimas?”
Raul ficou surpreso ao ouvir o jovem rapaz mencionar esse nome.
“E eu achando que você era totalmente inocente, mas parece que já está se adaptando. Isso é bom, ler o ambiente é fundamental.” Depois de dizer isso, Raul não falou mais, ficando em silêncio por um tempo. “Escuta, Dimitri não pode mais retornar a Vento Amarelo. Se você planeja voltar um dia, não se associe muito a ele.”
“Isso não seria o mesmo que trair o General?” Fernando perguntou, incomodado. Mesmo que quisesse retornar a Vento Amarelo, não queria abandonar um superior em plena guerra.
“Não, o próprio Dimitri pediu isso.” Raul falou, de forma solene.
Ao ouvir isso, a expressão de Fernando mudou.
“As tropas que se associarem a Dimitri, farão parte de seu exército. Isso é parte do plano do General Dimas para enfraquecer Kalfas e Vento Amarelo. Por isso, aqueles que quiserem poderão agir de forma autônoma. Infelizmente você é um Tenente e não pode se desvincular totalmente do exército principal, mas pode operar mantendo algum distanciamento.”
Fernando fez uma careta ao ouvir isso, não gostava de agir desse modo. Não tinha interesse em se envolver nos esquemas dos membros do alto escalão da legião, mas também não queria mudar a si mesmo devido a eles.
Percebendo a insatisfação do jovem, Raul suspirou.
“Garoto, você sabe porque eu aceitei treiná-lo e te ajudei quando nos conhecemos?”
Ouvindo a pergunta, negou com a cabeça. Naquele tempo ele e Raul eram meros desconhecidos, mas ainda sim o sujeito o ajudou. Se ele não tivesse aprendido sobre o Sistema de Habilidades, teria morrido pelo menos mil vezes em seu caminho até aquele momento. Fernando sabia muito bem disso e era grato a ele.
“A verdade é que… Eu tava entediado pra caralho.” Raul falou, com um rosto sério.
“…”
“Hahahaha.” Rindo da expressão do rapaz, Raul continuou. “A verdade é realmente essa, só comecei a te ensinar por puro capricho. Mas depois que vi do que você era capaz, percebi que foi uma das melhores decisões que tomei na vida. Garoto, você tem um talento incrível, se adapta fácil, entende rápido e cresce numa velocidade descomunal. Você é um monstro.”
Raul disse, divagando consigo mesmo, mas então sentou-se, olhando para o jovem.
“Mas saiba que você não é o único. Nesse mundo existem monstros que se alimentam de outros monstros. Você chegou muito longe num curto espaço de tempo, mas a verdade é que você ainda é fraco. Tão fraco que se não fosse por seus subordinados capazes, você nem mereceria estar na posição que está agora.”
A expressão de Fernando se manteve a mesma, mesmo com Raul jogando esse fato em sua cara. Isso porque ele sabia que não era qualificado para ser um Tenente por si mesmo.
“Enfim, já te falei tudo que tinha para falar. Vê se não morre.” disse, se levantando e preparando-se para sair.
“Espera.” Fernando falou, num tom calmo.
Mesmo que não gostasse de admitir, principalmente ao se lembrar dos treinos onde ele era constantemente enganado e espancado, ainda sim considerava Raul como seu mentor.
Da mesma forma, apesar de não parecer e fingir não ligar, Raul se importava com ele, como um verdadeiro aluno.
Pensando nisso, Fernando lembrou-se de algo. A verdade é que Teodora e os outros eram fortes, mas desde que Fernando expandiu suas Veias de Mana, seus talentos naturais vinham melhorando de forma muito mais agressiva e clara. Por exemplo, Ilgner que estava preso no nível de Subtenente por anos, disse estar muito próximo de chegar ao nível de um Tenente.
Reformular as Veias de Mana de alguém faz com que o indivíduo tenha um controle fino do seu mana, assim como uma circulação rápida e veloz, permitindo reagir muito mais rápido. Além disso, a qualidade do próprio mana e corpo parecia subir para um novo nível, seja no Sistema de Habilidades ou no de Magia, as Veias de Mana Expandidas eram algo extremamente benéfico.
Entretanto, assim como há prós, existem contras. Era algo realmente incrível, mas justamente por isso era perigoso. Ilgner havia repetidamente advertido Fernando de manter essa sua habilidade de expansão das Veias em segredo. Mas assim como Raul o ajudou no passado, ele planejava ajudá-lo agora.
“Tem algo que eu gostaria de tentar. Apenas deita ai, pode ser doloroso, mas vale a pena.” Fernando falou, com um rosto sério.
Ouvindo isso, a expressão de Raul mudou muito.
“Nem fudendo, esse Raul nunca leva, você que deita.”
Fernando tinha um rosto confuso ao ouvir isso.
“Do que você tá falando?”
“Não, que merda VOCÊ tá falando?”
“Eu só quero dar algo, então deita de uma vez.”
“Se você quer dar algo, então deita você!! Tá querendo morrer moleque?”
…
No fim, depois de uma longa discussão ambígua, Fernando finalmente entendeu do que Raul falava. Isso o fez ficar tão irritado, que começou a se arrepender de tê-lo respeitado, mesmo que por um breve momento.
“Porra moleque, se você queria me ajudar com as Veias de Mana, apenas dissesse de uma vez. Cheio das gracinha.” Raul disse, rindo. “Mas em que você planeja me ajudar? Seu nível na melhor das hipóteses, é um Subtenente acima da média, enquanto eu cheguei ao nivel de um Capitão. Eu posso não me comparar a você em relação à magia, mas no Sistema de Habilidades eu te ensinei tudo que sabe.”
“Nem tudo, senhor Raul.” Fernando falou, com um rosto calmo. A verdade é que a Aptidão Absoluta era algo que ele criou a partir de suas Veias de Mana que ele expandiu acidentalmente. Posteriormente aprimorou o método até criar a habilidade.
“Bem, não acho que uma habilidade que você aprende no começo possa ser de alguma utilidade, mas vou confiar em você, me mostre do que se trata.”
“Isso pode doer.” Fernando falou.
“Como se eu ligasse pra um pouco de dor.”
Tendo confirmado que Raul estava pronto, Fernando o fez beber uma Poção Catalisadora para ajudar a desobstruir seus canais de mana, mesmo que não ajudasse tanto alguém de seu nível, era melhor do que nada. Então colocou a mão em suas costas e testou o mana da Pedra de Mana. Assim que o fez, todo o corpo de Raul tremeu, como se tivesse sido eletrocutado. Estava claro que estava com uma dor descomunal, mas seu rosto mantinha-se calmo como sempre.
Fernando pensou em alternar para o mana da Espada Formek, mas percebeu que o corpo de Raul não rejeitou totalmente o mana da Pedra. Então logo iniciou o processo de reconstrução.
Inserindo o mana em seu corpo, quebrava as Veias de Mana aos poucos, construindo um novo e mais sólido canal. Se fosse qualquer outra pessoa, diria que o que Fernando estava fazendo era loucura e teria pensado que estava tentando prejudicá-lo. O próprio Fernando ficou surpreso com o quanto Raul confiava nele.
Conforme seguia desenhando o padrão das Veias, mesmo que Raul não reclamasse nenhuma vez ou mesmo tivesse uma única mudança de expressão, suor escorria de sua pele.
Depois de cerca de quinze minutos, Fernando tirou as mãos de suas costas.
“Está feito.” disse calmamente.
Raul, que esteve o tempo todo com os olhos fechados, os abriu lentamente, sentou-se, então levantou. Com um olhar perplexo, olhou para a palma da sua mão.
Crack! Crack!
Uma névoa vermelha, formada de mana pura, cobria sua mão, causando estalos.
“Isso… Como é possível?” Raul disse, sua expressão enquanto olhava para Fernando era um misto de choque, medo e empolgação.
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