Dica para leitura: aspas simples são para pensamentos internos, que é esse símbolo: ’
Aspas duplas para conversa mental: “
Travessão para falas em voz alta: —
Capítulo 84 — Perguntas
Garrick lhe deu um breve aceno de cabeça, cumprimentando Flügel com uma pitada de orgulho em seu olhar. Vendo o garoto que ele viu tão pequeno, crescer e ficar forte o bastante para se sujar inteiro de sangue de uma batalha e ainda assim retornar bem.
Mesmo vendo Flügel como um soldado e tratando ele como um, apesar de seus benefícios, ele sabia que Flügel era uma criança. Mesmo ele não podendo tratá-lo como uma, Garrick tinha noção que Flügel estava assim por ter sido machucado e se recuperado, como uma lâmina onde ela é aquecida e resfriada diversas vezes para ficar resistente o suficiente.
Movendo seu olhar para o garoto ao lado do sujo Flügel, Garrick se curvou levemente num cumprimento respeitoso, uma ação instintiva diante da realeza.
— Príncipe Aleksander, não sabíamos que o senhor chegaria tão cedo… e sozinho. — A surpresa era evidente na voz do Major.
— O pedido de vocês era urgente. Por isso vim primeiro, para ajudar um pouco antes que o restante dos reforços cheguem.
— E quando eles chegam? — Garrick perguntou, a voz carregada de uma esperança sutil.
— Em três dias a partir de hoje. A estrada não está amigável ultimamente… — Aleksander respondeu, mas sua atenção não estava na logística militar. Seus olhos verdes faiscavam com uma luz inusitada, e um sorriso quase imperceptível se formou em seus lábios. Ele estava inquieto.
Garrick, no entanto, não notou a empolgação do príncipe. Ele franziu a testa, os molares rangendo sob a pressão de sua ansiedade. Aquele tempo de espera era uma eternidade. No entanto, sua mente pragmática buscou rapidamente uma solução.
— Entendo, mas com a besta sagrada do império aqui, nós temos o melhor reforço possível. Não precisamos esperar.
— Realmente tem um Lich na floresta de Tournand? — O rosto de Aleksander estava cheio de uma animação estranha e esperançosa. Era como se ele não estivesse diante de uma ameaça, mas de um desafio intrigante.
Garrick, pego de surpresa pela pergunta, hesitou. — Uh… Sim, se não é um Lich, é algo tão poderoso quanto um… Dias atrás, quase morremos para uma ilusão e um de seus monstros — Garrick falou com pesar, como se não gostasse nem de se lembrar da batalha. A cautela dele contrastava com o entusiasmo de Aleksander.
Enquanto Aleksander enchia Garrick de perguntas sobre a batalha contra o Lich, Thalion estava agarrado a Flügel, chorando.
— Você foi tão bravo! — disse o velho, agarrando a cabeça de Flügel entre suas mãos. Seus olhos lacrimejavam com orgulho, como os olhos de um pai olhando para seu filho.
— Isso é vergonhoso Thalion! — Flügel disse, tentando se desvencilhar do abraço do velho mago, sem fazer muito esforço. Apesar de não conversarem tanto, ambos tinham um carinho um pelo outro, e Thalion via em Flügel o que ele via em Siegmeyer e Grenhard quando criança.
— Ele está cansado, Thalion — Siegmeyer disse, puxando Thalion pela gola. O rosto do mestre da Torre dos Magos estava mais pálido do que o habitual, um preço claro que ele tinha que pagar pelo esforço que fez ao correr.
Tirando Thalion de cima de Flügel, os olhos de Siegmeyer se fixaram no rosto do garoto, sujo de sangue podre. Seu olhar estava cheio de respeito e agradecimento.
O ato de coragem de Flügel foi capaz de fazê-los recuarem em segurança, tendo em vista que ambos não passariam de sacos de pancadas quando a situação não lhes deixasse usar magia, principalmente Siegmeyer com seu corpo enfraquecido por algum motivo desconhecido.
— Muito obrigado, Flügel. Eu irei te recompensar depois — Siegmeyer deixou um sorriso de lábios enfeitar seu rosto, deixando a mente de Flügel pensar sobre o que ele poderia receber de recompensa.
— Não precisa me agradecer, fiz o que a situação exigia ser feito. E eles não eram de muito problema, não fiquei muito machucado contra aqueles Goblins — Flügel olhou para Aleksander, que ainda estava entusiasmado escutando Garrick contar sobre a luta contra o fantoche do Lich.
— Mas eu acho que não sobrou nenhum corpo para analisarmos. O ataque do Severus obliterou tudo, não deixou nem pó para trás. Seria ótimo se pudéssemos analisar seus corpos, para entender como o Lich foi capaz de fazer os Goblins comerem as matrizes. — Flügel disse, a cena dos goblins agachados, devorando a base da matriz com uma fome antinatural, passou pela sua mente novamente, revirando seu estômago.
A memória daquela visão grotesca se misturava com o turbilhão de perguntas que o assombravam. A cada dia que passava, em vez de encontrar respostas, ele só acumulava mais mistérios.
Sua mente era um campo de batalha interno, onde questões sobre seu destino, a natureza das entidades que o perseguiam, o motivo de sua reencarnação, o poder de Severus, a ameaça do Lich e a verdadeira história por trás de Aelara e da magia se atropelavam, sem nunca encontrar uma conclusão.
Ele se via preso em um ciclo de busca incessante, uma ambição que consumia sua cabeça e sua paz. O simples fato de não saber, de não conseguir juntar as peças, começava a se tornar uma tortura. Era como se a verdade estivesse sempre a um passo de seu alcance, mas escondida atrás de um véu intransponível.
— Isso é uma pena, realmente — Siegmeyer disse com um suspiro profundo. — Poderíamos aprender muito sobre a necromancia do Lich e a fisiologia dessas criaturas, se pudéssemos estudá-las. Uma chance como essa não aparece duas vezes.
— Se você está aqui, quem deixou as matrizes estáveis novamente? Você não deveria estar na Torre dos Magos? — Desde que chegou e viu Siegmeyer ali, a pergunta assombrava a mente de Flügel. A ausência do mestre da Torre, no local mais importante para a segurança de Tournand neste momento, simplesmente não fazia sentido para o jovem soldado.
— Hm… não sou eu que cuida das matrizes — Siegmeyer respondeu, sua expressão se tornando séria e impenetrável. — É outra pessoa. Mas não posso dizer mais do que isso. É um assunto confidencial, restrito apenas aos membros de mais alta patente da Torre dos Magos.
O rosto de Siegmeyer se fechou de tal forma que Flügel soube, de imediato, que não adiantava insistir. O segredo era guardado a sete chaves, e a informação, vital para a estabilidade do reino, estava nas mãos de um desconhecido.
A revelação de Siegmeyer apenas adicionou mais um mistério à lista interminável de Flügel. Uma irritação sutil se instalou em seu peito, uma pontada de frustração por ter a verdade tão perto, mas ainda inacessível. Ele reprimiu o sentimento. Não era o momento de questionar segredos da Torre. Ele precisava de respostas mais urgentes, mais imediatas.
— Um Lich… — A voz de Aleksander soou ao seu lado, uma presença inesperada que fez Flügel sobressaltar-se. O Príncipe, que até então parecia absorto nas histórias de Garrick, tinha ouvido a última parte da conversa.
Seus olhos verdes faiscavam com uma mistura de curiosidade e uma determinação quase predatória. Ele olhou diretamente para Siegmeyer e Garrick. — Têm um plano para lidar com ele?
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