Dica para leitura: aspas simples são para pensamentos internos, que é esse símbolo: ’
Aspas duplas para conversa mental: “
Travessão para falas em voz alta: —
Capítulo 81 — Uma Criatura de Lendas
— Espere! — Aleksander interveio, soltando a mão de Flügel e a erguendo no ar. — Deixe-me cuidar disso. Minha magia de cura é de alto nível.
Nytheris parou, seus olhos escuros dentro do elmo prateado encontrando os de Aleksander por um instante tenso. O ar entre eles pareceu crepitar com um desafio silencioso, mas Nytheris cedeu, a aura negra se dissipando enquanto recuava. Flügel sentiu a relutância de seu familiar através do vínculo, um orgulho teimoso ferido pela interrupção.
Aleksander se aproximou, fincando o cajado no chão com firmeza. Ao notar o estado do outro ele o encarou com uma expressão que misturava respeito e um leve divertimento. E então murmurou algo baixo.
Uma aura quente e radiante de luz verde explodiu da ponta do cristal negro, envolvendo-o em um brilho reconfortante. A dor em seus membros diminuiu quase instantaneamente, e ele sentiu uma sensação pungente enquanto carne e pele se reconstruíam.
Ele não resistiu à cura, sentindo o peso de tudo que havia acontecido o atingir como uma onda. A floresta ao redor deles parecia mais silenciosa agora, o cheiro de ferro e decomposição substituído pelo aroma fresco da terra úmida e das folhas. O Severus dobrou as asas enquanto os observava com seus olhos faiscantes.
Assim que seu corpo estava totalmente revigorado, Flügel sentiu seu corpo finalmente relaxar do caos da batalha, mas seus músculos ainda estavam doloridos. Mesmo coberto de sangue, ele já não se parecia com um monstro, e sim com um garoto, embora com as marcas recentes da batalha.
Rodando o ombro direito e passando a mão no cabelo para trás, ele finalmente olhou para o mago vestido com uma armadura.
Aleksander tinha o rosto de um garoto de quatorze ou quinze anos, mas seus olhos afiados e fortes revelavam uma maturidade que não condizia com a idade. O cabelo loiro desgrenhado caía sobre seus olhos verdes brilhantes, como duas esmeraldas.
— Obrigado pela ajuda — disse Flügel, estendendo a mão direita para o garoto, que a aceitou com uma velocidade impressionante.
— Não precisa agradecer. O reino de Tournand pediu reforços ao império, e eu apenas cumpri ordens — Ele fez uma pausa, seus olhos se fixando nos de Flügel com um brilho quase infantil.
— Certo — Flügel poderia insistir que deveria agradecê-lo, mas ele estava bem e a intervenção de Aleksander era desnecessária e ele mais quase o matou do que salvou, ele não iria se dar ao trabalho de fazer mais do que o obrigado para ser gentil.
— Você é muito elogiado, sabia? Até entre os generais do império. Pelos relatórios, você é um soldado promissor, o mais jovem talento de Tournand. Mas eu pensei que você fosse mais velho, e também mais assustador… Bom, mas você lutando parecia um animal!
— Relatórios? — Flügel repetiu confuso, ele não sabia que tinha relatórios sobre ele sendo passado para o império Guardião, mas dado a existência de Aelara Veyris, talvez eles gostassem de saber sobre isso desde de cedo, exigindo assim um relatório sobre as tropas de Tournand. Flügel não gostava disso.
— Relatórios são comuns entre aliados — Aleksander disse, como se lesse seus pensamentos, embora a desconfiança em seu rosto não fosse difícil de detectar. — É assim que o Império se mantém informado sobre as capacidades de suas forças aliadas. Ajuda a otimizar a distribuição de recursos e reforços.
A explicação de Aleksander era lógica, mas não acalmou Flügel. Ele sempre prezou sua autonomia e o fato de ser monitorado, mesmo que indiretamente, o irritava.
— Entendo — Flügel respondeu, a voz carregada de ceticismo.
Os olhos de Flügel perscrutaram o corpo da besta sagrada. Severus era uma visão que roubava o fôlego. Seu corpo, estendendo-se por mais de quarenta metros, repousava sobre um amontoado de árvores quebradas, seus troncos retorcidos e esmagados sob o peso de suas escamas verde-azuladas.
A cabeça, distintamente aviária, lembrava uma águia majestosa, com um bico curvo e afiado como obsidiana polida e olhos ardendo em brasas azuis, profundas e faiscantes, que encaravam Flügel com uma inteligência severa.
Do pescoço para baixo, o corpo serpentino se estendia, longo e musculoso, coberto por escamas que pulsavam com tons metálicos entre jade verde e azul profundo.
Suas patas dianteiras, curtas, mas robustas, terminavam em garras afiadas como adagas, enquanto a cauda sinuosa se enrolava ao redor de uma árvore caída, a ponta afilada adornada por espinhos dourados. Como se sua cauda fosse feita para ser usada como uma maça.
As asas membranosas, amplas o suficiente para lançar sombras sobre campos inteiros, estavam parcialmente dobradas, os padrões dourados intrincados brilhando sutilmente como circuitos de mana.
Mesmo em repouso, ele exalava uma aura que misturava calor sufocante e frio cortante, e uma fumaça acinzentada escapava de suas narinas, carregando um cheiro metálico de cinzas extintas.
Olhando para ele naquele momento, com calma, Flügel percebeu a magnitude do que estava diante dele. Severus não era apenas uma montaria — era um guardião antigo, sagrado ao império, um dos poucos no continente sul. Seus olhos faiscantes o encararam por um instante, e ele engoliu em seco, sentindo-se pequeno sob o julgamento silencioso do ser imponente.
Mentalmente ele agradeceu que o Guardião estava de seu lado e não contra eles. Ele se perguntou sobre o quão forte realmente era Aelara Veyris para conseguir forçar o império a assinar um acordo “justo” com o reino de Tournand, mesmo com eles possuindo aquela besta do seu lado.
Passos apressados ecoaram na floresta, e ele se virou para a fonte do barulho, apenas para ver um bando de pessoas correndo em sua direção. Entre eles estava o Capitão Eadric.
O Capitão, com suas vestes manchadas de terra e lama, parou abruptamente ao vê-los, seus olhos arregalados de surpresa ao processar a cena: Flügel ensanguentado, mas ileso, Aleksander e Nytheris, e o imponente Severus do império.
— Flügel! Nytheris! Vocês estão bem? — Eadric exclamou, sua voz rouca de alívio e preocupação. Seus homens, igualmente exaustos, se espalharam, alguns examinando os arredores em busca de ameaças, outros apenas ofegante.
Flügel acenou com a cabeça, a tensão em seus ombros diminuiu um pouco com a chegada de seus companheiros. — Estamos. Aleksander nos deu uma mão.
Eadric olhou para Aleksander, um olhar de reconhecimento passando por seu rosto antes de se curvar ligeiramente. — Príncipe Aleksander. É uma honra tê-lo aqui. Soubemos que os reforços imperiais iriam chegar, mas não esperávamos encontrá-lo tão cedo…
Aleksander sorriu, um gesto amigável. — Vim o mais rápido possível pois disseram que a situação era crítica, mas parece que o pior já passou.
Os olhos de Eadric se demoraram em Severus, uma mistura de fascínio e cautela. A presença da criatura era avassaladora, e o Capitão, como muitos, só tinha ouvido falar dela em lendas.
— E essa… essa criatura… — Eadric começou, hesitantemente, seus olhos fixos em Severus.
Um murmúrio de espanto percorreu as fileiras dos soldados de Tournand. A simples visão do guardião imperial pousado era algo extraordinário, uma lenda materializada bem diante deles.
Flügel percebeu que a chegada de Eadric e seus homens trazia um certo alívio, mas também uma onda de pensamentos preocupantes. Ele notou a ausência de dois rostos importantes entre eles: Siegmeyer e Thalion.
— Siegmeyer te chamou para cá, Eadric? — perguntou Flügel, uma centelha de preocupação em sua voz.
— Sim, os dois estão bem, não se preocupe — a voz de Eadric carregava um calor reconfortante. Ele parecia feliz que Flügel demonstrava preocupação com seus companheiros.
— Ótimo… — Flügel relaxou os ombros, mas então sua mente voltou para a forma como Eadric havia saudado Aleksander.
— Espera… Príncipe? — Flügel perguntou, confuso, olhando novamente para Aleksander. Se ele era realmente o Príncipe do Império Guardião, Flügel poderia ter sido bastante rude ao não insistir em agradecê-lo adequadamente antes.
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