O clima era pesado.

    A cidade subterrânea de Áurea, com aqueles prédios cheios de luz e ruas douradas, parecia longe… quase como se o tempo ali passasse diferente.

    Louie estava quieto, mergulhado nos próprios pensamentos. Parecia preso num tipo de transe, como se o mundo ao redor tivesse sumido por uns segundos.

    Os olhos dele estavam cravados em Kael Dragan — que seguia parado bem na frente, com aquela expressão séria e firme de sempre.

    Kael sabia que aquilo tudo era só o começo.

    Sabia também que Louie tinha algo estranho dentro de si, só não conseguia dizer o que é… mas, a partir dali, não dava mais pra voltar atrás.

    A estranha organização não pararia com seus planos, e tudo indicava, que seu objetivo atual era… Louie.

    Era hora de acordar de vez.

    Hora de lutar. Reagir.

    E ele estaria ali pra guiar o moleque nessa nova jornada.

    Seja por simpatia… Ou dívida.

    — Louie — começou Kael, com a voz firme, mas num tom calmo que passava segurança — Tu carrega um poder enorme dentro de ti. São três poderes diferentes, mas que, além de fortes individualmente, se conectam de um jeito que nem tu entende ainda.

    — Só que… no estado em que tu está agora, vai ser difícil dominar até mesmo um deles de verdade — quem dirá os três ao mesmo tempo.

    Ele deu uma breve pausa, olhando Louie nos olhos.

    — Vão ter muitas situações pela frente que vão te forçar a se adaptar, improvisar… reagir e melhorar na hora. E isso não tem a ver só com sua força.

    — Tem a ver com controle. Controle de ti mesmo. De saber quando usar, como usar… e o por quê usar.

    Louie respirou fundo, sentindo as mãos se fecharem em punhos sem nem perceber. Sabia que tava prestes a encarar algo grande, mas a pressão era pesada — quase como se tudo estivesse nas costas dele.

    Tinha dentro de si o poder do Raio, que deixava ele controlar energia elétrica… a Super Força, que turbina o corpo além do normal… e os Íons, que envolvem partículas tão minúsculas e complexas que ele mal entendia o que era ainda.

    Kael percebeu que Louie tava nervoso e, com um gesto tranquilo da mão, pediu pra ele respirar e se acalmar.

    — Vamos começar pelo básico, Louie. Não tenta abraçar tudo de uma vez, senão tu vai acabar se perdendo. Vamos focar primeiro no que é mais fácil de entender… o resto vem com o tempo.

    Louie só fez que sim com a cabeça, ainda sentindo aquele peso estranho nas costas — como se o mundo inteiro esperasse algo dele.

    Kael continuou:

    — Vamos fazer dois exercícios. Um para ti aprender a mexer com o raio… e outro pra testar teu controle com a superforça. São dois poderes que têm uma ativação mais simples, dá pra pegar o jeito rápido se tu se concentrar direitinho.

    Fez uma pausa e olhou Louie nos olhos.

    — Mas, sempre se lembre disso… sem o devido controle, eles viram um problema. Fácil de sair do controle, e difícil de consertar depois.

    Louie engoliu seco.

    Kael parou por um instante, como se estivesse organizando as ideias na cabeça pra explicar do jeito mais simples possível o que Louie precisava entender sobre o controle básico do raio.

    Fez um gesto com a mão, pedindo pra Louie dar alguns passos para trás.

    O lugar estava iluminado, com a típica luz dourada de Áurea ao fundo… mas naquele instante, parecia que o resto do mundo tinha sumido. Só existia aquele pedaço de chão e os dois ali.

    Kael estendeu a mão na direção de Louie, o olhar firme, mas tranquilo.

    — O poder do raio é o primeiro que tu precisa entender. Ele é energia pura, viva. Uma parada que parece que vem de fora, mas na real… é de dentro. É como se fosse uma parte tua, só que solta, pronta pra sair. Mas pra isso, tu tem que saber guiar ela.

    Deu um passo mais perto.

    — Quando tu sente essa energia no corpo… onde é que sente mais forte? Como é essa sensação?

    Louie fechou os olhos por um momento, tentando buscar a lembrança da última vez em que usou aquele poder.

    E veio na hora.

    Era como se cada parte do corpo dele tivesse ligado num fio direto com alguma tempestade interna. Um calor forte nas mãos, um zunido nos ouvidos… e aquela sensação de que algo queria sair dali, urgente.

    — Eu sinto ela no corpo todo… mas parece que se concentra mais nas mãos — respondeu, abrindo os olhos devagar. — É meio estranho… como se tudo dentro de mim estivesse carregado. Como se em cada molécula do meu corpo estivesse completamente carregada.

    Kael assentiu com um leve sorriso.

    — É isso aí. Esse poder tá em cada pedacinho teu… nas tuas células, na tua cabeça, no teu peito. Tu não tem que controlar ele com força bruta, e sim aprender a deixar ele fluir.

    Fez um gesto com as mãos, como se empurrasse algo invisível.

    — Abra as mãos… sinta a energia vindo… e deixe ela sair. Não force sua saída, porém não a segure demais. Só guie ela. Como se estivesse soltando o ar dos pulmões.

    Louie respirou fundo e assentiu, sentindo que agora, talvez pela primeira vez, ele realmente estava pronto para enfim, e liberar por opção, e não necessidade.

    Louie abriu as palmas das mãos, sentindo uma leve vibração percorrer sua pele. Uma pressão começou a se formar nos dedos, como se a eletricidade estivesse se acumulando ali, pronta pra sair. Sem pensar muito, ele deixou fluir.

    Num movimento rápido, esticou os dedos — e a energia saiu de uma vez só.

    Uma explosão elétrica rasgou o ar, brilhante e barulhenta, se espalhando em linhas luminosas que sumiram no horizonte. O estalo ecoou forte, e uma onda de calor subiu pelo corpo de Louie.

    Kael ficou em silêncio, só observando. Louie, por outro lado, ofegava — sentia o corpo mais pesado do que esperava, como se aquela descarga tivesse sugado tudo dele.

    Kael então deu uns passos até ele.

    — Mandou bem, Louie. Conseguiu liberar a energia… — disse, com um tom tranquilo — mas soltou tudo de uma vez só. E isso te drenou por completo.

    Fez uma pausa, olhando firme pra ele.

    — Agora tu entende por que isso não pode ser usado assim? — Apontou de leve com o queixo. — O poder do raio é veloz e destrutivo, mas ele precisa de direção. Caso contrário, vira só uma enorme explosão única, caso o oponente se levnate após ela… tu vai estar desgastado e em desvantagem.

    Deu um leve sorriso de canto.

    — Vamos de novo. Mas dessa vez… não pensa em soltar tudo. Pensa em quanto tu quer liberar, não em quão forte vai ser. O controle começa aí.

    Kael continuava guiando Louie com calma, sempre observando cada movimento.

    Pediu que ele tentasse liberar só um pouco de eletricidade, e apontasse pra uma direção específica. Nada muito intenso — só o suficiente pra ele começar a entender como aquilo funcionava de verdade.

    Louie até conseguia fazer o que Kael pedia… mas sempre vinha junto aquela sensação esquisita. Era como se o corpo dele começasse a entender o poder, mas ao mesmo tempo fosse ficando cada vez mais cansado, esgotado.

    Ele tava pegando o jeito — isso era nítido — só que ainda tava longe de conseguir controlar aquilo de verdade. Sabia o que fazer, mas na hora de aplicar… era outra história.

    Horas se passaram em um piscar de olhos. E mesmo sem dominar de fato, Louie chegou num ponto que já era o mínimo necessário pra, pelo menos, não sair se machucando toda vez que usasse aquele poder.

    Depois daquilo, ele tava exausto. Suando, respirando pesado, as pernas meio bambas.

    Mas Kael não deu pausa.

    — Bora, agora a gente vai pra tua Super Força — falou, firme, mas sem dureza. — Esse poder é mais direto, físico… mas, igual ao raio, se tu não tiver controle, vai acabar se machucando — ou pior, machucando alguém.

    Louie respirou fundo, ainda meio acabado, e assentiu.

    Kael continuou:

    — A força tá aí dentro de ti. Mas não é pra sair quebrando tudo que vê pela frente. Tu tem que sentir o quanto precisa usar — e dosar isso.

    Deu uma batidinha no próprio peito.

    — É força no músculo, mas é cabeça que comanda.

    Kael indicou uma grande estrutura metálica próxima, no terraço do edifício, parecia ser parte de um enorme pôster antigo da cidade, um grande pilar. A estrutura era grande, sólido e imponente. Kael apontou para ele.

    — Tenta mover esse pilar — disse Kael, apontando com o queixo pra uma das colunas de concreto ali próximas. — Mas não joga tudo de uma vez. Vai devagar, sentindo tua força crescer. O lance aqui é o controle.

    Louie se aproximou devagar, ainda respirando pesado do treino anterior. Parou em frente ao pilar, esticou os braços e colocou as mãos sobre ele.

    No começo, nada. Nem um rangido. Mas ele sentia o corpo responder — os músculos enrijecendo, como se estivessem inflando de dentro pra fora. A força tava ali. Era como se estivesse segurando uma corrente elétrica dentro do corpo, só esperando pra ser solta.

    Kael percebeu o foco de Louie e falou, com calma:

    — A Super Força não é só sair dando murro e quebrando tudo. Tu tem que sentir ela dentro de ti… como se teu corpo fosse um sistema, e tua mente o controle. Respira fundo. Imagina a força fluindo, como uma mola sendo comprimida.

    Louie fechou os olhos. Se concentrou. Sentia os músculos esticando, o sangue pulsando mais forte… E aí, empurrou.

    De leve.

    O pilar tremeu.

    Mas ainda não se moveu.

    Ele abriu os olhos, mais focado agora. Respirou de novo, com calma, e colocou um pouco mais de força. Nem chegou perto de tudo o que conseguia — mas dessa vez, o pilar começou a deslizar devagar pelo chão.

    Louie sentiu na hora: ele podia ter movido aquilo com facilidade. Era nítido. Tinha força de sobra. Mas tinha conseguido segurar. Controlar.

    Kael sorriu de leve, satisfeito.

    — Mandou bem. Isso que tu fez agora… é o começo. Tu tem força de sobra pra jogar esse pilar pro outro lado do prédio se quisesse. Mas esse tipo de poder, quando mal usado, vira problema. E rápido.

    Louie recuou um passo, ofegante.

    — A força que tu usou aqui é básica… ainda tá só na superfície do que tu realmente pode fazer — continuou Kael, com o tom sério. — Mas já deu pra ver que, se souber usar com cabeça… vai virar um monstro.

    Louie assentiu, tentando absorver tudo. O corpo pesado, as pernas cansadas, mas a mente ainda ligada.

    Treinar os dois poderes — o raio e a força — tinha drenado ele por inteiro.

    E então, caiu no chão, sem forças…
    Mas com um sorriso no rosto.

    O corpo estava todo cansado, pesado demais pra levantar.
    Só que por dentro, ele sentia diferente.

    Tinha algo bom ali, no meio daquele caos todo.
    Uma sensação estranha de vitória, de conquista — mesmo com a tempestade estourando lá em cima, trovejando como se o mundo quisesse desabar.

    E Louie… ia.
    Mesmo caído, mesmo ofegante — ele já sabia que não ia parar ali.

    O começo da manhã finalmente dava as caras em Áurea.

    Lá em cima, um falso sol começava a brilhar — espalhando uma luz dourada por entre os prédios e as ruas lá embaixo, como se a cidade estivesse acordando junto com ele.

    Era um novo dia.

    Um novo caminho.

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 100% (2 votos)

    Nota