Capítulo 340 - Primeira Unidade
O rosto de Fernando estava cheio de ira ao ouvir a notícia sobre a queda de Vento Amarelo.
Todos olharam para o jovem Tenente, ninguém ousou dizer uma palavra sequer. Mesmo que muitos tivessem se juntado após a criação do Batalhão em Belai, todos sabiam que a origem de Fernando, assim como os demais membros mais fortes, era em Vento Amarelo.
A mão do jovem líder afrouxou, tirando-a da mesa danificada, ao mesmo tempo que a expressão de brutalidade em seu rosto foi lentamente amenizando. Então olhou para todos, agora com um rosto inexpressivo.
“Estão dispensados. Descansem um pouco e façam os preparativos, partiremos antes do amanhecer.”
Todos olharam uns para os outros, então lentamente, em silêncio, começaram a sair da sala.
Karol, Lance e alguns outros pareciam querer dizer algo, mas contiveram-se ao ver a expressão fria de Fernando, aquele não era o momento adequado.
Theodora, em especial, saiu quieta, evitando olhar nos olhos de seu Líder.
“Você não, Argos.” disse, com a voz calma.
Todos saíram, ficando apenas o Jovem Tenente e o Sargento, que estava parado em pé.
“O que precisa, Líder?” O homem falou com uma expressão serena.
Argos particularmente não se importava com a queda ou sobrevivência de Vento Amarelo. Mesmo que tivesse servido anos infiltrado na cidade, não tinha qualquer apego emocional, assim como não teve em relação aos Lobos de Batalha, quando os traiu para sobreviver. No entanto, sabia que seu Tenente tinha uma certa ligação com a cidade, assim como sua antiga Tenente, Gallia.
A expressão do Jovem pálido era vazia, enquanto olhava para a grande mesa. Então lentamente seus olhos moveram-se em direção a Argos.
“Reúna informações a respeito da guerra no Norte. Quero que descubra tudo sobre o que aconteceu lá, principalmente em relação a Vento Amarelo. E se… Há sobreviventes.” Fernando falou, a última parte sendo dita com alguma hesitação.
A expressão de Argos era complicada ao ouvir o pedido de seu Líder. A verdade, é que ele não tinha uma estrutura para montar uma rede de informações sólida. A maioria do que conseguia vinha de boatos, informações compradas de terceiros e ratos que ele havia espalhado por aí. Mas no fim, tudo que conseguia era limitado.
“Mesmo que me peça isso, Senhor, não conseguirei cumprir. Não temos mão de obra, muito menos recursos suficientes para buscar informações tão longe. No momento, o máximo que consigo é pescar algumas coisas em Belai, e estou trabalhando para conseguir contatos em outra cidade.”
A expressão de Fernando se manteve inalterada ao ouvir a resposta do sujeito.
“O que precisa para estabelecer uma grande e confiável rede de informações?”
A pergunta do Jovem Tenente surpreendeu Argos.
“Há muitos fatores, contatos, mão de obra confiável, homens treinados e recursos. Nada disso é fácil de conseguir em um curto período de tempo, ainda mais na nossa situação…”
Fernando, com um rosto inexpressivo, moveu o pulso. Logo 50 moedas de ouro apareceram sobre a mesa.
“Isso é suficiente?” perguntou calmamente.
“O que…”
A mente de Argos ficou em branco por alguns segundos ao ver a pilha de moedas de ouro à sua frente.
Com um rosto sério, Fernando olhou nos olhos do Sargento, então elevou o tom.
“Eu perguntei se é suficiente!”
Como se tivesse sofrido uma descarga elétrica, os sentidos do sujeito voltaram.
“S-sim, Senhor.”
Ouvindo isso, Fernando assentiu.
“Argos, você não virá conosco para a Tropa de Exploração, sua missão é essa: estabelecer uma grande e confiável rede de informações. Você será os olhos e ouvidos do Batalhão Zero na retaguarda.”
“O-o quê? Mas líder, eu…”
“Essa é sua missão.” Fernando repetiu, com firmeza.
Argos estava prestes a dizer algo, mas parou e acalmou-se ao olhar para o rosto de seu Líder. Com um olhar decidido, colocou o punho direito no peito esquerdo, fazendo a típica saudação militar.
“Entendido.”
Com uma expressão complicada, o Sargento aproximou sua mão das 50 moedas de ouro, movendo seu pulso e as fazendo desaparecer ao entrarem em sua Pulseira de Armazenamento. Seu coração batia forte, cheio de nervosismo e ansiedade, ele nunca havia colocado as mãos em tal valor antes.
O Jovem Tenente sabia que era uma quantia absurda, mas considerando todos os fatores para montar algo grande e bem estruturado, além de não saber quando poderia mandar mais recursos, não poderia arriscar deixar uma quantia insuficiente.
Depois de aceitar suas ordens, Argos saiu da sala, deixando Fernando sozinho em silêncio.
Professora…
Pensando em Gallia e todas as pessoas que contavam com ele em Vento Amarelo, o coração de Fernando estava apertado. Mesmo que sua mentora tivesse o avisado de que isso poderia acontecer, ele ainda não conseguia acreditar.
Se eu estivesse lá, poderia… pensou, com olhos lacrimejantes, mas sabia que era apenas um delírio de sua parte.
Ele saiu de Vento Amarelo como um mero Oficial e agora era um Tenente, uma força respeitável. Mas a verdade é que isso era apenas se comparado a pequenos poderes. Em relação a uma guerra, um Tenente era apenas uma folha voando ao acaso.
Bang!
Com um soco, a grande mesa retangular quebrou, desabando.
Se você, Professora, ainda estiver viva, assim como Papi e todos os outros, eu irei encontrá-los. Mas se não estiverem… O mínimo que posso fazer é vingá-los. Fernando pensou, com um rosto frio e olhos marejados, enquanto olhava para o vazio.
Após um momento, se acalmou, então levantou e foi em direção a janela. Observando o céu escuro, que era iluminado pela lua e as estrelas, sentiu-se mais tranquilo, como se não fosse ele mesmo.
Apesar do que estava sentindo, sabia que não poderia ficar parado, fora das muralhas uma guerra estava ocorrendo, havia muito a ser feito.
Naquela madrugada, todo o Batalhão Zero estava se movimentando, assim como o restante de Belai. Mesmo que ainda não fosse de manhã, luzes moviam-se por todos os lados, enquanto sons de gritos e conversas podiam ser ouvidos.
No salão de Guerra da Residência de Guilda do Batalhão Zero, as tropas preparavam seus mantimentos, armamentos, poções e tudo o mais.
Em contraste com os soldados que moviam-se ordenadamente, um grupo de cerca de cinquenta pessoas estava num canto, eram claramente civis, com alguns poucos parecendo ser soldados ou guardas aposentados.
“O que o Tenente Fernando está pensando? Trazer essa gente conosco.” Um soldado disse, com uma expressão irritada.
“Eu também não sei, mas não é nosso dever questionar as decisões de quem está no topo.” Outro homem respondeu.
“Droga, agora to meio ansioso… Talvez eu devesse ter ido embora quando tive a chance.” Outro Soldado disse.
“Calem a boca, seus mariquinhas, e verifiquem se têm mantimentos suficientes, não vou dividir minhas coisas com vocês.”
“Foda-se, eu não preciso da sua carne seca nojenta!”
Os burburinhos que estavam por todo o lado subitamente diminuíram quando uma figura surgiu na entrada do Salão de Guerra. Não era outro se não o próprio Fernando.
“Tenente!” Um soldado gritou, cumprimentando-o com a saudação militar.
“Tenente!” Outros ao redor fizeram o mesmo, enquanto abriam caminho.
Fernando apenas assentiu, em silêncio. Então lentamente caminhou em direção às pessoas que estavam juntas no canto do grande salão.
Vendo isso, todos do grupo ficaram de pé. A maioria eram homens, mas também havia algumas poucas mulheres. Na realidade, tinha até mesmo pessoas aleijadas, sem um braço ou mão.
Em Avalon, não era incomum que muitos ficassem multilados devido às constantes batalhas e trabalhos manuais perigosos, afinal havia um limite para o que poções de cura poderiam fazer. E também, Magos habilidosos em Cura, para realocar membros, não eram facilmente acessíveis.
No entanto, mesmo que alguém fosse mutilado e perdesse membros, contanto que você fosse de uma Legião, não seria tão difícil obter uma prótese, claro que a qualidade não seria a das melhores, como a que Lance conseguiu. Mas para pessoas comuns, mesmo uma prótese de má qualidade era cara e custosa, então a maioria se acostumava a viver uma vida de aleijado.
O fato de ter gente assim entre a multidão, mostrava que a maioria eram pessoas incapazes, que não tinham nada a oferecer e mal poderiam levantar uma espada para lutar.
Quando Fernando parou em frente ao grupo, os olhou com um rosto neutro.
Inicialmente, muitas dessas pessoas pensaram que era apenas um Oficial ou Cabo que viria falar com eles, mas quando ouviram a palavra ‘Tenente’ da boca dos Soldados, assim como a forma respeitosa como o tratavam, muitos rapidamente ficaram apreensivos. Esse era o Tenente Fernando em pessoa!
Um velho homem de armadura, ao ver a expressão do Jovem, ficou cheio de medo. Se o rapaz os recusasse, estava tudo acabado. Ninguém mais aceitaria levá-los para fora das muralhas durante uma guerra, com Orcs vagando por todos os lados.
“Tenente Fernando, eu me chamo Damon, sou um Sargento aposentado, servi lealmente sob os Leões Dourados por mais de trinta anos. Minha família… Ela estava numa das cidades à frente. Eu imploro, por favor, me leve com você. Se passarmos próximos a ela, eu só quero… Ter certeza.” O velho de armadura disse, em tom desesperado.
Muitos dos soldados ao redor, que pareciam querer zombar dessas pessoas, ficaram em silêncio. Se havia algo que homens como eles respeitavam, eram veteranos de guerra.
Para alguém escalar até a posição de Sargento, servindo por mais de trinta anos, essa pessoa não deveria ser alguém simples. A maioria das pessoas comuns não passariam da patente de Cabo. Além disso, só o fato de chegar a velhice em Avalon, enquanto havia sido parte do exército, já era um grande feito por si só.
As pessoas atrás do velho homem queriam clamar também, mas foram interrompidas no momento em que o jovem levantou a mão direita, sinalizando que parassem.
Com um rosto frio, Fernando varreu seu olhar sobre todos.
“Eu não me importo com quem vocês são ou quem foram no passado. Vocês vieram até mim e querem que eu os levem comigo. Imagino que saibam o que isso significa.” A voz fria do Jovem Tenente soou.
Ouvindo isso, todas as pessoas ficaram em silêncio, pois sabiam que estavam pedindo demais. A presença de pessoas destreinadas e sem capacidade era um risco à vida dos soldados e eles sabiam disso. Nenhum outro lugar os aceitaria.
“Eu irei aceitá-los.” Fernando disse, chocando todos no local, desde os soldados, até a multidão de indivíduos. “Mas nada é de graça nesse mundo, se querem vir com meu Batalhão, terão de trabalhar para mim. Além disso, não serei responsável em caso de eventuais mortes.”
Todos ficaram surpresos com as palavras do Jovem Tenente. O velho chamado Damon parecia o mais surpreso, mas logo sua expressão se tornou resoluta. Então sem pestanejar, ajoelhou-se, para mostrar sua lealdade.
“Eu servirei ao senhor com minha vida por esse ato de bondade.” disse, com a cabeça curvada.
Logo as pessoas atrás dele seguiram o exemplo.
Fernando não demonstrou qualquer reação, ele já estava acostumado ao modo de agir das pessoas desse mundo.
“Muito bem. Eu declaro agora a formação da Primeira Unidade de Logística do Batalhão Zero, e vocês farão parte dela!”
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